Maligno, de James Wan, é criativo, sombrio e surpreendente

Cena do filme Maligno. A imagem mostra a personagem Madison sentada no chão de uma cozinha. Sua expressão é de medo e surpresa. Madison é interpretada por Annabelle Wallis, uma mulher branca, de cabelos castanhos, lisos, com uma franja. A câmera filma de baixo para cima, de forma que os pés da atriz estão maiores e mais próximos do telespectador do que sua cabeça. Madison está centralizada na imagem. Atrás dela, ao fundo, estão armários e uma janela. Está de dia e uma luz fraca, que vem da janela, ilumina a cena. A imagem também tem uma iluminação azulada.
Em Maligno, James Wan une, com maestria, referências de várias vertentes do Horror (Foto: Warner Bros. Pictures)

Mariana Nicastro

Para os fãs do Terror, o nome de James Wan se destaca na atualidade devido ao seu talento em transformar até mesmo os roteiros mais simples em obras memoráveis. Isso ocorre com Jogos Mortais, Invocação do Mal, Sobrenatural, Velozes e Furiosos 7 ou Aquaman. Com Maligno, ele se superou. O longa se desenvolve sob uma ótica de Horror italiano setentista, com cores vibrantes, cenários diferenciados, atuações e trilha sonora novelescas e um vilão misterioso, cruel e interessante. 

Lançado no Brasil em 9 de setembro de 2021, pela Warner Bros. Pictures, o filme conta a história de Madison Mitchell (Annabelle Wallis) que, após enfrentar uma experiência traumática, começa a ter visões de crimes que parecem estar, de alguma forma, conectados a seu passado. Logo, ela inicia uma investigação para tentar compreender esses acontecimentos, enquanto vislumbra os ataques cruéis de uma misteriosa criatura. 

Cena do filme Maligno. O GIF é retangular e mostra a personagem Madison, deitada de lado na sua cama, em primeiro plano. A imagem está virada, de forma que mesmo deitada, Madison aparece de frente para a câmera, e na vertical. A câmera está bem próxima de seu rosto. Madison é interpretada pela atriz Annabelle Wallis, uma mulher branca, de cabelos castanhos, lisos, com uma franja. No GIF, Madison está paralisada em seu travesseiro, com uma expressão de medo. Ao fundo, há uma janela que revela que está de noite e chove do lado de fora. Um relâmpago ilumina o quarto por um momento e, quando isso acontece, uma silhueta grande e escura aparece bem atrás de Madison. Essa silhueta tem longos cabelos escuros cobrindo seu rosto. Toda a cena é iluminada por uma forte luz vermelha, em contraste apenas com a janela e seu exterior, que tem tons azulados. O GIF termina com um zoom dramático em um dos olhos de Madison.
As luzes e cores irreais e fantasiosas são motivadas pelo drama e tensão das cenas, além de traduzirem as sensações dos personagens (GIF: Warner Bros. Pictures)

Com um roteiro criativo, logo no primeiro ato o filme já revela que busca se afastar da verossimilhança. Inspirado em obras clássicas do Terror italiano, como Suspiria (1977), de Dario Argento, o distanciamento da realidade permite que os autores naveguem livremente pelo universo que criaram. Dentro da lógica surrealista de Maligno, até as situações mais bizarras são possíveis. 

Ela divaga entre diversas facetas do gênero e apresenta desde aspectos de produções de assombrações e demônios, até os de suspenses psicológicos. Referências aos famosos giallos e até mesmo aos slashers das décadas passadas também estão presentes. E a direção habilidosa de James Wan é capaz de unificar todas essas influências de forma coesa e harmônica.

Fotografia do filme Maligno. A imagem é retangular e mostra quatro personagens da obra, em primeiro plano. Todos exibem uma expressão de medo e susto. Eles estão lado a lado e bastante próximos da câmera, registrados da cintura pra cima. Mais à esquerda está a personagem Sydney, interpretada por Maddie Hasson. Maddie é uma mulher branca, loira, de cabelos médios, com franja. Ela é jovem e usa um casaco listrado. Ao seu lado, está a personagem Beverly, interpretada por Paula Marshall. Paula é uma mulher branca, de cabelos castanhos que vão até os ombros. Ela é a mais velha entre os quatro. Usa uma camisa de botões e um casaco escuro. Ao seu lado, centralizada na fotografia está a protagonista Madison, interpretada pela atriz Annabelle Wallis. Annabelle é uma mulher branca, na casa dos 30 anos. Ela tem cabelos castanhos, lisos e longos, com uma franja. Sua expressão facial representa mais pânico do que os demais e ela está gritando. Ao seu lado está o personagem de Kekoa, interpretado por George Young. George tem descendência chinesa. Ele tem cabelos escuros e curtos e usa um casaco de botões por cima de uma camisa social e gravata. O cenário ao fundo é do interior de uma casa. É possível ver parte de uma porta e de uma janela atrás dos personagens. Uma intensa luz azul ilumina toda a imagem.
Mesmo com pouca divulgação no lançamento, o longa atraiu um grande público, ressaltando a reputação e o prestígio de seu diretor (Foto: Warner Bros. Pictures)

Com todas essas referências e estilos na obra, ela pode até soar bagunçada e complexa, certo? Mas Malignant passa longe disso. Ainda que abrace diversos estilos de Terror, o roteiro de Akela Cooper (baseado no argumento dela, de Wan e de Ingrid Bisu) é simples, objetivo e facilmente compreensível. Os mistérios são resolvidos aos poucos e recheados de pistas para que o público tente decifrá-los junto dos personagens. Além disso, nada é simplesmente utilizado de qualquer forma dentro da história. Suas características distintas existem sempre por um motivo e com uma intenção, tendo um momento certo para serem aplicadas.

Os dois arcos principais, da investigação e dos assassinatos cometidos pelo vilão, se alternam como os pilares da trama e ambos progridem de forma satisfatória, em tensão, mistério, horror e violência. Aqui, as já conhecidas fórmulas de sustos muito utilizadas por James Wan em obras anteriores, como Invocação do Mal (2013) ou Sobrenatural (2010), estão menos evidentes. Ele busca inovar a maneira como se usa desse mecanismo e pode-se dizer que obteve êxito. Os sustos existem, mas de forma bastante diversificada e inesperada.

Vale mencionar a ambientação e os cenários da obra, que chamam a atenção por apresentarem características fictícias e fantasiosas. Como um hospital psiquiátrico na beira de um precipício, rodeado por névoa, a casa da protagonista, que é digna de filmes clássicos do Terror, e até mesmo ruínas históricas, no subsolo da cidade. A trilha sonora novelesca também merece destaque, com a icônica faixa Where Is My Mind? da banda Pixies, aqui distorcida a fim de dialogar com a obra.

Fotografia do filme Maligno. A imagem é retangular e a perspectiva da câmera é de dentro de um porta-malas de carro. De frente para o porta-malas aberto, no centro da imagem, é possível ver uma silhueta alta, de cabelos longos e escuros, segurando um corpo feminino desacordado. O corpo pertence a uma mulher de cabelos escuros, que usa uma calça jeans e um casaco bege. O cenário, atrás dessas duas figuras, mostra um muro de tijolos, parcialmente visível. Há muita fumaça cobrindo o fundo e ela é iluminada por uma fraca luz azul.
As relações entre as personagens principais da trama resultaram na declaração de Wan de que Maligno é, curiosamente, “como a versão de Terror de Frozen” (Foto: Warner Bros. Pictures)

Outro ponto de destaque é, sem dúvidas, a bela fotografia. Dirigida por Michael Burgess, ela também faz claras referências a filmes como Suspiria, com luzes vermelhas e azuis em destaque nas cenas. Elas contrastam fortemente com os cenários escuros e sombrios, principalmente quando o vilão entra em ação. E não é só nisso que a fotografia do filme brilha. Há perseguições das vítimas em primeira pessoa, zooms dramáticos para direcionar a atenção do telespectador e planos sequência muito bem executados, nos mais diversos ângulos. Ferramentas essas que nunca são usadas a toa, sempre motivadas pelo talento e bom gosto da direção.

A caracterização do vilão se consagra como um dos muitos triunfos desse filme. Ainda que tenha dividido opiniões, sendo as negativas daqueles que podem ter esperado criaturas mais óbvias e comuns dentro do Horror, ela combina com a personalidade e essência peculiares da obra. Gabriel é interessante, assustador e atiça a curiosidade do telespectador, que cria teorias sobre sua natureza desde a primeira aparição da entidade. 

Por fim, seu desfecho impactante e inovador rompe com qualquer ideia pré-estabelecida pelo público. Mesmo com todas as dicas fornecidas pela investigação na trama, o terceiro ato de Maligno revela o quanto essa obra é imprevisível e criativa. James Wan aqui entrega um trabalho que é bizarro, macabro, intencionalmente incômodo e sem dúvidas, gratificante, que homenageia décadas de Terror de uma forma inusitada. 

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