Os Melhores Filmes de 2021

Arte retangular na cor verde escuro. No canto superior direito está escrito em branco “OS MELHORES FILMES DE 2021”. Na parte inferior esquerda da imagem está uma foto da ovelha, personagem do filme Lamb, usando uma coroa de flores na cabeça. O animal é retratado em preto e branco, com silhueta verde clara ao redor de seu corpo, enquanto ele olha para o lado direito. Ao lado direito da ovelha está a figura da personagem Maribel, mulher protagonista da animação Encanto. Ela tem cabelos cacheados curtos e usa óculos e brincos redondos, além de bata com desenhos. A personagem também está colorida em preto e branco, com silhueta verde escura ao redor de seu corpo. Acima da ovelha e de Maribel está a imagem do personagem Gawain, homem protagonista do filme A Lenda do Cavaleiro Verde. Ele olha para o lado esquerdo com expressão séria e seus cabelos caem em seu rosto barbado. A imagem do personagem também está em preto e branco e, ao seu redor, está uma silhueta de cor verde vibrante. Entre todos os personagens, estão figuras animadas de uma coroa (Gawain), várias borboletas (Maribel) e alguns traços (ovelha) aparecendo e desaparecendo. No canto inferior direito, há o logo do Persona, um olho com a íris de cor verde claro.
Entre o melhor do Cinema em 2021, tivemos a estranha fofura de Lamb, a imponência de A Lenda do Cavaleiro Verde e o carisma infinito de Encanto (GIF: Reprodução/Arte: Ana Clara Abbate/Texto de Abertura: Vitória Silva)

Não poderíamos terminar o Melhores do Ano sem falar do setor que retomou os seus dias de glória em 2021: o Cinema. Após a paralisação completa das salas ao redor do mundo em 2020, em decorrência da pandemia de covid-19, o audiovisual precisou se readaptar. Com isso, ano passado foi o momento de observar o efeito da ascensão dos streamings, assim como o retorno da sagrada experiência de subir as escadas para sentar em uma poltrona aconchegante e comer pipoca fresquinha enquanto assiste ao mais novo lançamento cinematográfico na telona. 

As repercussões desse novo cenário podem ser vistas na principal premiação do Cinema. Na aclamada categoria de Melhor Filme do Oscar 2022, dos 10 indicados, 6 tiveram apoio na distribuição pelos serviços de streaming. A Netflix continua dominando o meio com seus originais, e emplacou 9 produções em 15 categorias diferentes. Mas, deixando as premiações de lado, o Persona também se dedicou em realizar sua própria condecoração diante da Sétima Arte. 

Com base em rankings feitos pela Editoria e nossos Colaboradores, 78 produções foram definidas como os Melhores Filmes de 2021. Do faroeste de Jane Campion à turma do bairro do Limoeiro, as produções aqui permeiam pela variedade dos grandes estúdios até os feitos do Cinema Independente. Fato esse que pode ser demonstrado pelos nossos três campeões de menções: Ataque dos Cães, Duna e Titane

A pluralidade de escolhas também é representada por uma volta ao globo terrestre. Entre os países de origem dos filmes que foram citados, estão: Brasil, Estados Unidos, França, Itália, México, Nova Zelândia, Irlanda, Japão, Alemanha, Kosovo, Dinamarca, Reino Unido, Islândia, Espanha, Colômbia, Irã, Coreia do Sul e Noruega. Destes, 7 obras citadas são produções nacionais, contando com nomes como o aguardado Marighella de Wagner Moura, o relevante Cabeça de Nêgo e o quase nomeado ao Oscar Deserto Particular

E, falando no careca dourado, dos 10 filmes que concorrem ao prêmio máximo da Academia, 9 apareceram na nossa lista. O olhar romântico de Paul Thomas Anderson e a comovente história de uma família de surdos não poderiam passar por 2021 sem marcar presença aqui. No Mês da Mulher, também teve espaço para elas na nossa lista, mas não na dose que deveria. Entre os 78 filmes citados, 19 foram dirigidos ou codirigidos por mulheres, o que representa quase, e apenas, ¼ do ranking total. 

Se vamos encontrar um cenário como esse no próximo ano, só o tempo irá dizer. Fato é que se podemos ter esperança em alguma mudança significativa no mundo cinematográfico, ela deve ser sempre pautada pela diversidade. Com base em 20 olhares diferentes, você confere abaixo a seleção do Persona para os Melhores Filmes de 2021

Cena do filme 7 Prisioneiros. Na imagem, por detrás de barras de aço desfocadas, vemos, ao centro, o protagonista de 7 Prisioneiros. Ele é um homem negro, de cabelos pretos curtos, aparentando cerca de 20 anos, encarando a câmera e o vemos em um primeiro plano, dos ombros para cima. Desfocados à esquerda e à direita dele, vemos outros dois homens, também aparentando cerca de 20 anos.
O filme estreiou, com muitos elogios, no Festival de Cinema de Veneza (Foto: Netflix)

7 Prisioneiros

Um dos finalistas à submissão para representar o Brasil como Melhor Filme Internacional no Oscar 2022, o longa protagonizado por Rodrigo Santoro e Christian Malheiros serve para denunciar trabalho análogo à escravidão e alcança o mesmo patamar de obras consideradas colossais no Cinema nacional. O filme se passa na capital paulista, escancarando o quão próxima essa realidade está – o pensamento político por trás de quem comanda – e como não fazemos questão de enxergar a barbárie. A direção de fotografia usa do triste cinza da maior metrópole da América Latina para traduzir a realidade apresentada. 

Rodrigo Santora se reafirma como um dos maiores atores de sua geração, enquanto Malheiros ganha um personagem notório que, além de ser um deleite assistir sua atuação, proporciona o raio-x social e econômico do país. A reviravolta do roteiro acentua toda a complexidade do tema, trazendo camadas do sistema que te oprime e te torna opressor. A direção incisiva de Alexandre Moratto se preocupa a todo momento em aproximar a ficção da realidade, tornando 7 Prisioneiros não apenas um dos melhores do ano como um dos melhores nacionais do momento. – Ana Júlia Trevisan

Cenas Favoritas: a chegada de Mateus a São Paulo; e a última cena.


Cena do filme A Crônica Francesa, de Wes Anderson. Na imagem retangular em preto e branco, o ator Benicio del Toro está ao centro, vestindo uma camisa de força de cor branca, atrás de grades de cor cinza. Ele é um homem branco de cabelos e barba de cor preta. Ao seu lado, está a atriz Léa Seydoux, vestindo uma roupa de guarda policial em cor preta, composta por um casaco de cor preta com botões brancos e um quepe militar na cabeça, igualmente de cor preta. Ela é uma mulher branca, de cabelos lisos de cor cinza. Ao fundo estão mais dois homens brancos, vestidos com os mesmos trajes militares, enquanto um deles segura um fuzil de cor preta e cinza.
A Crônica Francesa é uma homenagem ao Jornalismo e Literatura, e eleva Wes Anderson ao seu ápice cinematográfico (Foto: Indian Paintbrush)

A Crônica Francesa (The French Dispatch)

O senso comum nos filmes de Wes Anderson é o jogo de câmeras milimetricamente calculado, além dos cenários coloridos que ganham espaço e se expandem em nossa consciência. Mas em A Crônica Francesa, Anderson evoca sentimentos através de uma mistura de cenas coloridas e em preto e branco – jogo utilizado para evidenciar as histórias que não pertencem à trama principal –, atingindo seu auge cinematográfico. Através dos lindos enquadramentos, uma história deslumbrante (e cheia de ramificações) é narrada, contando com um  elenco de peso – de Bill Murray e Benicio del Toro a Tilda Swinton e Adrien Brody – para prestar uma singela homenagem à revista The New Yorker. Invariavelmente, temos o registro de uma verdadeira ode ao jornalismo.

Wes Anderson já havia ensaiado anteriormente seu desejo em homenagear a revista, pois um de seus passatempos favoritos sempre foi a leitura dos contos publicados nela. Foi lá, inclusive, que conheceu as histórias de J.D. Salinger, autor da conturbada família Glass a qual serviu de referência máxima na composição de Os Excêntricos Tenenbaums (2001). Porém, o foco do enredo – como é de se esperar num filme de Anderson – são as pequenas histórias que se interligam, cuja trama é orientada através do cotidiano dos funcionários que dão vida a revista diariamente (no filme, a revista se chama The French Dispatch). No fim, A Crônica Francesa provou que o mundo fantástico do diretor vai muito além do virtuosismo técnico – é humano, demasiado humano. – Bruno Andrade

Cenas Favoritas: a história, narrada pela crítica de arte J.K.L. Berensen (Tilda Swinton), sobre o personagem Moses Rosenthaler (Benicio del Toro), um presidiário com personalidade psicose que começa a pintar quadros fabulosos à medida que se relaciona com a guarda da prisão, Simone (Léa Seydoux). 


Cena do filme em animação A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas. Na imagem há quatro personagens. Da esquerda para a direita temos, Katie, uma adolescente branca, ela tem cabelos ruivos que estão presos em um rabo de cavalo, usa um óculos com armação vermelha. Ela veste uma jaqueta vermelha e uma camiseta branca, usa uma calça jeans rasgada no joelho e um tênis branco. Do lado direito dela aparece RIck, um homem adulto e branco, ele tem cabelo castanho, uma barba rala e um bigode, ele usa um óculos com armação marrom. Ele veste uma jaqueta amarela com pelo marrom na gola, uma camisa branca xadrez, uma calça jeans e uma botina marrom. Ao lado dele aparece Linda, uma mulher adulta e branca, ela tem cabelos castanhos cacheados, e seu cabelo é curto, ela usa um óculos rosa, uma camiseta rosa, uma calça jeans e botina marrom, em sua cintura está pendurada uma blusa rosa. Do lado dela aparece Aaron, um menino de cabelos loiros e lisos, ele usa uma camiseta azul, uma calça cinza e um tênis preto. Todos estão assustados. Atrás deles tem uma caçamba de lixo verde e dentro dela está um cachorro pug bege.
O estilo de animação de A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas surpreende por sua criatividade e inovação (Foto: Netflix)

A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas (The Mitchells vs. the Machines)

A Sony Pictures Animation vem ganhando destaque no cenário de animações, e A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas é mais um acerto que atesta a produtora como uma das melhores da atualidade. Com uma trama ágil e divertida, o roteiro nos leva a conhecer uma família extremamente carismática, a qual possui dramas bem realistas, facilmente identificáveis e que auxiliam tanto as gerações mais velhas quanto as mais jovens a se conectarem com os personagens. Outro ponto fortíssimo desse longa é seu humor, pois todo o enredo é recheado de piadas super divertidas e leves, que, com certeza absoluta, agradam toda a família. 

O estilo da animação é um grande diferencial do filme. Misturando o estilo 3D com o 2D, consegue criar cenas magníficas, além desse elemento ser utilizado até mesmo na comédia presente na história. Há vários momentos que aparecem colagens, montagens, referências e outros aspectos visuais que tornam toda a projeção ainda mais cativante de se assistir. Devido aos seus vários pontos positivos, A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas foi indicada ao Oscar de Melhor Animação, e merece muito esse prêmio, pois esse é um longa-metragem que transborda carisma, criatividade e paixão. – Nathan Sampaio

Cenas Favoritas: a cena de abertura do filme; a interação da família Mitchell com os robôs com defeito; e a luta contra os Furbies.


Cena do filme A Filha Perdida. Na imagem, vemos uma mulher de cabelos curtos e castanhos, pele clara e olhos castanhos. Ela está vestindo uma camisa de mangas compridas azul clara, e olha para frente, com a boca entreaberta, enquanto abraça uma boneca de cabelos loiros e roupa marrom. Atrás dela tem uma parede azul clara e outra branca, com luz incidindo por o que parece ser uma janela. Ela está em ambiente interno e está de dia.
A Filha Perdida aborda assuntos delicados para as mulheres, como maternidade, envelhecimento e liberdade de escolha (Foto: Netflix)

A Filha Perdida (The Lost Daughter)

Após ler o romance de Elena Ferrante, veio a curiosidade de assistir a adaptação dele, A Filha Perdida, da Netflix, que foi escrito, produzido e dirigido pela estreante Maggie Gyllenhaal (Batman – O Cavaleiro das Trevas). Surpreendentemente fiel ao livro, o filme arrisca ao mostrar de forma sincera (e assustadora) o universo feminino e suas funções na sociedade. A Filha Perdida conta a história de Leda (Olivia Colman, e, na juventude, Jessie Buckley), uma mulher divorciada que viaja sozinha para a Grécia durante as férias. Enquanto está na praia, ela observa uma mulher jovem, Nina (Dakota Johnson) cuidando de sua pequena filha e começa a recordar momentos de seu passado como mãe. 

Durante esses flashbacks mentais de Leda, fica evidente as dores que essas recordações acarretam, somadas  à conclusão de que ser mãe nunca foi seu real desejo. Ao contrário de muitas mulheres que vêem na maternidade o motivo para se sentirem realizadas, para Leda, não passou de um fardo, ou uma imposição do casamento. Tais assuntos, apesar de delicados, são retratados com sensibilidade e respeito. É um filme que intimida e incomoda, e, sem dúvida, deve ser visto e quem sabe até debatido, por pessoas de qualquer gênero. A Filha Perdida foi indicado a várias premiações, dentre elas: Oscar 2022 de Melhor Atriz para Olivia Colman, e ao BAFTA Awards 2022 de Melhor Roteiro Adaptado para Maggie Gyllenhaal. – Sabrina G. Ferreira

Cenas Favoritas: a dança de Leda em uma festa, após se surpreender ao notar que estava tocando a sua música preferida; e a conversa entre Leda e Nina, quando a primeira conta de forma dramática como foi ficar uma temporada bem longa longe de suas filhas.


Cena do filme A Ilha de Bergman. Na imagem, vemos uma mulher de cabelos castanhos presos, de pele clara, olhando para baixo. Ela está vestindo uma camisa de mangas compridas branca com listras cor de rosa aberta, por cima de uma blusa cinza e calças jeans. Ela tem algo nas mãos, possivelmente um celular, e uma mochila preta nas costas. Ela está ao ar livre, com uma vegetação no chão, e algumas árvores no canto esquerdo e na parte do fundo da paisagem. Também tem duas pequenas casas atrás dela, uma branca e outra vermelha, e está de dia.
Para acompanhar as referências de A Ilha de Bergman, é necessário ser movido pela “paixão bergmaniana”, por gerar reflexões no espectador (Foto: Pandora Filmes)

A Ilha de Bergman (Bergman Island)

É curioso pensar em A Ilha de Bergman como projeto, pois além da cineasta usar como título e pano de fundo o nome de um outro cineasta, considerado por muitos como um dos maiores de todos os tempos, surge também o receio de encontrar tentativas medíocres de reproduzir os embates filosóficos, as hostilidades ou os laços complexos que se desfazem, ao inigualável modo Ingmar Bergman de fazer filmes. No entanto, a obra vale muito a pena, pois, além de ser uma aula de aprendizagem sobre o autor sueco, também discorre sobre o amor, desenvolvimento profissional e dor.

Produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira (A Vida Invisível) e dirigido por Mia Hansen-Løve (O Que Está Por Vir), A Ilha de Bergman é centrado no casal de cineastas Chris (Vicky Krieps) e Tony (Tim Roth). Em busca de um lugar tranquilo para escrever seus novos filmes, eles decidem passar um verão na Ilha de Fårö, onde Ingmar Bergman viveu os últimos anos de sua vida. No local, o casal passa a ter os mesmos conflitos existentes nas obras intimistas e melancólicas retratadas pelo cineasta sueco. O longa concorreu à Palma de Ouro do Festival de Cannes 2021 para Mia Hansen-Løve e chegou aqui pela 45ª Mostra de SP. – Sabrina G. Ferreira

Cenas Favoritas: quando Chris e Tony estão próximos à janela e vemos pelos olhos deles a paisagem do externa da casa; e quando Tony está fazendo um passeio com um grupo de turistas, explorando a Ilha de Fårö, enquanto a guia de turismo dá uma aula sobre a importância de Bergman para a história da ilha, que ganhou destaque principalmente após gravar no local alguns dos seus célebres filmes.


Cena do filme Candyman. A cena mostra um homem negro, com barba por fazer e parado no corredor de um apartamento. Ele usa uma touca na cabeça e está com a mão direita machucada, enrolada em uma bandagem. Ele está com as mãos levantadas e olha assustado para algo que não está na imagem.
A reimaginação do clássico de 1992 deu origem a um dos melhores filmes de terror do ano (Foto: Monkeypaw Productions)

A Lenda de Candyman (Candyman)

Retomar a história de filmes de terror considerados clássicos pode ser uma empreitada arriscada. No caso do Candyman dirigido por Nia DaCosta, a retomada serviu como uma atualização muito bem-vinda de um dos personagens mais assustadores dos anos 1990. Em sua curta duração, elabora um mistério envolvente e traz discussões certeiras sobre temas sociais e raciais, de forma que o horror do mito de Candyman se funde aos horrores vividos pela população negra na vida real. Ao adotar o ponto de vista de um jovem artista negro, Anthony McCoy (Yahya Abdul-Mateen II), abre um leque de possibilidades muito bem exploradas pelo filme. 

Essas possibilidades geraram um dos melhores (e mais assustadores) momentos da obra: os assassinatos dentro da galeria de arte. A cena é linda visualmente e aterroriza por estabelecer uma tensão crescente entre o ambiente e os reflexos dos espelhos. Outra cena assustadora é a do final, onde a violência sangrenta e a música colaboram para deixar a situação apavorante. Aquela aparição, bem nos últimos segundos do filme, e aquela voz marcante são capazes de dar arrepios em qualquer um e mostram, caso ainda não tenha ficado claro, que Candyman vive. – Caio Machado 

Cenas Favoritas: os assassinatos na galeria de arte fechada, repleta de espelhos e onde a maior fonte de luz é a projeção de um filme na parede, é uma aula de como construir tensão no terror; a cena final, onde a violência sangrenta acontece fora do carro de polícia em que a protagonista está, também merece destaque por fechar o filme de uma forma profundamente desconcertante. 


Cena do filme A Lenda do Cavaleiro Verde. Na imagem há duas pessoas. No lado esquerdo está Gawain, um homem adulto e negro. Ele está de costas e tem cabelos pretos e cacheados, ele está usando um manto cinza, uma calça marrom e botas marrons, em seu pescoço tem um cachecol amarelo. Gawain está em cima de uma montanha e olha para um gigante. O gigante é cinza, não tem pelos no rosto e nem no corpo, tem rosto quadrado e olhos grandes. O gigante está com as mãos estendidas para Gawain. Ao fundo tem mais gigantes que estão andando.
A Lenda do Cavaleiro Verde cria planos e cenas lindíssimos e memoráveis (Foto: A24)

A Lenda do Cavaleiro Verde (The Green Knight)

A reimaginação da lenda arthuriana escrita e dirigida por David Lowery merece ser relembrada como um dos melhores filmes de 2021, pois o roteiro busca não apenas reproduzir uma história conhecida, mas refazê-la completamente, ao mesmo tempo que propõe reflexões e questionamentos sobre a honra e o destino. A jornada de Gawain é cheia de dúvidas, medo e hesitação, atitudes que nada se assemelha a um cavaleiro, e é o ponto mais forte da trama, discutir a honra e perguntar: o que ser honrado significa? Todo ato honrado é necessariamente bom? Nessas questões, a lenda já conhecida ganha camadas de profundidade e reflexão.

Mas as problemáticas do filme não se prendem apenas à honra, uma vez que ele discute sobre as nossas escolhas e as consequências que delas provém. Gawain se vê atormentado durante todo o longa por causa da decapitação do Cavaleiro Verde, e ele o fez mesmo sabendo que isso iria voltar para si. Tal atitude faz o personagem se questionar sobre o que ele realmente almeja e o que esperam dele, e essa dualidade de pensamentos permeia todo o longa-metragem, além de servir com uma indagação não só para o protagonista, como para a audiência também. A Lenda do Cavaleiro Verde carrega uma história densa, moderna, sombria e que aborda temas muito filosóficos, sendo um dos filmes mais intrigantes do ano. – Nathan Sampaio

Cenas Favoritas: a primeira aparição do Cavaleiro Verde; a moça que pede ajuda no lago; e o delírio que o protagonista tem sobre seu futuro.  


Cena do filme A Mão de Deus. Na imagem retangular colorida, o ator Filippo Scotti está parado em frente a uma praia, na qual se vê ao fundo uma montanha. Ele é um rapaz branco, com cabelos cacheados em cor preta, veste camiseta vermelha com listras amarelas, uma calça jeans de cor azul clara e um sapato de cor marrom. Ele segura, com a mão direita, a alça de sua mochila de cor marrom. Ele está com fones de ouvido envoltos na sua nuca.
A Mão de Deus marca o retorno do diretor Paolo Sorrentino ao seu próprio passado em Nápoles, rememorando tragédias familiares e, ao mesmo tempo, relembrando as belezas da descoberta (Foto: Netflix)

A Mão de Deus (È stata la mano di Dio)

As cenas iniciais de A Mão de Deus dão o tom de todo o filme. Após ver o mongezinho (uma criança vestida de monge), Patrizia (Luisa Ranieri) acredita poder finalmente engravidar. O quadro seguinte sucede a uma violenta reação do marido, Franco (Massimiliano Gallo), que acredita ter sido traído. É genial enxergar que o mítico e o real, de forma violenta, entram em choque, inserindo no contexto desproporcional de Nápoles Fabietto (Filippo Scotti), que está tentando encontrar sua própria essência enquanto lida com as adversidades da adolescência – perda da virgindade, passagem à idade adulta e seu amor pelo jogador Diego Maradona, figura a quem pertence o gol que dá título ao filme, cujo lado mitológico também será explorado. 

Até pouco mais da metade do filme há um desenvolvimento muito próximo da comédia dramática – tal qual Amarcord (1973), de Federico Fellini. Depois, após um acontecimento trágico, o longa muda bruscamente e entramos ainda mais na cabeça de Fabietto, cujo sonho – ainda incerto – é tornar-se cineasta. Essa quebra de estrutura traduz em imagens os sentimentos de Fabietto, que, enquanto se divide entre o vago destino de se tornar um artista, precisa lidar com a tragédia familiar e amadurecer repentinamente. Não surpreende que a graça de A Mão de Deus esteja na consagração do diretor Paolo Sorrentino como uma voz italiana original e poética, pois, a partir do futebol, conseguiu traçar uma história incomparável e familiar ao mesmo tempo: a sua própria. – Bruno Andrade

Cenas Favoritas: a cena em que a família está vendo o jogo no qual Maradona marca o gol de mão; e o momento em que Fabietto tem uma conversa com o diretor Capuano sobre cinema, definindo seu futuro como cineasta.


Cena do filme A Noite do Fogo. A imagem mostra três meninas, de aparentemente 8 anos, que estão do lado uma da outra, enquadradas do peito para cima e de frente para a câmera. A primeira tem a pele mais escura, cabelos escuros compridos e usa uma camiseta amarela. Ela está com o dedo nos lábios. A segunda tem a pele mais clara, tem os cabelos escuros presos e usa uma camisa branca com um coração e um colar. A última é mais alta que as outras duas, também tem a pele clara e os cabelos escuros presos. Ela usa uma blusa vermelha com o número 23 e mangas compridas, e olha em direção ao chão. Elas estão na frente de um morro coberto de grama, onde existem mais pessoas, porém o fundo é desfocado. É de dia.
Brilhando um elenco e direção de mulheres latino-americanas, A Noite do Fogo quase incendiou a categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar 2022 (Foto: Netflix)

A Noite do Fogo (Noche de Fuego)

As produções latino-americanas ficaram pelo caminho da corrida ao Oscar 2022, e talvez a perda mais doída dessa safra seja a seleção do México para a categoria de Melhor Filme Internacional, porque apesar de atribuído ao país indicado, se tem algo que a obra de Tatiana Huezo não é, é individual. Desde sua grandiosa produção em parceria com Brasil, Catar e Alemanha, até os detalhes mais fortes de sua história protagonizada por três jovens mulheres, A Noite do Fogo é a mais pura representação do porquê o Cinema é uma Arte coletiva.

O aspecto em questão é sempre o mais forte no gênero do documentário, linguagem em que a diretora é mestra. Para a sua primeira ficção, então, ela dedicou sua habilidade narrativa para adaptar livremente o livro Reze pelas mulheres roubadas, de Jennifer Clement. O resultado foi apreciado nos 4 cantos do mundo: no Festival de Cannes ou de Pingyao, na Academia ou na cidade de São Paulo, a obra fez de 2021 o ano de entender de uma vez por todas que pelo menos uma das tais veias abertas da América Latina é consequente de noites como a de fogo. – Raquel Dutra

Cenas Favoritas: o momento em que as três protagonistas estão conversando sobre o que pode acontecer com elas embaixo da árvore; e a tal noite de fogo.


Cena do filme A Tragédia de Macbeth. Em preto e branco, vemos o Rei chegar ao castelo de Macbeth (Denzel Washington) e ser recebido por sua esposa Lady Macbeth (Frances McDormand). Na parte esquerda da imagem, vemos o rei, a distância, chegando junto de sua comitiva e erguendo o braço direito para cumprimentar sua anfitriã. Atrás deles, vemos a silhueta de um castelo envolta em névoa branca. Mais próximo da tela, uma sequência de colunas quadradas e baixas enquadra a metade direita da cena, onde vemos Lady Macbeth, ao fundo, indo cumprimentar o Rei e Macbeth, mais próximo da câmera, oculto por uma das colunas, com sua silhueta quase fundida com as sombras criadas.
A tragédia de um homem preso entre culpa e ambição (Foto: Apple TV+)

A Tragédia de Macbeth (The Tragedy of Macbeth)

Se há algo ainda mais difícil do que contar uma história inteiramente nova, é achar uma nova maneira de contar uma história que todo mundo já ouviu milhares de vezes. Adaptando uma das peças mais famosas da língua inglesa, o diretor Joel Coen – pela primeira vez separado do irmão – escreve A Tragédia de Macbeth com mão firme, uma estética robusta e um bom olho para o elenco, que conta com Denzel Washington como o protagonista titular e Frances McDormand como sua ardilosa esposa.

Filmado em preto e branco e perspectiva quadrada, a quieta intensidade do filme reflete a junção dos seus aspectos teatrais com algumas das técnicas cinematográficas mais refinadas que o meio é capaz de proporcionar. A fotografia geométrica e precisa de Bruno Delbonnel é instantaneamente hipnotizante, ludicamente traduzindo do palco para tela a sua tragédia de erros que culmina em um final sangrento e potente. Denzel Washington é titânico no papel que lhe rendeu a indicação ao Oscar de Melhor Ator, combinando tanto a violência decisiva quanto o remorso lunático que levam a personagem ao seu triste fim. – Gabriel Oliveira F. Arruda

Cenas Favoritas: toda e qualquer cena envolvendo as três bruxas; e a caminhada de Macbeth em direção aos aposentos do Rei.


Cena do filme A Vida Depois. Vada (Jenna Ortega), lava as mãos numa pia encostada na parede esquerda da imagem. Na parede do seu lado esquerdo, na parte direita da imagem, Mia (Maddie Ziegler) se olha no espelho. Vada é uma adolescente latina, magra, de cabelos pretos e longos, usando uma camiseta vermelha com a estampa de uma bola de futebol branca. Mia é uma adolescente caucasiana, magra, mais alta do que Vada, de cabelos longos e loiros, usando um top branco e calças jeans, com uma bolsa amarela com alça verde apoiada à sua esquerda. Ambas as adolescentes se viram na direção da câmera, atentas. O banheiro em que elas se encontram possui azulejos brancos na metade inferior e beges na metade superior.
Depois que a violência te toca, não há como voltar atrás (Foto: HBO Max)

A Vida Depois (The Fallout)

O anúncio de um filme tratando sobre um tiroteio escolar sendo lançado diretamente por streaming não inspira muita confiança. Hollywood sempre teve propensão a explorar tragédias de maneiras que não respeitam as pessoas que viveram por elas, ou de enobrecer seu sofrimento quase ao ponto da paródia. Felizmente, A Vida Depois se esquiva dessa sina ao focar no impacto do trauma na vida de suas personagens e as diferentes maneiras que elas reagem a ele, por meio  de uma excelente caracterização e um roteiro sem medo de se abrir.

Grande vencedor do festival SXSW, o filme ganha vida e profundidade pela atuação sensível e reveladora de Jenna Ortega no papel de Vada, uma adolescente que fica presa em um banheiro com outras duas pessoas quando tiros são disparados dentro de sua escola. Capturando o terror da situação, já teria sido suficiente para a maioria, mas a A Vida Depois deixa claro que isso não é o bastante: a vida dessas personagens não acaba depois que elas passam por esse incidente, e talvez essa seja a parte mais difícil e macabra de se aceitar. Rejeitando a noção de que há uma maneira “correta” de se enfrentar um trauma, o longa de estreia da atriz Megan Park na direção e no roteiro deixa uma marca indelével. – Gabriel Oliveira F. Arruda

Cenas Favoritas: Vada fica chapada na escola e estoura uma caneta na boca; o momento em que ela se reconecta com a irmã; e a notificação que aparece em seu celular no final do filme.


Cena do filme Amor, Sublime Amor. A cena mostra a personagem Anita, interpretada por Ariana DeBose. Ela é uma mulher latina de pele negra, com cabelo na altura dos ombros, usa batom vermelho e vemos a alça de um vestido amarelo.
Sob a tutela e o carinho de Rita Moreno, Ariana DeBose eterniza sua própria versão de Anita, a melhor e mais rica personagem do musical (Foto: 20th Century Studios)

Amor, Sublime Amor (West Side Story)

Quando foi lançado, em 1961, Amor, Sublime Amor arrebatou um público cativo, ainda deslumbrado com a mágica e o fascínio dos musicais. O resultado foi uma performance arrebatadora nos prêmios da Academia do ano seguinte, faturando dois dígitos de troféus dourados. Então, qual a necessidade de recriar um clássico? Um filme repleto de significados e mensagens atemporais? Para Steven Spielberg, a motivação é tão clara quanto as luzes que iluminam o ginásio do colégio onde Tony e Maria se encontram: ele quer melhorar o que já era ótimo.

Apaixonado pelo longa de Jerome Robbins e Robert Wise, o pai do Cinema pipoca e o diretor que desbravou todo e qualquer gênero e formato, Spielberg realiza seu primeiro musical com o brilho nos olhos de uma criança. Na revigorante versão de 2021, Maria (Rachel Zegler) se apaixona por Tony (Ansel Elgort), iniciando um romance proibido, que perpassa suas vivências, rotinas e suas vidas. Anita (Ariana DeBose) interfere no que pode, mas o destino está selado. No topo de suas habilidades como criador, Spielberg alinha os astros para que, de maneira sublime, ele filme e eternize o amor. – Vitor Evangelista

Cenas Favoritas: o encontro na varanda; a movimentação super humana de Ariana DeBose na performance de America; e o momento em que Anita entende que a infância definitivamente ficou para trás. 


Cena do filme Annette. A cena mostra Annette, uma criança marionete em cima de um palco repleto de rosas aos seus pés. Annette é branca e seus cabelos são longos e ruivos, presos por um rabo lateral baixo. Há uma rosa lilás presa em sua orelha. Ela veste um vestido longo de mangas compridas com detalhes em verde. Ela encara o além, com um braço inclinado e o outro esticado. O fundo é preto e fumaças cenográficas envolvem-na.
Baby Annette, você será para sempre uma estrela (Foto: MUBI)

Annette

Leos Carax sempre soube que a Arte deveria ser perigosa, seja na glória de dois amantes dançando sob fogos de artifício, seja na completa podridão de um indivíduo que vagueia silenciosamente entre os limites da vida e performance. Com Annette, felizmente, não foi diferente. Levando vitória de Melhor Direção na premiação de Cannes e do César, o cineasta francês, juntamente do duo pop Sparks, deu vida à uma ópera rock fabulosa que acompanha a vida glamourosa de um casal aparentemente perfeito: Henry (Adam Driver), um comediante provocativo de stand-up, e Ann (Marion Cotillard), uma soprano renomada.

Sem medo de extrapolar os limites cinematográficos do “bom gosto”, o maximalismo artificial do primeiro musical de Carax rebaixa a narrativa convencional de sua filmografia a favor de uma justificativa metafórica, fantasiosa e dolorosamente sincera. O bebê do casal é Annette, uma criatura verdadeiramente de outro mundo. Ela é uma marionete (sim, literalmente uma marionete), até o catártico ato final que ecoa sombriamente o ritmo da inicialmente apaixonada We Love Each Other So Much. E não, não cabe a ninguém defender o absurdo de se usar uma marionete como figura central de um filme, exatamente porque o Cinema tem o direito de ser, sem desculpas, um espetáculo absurdo, ainda bem. – Ayra Mori

Cenas Favoritas: primeira versão apaixonada de We Love Each Other So Much, interpretada por Adam Driver e Marion Cotillard; versão de ninar de We Love Each Other So Much, interpretada por Simon Helberg; e todo o ato final.


Cena do filme Ataque dos Cães. A imagem mostra o personagem de Benedict Cumberbatch olhando para um punhado de rosas brancas que segura em sua mão. Ele é um homem branco, veste roupas de caubói e está em uma espécie de celeiro. A imagem é sutilmente iluminada, e na linha inferior, existem outras rosas em desfoque e uma vela acesa.
Acumulando 12 indicações ao Oscar, Ataque dos Cães faz de Jane Campion a 1ª mulher da história a disputar o prêmio de Melhor Direção mais de uma vez – e possivelmente, a terceira a vencê-lo (Foto: Netflix)

Ataque dos Cães (The Power of the Dog)

Há quem diga que um fenômeno só é especial pelo seu caráter de manifestação única. Mas quando o recorte é o Cinema mundial dos últimos anos, a transformação do extraordinário em ordinário é um pedido cada vez mais forte. E depois do que vivemos no ano passado, que outro nome no mundo poderia ocupar o lugar mais especial da vez se não o auspicioso Ataque dos Cães de Jane Campion? Desde a sua estreia já premiada no Festival de Veneza em setembro de 2021, a obra da diretora neozelandesa almeja e trabalha mês a mês para concretizar o fenômeno cinematográfico do ano. Na conclusão deste ciclo, consagrando-se motivo de recordes, prêmios e indicações incontáveis e exaltando uma trajetória impecável, aqui estamos nós, admirando-o.

Mas o poder do feito é justamente a sua completa despretensão. Na história protagonizada por um Benedict Cumberbatch que tem a irmandade danificada de Jesse Plemons e sofre profundamente com as presenças de Kirsten Dunst e Kodi Smit-McPhee, inexiste a perseguição por um filme metido à sua própria manifestação. A precisão magistral da mente que roteirizou e dirigiu a adaptação do livro homônimo não queria saber de nada além de contar sua história. O mundo o recebeu como era devido e o escreveu uma Bíblia de elogios, porque este é o fenômeno genuíno que buscamos: com todo o clamor que lhe é direito, que Jane Campion seja louvada como a melhor de 2021. – Raquel Dutra

Cenas Favoritas: a briga de Phil com Rose que surgiu de um improviso de Benedict Cumberbatch, e o momento que se desenrola a partir da rosa de papel feita por Peter.


Cena do filme Bar Doce Lar. A imagem mostra um menino e um homem sentados frente à frente conversando em um boliche. O menino está sentado à esquerda, é branco com cabelos castanhos, veste camiseta listrada de manga comprida, calças jeans e está com as mãos entrelaçadas no colo. O homem está sentado à direita, é branco de cabelos castanhos curtos, veste camiseta amarela com mangas compridas que estão arregaçadas, também está com as mãos entrelaçadas no colo e olha firme para o menino.
The Tender Bar, em seu nome original, é uma conversa sincera sobre a construção de uma criança (Foto: Amazon Prime Video)

Bar Doce Lar (The Tender Bar)

Numa sensível produção sobre laços familiares, Bar Doce Lar foi a melhor escolha para que Ben Affleck retornasse às telonas. O longa, que é baseado no livro de memórias homônimo de J. R. Moehringer, foi dirigido por George Clooney e co-estrelado por Tye Sheridan, Lily Rabe e Christopher Lloyd, além de Affleck. Sem dúvida que tais presenças hollywoodianas de peso garantiram a atuação no que marca a história: as relações. No entanto, a sinceridade que o ex-Batman deu para seu personagem de tio Charlie, e sua demonstração de amor na vida real para a criação do sobrinho JR, são as verdadeiras bases do filme, o tornando um dos mais bonitos de 2021.

Ainda que Affleck não seja o protagonista, seu desempenho rendeu a indicação ao SAG Awards de Melhor Ator Coadjuvante – uma mensagem nítida de que somos gratos por estar de volta aos trilhos. Sua presença foi vital para a construção do filme, pois tal qual JR, é fácil se apaixonar pelo tio Charlie. Dentro da narrativa, é justamente o roteiro seguro e a história simples que se destaca entre os outros filmes do ano, pois há familiaridade com a vida comum, de qualquer pessoa. Enquanto o menino cresce, seu desenvolvimento vem com as dúvidas, a raiva de um pai biológico distante, e o medo da monotonia acompanhar seu caminho, mas o que se sobressai é como o amor das pessoas que o cercam e o criam são o que o fazem continuar. – Nathália Mendes

Cenas Favoritas: JR criança sendo levado para o Dia de Pais e Filhos na escola pelo avô; Charlie oferecendo sua estante de livros para o sobrinho; e quando JR dá um soco no pai biológico.


Cena do filme Belfast. Na imagem em preto e branco, vemos um garoto loiro de cabelos curtos, olhando para a frente. Ele está vestindo um colete preto por cima de uma camisa branca. Só é possível visualizar metade do seu rosto, com uma sombra escura cobrindo a outra metade, e ele é visto somente dos ombros para cima. Ele está parado de costas para uma parede de tijolos. Ele está ao ar livre e está de dia.
Belfast é filmado em preto e branco, a fim de reproduzir o cinema sem cores dos anos 60 (Foto: Universal Pictures)

Belfast

Dentre tantos filmes hollywoodianos populares, a comédia dramática Belfast, dirigida e escrita por Kenneth Branagh (Tenet, Assassinato no Expresso do Oriente), de origem britânica e quase biográfica, ganha destaque na simplicidade ao acompanhar a vida de uma família durante um período histórico conturbado. O filme é centrado na infância e visão lúdica de Buddy (Jude Hill), um menino de 9 anos, diante do intenso conflito entre católicos e protestantes na cidade onde ele e sua família vivem, Belfast, na Irlanda do Norte, no final dos anos 60 – período conhecido no país como “The Troubles“. É impossível não se emocionar ao ver a inocência de uma criança que tem sua ilusão de mundo perfeito interrompida por brigas e violência extrema bem em frente a sua casa.

Além da bela fotografia em preto e branco, e marcante trilha sonora composta por canções do também irlandês Van Morrison, o longa ainda tem como um dos seus grandes acertos o elenco, que reúne Caitriona Balfe, como Ma; Jamie Dornan, como Pa; e Judi Dench e Ciarán Hinds como avós do garotinho. Se você busca assistir algo que impacte o seu dia e ainda te ensine, não deixe de ver Belfast. Sucesso de crítica, além de vencer o prêmio Globo de Ouro como Melhor Roteiro em 2021, a obra já coleciona várias indicações ao Oscar 2022, como Melhor Filme e Melhor Roteiro Original; ao BAFTA Awards de Melhor Filme, entre outros. – Sabrina G. Ferreira

Cenas Favoritas: o conjunto de nuances que torna a cena de abertura incrível; e quando Buddy está no cinema com sua família, onde todos ficam maravilhados com o poder da Sétima Arte, que serve como refúgio e ao mesmo tempo um descanso para todo aquele caos vivenciado por eles.


Cena do filme animado Belle. Belle, à direita, abraça o focinho do Dragão, à esquerda, em frente a um céu noturno estrelado. Belle é uma mulher jovem e magra, de pele rosada e cabelos rosa, lisos e longos. Seu rosto é marcado por sardas brancas e maquiagem rosa. Ela usa um vestido rosa sem alça, luvas brancas e uma tiara feita de ramos verdes. Ela se inclina na direção do Dragão de olhos fechados, com a mão esquerda tocando seus cabelos. O Dragão é um monstro de cara lupina e focinho largo, com chifres brancos e presas protuberantes, uma juba preta cobrindo sua cabeça, com as orelhas azuis, visíveis por entre os pelos. Seus olhos estão fechados e sua mão direita segura toda a cintura de Belle.
Em Belle, o amor não é idealizado como sentimento, e sim como ação (Foto: Studio Chizu)

Belle (Ryû to sobakasu no hime)

Muito mais do que apenas mais uma releitura de A Bela e a Fera, o novo longa de Mamoru Hosoda e do Studio Chizu é a culminação de sua carreira: uma explosão de emoções tão sinceras e intensas que seu clímax te fará cantar junto com os personagens ou te deixará completamente sem palavras. Combinando técnicas de animação 2D e 3D para a criação de seu glorioso mundo virtual, Belle é, ao mesmo tempo, uma íntima exploração de luto e do significado de comunidade em uma sociedade globalizada e uma grande ode ao poder transformativo do ato de amar.

Como seu título ocidental sugere, a nova iteração do conto francês foca especialmente em sua contraparte feminina. A jornada de Suzu (Kaho Nakamura) para lidar com a morte da mãe e o mistério que a leva a procurar pela identidade do Dragão (Takeru Satoh) dentro do ciberespaço convergem em uma performance musical em que todos os elementos do filme entram em sincronia para criar uma das sequências cinematográficas mais inesquecíveis do ano, conquistando cinco indicações no 49º Annie Awards, mas, infelizmente, ficando de fora da corrida pelo Oscar. – Gabriel Oliveira F. Arruda

Cenas Favoritas: Belle acha novamente sua voz no mundo de U; e a performance final de Suzu para salvar o Dragão.


Cena do especial de comédia Bo Burnham: Inside, da Netflix. Fotografia retangular e colorida. A câmera foca, em primeiro plano, no rosto de Bo Burnham, um homem branco, de olhos claros, cabelos ondulados e barba loiros. Ele, que está deitado em uma cama, coberto por uma manta azul, é iluminado por uma forte luz branca, enquanto olha para o lado, como se a encarasse. O resto do quarto está completamente escuro.
Escrito, produzido e dirigido pelo próprio Bo Burnham, o especial musical de comédia foi indicado ao Grammy e levou 3 Emmys para casa em 2021 (Foto: Netflix)

Bo Burnham: Inside

“Espero que este especial possa fazer para vocês o que tem feito para mim nos últimos meses, que é me distrair da vontade de colocar uma bala na minha cabeça, com uma arma”, diz Bo Burnham, nos primeiros minutos de Inside, assumindo sem compostura alguma o caráter notavelmente autodepreciativo do seu humor. Porém, dando um tiro no pé, o novo especial da Netflix começa a consumi-lo de tal forma que, no final, se torna seu próprio martírio. Presenciamos intimamente o músico e comediante beirando a insanidade em detrimento da produção: ele para de se cuidar, deixando seu cabelo e barba crescerem; o quarto claustrofóbico, onde ele grava todas as cenas, acumula cada vez mais os equipamentos entulhados; e seu processo criativo fica ainda mais caótico, explorando temas desconexos com uma fotografia e musicalidade alucinadas.

Em meio a todo esse fuzuê, Inside surpreende quando, em vez de tentar reproduzir metodicamente a experiência de um show, usa a limitação da pequena sala ao seu favor para criar sequências estonteantes que jamais seriam possíveis em cima de um palco. Além disso, é tematicamente curioso como Bo transforma, de uma hora para outra, uma sátira cômica sobre o perfil de Instagram de uma garota branca em um monólogo fragilizado sobre o luto. Aqui, esse tipo de quebra ocorre o tempo todo. Claro, Burnham instiga risadas, mas nunca em um lugar de conforto. E, assim, cria um produto direto de 2020, desconcertante, que desafia seu público e termina entregando todo o fardo de um ano de isolamento em seu colo. Como lidar com tamanho peso? É nessa dúvida que nasce Bo Burnham: Inside. – Enrico Souto

Cenas Favoritas: a sequência musical de White Woman’s Instagram; a virada para os 30 anos; e a esquete de “auto-gameplay”.


Cena do filme Canções Engarrafadas 1-4. A imagem mostra a tela de um computador com várias janelas de um navegador abertas. Na janela em destaque, há a página de um vídeo no youtube na vertical mostrando um grupo de homens andando no deserto. Nas outras janelas, há do mesmo modo páginas de vídeos, mas em todas elas constam um aviso de remoção de vídeo.
O filme experimental teve exibições em festivais on-line, mas se encontra indisponível no momento (Foto: Chloé Galibert Lainé e Kevin B. Lee)

Bottled Songs 1-4

Como mensagens escondidas em garrafas encontradas ao acaso em um rio, as quatro Canções Engarrafadas são um belo achado. Resultado das trocas de e-mail entre os criadores Chloé Galibert Leiné e Kevin B. Lee, o filme é um compilado de quatro ensaios investigativos, inteiramente capturados na tela de dois computadores, acerca de como a imagem do Estado Islâmico é perpetuada e ressignificada na internet. Pareceu chato? Engano seu: Bottled Songs é tenso, reflexivo, hipnotizante, e, com seus discretos 77 minutos de duração, é uma das grandes descobertas escondidas de 2021.

O filme completo ou apenas segmentos específicos foram exibidos em diversos festivais ao redor do mundo, além de integrar a programação do 5º Festival Ecrã de Experimentações Audiovisuais. Fugindo de um experimentalismo vazio e mal justificado, Bottled Songs é uma obra bastante acessível, que traz reflexões profundas sobre a geopolítica em tempos de internet, a natureza das imagens, e a nossa complexa relação com elas. – João Batista Signorelli

Cenas Favoritas: o primeiro segmento, que investiga a trajetória e as motivações de um vídeo da ISIS propagado pela mídia; e o segundo que disseca um longa-metragem de propaganda jihadista. 


Cena do filme Cabeça de Nêgo. Na imagem, o personagem Saulo, interpretado por Lucas Limeira, está sentado na mesa de uma sala de aula, mexendo no celular. Saulo é um jovem negro, de cabelo crespo e volumoso, ele veste um uniforme escolar, com uma camiseta branca de mangas vermelhas. Ao fundo, é possível ver parte de uma frase escrita na lousa.
Apesar de ter sido exibido em festivais no ano de 2020, o longa chegou aos cinemas brasileiros só em 2021 (Foto: Corte Seco Filmes)

Cabeça de Nêgo

Se já estamos cansados de lidar com a realidade corrupta e mascarada da política brasileira, Cabeça de Nêgo nos faz engoli-la à força. Dirigido por Déo Cardoso, o longa cearense alinha-se no cerne do movimento estudantil no país. A narrativa tem como figura principal o aluno Saulo (Lucas Limeira), que, inspirado pelos Panteras Negras, inicia um protesto no colégio em que estuda. A manifestação começa de forma silenciosa, até que toma as vias das redes sociais e se espalha pelos corredores da escola como uma bomba-relógio. 

A genialidade de Cardoso na obra se pauta pela simplicidade. Com apenas uma locação e poucos componentes na trama, o roteiro é capaz de escancarar questões como racismo, brutalidade policial e as ardilosas falhas na política e na imprensa brasileira. Sutil, assim como nossa realidade costuma ser. Além de dar força para as revoluções há muito desprezadas. Cabeça de Nêgo figurou na lista de pré-indicados para representar o Brasil no Oscar, e já é um das maiores produções da cinematografia nacional. – Vitória Silva 

Cenas Favoritas: Saulo lendo ao som de Sorrisos e Lágrimas; a reunião de professores; e a cena final do protesto dos alunos. 


Cena do documentário Chorão: Marginal Alado. Na imagem, Chorão, um homem branco de cabelo e olhos claros, embarca em um ônibus de viagem. Ele veste uma camisa cinza com uma estampa verde em círculo. Por cima da peça, uma camiseta de xadrez nas cores preto, vermelho e branco com botões cobre metade de seus braços. O cantor usa um boné preto como acessório. Ao fundo, o terminal cinzento.
Marginal Alado abriu uma ferida que nunca vai se curar por completo: a saudade de Chorão e de sua genialidade (Foto: Netflix)

Chorão: Marginal Alado

Saudoso e simbólico, os defeitos técnicos de Chorão: Marginal Alado foram acobertados pela sua capacidade de ter, simultaneamente, confortado e quebrado o coração de quem o assistiu. Em meio às lágrimas de saudade, o documentário dirigido por Felipe Novaes fez o incrível trabalho de resgatar a memória de Alexandre Magno Abrão para além da sua persona artística. Feroz nos palcos e carinhoso nos bastidores, o acesso a gravações inéditas trouxe à tona o feio e o belo de uma das figuras mais emblemáticas da história do rock nacional. 

Quem escolheu o filme entre as tantas opções do catálogo da Netflix saiu com os sentimentos à flor da pele. A verdade é que o vocalista do Charlie Brown Jr. ainda visita as mentes dos fãs, e os depoimentos tocantes do documentário causaram efeitos colaterais, como a presença letal do testemunho de Champignon. Vencedor do prêmio do público de Melhor Documentário Brasileiro da 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, Chorão: Marginal Alado é uma montanha-russa de emoções. – Nathalia Tetzner

Cenas Favoritas: a filmagem de uma fã se declarando para Chorão após um show, pois ela não tinha dinheiro para comprar os ingressos e ele a conforta; e o depoimento emocionante de Champignon.


cena do filme Colmeia. Na imagem, em um quintal ao ar livre e com árvores ao fundo, vemos as mulheres do filme preparando um alimento. Da esquerda para a direita, vemos, de pé e inclinada sobre uma panela, uma mulher branca, de cabelos castanhos longos presos em um lenço, aparentando cerca de 40 anos, vestindo uma camiseta cinza. Ao centro, em um primeiro plano, vemos uma mesa com panelas e pimentas amassadas, no processo de preparo do alimento. Atrás da mesa, vemos duas mulheres brancas de cabelos castanhos, uma sentada e outra de pé, ambas preparando o alimentando. À esquerda, vemos uma mulher branca, de cabelos castanhos longos e lisos presos em um rabo de cavalo, vestindo uma camiseta rosa, sentada preparando o alimento.
Colmeia é uma coprodução de Kosovo, Suíça, Macedônia do Norte e Albânia (Foto: LevelK)

Colmeia (Zgjoi)

Colmeia soma conquistas para provar que mereceu seu lugar no “Melhores de 2021”. O filme saiu com três prêmios do Festival de Cannes 2021, sendo o primeiro a levar tantos troféus em categorias principais, abocanhou mais alguns em Sundance, passou com sucesso pela 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, e, agora, integrou a lista de submissões de Melhor Filme Internacional no Oscar 2022. Escolha oficial do Kosovo, o longa recria a história real de Fahrije Hoti, uma mulher kosovar, que, após ter seu marido desaparecido na Guerra de Kosovo, enfrenta o patriarcalismo e o machismo local para sustentar a família, sozinha.

O roteiro e a direção de Hive (título em inglês) são assinados por Blerta Basholli. Na figura de Fahrije, interpretada profundamente por Yllka Gashi, a cineasta reivindica a responsabilidade de mostrar o dia a dia das mulheres kosovar e as consequências de um conflito que deixou mortos e desaparecidos, unindo os dois e os apresentando da perspectiva feminina – o que, no país, é justamente o problema. Introspectivo, extremamente sensível e necessário, Colmeia impacta e emociona ao retratar a realidade, mas também ao deixar uma mensagem de esperança. – Vitória Lopes Gomez

Cenas Favoritas: quando Fahrije consegue o apoio das mulheres da vila; Fahrije e as mulheres da vila conversando enquanto produzem ajvar; e Fahrije cuidando das abelhas, ao final do filme.


Cena do documentário Controlling Britney Spears: Em Busca de Liberdade. Na imagem, fotógrafos registram a manifestação de fãs da cantora do lado de fora do tribunal de justiça. No meio de vários cartazes, um se destaca: o pedaço de papelão escrito Free Britney (Liberte a Britney) em preto. Ao fundo, uma rua com carros de tons cinza.
O segundo documentário sobre a tutela da princesa do pop aumentou ainda mais a pressão popular em torno do caso (Foto: Hulu)

Controlling Britney Spears: Em Busca de Liberdade (Controlling Britney Spears)

“Ultimamente, as pessoas tentam me manter amarrada/Há uma contagem regressiva esperando para que eu entre em erupção”. A letra de I Wanna Go resume a narrativa da luta de Britney Spears e os seus fãs pelo fim da sua tutela. Controlada pelo pai há anos, Controlling Britney Spears trouxe fatos concretos e detalhou o cenário abusivo em que a princesa do pop se encontrou por tanto tempo. Com uma apuração excelente do The New York Times, o caso mais comentado do ano de 2021 foi investigado em profundidade, fato que aumentou ainda mais a adesão do público. 

A sequência de Framing Britney Spears: A Vida de uma Estrela abordou a relação entre tutelar e tutelado a partir de uma visão crítica sobre o sistema judiciário americano. Ao expor a fraqueza da legitimidade da tutela, os relatos assustadores de pessoas que trabalharam para o pai de Britney Spears ganharam credibilidade. Para além, o documentário também expôs como Jamie Spears não agiu sozinho, mas acompanhado de uma rede de suporte, cuja intenção se mostrou questionável. Agora livre, a artista deve lançar um livro contando a sua própria história. – Nathalia Tetzner

Cenas Favoritas: os primeiros minutos do documentário com a presença dos fãs do lado de fora do tribunal; e as revelações sobre o esquema de segurança contratado pelo pai de Britney Spears.


Cena do filme Cruella. A imagem mostra a personagem Cruella da cintura para cima, enquadrada mais à esquerda da câmera. Cruella é vivida por Emma Stone. Emma é uma mulher branca, na casa dos 30 anos. Ela tem olhos azuis claros. Na imagem, seu cabelo é cacheado, curto, volumoso e igualmente dividido ao meio, em duas cores. É castanho-escuro do lado esquerdo e branco na parte direita. Ela usa uma máscara preta sobre os olhos, um vestido vermelho sem mangas e luvas vermelho-escuras, além de um batom também vermelho. Ela está com uma das mãos sobre o peito e outra na cintura. Cruella olha para o lado e parece surpresa. Atrás dela, há uma parede branca de um ambiente fechado. O fundo está desfocado, mas é possível ver a silhueta de várias pessoas com trajes de gala.
“Quando você coloca esse cabelo preto e branco louco, a maquiagem incrível e o figurino totalmente único, você se sente a Cruella de Vil” afirma Emma Stone, em entrevista para a Disney (Foto: Walt Disney Pictures)

Cruella 

Com grandes investimentos na produção de live-actions de suas obras icônicas, a Disney, dessa vez, entregou um fantástico filme solo de uma de suas vilãs mais famosas: Cruella. Transbordando estilo, personalidade, atuações certeiras e impecáveis, e uma singular história de origem, o longa conquistou seu espaço entre os melhores filmes de 2021. Emma Stone dá vida a uma representação brilhante da complexa Cruella De Vil, em todas as suas camadas. Além da certeira escolha de Stone para o papel, o elenco também conta com a admirável Emma Thompson, como a antagonista Baronesa.

O filme de Craig Gillespie equilibra perfeitamente o drama pessoal da tímida e solitária Estella, com a ousadia e acidez de Cruella. O resultado são 134 minutos que enlaçam o telespectador e o hipnotizam com um show visual e musical, simultâneos à cativante trajetória da anti-heroína. Vencedor de Melhor Filme de Drama no People’s Choice Awards 2021, o longa concorre ao Oscar 2022 nas categorias de Melhor Figurino e Melhor Cabelo e Maquiagem. Jenny Beavan, designer e duas vezes vencedora do Academy Awards, coloca Cruella sob holofotes – e na passarela – com seu figurino impactante e inventivo. Além disso, apesar de desentendimentos de Emma Stone com a Disney, devido ao lançamento do filme no Disney+, Cruella 2 já é um projeto em andamento, e conta com o retorno da atriz. – Mariana Nicastro

Cenas Favoritas: as criativas e divertidas entradas de Cruella nos eventos em que a Baronesa atenderia, roubando a cena para si, das formas mais inusitadas possíveis; outra cena favorita é o monólogo de Cruella, mais próximo do final do filme, que revela muito sobre a personagem, suas revoltas e o que a tornou uma excêntrica vilã.


Cena do filme Deserto Particular. A imagem mostra dois homens que estão num lugar alto, que mostra a paisagem de um rio. Eles estão frente a frente e conversam olhando para o chão. É um fim de tarde e a imagem é colorida em tons de azul, verde e amarelo.
Antes de representar o Brasil no Oscar 2022, o filme de Aly Muritiba passou premiado pelo Festival de Veneza e foi integrou a seleção da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Pandora Filmes)

Deserto Particular

Na difícil função de representar o Brasil no lugar mais importante do Cinema mundial, Deserto Particular desempenha sua função como poucos filmes selecionados para tal conseguem fazê-lo. É uma pena, no entanto, que o encanto da obra de Aly Muritiba não esteja entre os indicados finais ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Mas o fato aqui é outro, e a história, iniciada quando Daniel (Antonio Saboia) parte corajosamente em busca do amor e encerrada numa quase conquista plena de objetivos, tem muito a nos ensinar. 

Primeiro, Deserto Particular é mais uma confirmação de que delicadeza nada tem a ver com lassidão. O roteiro, que Muritiba também assina em dupla com Henrique dos Santos, coloca sua força na voz calma de Robson (Pedro Fasanaro), como a forma mais fiel de expressar a existência em meio à dureza que o Brasil reserva para a sua população LGBTQIA+. Já para os ensinamentos que a história deixa para os aspectos mais amplos e complexos da vida, não vale nenhuma tentativa de explicação. O sentir é a ação mais importante que o filme deixou para essa lista de Melhores de 2021. – Raquel Dutra

Cenas Favoritas: o momento em que Sara e Daniel dançam juntos ao som de Total Eclipse of the Heart; e o diálogo de Robson e Daniel à beira do rio.


Cena do filme Drive My Car. A cena mostra Yûsuke e Oto, em ordem. Yûsuke, interpretado por Hidetoshi Nishijima, é um homem adulto japonês de cabelo curto preto e olhos castanhos escuros. Oto é uma mulher adulta japonesa de cabelo preto com comprimento abaixo do ombro. Ambos estão nus na cama. Yûsuke está deitado com a cabeça apoiada em um braço encarando Oto, que está sentada de costas para a câmera. Ela está ao lado de uma coberta cinza. É começo da manhã e a iluminação do cômodo é baixa, formando muitas sombras. A imagem está escura, sendo possível distinguir apenas o delineado dos móveis e objetos dispostos no fundo do quarto. As paredes são brancas.
Destaque do círculo de críticos de Cinema em 2021, Drive My Car é a primeira produção nipônica a disputar o prêmio de Melhor Filme no Oscar, além de ser o filme japonês com mais indicações na história da cerimônia (Foto: C&I Entertainment)

Drive My Car (Doraibu mai kâ)

Desde a vitória histórica da produção sul-coreana de Bong Joon-Ho, Parasita, na categoria de Melhor Filme no Oscar 2020, a Academia tem-se tornado, ainda que bastante acanhadamente, aberta para a quebra dos paradigmas além-Hollywood: em 2021 vimos a segunda diretora e primeira mulher não-branca, Chloé Zhao, a levar a estatueta de Melhor Direção, e em 2022, parece ser a vez da adaptação nipônica do conto homônimo de Haruki Murakami, Drive My Car – indicado a quatro categorias na premiação deste ano, incluindo Melhor Filme, Melhor Filme Internacional, Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Direção para Ryûsuke Hamaguchi.

Um filme profundamente humano, Drive My Car se excede ao testemunhar os relances de beleza no ordinário, ainda que em instantes muito breves seguidos pelos sentimentos mais opressivos do ser. Luto, impassibilidade e culpa delineiam as quase três horas de duração da obra, regida por uma barreira espessa de incomunicabilidade que é ultrapassada somente pelo artifício da Arte. A atuação catalisa o drama dos protagonistas, obrigados a encarar as próprias emoções pelo reflexo de suas personagens a serem interpretadas. Dentro de um Saab 900 vermelho ou sobre o palco de um teatro, os singelos momentos de calor compartilhado emocionam, com palavras ditas ou não. Beep beep beep beep, yeah. – Ayra Mori

Cenas Favoritas: o transe criativo de Oto pós-sexo; a interpretação silenciosa de Sonia no ato final da peça teatral; e o breve momento de calor entre Misaki e Yûsuke, quando ambos erguem seus cigarros para fora do carro, com as mãos próximas uma das outras.


Cena do filme Duas Tias Loucas de Férias. A cena mostra Barb e Star voando no céu com braços e pernas abertas. Barb, interpretada por Annie Mumolo, é uma senhora branca de meia idade com cabelo castanho claro curto e ondulado. Ela veste uma blusa florida amarelada, culottes no mesmo tom de amarelo e sandálias douradas. Star, interpretada por Kristen Wiig, é uma senhora branca de idade média com cabelo ruivo curto e ondulado. Ela veste uma blusa florida rosa pastel, culottes rosa e sandálias beges. A câmera está posicionada de baixo para cima, onde ambas olham para baixo com cara de espanto. O fundo é um céu azul limpo.
Se Saturday Night Live e Zorra Total tivessem um bebê, Duas Tias Loucas de Férias com certeza seria seu filho pródigo (Foto: HBO Max)

Duas Tias Loucas de Férias (Barb and Star Go to Vista Del Mar)

Às vezes, tudo o que precisamos é de uma vista para o mar, um dia ensolarado, culottes, um coquetel colorido e Duas Tias Loucas de Férias. Reunindo as estrelas de Saturday Night Live, Annie Mumolo e Kristen Wiig – dupla cuja colaboração anterior resultou no sucesso de Missão Madrinha de Casamento –, o filme dirigido por Josh Greenbaum acompanha as aventuras das melhores amigas, Barb (Mumolo) e Star (Wiig), ao deixar sua pequena cidade natal pela primeira vez com destino para Vista Del Mar, na Flórida. E envolvidas por uma explosão de cores saturadamente pastéis, o roteiro pastiche se rende completamente ao ridículo, no melhor sentido da palavra.

O que inicialmente parecem ser férias tranquilas, logo enreda as parceiras inseparáveis em noitadas intensas, romances de verão e um plano maligno de uma vilã flamboyant à la Dr. Evil do universo cinematográfico de Austin Powers. Mocinhas, vilãs ou nenhuma delas, as protagonistas são assumidamente caricatas, desde o figurino exagerado até o diálogo desconfortável. Mas ainda que com o perigo trapaceiro de cair no pedantismo, é na artificialidade que o humor bizarro de Duas Tias Loucas de Férias encontra a inocência genuína. A amizade, o amor e mesmo a maldade, tudo é inocente, numa zorra total que possui todos os requisitos para se tornar um clássico cult daqui a 10 anos. – Ayra Mori

Cenas Favoritas: abertura ao som de Guilt; encontro do “clube da fala”; e cena musical na praia com Jamie Dornan dançando balé.


Cena do filme Duna. Focalizado no centro da imagem está Paul, um homem jovem, branco, com olhos verdes e cabelos castanhos na altura da orelha. Usa uma roupa de aspecto futurista preta cobrindo até o seu pescoço e, com a sua mão direita, segura uma adaga encostada em seu ombro esquerdo. Ao fundo, vê-se de forma desfocada algo parecido com uma falésia.
Paul Atreides inicia sua jornada como o escolhido no sucesso Duna (Foto: Warner Bros. Pictures)

Duna (Dune) 

Não é segredo para ninguém que Duna foi um dos grandes marcos no cinema de 2021. Mesmo sendo um filme essencialmente longo (com 2h35min de duração) e sem cenas de ação extremas, a produção garantiu um sucesso estrondoso e uma bilheteria avassaladora, apesar de ter seu lançamento simultâneo no cinema e na plataforma de streaming HBO Max. Com uma fotografia impressionante (responsabilidade de Greig Fraser), um elenco de peso – especialmente o trio de estrelas: Timothée Chalamet, como o protagonista Paul Atreides; Jason Momoa, interpretando o espadachim da família Atreides, Duncan Idaho; e Zendaya, no papel de Chani – e uma história de tirar o fôlego, Duna faz um ótimo trabalho trazendo vida à obra de Frank Herbert e garantindo uma nova legião de fãs. 

Girando em torno da chegada da família Atreides no planeta Arrakis, produtor da importante mélange (especiaria), e do processo de autodescobrimento do protagonista, o longa introduz o espectador ao universo que conta com muitos conflitos envolvendo a crença, a política e questões de moral e lealdade. Talvez um dos maiores acertos dessa adaptação comandada por Denis Villeneuve tenha sido dividi-la em partes, nessa primeira foi possível contemplar com calma os personagens e componentes desse universo, ideal para aqueles que caíram de paraquedas no cinema ficarem com um gostinho de quero mais. A segunda parte foi confirmada no dia 26 de outubro de 2023, e só resta esperar para que seja tão impressionante quanto a primeira, que já foi indicada a várias premiações, incluindo o Oscar de Melhor Filme. – Gabrielli Natividade da Silva 

Cenas Favoritas: a sequência do ataque à família Atreides; e a fuga de Paul e sua mãe, Jessica (Rebecca Ferguson). 


Cena da animação Encanto. A imagem mostra as personagens Maribel e sua mãe Julieta centralizadas, representadas da cintura para cima. Mirabel é jovem e está à esquerda. Ela é latina, tem a pele escura, cabelos castanhos e cacheados. Ela usa uma blusa branca com estampas de borboletas e uma saia verde, com desenhos coloridos. A personagem tem olhos bem grandes e redondos, sobrancelhas grossas e usa um óculos também redondo. Ela está levemente virada para na direção de sua mãe, à direita. Com a sua mão direita segura um pãozinho e com a sua mão esquerda aperta a mão de Julieta. Julieta, por sua vez, também é latina, tem a pele escura, cabelos cacheados e castanhos, com mechas grisalhas, presos no topo da cabeça. Seus olhos são grandes, assim como seu nariz. Ela usa um avental verde com flores dos bolsos. Julieta está virada na direção de Mirabel e suas mãos seguram a mão da filha. Atrás delas há um muro vazado com desenhos de borboletas. O lugar está iluminado por velas.
Com todo o sucesso da história, personagens e músicas, Encanto abre suas portas mágicas para sequências, spin-offs e até mesmo um musical da Broadway cogitado por Lin-Manuel Miranda (Foto: Walt Disney Animation Studios)

Encanto

Fazendo jus ao seu título, Encanto é uma animação musical mágica e deslumbrante da Disney, lançada em novembro de 2021. Dirigida por Byron Howard e Jared Bush, com co-direção de Charise Castro Smith, ela apresenta com sensibilidade e leveza os dramas da protagonista Mirabel Madrigal (Stephanie Beatriz), que embarca em uma aventura no meio de sua própria casa – e família. O filme tem um visual estonteante, com muitas cores chamativas e cenários inventivos e agradáveis. Para acompanhar a trama criativa e interessante, a trilha sonora original de Lin-Manuel Miranda é singular e notável, com músicas que permanecem na mente do telespectador por dias. A música We Don’t Talk About Bruno (Não Falamos do Bruno, no Brasil) atingiu o topo da Billboard e superou, até mesmo, Let It Go, grande sucesso de Frozen (2014). 

As cenas musicais são divertidas, dão ritmo ao desenvolvimento da história e tornam toda a experiência ainda mais envolvente, fazendo do filme um dos melhores de 2021. Encanto é emocionante, imersivo, e sabe contrastar a leveza e alegria dos moradores de uma vila encantada na Colômbia, com comoção e sutileza, para passar uma linda mensagem sobre amor e família. O longa ganhou o prêmio de Melhor Animação, no Globo de Ouro, e concorre ao Oscar 2022 em categorias como Melhor Trilha Sonora Original, Melhor Canção Original, com Dos Oruguitas, e, novamente, em Melhor Animação. – Mariana Nicastro

Cenas Favoritas: a icônica cena da música We Don’t Talk About Bruno, toda a apresentação é divertida e a música é incrível; a cena entre as personagens Isabela e Mirabel, acompanhadas da música What Else Can I Do?, também é maravilhosa, com um show de cores e flores; e a conversa entre Mirabel e sua avó Alma na beira do lago.


Cena do filme Eternos, da Marvel. Imagem retangular e colorida. Nela, vemos um grupo de sete pessoas em um deserto, vestindo roupas escuras e óculos de sol aviadores. Todas olham para frente, seriamente. No meio delas, e em foco, está Phastos, interpretado por Brian Tyree Henry. Ele é um homem negro, com cabelos curtos e barba escuros, que usa brincos de argola nas orelhas e um par de óculos no rosto. Ele veste uma camisa azul-clara e um colete preto, por trás de uma camisa xadrez azul-escura. Ele olha para frente sério, assim como os outros, e levanta na altura do peito a palma da sua mão direita, onde está suspenso um holograma amarelo de uma nave espacial triangular. A cena se passa de dia, com a iluminação dura do sol.
Possivelmente o filme mais diverso de toda a filmografia da Marvel Studios, Eternos apresenta a primeira heroína surda e o primeiro casal assumidamente gay da história do MCU (Foto: Marvel)

Eternos (Eternals)

Há tempos que um filme de super-herói era instigante a ponto de gerar discussões que fossem além de teorias. É o caso de Eternos, que, em 2021, teve uma recepção infame pelo público e crítica. Todavia, faltava criatividade no MCU muito antes disso. No Cinema, a fórmula Marvel se provava esgotada, impossibilitada de construir personalidade própria e dependente de legados pretéritos. Ao passo que, as apostas na Televisão, que pareciam inovadoras de início, apenas reiteraram o modus operandi do estúdio, que converte qualquer ideia ousada em um pastiche superficial e genérico. Quando as aventuras de proporções cósmicas daquele multiverso são tão inconcebíveis que se tornam praticamente irrelacionáveis, é na sobriedade que a Marvel Studios reencontra o brilho que fez sua franquia estourar em 2012. Foi o que ocorreu no escopo das séries, e agora também nas telonas, com Eternos

E não é que o filme abandone o padrão de seus exauridos antecessores, apresentando a redundância de uma ameaça global que levará a humanidade à extinção. Isso está presente, porém, não passa de um plano de fundo. Ao invés, o foco aponta para o imenso elenco de protagonistas, formado por criaturas divinas, quase deuses, que, pelo incrível toque da direção de Chloé Zhao, são subvertidos à condição mais inerentemente humana, se misturando a nós e lidando com dilemas plenamente tangíveis. O esforço de Zhao em imprimir ao máximo sua identidade em Eternos, evitando o uso excessivo de CGI e gravando a maior parte das cenas em locações, dá vida à narrativa e a transforma na experiência mais bonita, poética e contemplativa de toda a trajetória da Marvel. – Enrico Souto

Cenas Favoritas: Gilgamesh e Sprite acalmando Thena com visões do passado; o primeiro encontro com Phastos; e o flashback de Ikaris com Ajak.


Imagem do filme em animação Evangelion: 3.0+1.01 Thrice Upon a Time. Imagem retangular e quadrada. O cenário é uma floresta esverdeada, onde está deitada, sobre a grama, Rei Ayanami. Ela é uma garota asiática, de pele clara, com olhos vermelhos e cabelos curtos da cor azul. Ela veste um uniforme em collant preto e vermelho, com os números “09”, e dois prendedores de cabelo das mesmas cores em seus cabelos. Ela apoia sua cabeça sobre sua mão, e olha para frente, visivelmente cansada. O cenário é dia, iluminado pela luz difusa do sol, que bate nas árvores.
Subvertendo o conceito de reboot e se demonstrando um comentário sobre a própria série original, Rebuild of Evangelion é uma montanha-russa emocional, que finaliza em 2021 no seu pico (Foto: Amazon Prime Video)

Evangelion: 3.0+1.01 A Esperança (Shin Evangelion Gekijouban:||)

A primeira hora de Evangelion: 3.0+1.01 Thrice Upon a Time é, possivelmente, a mais contida da história da saga. Fiel à essência de seu material original, porém sempre a evocando de maneira revigorante, o quarto e último filme da série Rebuild of Evangelion encontra seus primeiros resquícios de fé em uma vila de sobreviventes do Terceiro Impacto, que continua semeando mesmo depois do mais literal dos apocalipses. Os protagonistas, aprisionados em seus corpos adolescentes e impossibilitados de amadurecer, voltam a experienciar, depois de muito tempo, uma vida normal. Rei Ayanami, em especial, tem um contato virginal com o convívio em comunidade, se conectando com aqueles ao seu redor através das mais simples tarefas e, desse modo, moldando sua individualidade.

No cerne dos conflitos emocionais de Evangelion está o dilema do ouriço: que precisa do calor de outros para sobreviver, mas que se machuca ao se aproximar demais de seus espinhos. Dizer que Thrice Upon a Time resolve esse impasse talvez seja muito ousado, entretanto, ao menos, dá o primeiro passo. Apesar do início comedido, a ação frenética e abstrativa já conhecida pelos fãs alcança seu auge visual na segunda metade. Por meio de uma animação estonteante, que leva as técnicas tradicionais para outro patamar, é traduzido com fascínio o processo de morte e renascimento, literal e figurado, que os personagens vivenciam. Ao término dessa metamorfose visceral, Shinji entra em harmonia com suas feridas, assume suas virtudes, encontra a prometida esperança e, finalmente, se torna capaz de crescer. Evangelion: 3.0+1.01 alcança a utopia depois de 26 anos, e é um privilégio poder presenciá-la. – Enrico Souto

Cenas Favoritas: Rei aprendendo a plantar junto as outras mulheres da vila; o momento em que Asuka tira o seu tapa-olho; e a última conversa entre Gendoh e Shinji.


Cena do filme Flee. A imagem é uma ilustração e mostra um casal se beijando numa cozinha. O primeiro é Kasper, que está à esquerda, usa óculos e veste uma blusa azul. O segundo homem é Amin, que está à direita, tem barba, veste uma blusa vinho e segura Kasper com o braço esquerdo.
Filme de longa-metragem, documental e animado que não perde o fio de sua história delicada em momento algum durante 120 minutos, está bom pra você? (Foto: NEON)

Flee (Flugt)

Cada vez mais, as possibilidades inventivas dos documentários atraem o grande público. Com Flee não foi diferente. Muito bem fundamentado como uma produção documental, o filme de Jonas Poher Rasmussen ainda se beneficia da beleza narrativa da animação para criar um longa-metragem completamente singular, que dedica seus 120 minutos de história ao desenvolver retratos de migração forçada e reflexões sobre vida e liberdade à margem da sociedade. Combinando a maestria de sua execução com a importância de seus temas, o filme é um ambiente de contrastes, estéticos e narrativos, que oscilam entre uma revelação ora dolorosamente próxima, ora deliciosamente harmônica.

Assim, não é difícil entender porque Flee se garantiu nos principais festivais e premiações de Cinema pelo mundo. O percurso, iniciado em Sundance, com passagens de exibição por Cannes e Toronto e com indicações no BAFTA, Critics Choice Awards e PGA, termina com todo o louvor que merece no Oscar 2022. Lá como a primeira animação na briga pela “tríplice coroa” da Academia, a produção independente da Dinamarca é considerada para as brilhantes categorias de Melhor Documentário, Melhor Filme Internacional e Melhor Animação e nem precisou garantir vitória para fazer história. – Raquel Dutra

Cenas Favoritas: os momentos de Amin quando criança; e o desabafo do personagem no final do filme. 


Cena do filme Friends: The Reunion. A imagem mostra os 6 atores sentados na sala do apartamento que fazia parte da série. À esquerda estão sentados em um sofá branco Matt LeBlanc, Lisa Kudrow, Jennifer Aniston e Courteney Cox. Ao lado de Courtney, David Schwimmer está sentado em uma cadeira amarela, e à sua direita, Matthew Perry está em uma poltrona bege.
Mesmo sendo um especial, o formato geral de Friends: The Reunion permite que o coloquemos na lista de Melhores Filmes de 2021 (Foto: HBO)

Friends: The Reunion

Quase 20 anos depois do fim de Friends, não havia presente melhor a ser dado para todas as pessoas que tiveram suas vidas mudadas pela série do que ver Matt LeBlanc, Lisa Kudrow, Jennifer Aniston, Courteney Cox, David Schwimmer e Matthew Perry juntos novamente, dentro da sala do apartamento 20. O especial Aquele com a The Reunion de Friends foi um dos lançamentos mais incríveis de 2021, uma dose saborosa de amor e saudade sobre a amizade sincera que transcende roteiros. Dotada de naturalidade e espontaneidade, a conexão dos atores após duas décadas arrancou lágrimas – inclusive deles mesmos.

Os momentos gloriosos do especial foram justamente aqueles em que o grupo se encontrava sozinho, fazendo piadas uns com os outros, compartilhando memórias especiais da época em que filmavam a sitcom. Afinal de contas, a intimidade entre um grupo de amigos é o que conquistou uma legião ao longo do tempo, e descobrir onde Courteney escondia papéis com suas falas pelo set deixou claro que a sensação nunca irá embora. Se relembrar é viver, a mistura entre os atores lendo cenas antigas e flashbacks dos momentos favoritos da série foi crucial para Friends: The Reunion se tornar inesquecível. – Nathália Mendes

Cenas Favoritas: os atores entrando no set da série que foi recriado; Lisa Kudrow relendo a cena em que descobre o relacionamento de Chandler e Monica; e o quiz entre o elenco.


Cena do filme Homem-Aranha Sem Volta para Casa. Nela, Homem-Aranha e MJ aparecem se jogando de uma estrutura metálica de ponte. Ele veste seu traje tradicional vermelho e preto com teias desenhadas e uma aranha no centro do peito. Já ela, uma adolescente negra de cabelo comprido e cacheado, veste uma calça preta na altura da canela, uma camiseta branca de manga comprida com a figura de uma mulher medieval estampada, um casaco preto com mangas dobradas, e um all star preto de cano longo. Com os cabelos esvoaçantes, ela está visivelmente apavorada por estar saltando. Ao fundo da ponte, prédios da cidade de Nova York
Atualmente, o longa é a 6ª maior bilheteria mundial, botando US$ 1,8 bilhões de dólares nos bolsos (Foto: Sony/Marvel)

Homem-Aranha: Sem Volta para Casa (Spider-Man: No Way Home)

Mesmo não sendo um coming-of-age, o fechamento da maltratada trilogia do Amigão da Vizinhança no solo da Marvel é um ótimo filme de amadurecimento. Aqui, Peter Parker (Tom Holland) finalmente ganha seu arco dramático no MCU, e tanto o Teioso como o diretor Jon Watts se consolidam no universo Marvel. Abusando da nostalgia e da nova fórmula de vários heróis e vilões em tela que deu certo com Guerra Infinita e Ultimato, Homem-Aranha: Sem Volta para Casa é uma festa de personagens do imaginário do Cabeça de Teia e uma celebração da figura mais popular e querida da Casa das Ideias.

O filme é um exercício de retcons e fan-services muito consistente e que respeita toda a história do Aranha nas telonas, de forma a agradar gregos nostálgicos de Sam Raimi e os troianos órfãos de Marc Webb. Sem Volta para Casa foi feito sob medida para todos seus fãs e também para os críticos de Tom Holland ao abandonar a dinâmica falha de Peter Parker ser um protagonista omisso e resumido a pet de um herói mais estabelecido. Ele talvez seja uma das produções mais ousadas da Marvel ao abordar o peso e os sacrifícios que uma habilidade sobre-humana exige, tanto da parte dos heróis como dos vilões (que roubam a cena). O Homem-Aranha não é o herói que queremos, mas o que precisamos. E, esse filme, era o que queríamos e precisávamos. – Guilherme Veiga

Cenas favoritas: a sequência de Peter Parker, Tia May, Electro, Homem-Areia, Dr. Octopus e Duende Verde no apartamento do Happy; aquela cena do Ned tentando achar o Peter abrindo os portais do Dr. Estranho; e o diálogo do “com grandes poderes vem grandes responsabilidades” entre os três personagens no alto da escola.


Cena do filme Identidade. A cena mostra Ruth Negga sentada no colo de Alexander Skarsgård. Ela é uma mulher negra de pele clara, tem cabelos claros e olha para ele sorrindo. Ele é um homem branco, de barba e cabelos escuros e veste terno e gravata. A foto está em preto e branco.
Com performances vertiginosas de Tessa Thompson, Ruth Negga, Andre Holland e Alexander Skarsgård, Identidade é um dos melhores títulos de 2021 (Foto: Netflix)

Identidade (Passing)

Rebecca Hall tem emendado trabalhos exemplares, mas 2021 marcou uma virada para a atriz, que se tornou diretora com Identidade. Adaptando o livro de Nella Larsen, a jovem cineasta escolhe marcar sua carreira contando a história de Irene (Tessa Thompson) e Clare (Ruth Negga), duas amigas negras da época do colégio que cresceram e perderam o contato. Já na vida adulta, uma desavisada Irene se depara com Clare, que se “passa” por branca em um estabelecimento da elite. O conflito nasce do choque pelo absurdo da situação, ao passo que a personagem de Thompson acaba por repensar toda sua conduta.

O resultado dessa epifania é fotografado em caixa menor e sob as lentes do preto e branco, detalhes sutis, mas sagazes, do controle criativo de Hall. Sucesso no Festival de Sundance, Identidade foi comprado pela Netflix e distribuído com esperanças de reconhecimento nas premiações. Por mais que tenha ficado de fora da maior delas, o longa-metragem não apenas impressiona pela maturidade e pelo estilo de tratamento de seus variados e delicados temas, mas também recompensa o público do streaming, que já cansou de consumir a mesma porcaria toda semana. – Vitor Evangelista

Cenas Favoritas: a dilacerante troca de olhares escondidos em cardápios; e a sequência final, quando Deus poda as asas da liberdade.


Cena do filme King Richard: Criando Campeãs. Da esquerda para a direita na imagem, Richard Williams empurra um carrinho de compras com Venus Williams e as bolas verdes de tênis dentro. Apoiada no carrinho está a jovem Serena Williams. Richard é um homem negro de cabelo e olhos escuros. Serena é uma menina negra de cabelo e olhos escuros. Venus é uma menina negra de cabelo e olhos escuros. O pai das meninas veste uma jaqueta branca e vermelha acompanhada de um shorts vermelho. A filha mais velha veste uma camisa de listras brancas, azuis e amarelas acompanhada de um shorts branco. Venus veste uma camisa de listras brancas e vermelhas acompanhada de um shorts azul. Na frente deles há uma rede de tênis que cobre metade da foto e, ao fundo, a cor cinza predomina.
Oscar Bait ou não, o longa emocionou até quem nunca sequer assistiu uma partida de tênis (Foto: HBO Max)

King Richard: Criando Campeãs (King Richard)

Frutos de um plano de 78 páginas, o filme biográfico sobre Richard Williams e as carreiras de suas duas filhas, Venus e Serena, foram sucessos de suas próprias épocas. Se, nos anos 90, o Tênis precisava de duas jovens negras dispostas a fazer história, o ano de 2021 precisou de um longa dramático, motivacional e baseado em fatos reais. Muitas vezes configurado como Oscar Bait, King Richard: Criando Campeãs realmente garantiu indicações nas principais categorias do prêmio tão cobiçado por Hollywood, mas também se mostrou digno do apreço crítico e popular.

Protagonizado por Will Smith, o ator contou com um elenco de peso e um roteiro à altura para construir o seu personagem. Ao lado de Aunjanue Ellis, Saniyya Sidney e Demi Singleton, o relacionamento familiar em cena destacou o melhor da atuação de todos. Enquanto os escritos de Zach Baylin e a direção de Reinaldo Marcus Green trouxeram para a tela o desenvolvimento impecável da história. King Richard: Criando Campeãs se originou de um plano e, assim como o seu protagonista, conseguiu executá-lo com maestria. – Nathalia Tetzner

Cenas Favoritas: o momento em que Richard Williams tenta defender suas filhas do assédio; e a primeira partida profissional de Venus contra a segunda melhor tenista do mundo na época.


Cena do filme Lamb. Na imagem, está a personagem Ada, uma bebê-ovelha. Ela está com um rosto levemente inclinado, olhando em direção à outra personagem, que não aparece na imagem. Ada usa uma coroa de flores e um casaco, que também não aparece por completo.
Nem Kristen Stewart, nem Olivia Colman, sem dúvidas a maior performance de 2021 vai para a pequena Ada (Foto: A24)

Lamb (Dýrið)

A produção de Valdimar Jóhannsson pode causar estranheza num primeiro momento, mas, aos poucos, dá espaço para uma história peculiarmente aconchegante. Um casal islandês tem sua rotina baseada na criação de ovelhas em sua pacata fazenda. Convivendo com as dores de uma perda recente, eles são gratificados pela dádiva de um bebê-ovelha, nomeada como Ada. E isso é tudo que você precisa saber. 

Se os angustiantes e silenciosos minutos da obra podem sugerir uma narrativa sobre uma monstruosidade ou algo do tipo, Lamb consegue provar o contrário. Coproduzido pela Islândia, Suécia e Polônia, o filme transita entre diferentes gêneros, centrando-se principalmente num drama familiar. Sem a necessidade de grandes metáforas ou reviravoltas, a narrativa fascina pelo seu aspecto fantasioso, mostrando sutilmente as diferentes formas que o ser humano encontra para lidar com as adversidades quando é movido pelo amor. Vencedora do prêmio de originalidade do Festival de Cannes, a produção também havia sido a escolhida da Islândia para representar o país no Oscar 2022. – Vitória Silva

Cenas Favoritas: o almoço em família; e qualquer outra cena da Ada fazendo alguma coisa. 


Cena do filme Licorice Pizza. Na imagem retangular colorida, os atores Alana Haim e Cooper Hoffman estão andando lado a lado pela noite. Alana é uma mulher branca, possui cabelos castanhos lisos e longos e olhos azuis, e veste uma blusa com detalhes floridos em cor amarela, roxa e vinho. Ela está com a cabeça virada para o lado esquerdo, olhando para Cooper. Ele é um jovem branco, possui cabelos ruivos e olhos castanhos, e veste uma camisa bege de mangas curtas, com detalhes em cor preta e marrom, além de utilizar uma camiseta de cor branca por baixo. Ele está com a cabeça inclinada para a direita, olhando para Alana.
Favorito ao Oscar de Melhor Roteiro Original, Licorice Pizza aposta na nostalgia para contar uma história de amor (Foto: Universal Pictures)

Licorice Pizza

É difícil encontrar um filme ruim na carreira cinematográfica de Paul Thomas Anderson (PTA). Ele é um desses diretores que conseguem manter um nível alto de execução e idealização, deixando sua marca em todos os longas. Seja nas adaptações de livro – como Vício Inerente (2014) e Sangue Negro (2007) –, seja nos excelentes roteiros originais – Boogie Nights (1997), Magnólia (1999) e Trama Fantasma (2017). Em Licorice Pizza, Anderson dá segmento a essa última característica, e cria uma história fantástica sobre as dificuldades de amadurecer e amar em tempos de crise (no filme, a Crise do Petróleo de 1973).

A bem da verdade, o diretor subverte o gênero das comédias românticas em Licorice Pizza, e cria uma trama que dá protagonismo a Alana Kane (Alana Haim) ao invés de Gary Valentine (Cooper Hoffman), o jovem rapaz de 15 anos apaixonado pela mulher de 25. É sobre amadurecimento, sim, mas à moda de PTA: os dois personagens se inserem na venda de colchões d’água, entram em campanhas políticas e o garoto chega a ir preso por alguns minutos. É uma história de amor à moda antiga, na qual os personagens movimentam-se junto a História social, completamente perdidos nas ebulições culturais dos anos 1970. Ao manter o relacionamento de Gary e Alana no campo do amor platônico, o diretor reveste Licorice Pizza de uma aura nostálgica, criando um belo tratado sobre os amores possíveis. – Bruno Andrade

Cenas Favoritas: a cena inicial, quando Gary Valentine (Cooper Hoffman) começa a conversar com Alana Kane (Alana Haim); o momento em que eles abrem o negócio de colchões d’água; e a cena final. 


Cena do filme Liga da Justiça de Zack Snyder. Da esquerda para a direita da imagem, as silhuetas dos super-heróis Aquaman, Mulher-Maravilha, Super-Homem, Batman, Flash e Ciborgue. Aquaman carrega um tridente. Mulher-Maravilha carrega uma espada e um escudo. Super-Homem e Batman usam capas longas. Flash e Ciborgue vestem armaduras. Ao fundo da imagem, uma aeronave futurística e uma cidade devastada. A fotografia é inteiramente composta de cores nos tons marrom e branco
As quatro horas de filmagem em 4:3 foram o suficiente para destacar o longa entre os infinitos filmes de super-heróis (Foto: HBO Max)

Liga da Justiça de Zack Snyder (Zack Snyder’s Justice League)

Injustiçado, Zack Snyder finalmente conseguiu dar vida ao seu espetáculo sobre os super-heróis mais clássicos da DC Comics, no ano de 2021. A Liga da Justiça de Zack Snyder reuniu na tela do streaming HBO Max o melhor dos dois mundos: uma cinematografia madura e um enredo recheado de fan service para os leitores de quadrinhos que amam a nostalgia. Se, na versão de 2017, Joss Whedon falhou miseravelmente ao subtrair a profundidade do universo em busca de replicar uma fórmula fajuta de sucesso comercial, Snyder encarou uma indústria cada vez mais superficial, com uma obra de quatro horas filmada em 4:3.

O rastro de desastre deixado por Whedon incluiu acusações de racismo pelo ator Ray Fisher, responsável por interpretar o Ciborgue, e rumores de assédio com uma dublê da Mulher-Maravilha. Não à toa, a Liga da Justiça de Zack Snyder compilou diversas cenas de Victor Stone que foram descartadas do primeiro filme e também não sexualizou a guerreira amazona como no longa passado. Fazendo justiça dentro e fora da narrativa, a edição estendida prometeu e entregou tudo o que os participantes do movimento Release The Snyder Cut esperavam. – Nathalia Tetzner

Cenas Favoritas: a cena completa e não-sexualizada do momento em que a Mulher-Maravilha luta contra um ataque terrorista no museu; e a introdução do Flash e os seus poderes em um pet shop.


Cena do filme em animação Luca, da Pixar Animation Studios. Imagem retangular e colorida. Nela, vemos dois garotos em cima de uma moto improvisada, montada com objetos velhos e enferrujados. Eles estão no ar, como se tivessem sido lançados para cima, e encaram, espantados, uma das gaivotas de um bando que voa na altura em que estão. O primeiro, que pilota a moto, é Alberto, um garoto pardo, de 14 anos, com cabelos encaracolados claros e olhos verdes. Ele veste uma regata amarela, uma bermuda marrom e, nos pés, está descalço. Enquanto olha para a gaivota, sua boca fica aberta e suas duas mãos seguram o guidão da moto. Atrás dele, está Luca, um garoto branco, de bochechas rosadas, cabelos lisos e olhos da cor castanha. Ele veste uma camisa xadrez azul-clara, uma bermuda azul-escura e, assim como Alberto, está descalço. Enquanto também encara a gaivota, sua boca fica entreaberta, e ele se segura em Alberto pelo torso. O fundo é um céu limpo e ensolarado.
Criando uma ambientação cartunesca e ensolarada, saída diretamente da Riviera Italiana, Luca apaixonou o público e carimbou seu lugar no Oscar em Melhor Animação, junto a outros dois filmes da Disney, reafirmando a hegemonia da empresa na categoria (Foto: Pixar Animation Studios)

Luca

Antes de qualquer coisa, é importante ressaltar: sim, Luca, da Pixar, é um filme muito gay. Indícios disso estão nas notáveis referências de A Pequena Sereia – que também é muito gay –, nos paralelos temáticos e estéticos com Call Me by Your Name, e até na própria relação entre os protagonistas Luca e Alberto (Jacob Tremblay e Jack Dylan Grazer), que é claramente codificada como um romance – o que sequer seria uma questão, caso fossem de gêneros opostos. Nesse sentido, o que o diretor, Enrico Casarosa, tem a dizer não faz diferença, porque todos os outros elementos do longa apontam para o lado inverso. Independente de suas intenções, o cineasta se apropria de signos específicos para compor sua narrativa, e esses signos carregam significados, quer queira ou não. O Cinema tem contado as histórias de pessoas queer através de alegorias desde seu princípio, e o mínimo que Casarosa deveria fazer é ter coragem para assumir esse fardo.

Sobre a trama, acompanhamos dois monstros marinhos (Rodrigo Cagiano e Pedro Miranda no Brasil): Luca, que tem o sonho de conhecer a superfície, mas é impedido pelo medo e por seus pais conservadores; e o atrevido Alberto, que balança esse status quo ao cativar Luca e o convencer a fugir de casa, para que vivam aventuras juntos. Porém, ao chegarem até terra firme, se deparam com um ambiente hostil e violento contra sua espécie e, por isso, precisam se passar por humanos. Indo além do realismo mágico ao se inspirar no Studio Ghibli, a animação é repleta de subtexto sobre autodescoberta e preconceito, retratando relações humanas com franqueza, ao mesmo tempo que encontra sua veracidade na pureza da infância. Ao seu fim, Luca prova-se único não porque questiona o sentido divino da vida, mas porque, pelo contrário, entende que são nas histórias mais palpáveis que conseguimos formar os vínculos mais intensos. – Enrico Souto

Cenas Favoritas: cena em que Luca e Alberto finalmente conseguem descer da ladeira com a Vespa improvisada; a revelação de Alberto para Giulia; e a despedida no trem.


Cena do filme Mães Paralelas. Na imagem, as personagens Janis, interpretada por Penélope Cruz, e Ana, interpretada por Milena Smit, estão em uma cozinha, atrás de uma bancada com utensílios e um fogão. À esquerda, está Ana, com as mãos apoiadas na bancada e olhando em direção à Janis. Ana é uma mulher branca, de cabelos loiros e curtos; ela veste uma blusa vinho de mangas compridas e uma calça escura. À direita, está Janis, com o olhar voltado para Ana. Janis é uma mulher branca, de cabelos castanhos claros na altura dos ombros; ela veste uma blusa branca com o escrito “We should all be feminists” em letra preta e o que parece ser um avental colorido em sua cintura.
O filme concorre em duas categorias no Oscar 2022: Melhor Atriz, para Penélope Cruz, e Melhor Trilha Sonora Original, para Alberto Iglesias (Foto: Netflix)

Mães Paralelas (Madres Paralelas)

Por mais que o título aparente, a nova produção de Almodóvar não é um filme sobre maternidade. Ou, pelo menos, não apenas sobre isso. Centrando-se na espontânea relação originada a partir do encontro de duas mães, Janis (Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), que dão à luz a suas filhas no mesmo dia, o diretor espanhol prova mais uma vez a potência da sua forma de fazer Cinema. No pano de fundo, a protagonista também trava uma batalha para tentar recuperar os restos mortais de seu bisavô, morto pelo Franquismo.

De conflitos e complexidades maternas já temos A Filha Perdida de Maggie Gyllenhaal, logo, é nas miúdas entrelinhas que a força da narrativa de Mães Paralelas se constrói. Com reviravoltas que poderiam superficialmente gerar um conflito entre as personagens principais, Almodóvar consegue facilmente conduzir a produção para a maneira como o fio da vida de Janis e Ana se conecta historicamente, junto ao de outros espanhóis. E é nessa sutileza que entrega uma das maiores obras de 2021. – Vitória Silva

Cenas Favoritas: Janis contando sobre as mulheres de sua família para Ana; o reencontro entre as duas personagens; e a cena final do filme. 


Cena do filme Maligno. Madison (Annabelle Wallis) está deitada verticalmente em uma cama, de olhos arregalados, olhando na direção da câmera, banhada por luz vermelha. Madison é uma mulher caucasiana e magra, de cabelos longos, escuros e lisos. Atrás dela, uma sombra começa a se erguer, da esquerda para a direita, se assomando sobre ela. Atrás desse vulto, um fundo azul distorcido.
Afinal, para onde nossa mente vai quando adormecemos? (Foto: Warner Bros. Pictures)

Maligno (Malignant)

Existem diversos momentos em Maligno, o novo filme de James Wan, em que você se pega pensando que aquilo não pode ser real. Seja num diálogo em que uma informação normal é entregue com toda a gravidade de um plot twist ou quando o plot twist de fato se revela e é diferente de tudo que você pudesse ter imaginado até então. Há um verdadeiro senso de surrealismo no longa que, junto de sua trama doida, nos deixa em estado semidesperto constante, no qual as barreiras entre o factual e o imaginário se diluem e, de repente, tudo é possível.

Mais do que apenas uma homenagem ao gênero de Terror, giallos e slashers, Maligno é uma celebração do Cinema em si, e de sua habilidade de nos transpor para outros espaços com um mero corte e de nos fazer sonhar junto de seus personagens. O longa transborda personalidade e estilo em cada frame, desde seu cover sombrio de Where Is My Mind? até a excelente colorização acentuada de várias cenas. A estética se torna substância na trama demente e divertida de um assassino perturbador e a única mulher capaz de prever psíquicamente seus crimes. – Gabriel Oliveira F. Arruda

Cenas Favoritas: o prólogo no sanatório na colina; a fita VHS que expõe o plot twist; e, basicamente, todo o terceiro ato.


Cena do filme Marighella. A imagem mostra um homem negro no canto direito segurando o filho no colo. Ele tem a cabeça levemente baixa, seus cabelos e bigode são pretos e usa uma camisa azul clara. A criança é negra, veste camisa bege, está com os braços envolta do pescoço do pai e a cabeça virada encarando o outro lado da imagem. No fundo, um grupo de militares está desfocado, marchando pela rua.
A participação de Maria Marighella, neta de Carlos, interpretando a própria avó no filme, exemplificou a história de luta que transcende gerações (Foto: O2 Filmes)

Marighella

Desesperador, angustiante e de arrancar um grito agoniado da garganta, essa é a definição do filme de Wagner Moura, que foi sua estreia na direção. Censurado por longos dois anos pelo governo Bolsonaro, Marighella foi uma das, senão a melhor, estreia de 2021, deixando um gosto misto de terror e esperança, tal qual a mensagem de Carlos Marighella na história. Usando como base o livro de Mário Magalhães, o longa sobrepôs o Guerrilheiro que Incendiou o Mundo para desmentir as invenções da Ditadura Militar que o assassinou a tiros em 1969. Da mesma forma, contrária à vilania criada por um regime sujo, descobrimos um ser humano por completo, dotado de amor pelas pessoas a sua volta, demonstrando coletividade e companheirismo, e, principalmente, o que é ser brasileiro de fato. 

A obra não só resgatou a memória do Guerrilheiro e dos militantes, como também fez o papel de devolver o significado de amar o próprio país – uma identidade que está do lado oposto ao que a galera pró-governo defende quando veste a camisa da Seleção de Futebol do Brasil. Feito um soco no estômago, a violência do filme de Moura fica mais nauseante quando notamos que suas podres figuras estão presentes fora da tela, dando outro nome à tortura, sufocando a democracia, e roubando o significado do fazer parte do povo. Mais do que isso, Marighella aflora a vergonha e culpa pelo esquecimento de quem lutou pelo país, junto de uma poderosa vontade em resgatar o orgulho de ser patriota. – Nathália Mendes

Cenas Favoritas: Marighella banhando o filho Carlinhos no mar; tortura de Jorge nos porões da Ditadura; e o pós-créditos em que o grupo militante canta o hino nacional. 


Cena do filme Mass. A cena mostra quatro pessoas reunidas em um círculo, de mãos dadas e olhando para lugares diferentes. Atrás deles, vemos uma janela iluminada pelo sol e ao lado deles vemos um abajur branco e verde.
Sucesso de público no Festival de Sundance, Mass foi prejudicado pela falta de verba de sua distribuidora, falhando em ser reconhecido no Oscar 2022 (Foto: Bleecker Street)

Mass

Em uma sala nos fundos de uma igreja, quatro pessoas se encontram para conversar. Dois casais atormentados pelo luto sentam-se frente a frente, com lágrimas nos olhos e gargantas arranhando. Acontece que isso se trata de um exercício recorrente na vida deles: desde que um tiroteio tomou parte na escola de seus filhos, levando a vida de ambos, os adultos precisam se ver. Brutal e honesto, Mass se vende pela força do melhor elenco de 2021, aliado ao texto mais candido.

O diretor Fran Kranz (conhecido por atuar como o arquétipo maconheiro em O Segredo da Cabana) tem em sua posse um um cenário arejado, uma mesa de centro e quatro dos melhores atores da atualidade para baterem bola. Se Reeb Birney internaliza e foge de confrontos, Jason Isaacs mantém as íris umedecidas por duas horas. Martha Plimpton vocifera em silêncio, e a majestosa Ann Dowd transforma linhas em um página no mais resplandecente ouro. No fim, o Cinema não precisa de nada além disso. – Vitor Evangelista

Cenas Favoritas: o momento em que descobrimos quem é pai de quem; e o brutal monólogo de Ann Dowd, rasgando o peito e implorando por uma violência que nunca aconteceu.


Cena do filme Matrix Resurrections. A cena mostra Trinity e Neo se encarando. Ambos os rostos estão em perfil, contra a luz do Sol. Trinity, interpretada por Carrie-Anne Moss, é uma mulher adulta branca de cabelo curto estilo joãozinho preto. Neo, interpretado por Keanu Reeves, é um homem adulto branco de cabelo comprido preto. Há um contraste entre a iluminação natural clara do fundo com a iluminação escura de ambos os rostos. Esse contraste torna não identificável os detalhes do rosto de cada um. A fotografia é alaranjada. O fundo é a linha do horizonte de uma cidade, com arranha-céus e um céu limpo alaranjado iluminado pelo Sol.
Depois de 18 anos, Matrix retorna enterrando o seu passado para ressuscitar os velhos amores (Foto: HBO Max)

Matrix Resurrections (The Matrix Resurrections)

Em 1999, as Irmãs Wachowski revolucionaram o gênero da ficção científica com o primeiro filme da trilogia Matrix. Filtros verdes, kung-fu, looks góticos regados de látex e óculos escuros tornaram-se sinônimos imediatos do universo distópico criado pela dupla. Contudo, após 18 anos do lançamento do terceiro capítulo da franquia, retorna somente Lana Wachowski, negando todo conforto da nostalgia de seus antecessores. Com carinho, Resurrections recorda o que passou, mas cresce, a partir dele, sozinho. Desta vez, não nos é estendida nenhuma pílula, porque a binariedade delas já não é mais suficiente.

Principalmente em tempos de robotização dos blockbusters, Lana Wachowski se recusa a percorrer os passos coreografados pelo sistema da Matrix, de Zion ou, mesmo, de Hollywood. Lutar, agora, não faz mais sentido para Neo e Trinity. Caem-se as armas, caem-se as bombas. O poder é, por mais brega que seja, do amor. O amor fortalece ambos, os liberta e impede que seus corpos caiam do céu. Matrix Resurrections se permite enterrar os nomes que deixou para trás, em paz, com um par de mãos dadas que dá a chance do amor vencer, pelo menos uma vez. No fim, o amor é a gênese de tudo, e isso é lindo demais. – Ayra Mori

Cenas Favoritas: Trinity enxergando pela primeira vez a codificação do céu; Neo e Trinity dando as mãos; e Trinity metendo o pau no Neil Patrick Harris.


Cena do filme Medusa. A cena mostra duas mulheres escondidas em meio a uma floresta. Uma delas é branca e loira, enquanto a outra é negra e tem cabelos pretos. As duas têm expressões assustadas, e se abraçam.
Com passaporte carimbado em Cannes e Toronto, o novo filme de Anita Rocha da Silveira é tão potente que paralisa (Foto: Bananeira Filmes)

Medusa

Continuando suas investidas no Cinema de horror, a diretora Anita Rocha da Silveira realiza em Medusa um estudo sensível da religião e do cerceamento da liberdade de seus seguidores. Sob os olhos de Mariana (Mari Oliveira), o filme acompanha uma pequena cidade do interior, atravessada por ondas de violência e perseguição a mulheres tidas como “impuras”. Sem se acanhar, o texto enfia a mão em feridas ainda abertas do Brasil extremista de hoje, debatendo desde corrupção até os efeitos nocivos das mídias sociais.

Depois de impressionar no Festival de Cannes, Silveira levou o filme a Toronto e, enfim, chegou aqui pela seleção da 45ª Mostra de SP. Além de conferir com exclusividade o trabalho, o Persona ainda teve a oportunidade de bater um papo com a cineasta carioca, descobrindo suas inspirações por trás da estilosa fotografia e do extravagante design de produção. Nada é por acaso, e quando as mulheres gritam pela liberdade ao fim da jornada, o espectador não tem outra opção senão a de se unir ao coro. – Vitor Evangelista

Cenas Favoritas: a primeira exploração da clínica; e a dança que acaba em dormência.


Cena do filme Memoria. A imagem mostra uma mulher branca e um homem latino sentados à distância ao lado de uma mesa, em meio a uma área com vegetação e algumas estruturas de madeira ao fundo.
Memoria recebeu o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes (Foto: MUBI)

Memoria

A sessão de Memoria na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo foi algo um tanto indescritível. Depois de mais de duas horas em silêncio absoluto, a plateia permaneceu quieta, como se ainda não tivesse acordado de um longo transe. Diferente de tudo o que você já viu, o mais recente filme de Apichatpong Weerasethakul é uma estranha experiência imersiva e hipnótica, e que, em uma sala de cinema, te obriga a encarar a lentidão e os mais singelos detalhes de suas imagens e sons.

Não é à toa que a distribuidora estadunidense NEON divulgou que o filme jamais será lançado em streaming ou mídia física, e que permanecerá eternamente sendo exibido nas salas de cinema dos EUA, um local por vez. Se isso afeta o lançamento do filme adquirido pela MUBI no Brasil, não sabemos, mas não é exagero dizer que no caso deste, a experiência em uma tela menor não parece algo nada atraente. Memoria é um longa desafiador, sublime, e que merece ser encarado em uma tela grande e no melhor sistema de som possível. Torçamos para que a MUBI também o leve para as salas de cinema do Brasil. – João Batista Signorelli

Cenas Favoritas: a cena do estúdio de som; e o longo encontro da personagem de Tilda Swinton com o segundo Hernández ao final do filme.


Cena do filme Meu Pai. À direita temos Anthony Hopkins vestindo um roupão vermelho. Ao fundo, de forma desfocada, vemos uma estante cheia de livros e um sofá azul. Do lado esquerdo de Anthony há uma cadeira marrom e azul, um vaso azul e um abajur. Ao lado direito há mais uma cadeira azul, uma mesa de vidro com um prato redondo azul.
Com The Father, Anthony Hopkins ganhou o segundo Oscar da carreira (Foto: TOBIS Film GmbH)

Meu Pai (The Father)

Quando o Persona monta a lista de Melhores do Ano – seja no novo formato ou no anterior – existe uma regra básica a ser seguida: só entra para o post filmes lançados no ano e que não estiveram na temporada de premiação anterior. Mas, quando falamos de Meu Pai, sensível produção que rendeu o Oscar de Melhor Ator a Anthony Hopkins, há uma brecha que permite falar sobre ele agora. The Father estreou após o Melhores Filmes de 2020, e não há como deixar de fora o gosto amargo provocado pelo longa que retrata com precisão os efeitos do Mal de Alzheimer.

Adaptado da premiada peça de teatro O Pai, o filme tem a direção brilhante de seu dramaturgo Florian Zeller e atuações de Anthony Hopkins e Olivia Colman. Meu Pai nos coloca dentro da mente confusa de Anthony e se torna grandioso em cada um de seus detalhes. O cenário combinado à atuação e direção, transfere com precisão cada um dos sentimentos passados por quem tem a doença e pela família que dá suporte. O filme reverbera dias a fio na mente de quem assiste, e não foi à toa que saiu vitorioso na categoria de Melhor Roteiro Adaptado no Oscar de 2021. – Ana Júlia Trevisan

Cenas Favoritas: cena do relógio; e as cenas de repetição.


Cena do filme Não Olhe Para Cima. A imagem mostra uma mulher à direita, ela é branca, tem cabelos ruivos na altura dos ombros, veste agasalho de lã laranja com estampas, e está com as mãos na boca em expressão de choque, encarando uma tela do outro lado da imagem.
Olhe para cima e veja uma sociedade que contesta a ciência e aplaude o ridículo (Foto: Netflix)

Não Olhe para Cima (Don’t Look Up)

Se para bom entendedor meia palavra basta, Não Olhe para Cima fez questão de colocá-la numa sátira de puro escárnio. Metade das pessoas não entenderam a superficialidade do diretor Adam McKay, mas não haveria forma mais condizente e precisa para explicar o momento bizarro que o ser humano se encontra, por isso, o lançamento foi tão importante e barulhento. Em sua piada de mau gosto, a narrativa vomita uma verdade irritante: a vida útil do planeta Terra está chegando ao fim, é irreversível, pois estivemos tempo demais presos no Metaverso fabricando notas de repúdio contra o negacionismo científico. Assim, sem surpreender, sua história sobre quão estamos ferrados foi uma das melhores de 2021, e concorre a quatro estatuetas no Oscar 2022, incluindo Melhor Filme, a principal categoria.

A genialidade do longa está no exagero de cenas e personagens, simulando um enredo forçado mas que de irrealistas, na verdade, não tem nada. O diretor também utilizou de um elenco recheado de estrelas para mostrar que mesmo pessoas premiadas podem ser grandíssimos idiotas. Seu objetivo nunca foi divertir, ou fazer uma crítica social profunda, muito menos que você ache engraçado as similaridades dos governantes do mundo real com a presidenta de Meryl Streep. A única razão de McKay em apontar para cima, é para que você saiba o seu papel de completo imbecil. – Nathália Mendes

Cenas Favoritas: discurso da presidente Orlean ao saber do meteoro; Dr. Randy desabafando ao vivo; e o jantar em família no final do filme.


Cena do filme No Ritmo do Coração. Ruby (Emilia Jones) está no banco de passageiro de um carro, se inclinando para fora da janela, olhando para trás e fazendo o sinal de “eu te amo” em linguagem de sinais com a mão direita, erguendo o mindinho e o indicador para cima e estendendo o polegar para o lado. Ruby também cruza o dedo médio atrás do indicador, significando uma promessa. Ruby é uma jovem mulher caucasiana, magra, de cabelos castanhos amarrados para trás, usando uma camisa xadrez vermelha e preta. O Sol matinal ilumina a cena e vemos algumas casas amarelas fora de foco na frente do carro e o topo verdejante de uma árvore no centro da imagem.
Dizer adeus nunca é tão fácil quanto parece (Foto: Apple TV+)

No Ritmo do Coração (CODA)

Algumas narrativas vivem para sempre. Muito além de clichês ou tendências, algumas histórias sempre terão seu espaço na cultura simplesmente por refletirem os aspectos mais essenciais da experiência humana, sejam elas bem ou mal executadas. Ver uma jovem pessoa tentando achar seu lugar no mundo enquanto lida com as tensões criadas ao entrar em conflito com as expectativas de sua família é, com certeza, uma delas, independente de quantas vezes foi ou será contada. Refilmagem de um longa francês, No Ritmo do Coração captura todas as melhores partes dessas narrativas, costurando uma trama de amadurecimento emocional potente e reverberante.

Ancorado pela performance central de Emilia Jones como Ruby, o filme de Sian Heder encantou o júri e a audiência de Sundance em 2021, levando alguns dos maiores prêmios do festival, e, posteriormente, sendo indicado a três categorias do Oscar 2022, incluindo Melhor Filme e Roteiro Adaptado. Capturando as complexidades de uma família de surdos que dependem da filha ouvinte para se relacionar com o mundo, a obra vai muito além da simples representatividade, ao criar uma família tão convincente em suas qualidades e suas falhas que é impossível não se identificar com os diversos dilemas vividos por suas personagens. – Gabriel Oliveira F. Arruda

Cenas Favoritas: Ruby explica à seu professor o que a Música a faz sentir; Frank tenta entender a paixão de sua filha tentando sentir suas cordas vocais; e a audição para Berklee, na qual Ruby finalmente aprende a conectar seus dois mundos.


Cena do filme Noite Passada em Soho. Nela temos um close da personagem de Anya Taylor-Joy. Ela é uma mulher branca, magra, alta e de cabelos loiros moldados como se fosse um penteado dos anos 60. Ela vira a cabeça para trás como se estivesse sendo chamada. A imagem é tratada com um filtro que a deixa vermelha e o fundo está preto com algumas luzes vermelhas desfocadas.
Anya Taylor-Joy, a garota dos sonhos de muita gente, interpreta aqui a garota dos sonhos de Thomasin McKenzie (Foto: Focus Feature)

Noite Passada em Soho (Last Night in Soho)

Muita gente quis nascer em outra época. É dessa premissa que Edgar Wright conduz o suspense com toques sobrenaturais Noite Passada em Soho. Aguardado desde seu último projeto, Em Ritmo de Fuga (2017), Wright entrega uma obra extremamente inventiva e esteticamente primorosa que tece suas críticas e levanta debates a temas como o showbiz e o machismo de forma muito singular. Mantendo seu DNA, Edgar apresenta uma direção que destoa um pouco de suas obras, cadenciando seu estilo frenético para dar enfoque às duas grandes protagonistas Ellie (Thomasin McKenzie) e Sandie (Anya Taylor-Joy), e centrar-se no embate entre duas personalidades de épocas distintas, além de prestar homenagens a algumas referências cinematográficas, como o terror psicológico britânico dos anos 70 e os giallos.

Design de produção e fotografia são outros pontos altos da trama. A reconstrução do Soho sessentista é impecável e consegue dar o tom do bairro boêmio londrino, aliado a uma fotografia que abusa de um neon que amplifica a perturbação psicológica pela qual a Ellie está passando. As escolhas do diretor também se provam muito acertadas, desde sua trilha sonora e como ela se insere na trama, a ideia de um apartamento de certa forma assombrado e até a concepção de fazer o masculino como um todo seu principal predador. Tudo é colocado de forma muito bem intencionada para criar uma obra crítica e envolvente. – Guilherme Veiga

Cenas Favoritas: o primeiro encontro de Ellie e Sandie no Café de Paris; a festa de Halloween que Ellie e John participam; e os plot twists da sequência final.


Cena do filme O Esquadrão Suicida. Nela temos o personagem Tubarão-Rei. Ele se trata de um tubarão-humanoide. Seu corpo tem a anatomia de um ser humano extremamente forte, mas sua cabeça é no formato da de um tubarão e tem barbatanas entre os dedos. Ele é da cor cinza e apresenta algumas cicatrizes ao longo do braço e do tronco. Ele está sentado em um auditório com cadeiras da cor azul. Na cena, ele aponta com sua mão direita para sua mão esquerda (ambas com quatro dedos) que está esticada como se ele estivesse pedindo fala.
“ — Hand ” (Foto: Warner Bros. Pictures)

O Esquadrão Suicida (The Suicide Squad)

Mais uma vez nonsense, personagens secundários e uma baita trilha sonora ditam um trabalho de James Gunn, só que, dessa vez, na vizinha DC. O Esquadrão Suicida chegou em 2021 para espantar o flop da versão de 2016 e, para isso, a Warner apostou na horrivelmente e linda mente de Gunn. O diretor desempenhou seu trabalho mais livre criativamente, onde exagera no humor ácido, depravado e sanguinolento e não tem apego nenhum a qualquer personagem. Mas Gunn, através da sua escrita, sabe tirar o necessário de personas tão desajustadas e construir arcos dramáticos coesos para elas, além de entregar uma típica aventura quadrinhesca, com uma crítica ao imperialismo americano camuflada.

A WWE e o filme de origem do fusquinha amarelo de Transformers se provaram um belo celeiro de personagens de quadrinhos. Nesse rol, se junta à Hailee Steinfeld e Dave Bautista, o hilário Pacificador de John Cena (que lhe rendeu uma série própria). Cena, com seu Pacificador de ideologias muito ortodoxas, rouba a cena e chama a comédia para si, lembrando que estamos falando de um filme com a expansiva Arlequina de Margot Robbie. Mas James Gunn se mostra consciente ao entender um dos problemas do filme anterior, que foi a falta de manejo da grande quantidade de personagens, e, aqui, mesmo com mais nomes, desenvolve seus anti-heróis de forma uniforme, escrachada e instigante. Tais acertos fazem com que esse esquadrão suicida seja realmente O esquadrão suicida. – Guilherme Veiga

Cenas Favoritas: a missão inicial do primeiro esquadrão na praia; a matança por engano no acampamento da resistência; e todas as piadas com o Milton.


Cena do filme Os Olhos de Tammy Faye. Nela vemos a atriz Jessica Chastain, uma mulher branca de cabelos volumosos, ondulados e loiros. Ela veste uma roupa azul e usa sombra nos olhos e um anel no dedo indicador da mão direita da mesma cor. Seu corpo está inclinado e sua mão esquerda está levantada. Há um microfone em sua frente e um fone de ouvido em seu pescoço e orelhas. Sua mão direita segura o fone na altura do pescoço. Ela está em um estúdio de gravação de música, um ambiente em tons de azul escuro.
Jessica Chastain venceu o SAG 2022 de Melhor Atriz por seu papel como Tammy Faye (Foto: Walt Disney Germany)

Os Olhos de Tammy Faye (The Eyes of Tammy Faye)

Tammy Faye e seu marido, Jim Bakker, são dois dos maiores nomes do televangelismo estadunidense. Eles fundaram a emissora PTL e construíram um patrimônio milionário com doações dos fiéis. Junto, também, eles ajudaram a construir a reputação de abuso e contravenções do televangelismo maquiadas de Cristianismo. Inspirado no documentário homônimo de 2000, e dirigido por Michael Showalter, à partir de um roteiro assinado por Abe Sylvia, The Eyes of Tammy Faye mostra a ascensão e queda do casal, tendo como principal ponto de referência a ingenuidade de Tammy.

Jessica Chastain e Andrew Garfield são os responsáveis por protagonizar o longa. Chastain é produtora do projeto e vive seu melhor momento na carreira, atuando de maneira perspicaz em seu papel mais importante. Os Olhos de Tammy Faye conquista logo de início por sua impecável estética que trabalha os elementos gráficos dos anos 70 e 80, sendo fiel a toda nostalgia que a época remete. Tammy é extravagante e sua maquiagem, marca registrada da cantora cristã, ganha o espaço necessário para a construção da personagem. – Ana Júlia Trevisan

Cenas Favoritas: a entrevista com portador de AIDS; e a cena da overdose.


Cena do filme Pegando a Estrada. A imagem mostra um menino persa, com a metade superior do corpo para fora do teto solar de um carro. Ele veste uma camisa de manga comprida florida, e tem os braços estendidos com os punhos fechados , com a boca aberta como se estivesse gritando.
O longa de estreia de Panah Panahi ainda não tem distribuição prevista para o Brasil (Foto: Celluloid Dreams)

Pegando a Estrada (Jaddeh Khaki)

Lá no distante outubro de 2021, Pegando a Estrada foi um dos primeiros filmes vistos pelo Persona na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, onde, com justiça, figurou na seleção de favoritos do público do festival. O ano foi cheio de grandes filmes, mas nenhum alcançou o mesmo grau de sensibilidade que Pegando a Estrada, um fascinante road movie que, sem avisar, te arremessa do riso às lágrimas de um instante para o outro ao contar a história de uma família que segue em uma estrada isolada rumo a um lugar que desconhecemos, e por motivos que nunca ficam completamente claros. 

Em um artigo de Walter Salles no New York Times, onde o diretor formula uma teoria sobre o subgênero cinematográfico, ele diz que “os road movies mais interessantes são aqueles em que a crise de identidade do protagonista reflete a crise da própria cultura.”  E o filme de estreia de Panah Panahi faz exatamente isso: a incerteza, a incompreensão e a tensão vividos por aquela família, e especialmente pelo filho mais velho, saltam da tela e refletem as angústias das vítimas de perseguições políticas e dos deslocamentos forçados. Engraçado, tenso e sublime, Pegando a Estrada é o melhor filme de 2021 e merece a sua atenção. – João Batista Signorelli

Cenas Favoritas: pai e filho contemplando um céu estrelado; e as duas maiores cenas do ano: uma cruel despedida forçada capturada sem cortes por uma câmera distante e fria, e o carpool karaoke mais triste da história do Cinema. 


Cena do filme Pig. No centro da imagem está Robin, um homem adulto e branco. Ele é mostrado do peito para cima. Tem cabelos grisalhos e grandes, na altura do pescoço, sua barba é grisalha. Seus olhos são verdes. Ele tem um machucado vermelho na bochecha e alguns cortes no rosto, seu nariz está com um curativo e sua barba está manchada de sangue. Ele usa uma camiseta bege manchada de sangue. O fundo é uma cortina cinza. Na frente de Robin tem duas taças.
Nicolas Cage constrói um dos melhores personagens de sua carreira em Pig (Foto: BlackBox Entertainment)

Pig

Morte, luto, sofrimento, vocação e relações pessoais são apenas alguns dos vários temas que Pig aborda durante sua projeção. O longa-metragem, dirigido por Michael Sarnoski e escrito por ele junto de Vanessa Block, demonstra uma notável sensibilidade ao tratar de assuntos complexos, além disso, seus personagens são profundos e multidimensionais, o que os tornam muito realistas. Embora o ponto de partida da história remeta a filmes genéricos de ação, o roteiro se desenvolve de maneira calma e subverte nossas expectativas de maneira muito positiva, entregando, no final, uma trama carregada de sentimentalismo e reflexões.

Nicolas Cage protagoniza essa obra e prova, mais uma vez, que pode ser um ator excelente dentro de uma história bem construída. Seu personagem carrega uma dor profunda, a qual é demonstrada através de olhares e atitudes, até mesmo o jeito de andar do personagem retrata sua fragilidade emocional. Conforme a trama avança, o protagonista fica cada vez mais deteriorado fisicamente, como se fosse uma externalização de seus sentimentos há muito tempo enterrados. Pig é carregado de sensibilidade e reflexões, seu roteiro calmo e profundo constrói personagens realistas e entrega uma história marcante, que, com certeza, é um dos filmes mais interessantes e impactantes de 2021. – Nathan Sampaio

Cenas Favoritas: o diálogo entre o protagonista, Robin, e a criança em uma antiga casa; a ida de Robin e Amir a um restaurante; e quando Robin e Amir estão na cozinha, próximo ao final do filme.


Cena do filme Roda do Destino. A cena mostra duas mulheres japonesas em uma ponte em cima de uma avenida. A mulher à direita tem cabelo curto, veste uma blusa azul e carrega uma bolsa preta nas costas. Ela segura a mão da mulher à esquerda. A mulher à esquerda tem cabelo um pouco mais longo e veste uma blusa branca. Ao fundo, vemos a copa das árvores.
Roda do Destino não recebeu indicações ao Oscar, mas merece tanta atenção quanto Drive My Car (Foto: NEOPA)

Roda do Destino (Gûzen to Sôzô)

O ano de 2021 foi ótimo para Ryûsuke Hamaguchi. O diretor japonês entregou dois excelentes filmes: Roda do Destino e Drive My Car, que foi indicado a quatro Oscars, incluindo Melhor Filme e Melhor Diretor. A adaptação do conto de Murakami merece o destaque que está recebendo, mas Wheel of Fortune and Fantasy também merece atenção pela forma como trabalha os relacionamentos humanos e o acaso ao longo de suas três histórias. É um belo mergulho nas vidas, nos desejos e nos arrependimentos de Meiko (Kotone Furukawa), Nao (Katsuki Mori) e Natsuko (Fusako Arabe), protagonistas de cada segmento. 

Pela lente de Hamaguchi, momentos banais se tornam confissões íntimas de suas personagens e as coincidências da vida adquirem um ar quase mágico devido à sua imprevisibilidade. Cenas como a da leitura do trecho do livro no escritório de Segawa (Kiyohiko Shibukawa) e o longo diálogo entre Natsuko e Aya (Aoba Kawai) demonstram a grande habilidade do diretor em construir situações dramaticamente potentes a partir de conversas. Todas as histórias são ótimas, mas merece destaque a terceira, intitulada “Mais Uma Vez”. Nela, o tema do arrependimento amoroso é tratado com uma sensibilidade comovente. – Caio Machado 

Cenas Favoritas: a tensa leitura do livro no escritório de Segawa, onde parece que algo ruim vai acontecer a qualquer momento; e a conversa desconfortável entre Nao e Sasaki no ônibus, carregada de ressentimento.


Cena do filme Romeo & Juliet. Julieta (Jessie Buckley) se inclina em sua varanda na direção de Romeu (Josh O’Connor), com a lua fora de foco ao fundo. Julieta, à esquerda, é uma mulher caucasiana jovem, magra e ruiva, de cabelos ruivos e lisos. Podemos ver a manga azul-escura de seu vestido e seu colar dourado balança abaixo dela, enquadrado pela circunferência prateada da lua. Romeu é um homem caucasiano jovem, magro e de cabelos escuros e curtos, com a face iluminada pelo luar. Podemos ver a gola de sua camisa branca no pescoço.
Há beleza na simplicidade (Foto: National Theatre)

Romeo & Juliet

Se a necessidade é mesmo a mãe da criatividade, a nova adaptação de Romeu & Julieta para os palcos britânicos é o maior exemplo de como a pandemia afetou o meio artístico. Estrelando Jessie Buckley (A Filha Perdida) e Josh O’Connor (The Crown), como os amantes desafortunados de Shakespeare, a produção do National Theatre teve de mudar completamente seu formato para ser exibida em 2021, incorporando não só os cenários originalmente construídos em suas filmagens, mas o espaço entre eles e os ensaios de seu elenco, transcendendo sua própria tragédia em puro triunfo.

Apesar de modernizar diversos aspectos da peça imortal, Romeo & Juliet preserva aquilo que se faz essencial em qualquer iteração da obra do Bardo de Avon: seu texto. O diretor Simon Godwin cria um espaço amplo e versátil para que seu elenco extraia o máximo de suas falas seculares e habitem seus personagens, com destaque para Benvólio (Shubham Saraf) e Mercúcio (Fisayo Akinade), que aqui exibem tanta química quanto o casal principal, apesar de a cereja do bolo ainda pertencer à Buckley ao sussurrar suave e tragicamente, antes de gritar: “Teus lábios estão quentes”. – Gabriel Oliveira F. Arruda

Cenas Favoritas: a morte de Mercúcio pelas mãos de Teobaldo; e o último beijo dado entre os amantes.


Cena do filme Saint Maud. A cena mostra a personagem Maud, uma mulher branca e de cabelos claros compridos, deitada no chão, com as mãos no rosto e o cabelo estirado atrás dela, como uma cascata.
Bendito seja: lançado no Festival de Toronto de 2019, Saint Maud só chegou para apreciação do público dois anos depois (Foto: Escape Plan Productions)

Saint Maud

Não tem como fugir disso: Saint Maud é um filme de sensações. Morfydd Clark desliza na pele de Maud, uma enfermeira desiludida, que encontra na fé seu farol de esperança. Para dissecar os sentimentos e receios da jovem, a diretora Rose Glass filma com a cautela de alguém à beira de uma explosão. Capturando a parcimônia da performance de Clark por ângulos discretos e uma coloração lavada e um tanto apática, o Cinema de Glass se pauta na súplica. 

Maud implora pela atenção de sua nova paciente, por respostas de Deus e acredita piamente que os pensamentos que se camuflam em sua cachola podem e serão resolvidos por um expurgo divino. O que ela não sabe, porém, é que está inserida dentro de um filme de terror e, quando Rose Glass decide por soltar o fio da sutileza, ela não hesita ou poupa sua protagonista sacra. Tudo queima, tudo mesmo. – Vitor Evangelista

Cenas Favoritas: o susto na cama escura; e a limpeza ardente que conclui a trama.


cena do curta-metragem Save Ralph. A cena se passa em um vestiário. Ao fundo, vemos uma parede de ladrilhos verdes claros, com três placas de avisos, um relógio. Vemos cadeiras brancas e, à esquerda, um bebedouro com uma faixa e uma placa de interditado. Do lado direito, ao fundo, vemos um armário de vestiário. Em um primeiro plano da imagem, ao centro, vemos Ralph, um coelho branco, fazendo joinha com a mão direita. Ele tem hematomas e feridas ao redor dos olhos e um colar cervical no pescoço.
No Brasil, os testes em animais já foram proibidos em alguns estados, mas não chegam perto de serem a maioria (Foto: The Humane Society of The United States)

Salve o Ralph (Save Ralph)

Salve o Ralph leva menos de quatro minutos para passar seu recado: “nenhum animal deveria sofrer e morrer em nome da beleza”. O curta-metragem, dirigido por Spencer Susser e dublado por atores globais, como Taika Waititi, Ricky Gervais e Zac Efron, mostra Ralph, um coelho de laboratório, em um documentário sobre sua rotina sendo submetido a testes em uma empresa farmacêutica. Na animação stop-motion, o personagem tem a aparência similar à do animal, no que o filme opta por deixar de lado a liberdade da fantasia, e sensibiliza com a proximidade do real.

Através da ironia do pseudo-documentário, em que Ralph defende os testes em outros coelhos e as crueldades às quais é submetido, Salve o Ralph critica os procedimentos e provoca quem continua comprando os produtos. O curta faz parte de uma campanha da The Humane Society of The United States, organização estadunidense que luta pelo fim dos testes em animais, ainda permitidos e muito empregados pela indústria farmacêutica e estética. Como o diretor lembra, “é importante que Ralph até se pareça real, porque ele representa a realidade de outros incontáveis animais que sofrem todos os dias”. – Vitória Lopes Gomez

Cenas Favoritas: apresentação do Ralph; cena em que o Ralph é testado; e expõe as crueldades da indústria farmacêutica e estética.


Cena do filme Sempre em Frente. Na imagem em preto e branco, vemos um garoto de cabelos escuros, encaracolados até os ombros e com franja, sentado, de costas para uma parede branca. Ele está vestindo uma blusa de mangas compridas estampada, e está segurando um caderno aberto na mão esquerda, enquanto olha sorrindo para o homem que está ao seu lado. Ao lado dele, no canto esquerdo da imagem está um homem, de barba e cabelos grisalhos. Ele também está sentado, olhando para o garoto. Ele está vestindo uma camisa branca, e também está de costas para a parede branca. Eles estão em ambiente interno.
Sempre em Frente tem como ponto chave mostrar como uma geração cresce e sua personalidade se desenvolve em meio às constantes mudanças do tempo em que vivemos (Foto: Diamond Films)

Sempre em Frente (C’mon C’mon)

Um filme esnobado nas grandes premiações do ano, mas aclamado pelas da crítica, sem dúvida, merece ser visto. E Sempre em Frente, escrito e dirigido por Mike Mills (Toda Forma de Amor, Mulheres do Século 20), não desaponta nem um pouco. Muito pelo contrário, é um belíssimo longa, que comove e ensina ao falar sobre relacionamentos familiares de maneira honesta e delicada. A história fala de Johnny (Joaquin Phoenix), um jornalista de rádio que, após sua irmã pedir para que ele tomasse conta do filho, embarca em uma viagem pelo país com o sobrinho de oito anos, Jesse (Woody Norman), a fim de mostrar ao garoto a vida fora dos muros da sua cidade natal, Los Angeles.

No fim, a similaridade com os personagens é tanta que temos a sensação de ter assistido às memórias de alguém conhecido. Sempre em Frente tem como ponto forte a forma que retrata essa relação de dois seres humanos em fases e transições completamente diferentes. É um filme humano e, acima de tudo, real, que merece reconhecimento. O mais encantador é a química da dupla Phoenix e Norman, rara de se ver em um elenco. Dentre as premiações, foi indicado ao BAFTA Awards de Melhor Ator Coadjuvante para Woody Norman, ao Film Independent Spirit Awards de Melhor Filme, entre outros. – Sabrina G. Ferreira

Cenas Favoritas: as entrevistas de Johnny com várias adolescentes sobre como elas se sentem, onde moram e seus principais anseios, esperanças e vivências como americanas; e a cena em que o pequeno Jesse está dando conselhos para Johnny com dicas sobre como ele faz para se sentir calmo em momentos de nervosismo.


Cena do filme Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis. Na imagem, está, à esquerda, a personagem Katy, interpretada por Awkwafina, e, à direita, Shang-Chi, interpretado por Simu Liu. Katy é uma mulher de traços orientais, de cabelos pretos e longos presos em um rabo baixo; ela veste uma camisa social branca, gravata preta, um colete vermelho e calça social preta. Simu Liu é um homem de traços orientais, de cabelos pretos e lisos; ele também veste uma camisa social branca, gravata preta, um colete vermelho e calça social preta.
Ao lado de Homem-Aranha: Sem Volta para Casa, o longa garantiu mais uma indicação para a Marvel no Oscar 2022, na categoria de Melhores Efeitos Visuais (Foto: Marvel Studios)

Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (Shang-Chi and the Legend of the Ten Rings)

Por que não estamos falando sobre Shang-Chi? No ano de ouro da Marvel, que se vangloriou com o sucesso de suas produções no Disney+, enfrentou as polêmicas da mais nova legião de heróis no Cinema, e faturou com os recordes do multiverso do Amigão da Vizinhança, parece que não sobrou espaço para falar do marco histórico do primeiro filme de um super-herói asiático em seu universo cinematográfico. Tudo bem que a estreia da produção teve que lidar com a volta silenciosa das salas de cinema, mas há de se questionar, e muito, a sua quase ausência na memória dos feitos do estúdio em 2021. 

Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis não entrega apenas cenas de luta bem coreografadas, mas também uma história de origem interessante e que sabe mesclar elementos da mitologia chinesa devidamente. Apesar de um pouco condicionada à conhecida fórmula Marvel, a performance de Simu Liu consegue dar vida a um super-herói com um carisma e profundidade que nem alguns dos Vingadores chegaram a atingir. A obra, dirigida por Destin Daniel Cretton, ainda conta com a brilhante dinâmica entre os demais personagens da narrativa, em especial na relação com Katy, que nos deu a oportunidade de ver Awkwafina brilhar nas telonas mais uma vez. – Vitória Silva 

Cenas Favoritas: a luta no ônibus; a chegada em Ta Lo; e a conversa entre Shang-Chi e Katy sobre o passado.


Cena do filme Shaun, o Carneiro: Aventura de Natal que mostra diversas ovelhas brancas e sorridentes, usando uma coroa colorida, reunidas em volta da mesa de natal. Na imagem também aparece um bode cinza e um cachorro amarelo com um gorro verde de duende. A mesa está com comidas natalinas e tem um bolo escuro com cobertura branca no centro. O ambiente da festa é um celeiro de madeira simples com uma árvore de natal ao fundo.
Shaun, o Carneiro: Aventura de Natal constrói uma trama narrada apenas com onomatopeias (Foto: Aardman Animations/Netflix)

Shaun, o Carneiro: Aventura de Natal (Shaun The Sheep: The Flight Before Christmas)

A experiência por trás de um filme de animação deve ir muito além da narrativa desenvolvida na obra. A estética apresentada para que os personagens ganhem vida é fundamental para a imersão do telespectador na atmosfera proposta pela trama. Esse é justamente o caso do curta metragem Shaun, o Carneiro: Aventura de Natal, que utiliza a técnica de stop motion para animar bonecos de massinha. A película, produzida pela Aardman Animations em parceria com a Netflix encanta com um especial de Natal vivido pelo carismático carneiro.

A narrativa desenvolvida ao longo do curta é bem simples, voltado na tarefa árdua das ovelhas em recuperar Timmy, o carneiro bebê que foi entregue por engano a uma criança. No entanto, o seu desenrolar apresenta uma dinâmica coerente dentro do curto limite de tempo do filme. Outro ponto positivo é o apelo nostálgico pelo Shaun e pelos outros animais que vivem na fazenda. O personagem, que surgiu nas animações Wallace & Gromit, ganhou seu espaço na série Shaun, o Carneiro e agora se consagrou com seu especial de Natal. Gabriel Gatti

Cenas Favoritas: quando o Fazendeiro vai preparar sua soda e acaba errando na medida dos ingredientes depois que a sua internet trava; quando o Fazendeiro abre uma garrafa na feira de Natal e atinge os músicos, que, por sua vez, passam a persegui-lo ao longo do curta; e quando Timmy, o carneiro bebê, aparece fazendo um boneco do Papai Noel com a lã de sua mãe.


Cena do filme Shiva Baby. A imagem é retangular e exibe o busto da personagem Danielle, interpretada por Rachel Sennott. Rachel é uma mulher branca, jovem adulta, de cabelos castanhos-claros ondulados. Seus cabelos estão presos em um coque. Apenas a mecha de sua franja está solta. Ela usa uma camisa branca e um blazer preto, por cima. Uma de suas mãos está erguida ao lado de seu rosto e ela segura uma pequena torta. Sua expressão é de irritação, enquanto come. O fundo está desfocado, mas é possível identificar três silhuetas que usam roupas sociais.
A representatividade bissexual é a grande engrenagem de Shiva Baby (Foto: Shiva Baby LLC)

Shiva Baby

Marcando a astuta estreia da diretora canadense Emma Seligman, Shiva Baby constrói um tragicômico cenário de transição entre a juventude e a vida adulta. As relações incômodas dentro da narrativa passiva-agressiva vem da própria experiência de Seligman, mulher, judia e bissexual, assim como a protagonista, Danielle (Rachel Sennott). O filme se materializa, principalmente, na calamidade de ver os pais quererem decidir não só o futuro, mas por quem ela se atrai. Além dos pilares que constroem as características da protagonista, a interação que o longa tem com o público reforça a claustrofóbica narrativa, nos aproximando de Shiva Baby.

Poucas produções consegue fazer humor com sexo de maneira tão boa, vide o primor inatingivel de Fleabag. Com traços que lembram a produção britânica, o roteiro é aguçado ao apresentar cada passo de Danielle de maneira orgânica e praticamente em tempo real. A agilidade da narrativa também faz com que o filme funcione como um thriller, tornando a experiência de assistir a produção ainda mais satisfatória. Tudo isso graças ao timing da direção que encontra as brechas do riso na comédia e do susto no horror. – Ana Júlia Trevisan

Cenas Favoritas: a cena da conversa no quarto; e a cena do choro.


cena do filme Spencer. A cena mostra uma pessoas sentadas à mesa de jantar, iluminada com velas. À esquerda, vemos parte do braço de um homem, desfocado. Ao centro da imagem, vemos Diana, a personagem interpretada por Kristen Stewart. Ela é uma mulher branca, magra, de cabelos loiros lisos e na altura do ombro, aparentando cerca de 30 anos. Ela usa brincos, um colar de pérolas e um vestido esverdeado, e tem uma expressão tensa. À direita da imagem, vemos a figura de duas pessoas comendo à mesa, desfocadas, e velas acesas.
O local retratado em Spencer é o Queen’s Sandringham, a casa de campo da Família Real, em Norfolk, Reino Unido (Foto: Shoebox Films)

Spencer

O espectro da Princesa Diana em Kristen Stewart não poderia fugir da lista dos Melhores de 2021. Spencer, fruto da imaginação do roteirista Steven Knight, reimagina os dias anteriores à separação dela e do Príncipe Charles, durante o final de semana de Natal. Na direção do filme, o chileno Pablo Larraín conduz um olhar angustiante pelos corredores fantasmagóricos do palácio de férias da Família Real, mas também mostra a tocante relação entre mãe e filhos. A reconstrução dos ambientes, das vestimentas e da caracterização dos personagens intensifica a imersão e o desconforto com as situações, e rendeu reconhecimentos aos departamentos de arte do longa.

Imersão essa que também é crédito da fotografia de Claire Mathon. As lentes da cinegrafista se mantêm próximas e, ao mesmo tempo, distantes da Lady Di, e acentuam a nebulosidade e o pesar dos dias retratados, a partir de uma livre imaginação. E encarnando a Spencer em pessoa, Kristen Stewart entrega uma das melhores performances de sua vasta carreira. A linguagem corporal, a presença em cena, o sotaque e os maneirismos adotados pela versátil atriz incorporam a Princesa do Povo, no que ela externaliza as aflições e angústias da figura. O longa recebeu indicações e troféus em dezenas de importantes premiações, incluindo reconhecimentos à trilha sonora de Jonny Greenwood, à direção, à direção de arte e ao elenco principal e coadjuvante. Ainda em aberto, Stewart concorre como Melhor Atriz no Oscar 2022. – Vitória Lopes Gomez

Cenas Favoritas: Diana chegando na residência pela primeira vez; Diana e Maggie conversando na praia; e a cena do jantar de Natal.


Cena do documentário Summer of Soul. A imagem é colorida e tem efeito desfocado e distorcido. É de dia e o cenário é um parque. À esquerda, está Nina Simone. Ela é uma mulher negra e está de perfil, virada para a direita, enquanto canta sorrindo, de olhos fechados. Ao redor dela, preenchendo todo o resto da imagem, existe um público majoritariamente negro que a assiste.
O documentário mais premiado do ano é a grande aposta ao Oscar de Melhor Documentário de 2022 (Foto: Searchlight Pictures)

Summer of Soul (…ou, Quando a Revolução Não Pôde Ser Televisionada) [Summer of Soul (…Or, When the Revolution Could Not Be Televised)]

É o lendário verão de 1969, quando a cultura norte-americana viveu uma de suas revoluções mais significativas. Mas não, não estamos falando de Woodstock. Ao contrário do que a apropriação branca do momento histórico faz parecer, o evento hippie não era o único centro de efervescência cultural da época. Como prova disso, existe Summer of Soul, que se dedica a registrar como elemento principal da história daquele ano o contexto da comunidade negra de Nova York. O filme de Ahmir “Questlove” Thompson se reúne ao redor do Harlem Cultural Festival, que tomou uma região durante seis finais de semana seguidos. 

Na companhia de alguns dos maiores nomes da Música negra, como Stevie Wonder e Nina Simone, e de gêneros essencialmente representativos, como o blues e o jazz, a obra se tornou o documentário mais premiado do ano. Respirando Música e expressando uma intenção determinada do início ao fim, Summer of Soul se destaca não só pela grandiosa narrativa, mas também pela forma como se manifesta. O fenômeno começou em 2021, conquistando a maioria das críticas dos Estados Unidos e a visibilidade do Festival de Sundance, num percurso impecável até chegar em 2022, com o reconhecimento do Sindicato dos Produtores e dos Diretores, grandes chances de vencer o Grammy e finalmente indicado ao Oscar. E dessa vez, a revolução será televisionada. – Raquel Dutra

Cenas Favoritas: a série da abertura que introduz o filme com uma sequência de montagem totalmente harmônica com a trilha e as imagens.


Cena do filme Tempo. A cena mostra uma família abraçada em uma praia, embaixo de um guarda-sol. Vemos um homem mexicano de cabelo preto abraçado a um menino magro, também de cabelo preto. À esquerda, vemos uma jovem branca, com cabelo castanho na altura dos ombros, abraçando os dois e uma mulher com a cabeça apoiada nas costas da jovem. A mulher tem cabelo curto e veste uma camisa branca com linhas azuis. Ao fundo, vemos as ondas do mar.
Tempo é uma reflexão intensa sobre o envelhecimento (Foto: Universal Pictures)

Tempo (Old) 

Para algumas pessoas, o processo de envelhecimento é entendido como um verdadeiro horror. Tempo, o trabalho mais recente de M. Night Shyamalan, se aproveita disso para elaborar situações angustiantes e grotescas em um filme que lida com o suspense com maestria. A câmera de Shyamalan explora cada canto da praia e insere o medo naquilo que não vemos, pois sabe que não há nada mais assustador do que a imaginação humana. Porém, o filme impressiona não só pelo terror, mas por também inserir cenas tocantes em meio à correria dos personagens para sair daquele ambiente hostil. Nesse sentido, a conversa melancólica entre Guy (Gael García Bernal) e Prisca (Vicky Krieps) à noite é um dos melhores momentos da obra. 

Outra cena que merece destaque é quando Trent e Maddox decidem construir um castelo de areia, perto do final. Nela, uma atividade banal se torna uma emocionante reflexão sobre a passagem do tempo e a perda da inocência que vem com a chegada da idade adulta. Em um ano onde a pandemia se manteve presente, o filme pode ser entendido como uma alegoria à quarentena, onde ficar em casa altera com a percepção de tempo das pessoas e traz todo um leque de incertezas. No entanto, em um período histórico com tantas perdas, a obra pode ajudar a compreender que envelhecer não é tão ruim assim. Na verdade, é um privilégio. – Caio Machado 

Cenas Favoritas: a da caverna, onde Trent e Maddox só conseguem enxergar o que a luz do fósforo permite enquanto a mulher os persegue é capaz de causar calafrios; a cena onde as crianças constroem um castelo de areia também merece ser mencionada por sua sensibilidade ao discutir sobre o processo de tornar-se adulto.


Cena do filme The Box: No Ritmo do Coração. Na imagem, Jihoon, um homem branco de cabelo e olhos escuros, toca um violão de tom marrom. O cantor veste uma camisa branca e carrega um fone de ouvido headset branco ao redor do pescoço. Ao fundo, as águas do rio e os prédios da cidade
O filme sul-coreano foi certeiro na escolha do tom leve para abordar cenários complexos (Foto: Studio Take/Cine Pilwoon)

The Box – No Ritmo do Coração (Deo Bagseu)

A princípio despretensioso, The Box – No Ritmo do Coração até pareceu ser só mais um filme bobo para assistir em uma Sessão da Tarde, mas a narrativa complexa mostrou que a leveza da produção foi exclusividade do tom da abordagem. Assombrado pelos traumas do passado, a composição do personagem principal Jihoon (Park Chanyeol) foi certeira, sendo muito difícil que alguém não tenha se identificado com ele durante algum minuto da sua trajetória na narrativa. Assim como o público, Minsoo (Jo Dalhwan) se encantou pelo jovem músico e se comprometeu a levá-lo ao estrelato.

Acontece que ao lado de um produtor musical falido, Jihoon não iria muito longe, certo? Errado. Entre momentos trágicos e cômicos, a caminhada dos dois amantes da Música prendeu a atenção de quem assistiu o longa e se configurou como uma premissa simples, mas bem executada. Se o protagonista passa boa parte do tempo cantando dentro de uma caixa de papelão por timidez, The Box – No Ritmo do Coração também não foge disso, a direção de Yang Jeong-Woong não foi ‘fora da caixa’, porém não se limitou a ela. – Nathalia Tetzner

Cenas Favoritas: a cena em que Jihoon se lembra da infância, em um flashback que explica os seus motivos para temer cantar fora da caixa; e o momento em que ele tenta se apresentar em público pela primeira vez, ao lado de uma cantora cega.


Cena do filme The Card Counter. A cena mostra um homem guatemalteco-americano sentado à mesa em um refeitório, com várias mesas ao redor. O homem tem cabelo comprido em cima, penteado para trás e raspado dos lados. Ele veste uma camisa cinza e mostra uma carta de baralho, dez de ouros, para outra pessoa que não está em cena.
Oscar Isaac entrega uma das melhores atuações do ano em The Card Counter (Foto: Focus Features)

The Card Counter: O Jogador (The Card Counter) 

Dizem que, ao longo da carreira, um cineasta faz várias versões de um mesmo filme e, com o tempo, pode se aproximar da perfeição ou do fracasso. Em The Card Counter, Paul Schrader prova que se enquadra no primeiro caso. O filme conduz temas já trabalhados em obras anteriores, como a redenção e o amor como força transformadora, de maneira minuciosa, tão atenta aos detalhes quanto seu protagonista, o taciturno William Tell (Oscar Isaac). Sob as luzes coloridas dos cassinos e acompanhado da tensão das mesas de jogo, é um excelente estudo de personagem que fascina por seu ritmo desacelerado e pela atmosfera sombria que consegue construir.

O filme exerce um grande controle sobre as emoções de seus personagens e os atores, especialmente Oscar Isaac e Tye Sheridan, entregam performances contidas, de uma aparente tranquilidade que esconde uma angústia existencial dolorosa. É essa escolha de segurar as emoções ao máximo que torna as cenas mais intensas tão impactantes. Nos melhores momentos, como no passeio noturno de Tell com La Linda (Tiffany Haddish) e no confronto do protagonista contra Gordo (Willem Dafoe), o filme consegue emocionar graças à maneira sincera como trata seus personagens. No final, mostra que todos merecem amor, independente dos traumas que carreguem. Junto com Matrix Resurrections, é um dos filmes mais românticos de 2021. – Caio Machado 

Cenas Favoritas: o passeio noturno de William Tell com Linda, enquanto os dois andam por corredores repletos de luzes coloridas, é maravilhoso e surpreende pelo ar romântico em um filme tão sombrio; a cena em que o protagonista vai confrontar o personagem de Willem Dafoe na casa dele, também durante a noite, consegue impactar por sua intensidade e violência, mesmo não sendo explícita. 


Cena do filme The Velvet Underground. A cena mostra três músicos em um salão, rodeados de caixas de som. Todos são brancos, têm cabelo preto e usam roupas pretas com calça jeans. Estão com guitarras nos braços. Nas paredes, vemos vários balões.
Todd Haynes quebra a estrutura dos filmes documentais em The Velvet Underground (Foto: AppleTV+)

The Velvet Underground

Como fazer jus à uma banda tão importante para a história da música quanto The Velvet Underground? Seguir nos moldes de um documentário tradicional sobre Música, contando a história do grupo de maneira linear e com depoimentos aqui e ali não parece justo, então o diretor Todd Haynes optou por fugir desse modelo e experimentar na estrutura documental, assim como os músicos fizeram em sua carreira. É justamente isso o que o torna especial diante de outros filmes do gênero: sua disposição para experimentar com a linguagem cinematográfica e explorar o que é exibido na tela, as imagens de arquivo e os sons, sejam eles músicas ou não. 

Não é só uma biografia da banda. É também um retrato imersivo e carinhoso da cena cultural que habitou a Nova York da década de 1960. Consegue transmitir a sensação eletrizante de viver na cidade naquele período e ainda reflete sobre o contexto histórico com um olhar crítico através dos depoimentos, como na sensacional cena que critica a hipocrisia do movimento hippie. Também é muito emocionante a homenagem que o filme faz a Jonas Mekas, grande nome do Cinema experimental que faleceu em 2019. The Velvet Underground é uma excelente biografia sobre a banda liderada por Lou Reed e uma carta de amor apaixonada à experimentação na arte. Sem experimentar, sem quebrar regras, não há evolução. – Caio Machado

Cenas Favoritas: a cena em que as entrevistadas denunciam a hipocrisia do movimento hippie é fantástica por sua sinceridade; e todo o relato da viagem da banda à Califórnia, em 1966, é vibrante e cômico pelo contraste entre o visual soturno dos integrantes e o ambiente ensolarado.


Cena do filme The Worst Person in the World. A cena mostra Eivind e Julie trocando a fumaça do cigarro pela boca, um de frente para o outro, em perfil. Eivind, interpretado por Herbert Nordrum, é um homem adulto branco de cabelo curto loiro escuro. Ele veste um paletó preto com uma camisa branca por baixo. Julie, interpretada por Renate Reinsve, é uma mulher adulta branca de cabelo longo com franja curta na cor castanho claro. Ela veste um paletó marrom. Ela segura o ombro de Eivind com a mão da frente e, com a outra mão, segura um cigarro. Ambos estão com os olhos entreabertos, quase fechando. A fumaça do cigarro é espessa e destacada, com desenhos ondulados. O fundo é desfocado, sendo possível identificar apenas folhagens de árvores verdes e pontos de luzes aleatórios, nas cores vermelho, branco e azul.
Apesar das somente duas indicações para Melhor Filme Internacional e Melhor Roteiro Original à premiação do Oscar 2022, é Renate Reinsve como Julie que faz de The Worst Person in the World um dos melhores filmes do ano (Foto: MK2 Productions)

The Worst Person in the World (Verdens verste menneske)

Dividido por doze capítulos, um prólogo e um epílogo, The Worst Person in the World acompanha quatro anos da vida de Julie (Renate Reinsve), uma jovem adulta ótima em não tomar decisão alguma – e estranhamente parecida com a atriz Dakota Johnson. Protagonista, Julie não é estudante de medicina, não é estudante de psicologia, ela é fotógrafa. Julie não tem cabelo loiro, não tem cabelo rosa, ela tem cabelo castanho. Julie não está no começo de seus vinte anos, não está no fim de seus vinte anos, ela está no início de seus trinta. Em síntese, Julie é tudo, mas também não é nada, muito menos a pior pessoa do mundo.

Em constante processo de mudança, Julie permanece, do início ao fim, um verdadeiro mistério. A presença fascinante de Reinsve como musa do filme (performance essa que lhe rendeu uma vitória de Melhor Atriz em Cannes 2021) expande o drama norueguês para adiante da admiração romanticamente superficial do diretor Joachim Trier sobre a protagonista, que a engessa como estátua meramente contemplativa. Reinsve puxa Julie para baixo do pedestal, provando, por trás da beleza, as falhas de sua anti-heroína, e fazendo de The Worst Person in the World um dos melhores filmes do ano. – Ayra Mori

Cenas Favoritas: prólogo; quando o mundo pausa e Julie corre por Oslo; Aksel tocando bateria no ar.


Cena de tick,tick… BOOM! Nela, o personagem de Andrew Garfield aparece no canto direito. Andrew é um homem branco, alto e de cabelo grande. Ele segura um microfone com fio com a mão direita, enquanto a esquerda está sobre o peito na altura do coração. Andrew está com um semblante alegre e sorriso tímido, por estar em um palco, provavelmente está agradecendo. Ele veste uma camisa branca de manga comprida e uma calça de alfaiataria. A camisa está por dentro da calça. Na frente de Andrew está um pedestal de microfone na cor preta e logo atrás há um piano na cor marrom. O fundo do cenário é composto por quatro fileiras de lâmpadas circulares, que estão acesas, sobre um fundo preto.
O Globo de Ouro para Andrew em Melhor Ator em Filme de Comédia ou Musical o credencia como um dos favoritos ao Oscar (Foto: Netflix)

tick, tick… BOOM!

O estreante diretor Lin-Manuel Miranda (Hamilton) vê o musical Rent como divisor de águas em sua vida e inspiração para a carreira. Então, não tinha pessoa melhor em momento mais ideal para dirigir tick, tick… BOOM!, filme que conta o processo criativo do compositor Jonathan Larson (Andrew Garfield) e é baseado em outro musical homônimo do escritor. Aqui, o cineasta aborda a história de forma muito íntima sobre o trabalho de Larson e é extremamente bem contextualizado com as vivências e dramas do compositor durante os anos 90, graças a um subtexto dosado na medida certa. Mesmo se tratando de uma história difícil e tortuosa, Lin-Manuel Miranda opta por dar um tom otimista para celebrar as pequenas vitórias que Larson infelizmente não aproveitou, esperando seu sucesso artístico, e faz dessa obra, uma carta de amor ao mestre.

tick, tick… BOOM! é um musical sem tirar nem pôr, daqueles em que os personagens começam com a cantoria nos momentos mais improváveis. Isso poderia trazer ao filme o estigma que todo musical injustamente carrega, mas o texto e direção conseguem preencher os intervalos das músicas com uma narrativa envolvente e humana, e uma metalinguagem bem sutil sobre o próprio processo criativo. Andrew Garfield dá vida ao protagonista de forma incrível e apaixonada. Ele consegue captar a complexidade da mente de um gênio por meio de uma dualidade que expressa toda a ansiedade do compositor através do olhar e toda a paixão de Larson através de sua voz, a construção de Garfield aqui é muito coerente. No mais, tick, tick… BOOM! é um musical feito por quem e para quem ama o gênero. – Guilherme Veiga

Cenas Favoritas: a performance inicial de 30/90; a cena da piscina com o desenho da piscina se transformando em partitura na performance de Swimming; e o primeiro ensaio do sexteto para Superbia.


Cena do filme Titane. A cena mostra Alexia caracterizada de Adrien em cima de um caminhão de bombeiros. A câmera filma ela de cima do caminhão, e ela está de frente para a câmera, dançando em uma pose sensual de olhos fechados. Ela está careca e veste um macacão de bombeiro. Ao fundo, no chão do galpão, vemos diversos bombeiros, alguns sem camisa, assistindo a apresentação de Alexia. O galpão é iluminado por uma luz roxa azulada, e vemos bandeirinhas penduradas.
Let’s ride (Foto: Kazak Productions)

Titane

Chocar está cada vez mais difícil. Toda bizarrice inesperada, estranheza, nojeira ou absurdo a internet já mostrou. Mesmo assim, Titane atropela até os mais avisados. O longa francês da roteirista e diretora Julia Ducournau conta a história de Alexia (Agathe Rousselle), que, quando criança, teve uma placa de titânio implantada em seu crânio após um acidente de carro. Já adulta, o trauma se converte em prazer: ela transa com um Cadillac e fica grávida dele, com direito a óleo de motor escorrendo de sua vagina. Ah, ela também é uma serial killer, e para fugir da polícia, assume a identidade de Adrien, um menino desaparecido há muitos anos. De cabelo e sobrancelha raspados, nariz quebrado e um semblante perdido, é aceita pelo pai verdadeiro do garoto, Vincent Legrand (Vincent Lindon).

Na estrada em que dirige, Ducournau não respeita uma lei de trânsito sequer. O mórbido aposta racha com o sensual e o cômico, e quando se espera que o filme acelere no brutal, ele abre espaço para uma narrativa com sentimentos. Tudo é sempre muito sensorial e propositalmente apelativo, confundindo o espectador se o que está se vendo na tela é literal ou metafórico. Não há uma única cena em que a criadora de Titane se perde. A segunda mulher vencedora da Palma de Ouro do Festival de Cannes em 74 anos está pouco se fodendo para o que esperam de seu Cinema. Ela não diz ser subversiva, ela é. Seu trabalho é como uma saborosa cebola que também faz chorar, desabrochando em camadas. É despretensiosamente pretensioso, e é isso que o torna genial. – Jho Brunhara

Cenas Favoritas: a cena em que os bombeiros estão dançando na festa organizada por eles; e a cena em que Alexia, caracterizada de Adrien, dança sensualmente em cima do caminhão para os bombeiros assistirem.


Cena do filme Rua do Medo: 1978. Emily Rudd e Sadie Sink se encaram, uma de frente para a outra e de perfil para nós. Emily, à esquerda, tem cabelos ruivos, é uma mulher branca e usa camisa polo branca com listras laranjas. Sadie, à direita, é mais jovem, também ruiva e branca, e usa uma blusa branca com listras vermelhas e azuis.
Pânico, Halloween, O Massacre da Serra Elétrica, Carrie e Sexta-Feira 13 são alguns dos filmes referenciados na Trilogia (Foto: Netflix)

Trilogia Rua do Medo (The Fear Street Trilogy)

2021 foi um ano bastante frutífero para a Netflix. Desde o princípio, o streaming garantiu que não faltaria investimento em lançamentos, e nessa busca por movimentar as sextas-feiras, a aposta foi certeira numa trilogia de filmes de terror dirigida por Leigh Janiak. Rua do Medo: 1994, Rua do Medo: 1978, Rua do Medo: 1666, a cada semana um deles chegou, respectivamente, ao catálogo Tudum, construindo uma storyline que abocanhou os guilty pleasures do horror.

Com o primeiro filme servindo para introduzir os personagens e a trama, os ovos de ouro ficam mesmo para os dois filmes seguintes. Rua do Medo: 1978 traz história de acampamento, sangue e os belos cabelos ruivos de Sadie Sink. Com uma boa progressão, o filme traz um plot twist que faz compensar a espera de uma semana em relação ao anterior e cria uma ansiedade para o próximo. Já Rua do Medo: 1666 volta à caça às bruxas e, inserindo a temática queer, fecha a trinca com todos elementos que dão as características das melhores produções do gênero. – Ana Júlia Trevisan

Cenas Favoritas: o plot twist de Rua do Medo: 1978; e a cena da fogueira de Rua do Medo: 1666.


Cena do filme Turma da Mônica: Lições. A imagem mostra quatro crianças uma atrás da outra, Cebolinha, Magali, Cascão e Mônica, vestindo uniforme escolar, agachadas ao lado da parede amarela de um corredor.
O elenco de Lições voltará a viver os personagens icônicos em uma série original do Globoplay (Foto: Paris Filmes)

Turma da Mônica: Lições 

Já fazem mais de 50 anos que o universo criado nos quadrinhos por Maurício de Sousa permanece vivo no imaginário cultural brasileiro. Sua mãe leu, você leu, e o seu priminho mais novo também. Em 2019, Daniel Rezende soube, satisfatoriamente, transportar esse universo para o live-action com um elenco infantil adorável em Turma da Mônica: Laços. A ambiciosa sequência, que chegou no finalzinho de 2021, tem a ousadia de fazer o quarteto lidar com algo que poucas ou nenhuma vez vimos com essa carga toda nos quadrinhos: crescer. Não se trata do “estar crescidos” estático da Turma da Mônica Jovem, mas do crescer como um processo, uma transformação.

Ver um arco dramático operando mudanças significativas em personagens que existiram por tantos e tantos anos da mesma forma, dói. E é assim que Turma da Mônica: Lições consegue ser tão bom: transformando figuras tão amadas sem esquecer de quem elas são. Isso sem contar a construção de mundo impecável, na fotografia nostálgica, na chuva de coadjuvantes adoráveis e easter eggs, e no fato de que este talvez seja o filme que melhor consegue representar uma vivência escolar no Brasil. Lições é um longa corajoso, hilário, emocionante e que abre portas para a expansão de um universo cinematográfico promissor. É bom tomar cuidado, Marvel. – João Batista Signorelli

Cenas Favoritas: dois encontros hilários: Cascão com do Contra, e Cebolinha com Humberto.


Cena do filme Um Herói. A imagem mostra um homem homem persa de cabelos escuros e barba, vestindo camisa branca desabotoada e terno preto sendo segurado por outros dois homens, que parecem impedir sua passagem. Eles se encontram em um lugar movimentado, com pessoas ao fundo.
Um Herói é o que poucos dramas conseguem ser: um filme de tirar o fôlego (Foto: California Filmes)

Um Herói (Ghahreman)

Até que ponto uma meia-verdade não é uma mentira? Quais as possíveis consequências catastróficas das “histórias reais” que narramos? Um ato de gentileza pode destruir a vida de alguém? Essas e outras questões são trabalhadas no novo longa de Asghar Farhadi, que desmascara as narrativas de heroísmo, criando um ambiente de incerteza moral onde nenhuma boa ação parece suficiente para amenizar uma inevitável catástrofe pessoal. 

Visto e aclamado pelo Persona na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o vencedor do Grande Prêmio no Festival de Cannes esteve na pré-lista de indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional, mas não conseguiu figurar na lista final, o que não diminui os méritos deste que é, sem dúvida, um dos filmes mais envolventes e emocionantes do ano. Encontrando tensão digna de um suspense nos dramas da vida real, e uma profunda humanidade em meio a conflitos que não parecem ter qualquer tipo de solução razoável, Um Herói transborda de empatia e dor, e mostra que esses dois normalmente andam juntos. – João Batista Signorelli

Cenas Favoritas: as lágrimas doloridas do filho de Rahim; e quando a tensão explode entre este e o seu credor. 


Cena do filme Um Lugar Silencioso - Parte 2. Na imagem há três pessoas de costas. Da esquerda para a direita temos Marcus, um adolescente branco de cabelos cacheados e castanhos, ele usa uma blusa cinza com detalhes em azul e vermelho, e uma calça cinza. Ele carrega uma mala na mão esquerda e um balde na mão direita. No centro temos Evelyn, uma mulher adulta e branca, ela tem cabelos longos e loiros e usa um vestido verde, nas suas costas tem uma mochila e ela segura uma alça de um caixote com a mão direita. No canto direito temos Regan, uma adolescente branca, seu cabelo é castanho, cacheado e curto, ela usa uma blusa azul e uma saia listrada azul e rosa, em suas costas tem uma mochila, ela segura outra alça do caixote com a mão esquerda. Todos os personagens estão saindo de um túnel de trem, o chão está coberto de mato e ao fundo tem alguns prédios de indústria.
Um Lugar Silencioso – Parte II comprova a qualidade de John Krasinski como um diretor de suspense (Foto: Paramount Pictures)

Um Lugar Silencioso – Parte II (A Quiet Place – Part II)

A sequência de Um Lugar Silencioso explora de maneira primorosa as consequências do longa original, além disso, ele desenvolve ainda mais os protagonistas, principalmente do núcleo mais jovem, que recebe um maior foco nesse enredo. Juntamente com o retorno do elenco original, tem-se a apresentação de novos personagens, os quais são igualmente interessantes e carismáticos. Essa adição de novos integrantes ao grupo de sobreviventes foi um acerto do roteiro de John Krasinski, pois permitiu explorar outros dramas do pós-apocalipse, além de tratar de eventos relevantes daquele universo, como o dia da invasão.

O terror e o suspense presentes na história permanecem excelentes, há várias situações muito tensas, criativas e angustiantes. Mesmo com as descobertas do filme anterior, as criaturas seguem sendo uma presença ameaçadora. O uso do silêncio continua muito bom, e é interessante observar como os mais diversos personagens presentes na trama lidam com o barulho e quais os métodos eles desenvolveram para sobreviver. Um Lugar Silencioso – Parte II é um excelente retorno para o mundo pós-apocalíptico apresentado no longa de 2018, pois desenvolve, de maneira natural e orgânica, os elementos do original, além de apresentar novos sobreviventes e expandir a visão sobre esse universo assustador. – Nathan Sampaio

Cenas Favoritas: o primeiro encontro da família Abbott com Emmett; o encontro inesperado que Emmett e Regan têm em sua jornada; e a invasão na vila.


Cena do filme Verão de 85. A cena mostra os personagens David e Alexis numa festa. David é um menino de 18 anos branco, alto, magro e de cabelo médio liso castanho. Alexis é um menino branco, mais baixo que David, magro, e de cabelo curto liso loiro. A festa em que eles estão está escura, iluminada por luzes de cor rosa, roxa e amarela. Os dois personagens estão iluminados por uma luz amarela, e David está atrás de Alexis, colocando um fone de ouvido em suas orelhas.
O longa franco-belga Verão de 85 foi exibido em 2020 na França, mas o lançamento no Brasil só aconteceu em 2021 (Foto: FOZ)

Verão de 85 (Été 85)

É o que dizem: o amor é uma faca de dois gumes. Para Alexis (Félix Lefebvre), ambas as pontas são afiadíssimas. Quando se deu conta do amor que sentia por David (Benjamin Voisin), não imaginava que poderia existir sentimento maior. Até perdê-lo. Antes fosse um término qualquer, seu amante foi perdido para a Morte, para sempre. E o romance que usa uma França litorânea perfeita dos anos 80 como cenário vira suspense por sua tragédia, alastrando o drama de um garoto apaixonado vivendo o melhor e o pior de um momento específico de sua juventude. Aquele Verão de 85 nasceu em 1982, no livro Dance on My Grave, de Aidan Chambers, adaptado por François Ozon para seu filme.

O exímio trabalho de Ozon dá vida à obra-marco da Literatura LGBTQIA+ na sua maneira, capturando os sentimentos inocentes de Alex, encantado pela lábia e charme de David, que sabe muito bem o que está fazendo. No emaranhado de corações derretidos e partidos, acompanhamos uma história mágica, mas, ainda assim, de apertar o peito. A forma singular com que o menino que ficou enxerga sua própria vida e os eventos transpassa para a atmosfera do filme, e somos convidados a ver com esses mesmos olhos. Mesmo na morte, mesmo na perda, há a latência de amar e seguir em frente; e a promessa de dançar no túmulo do amigo-amante mostram que tanto Alexis quanto David se entendiam mais do que qualquer pessoa seria capaz. – Jho Brunhara

Cenas Favoritas: a cena em que eles estão dançando ao som de Sailing do Rod Stewart na festa; e a cena em que eles se beijam escondido na loja mesmo com a mãe de David muito perto.


Cena do filme Viúva Negra. Focalizadas dividindo o centro da imagem estão Natasha (direita) e Yelena (esquerda), ambas mulheres brancas com olhos verdes e cabelos em um rabo de cavalo. Yelena é um pouco mais nova que Natasha e loira, veste um uniforme de mangas longas branco com um colete preto por cima, tem seu corpo virado para frente, mas olha em direção à irmã. Natasha é ruiva, veste uma roupa parecida com a de Yelena, porém preta e sem o colete, seu corpo está de perfil (na direção da irmã), mas sua cabeça está virada para frente. A luz do sol bate nelas vinda da esquerda e ao fundo (desfocado) é possível ver um pouco do céu, algumas árvores e destroços de uma aeronave, tudo coberto por fumaça.
Viúva Negra chega sendo um adeus à Natasha e um gesto de boas vindas à Yelena na Marvel (Foto: Disney)

Viúva Negra (Black Widow) 

Com o sucesso de Vingadores: Ultimato, veio também a morte de Natasha Romanoff (Scarlett Johansson), uma das personagens mais queridas, porém injustiçadas, da saga. Em dez anos desde a sua primeira aparição na Marvel, a Viúva ainda não tinha um filme solo, e, com a duração tão longa de Ultimato e a morte de Tony Stark, a partida de Natasha passou quase despercebida. Levando tudo isso em conta, Viúva Negra, mesmo não agradando a todos e rendendo um processo entre Scarlett Johansson e Disney (pelo lançamento e bilheteria do projeto), fez muitos fãs felizes, e uma prova disso é o público tê-lo escolhido como Filme Favorito na premiação do People’s Choice Awards. O longa finalmente deu atenção à vida pessoal e ao passado de Nat, que tinham sido apenas pincelados até então. Ainda que não tenha sido como o público esperava (afinal, não foi mostrado com detalhes a esperada infância de Natasha na Sala Vermelha), o arco só de Natasha, longe da sombra trazida pelos outros Vingadores, já foi uma amostra do que ela merecia desde o princípio. Apenas um filme para uma mulher tão interessante e complexa nunca será o suficiente, mas serve para aquecer um pouquinho o coração de quem assiste e se lembra dela com saudade. 

Dirigido por Cate Shortland, roteirizado por Eric Pearson, Jac Schaeffer e Ned Benson, e com um lançamento simultâneo no cinema e no Disney+, a trama se passa após Capitão América: Guerra Civil e circula em torno da história de Natasha, transitando entre seu passado como Viúva e seu presente como Vingadora. O longa se inicia com uma sequência de desesperar qualquer um ao som de de Smells Like Teen Spirit, e vai trazendo aos poucos fatores importantes da vida de Romanoff – em especial sua família, composta pelos agentes Alexei (David Harbour) e Melina (Rachel Weisz), sob o disfarce de seus pais, e sua irmã, a queridinha Yelena (Florence Pugh), que já apareceu em outro projeto da Marvel. Com cenas de ação extravagantes e toque de humor, o filme estampa perfeitamente o perfil da Marvel. O longa ter explorado (ainda que superficialmente) o Programa Viúva Negra, a existência de outras viúvas e o papel importante de Natasha Romanoff nesse meio apenas fez todos amarem ainda mais a personalidade forte dessa personagem. – Gabrielli Natividade da Silva    

Cenas Favoritas: o reencontro da família de Natasha; e a cena pós-créditos.          

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