O amor não é óbvio é o retrato de um primeiro amor entre garotas

capa do livro O amor não é óbvio. No meio, em frente a um fundo rosa escuro, está a capa. A ilustração do livro, está em preto e branco, de duas garotas, no estilo colagem. A da direita tem o cabelo longo, liso e repicado, ela usa óculos redondos e está segurando um binóculo com as mãos. Ao lado dela está uma garota de cabelos curtos e lisos, vestida com uma jaqueta jeans cheia de bottons. Ainda, na parte superior, está o nome da autora e o do livro.
A capa de O amor não é óbvio, um dos principais romances lésbicos do país, também foi ilustrado pela talentosa autora Elayne Baeta (Foto: Editora Record)

Monique Marquesini

Da busca por registrar e contar histórias felizes de amor entre garotas, origina-se O amor não é óbvio. Publicada em 2019, a obra é a estreia da admirável autora baiana Elayne Baeta e marca o primeiro best-seller lésbico nacional a atingir a lista de mais vendidos do país. Anteriormente lançado em formato digital de forma independente, o romance  ganhou espaço na Literatura brasileira e foi lançado pela Editora Record, sob o selo Galera. A escritora, ilustradora e poeta só escreve sobre o que já sentiu no peito, e talvez por isso, suas narrativas sejam nada óbvias.

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Em O peso do pássaro morto, a perda é a grande protagonista

Capa do livro O peso do pássaro morto. Na imagem, um fundo roxo carrega o título da obra como se as palavras estivessem apoiadas em fios elétricos pretos. No canto superior direito está grafado o nome da autora em branco, já no canto inferior esquerdo é marcada a logo da editora. Ainda há nos extremos da capa os números: 8, 17, 18, 28, 37, 48, 49, 50, 52.
O peso do pássaro morto, publicado pela Editora Nós em 2018, é a obra de estreia de Aline Bei (Foto: Editora Nós)

Jamily Rigonatto

“–claro, – respondi
entendendo que o tempo
sempre leva
as nossas coisas preferidas no mundo
e nos esquece aqui
olhando pra vida
sem elas”

Quantas vezes na vida é preciso deixar parte de nós ir? E quantas vezes isso acontece até que não reste nada? Em O peso do pássaro morto, Aline Bei nos convida para integrar essas perguntas em sua poética questionadora, que desde o lançamento do livro em 2018, compõe o ar encantador habitante da crueldade. Em um retrato versado pelo gosto amargo de perder, a autora de Pequena coreografia do adeus e Rua sem saída apoia-se em palavras duras e sinceras para explorar o ato de se despedir, com toda sua naturalidade devastadora. 

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De 1922 para 2022: o que é ser Moderno no Brasil?

A Semana de Arte Moderna terminou ontem, mas as perguntas que o movimento cultural brasileiro deixou são para mais de 100 anos

Pintura "Operários" de Tarsila do Amaral. A imagem é composta por vários rostos de pessoas das mais diversas feições e tons de pele. Elas se organizam na diagonal da imagem, de forma crescente, da esquerda para direita, uma em cima da outra. Ao fundo, existe o desenho de uma indústria e o céu é azul.
“Que esperem o centenário. Se no ano de 2022 ainda se lembrarem disso, então sim.”, respondeu Manuel Bandeira quando questionado sobre a necessidade de relembrar a Semana de Arte Moderna em 1952 (Foto: Reprodução)

Raquel Dutra

18 de fevereiro de 1922. As cortinas do salão de concertos já se fecharam, as luzes do saguão de exposições já se apagaram, e as portas do Theatro Municipal de São Paulo já se trancaram. Lá fora, pelas ruas da cidade, corre uma promessa de novos ares, criada pelos artistas que estiveram reunidos durante os últimos cinco dias no centro cultural mais tradicional da capital paulista. A ideia é transformar a Arte nacional através do que existe no nosso próprio país, buscando, assim, uma expressão artística 100% brasileira. “Genial e revolucionário!” exclama quem cruza com essa energia pelo caminho, porque ali, alguém testemunhou o início do modernismo no Brasil. É o primeiro dia pós-Semana de Arte Moderna, e sua força tem o potencial de influenciar todo o resto do país a procurar pelas suas raízes e colocá-las para fora, sem depender nunca mais de referências externas. Pelo menos, é o que eles dizem.

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Manuel Bandeira não engole sapos diante do academicismo literário

Quatro anos antes da Semana de 1922, o poeta brasileiro já repensava a Literatura nacional por meio de características modernistas

Pintura da artista brasileira Tarsila do Amaral. Imagem retangular horizontal. Na parte superior, vemos um céu azulado e alguns cactos verdes. Uma espécie de caverna ocupa quase toda a imagem. Por meio dessa cavidade rochosa, observamos um fundo bege, uma espécie de lago e, mais à direita, um sapo verde. A pintura inteira apresenta características cubistas.
Publicado no livro Carnaval, de 1919, o poema Os Sapos, de Manuel Bandeira, antecipou as características da Literatura criada pela primeira geração modernista brasileira; na imagem, vemos a pintura O Sapo, de 1928, feita por Tarsila do Amaral (Foto: Romulo Fialdini)

Eduardo Rota Hilário

Entre Baleias e burrinhos pedreses, há um bom tempo que a Literatura brasileira dá vida aos bichos mais singulares do cenário criativo nacional. Sendo alguns mais conhecidos do que outros, em uma possível lista das mais memoráveis dessas criaturas, os sapos de Manuel Bandeira com certeza garantiriam uma posição e reconhecimento bastante nobres e justos. Criados pelo artista recifense em poema homônimo, de 1918, Os Sapos só foram publicados em 1919, no livro Carnaval – mas foi na Semana de Arte Moderna de 1922 que conquistaram de fato uma grande projeção.

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Persona Entrevista: Aline Bei

A autora comenta sobre as inspirações para seu livro mais recente, Pequena Coreografia do Adeus, parte da parceria do Persona com a Cia das Letras

Arte retangular com fundo vermelho. No canto esquerdo foi adicionado 4 faixas com as palavras "persona entrevista" nas cores pretas e brancas, posicionadas na vertical. No topo foi adicionado o texto "aline bei" em letras pretas, e mais abaixo há a foto da autora de mesmo nome em preto e branco. Ela é uma mulher branca jovem. Ela veste uma camisa preta e usa cabelo em coque no topo da cabeça. Seu cabelos são castanho escuro. Atrás dela foi adicionada a capa de seu livro Pequena coreografia do adeus.
O Persona entrevista, pela primeira vez, um nome da Literatura depois de diversas conversas com cineastas do Brasil e do mundo (Foto: Companhia das Letras/Arte: Jho Brunhara)

Caroline Campos

Fiz essa entrevista ainda em julho, há longos cinco meses – que mais parecem cinco anos. Cercada pelos horrores da pandemia e a esperança da vacina, encontrei na leitura de Pequena coreografia do adeus uma forma de desabrochar velhos traumas e olhar para dentro de mim com o mesmo carinho que era capaz de olhar para Júlia, protagonista dessa criação de Aline Bei. Não esperava encontrar o que encontrei – palavras flutuando pelas páginas como pensamentos perdidos, te convidando a preencher esses espaços com sua própria e pesada bagagem. 

E quem diria que a artista por trás de um dos maiores lançamentos literários de 2021 não só elogiaria minha emocionada resenha como também toparia fazer parte de mais uma edição do Persona Entrevista. Em uma conversa no fim da tarde de uma terça-feira, Aline me contou sobre a infância com a leitura, a rotina movimentada pós-lançamento e as várias faces de suas protagonistas femininas. Com alguns meses angustiantes de atraso (2021 não foi fácil para ninguém), você pode conferir esse bate-papo especial para conhecer melhor a figura por trás dessa dança tão (des)amorosa.

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A Paixão segundo G.H. é um passeio por nós mesmos

A imagem é uma arte com fundo vermelho com a capa do livro A Paixão segundo G.H. ao centro e um selo escrito Clube do Livro Persona no canto direito inferior e o logo do Persona no canto esquerdo superior. A capa tem um fundo na cor creme com linhas de distorção, é possível ver no canto superior direito dunas de areia e edifícios que remetem à arquitetura árabe. Abaixo, está escrito Clarice Lispector em letra cursiva e na cor vermelha e o título do livro em caixa alta e na cor bege. No canto inferior esquerdo, abaixo do título, há o desenho de uma moça branca, com cabelos castanhos longos presos em um rabo de cavalo baixo; ela veste uma blusa azul clara de mangas compridas.
Com 165 páginas, A Paixão segundo G.H. foi a primeira leitura do Clube do Livro do Persona (Foto: Reprodução/Arte: Jho Brunhara)

Vitória Silva

Nascida em 1920, Clarice Lispector é um dos nomes intocáveis da nossa Literatura. A ucraniana, batizada como Haya Pinkhasovna Lispector, chegou ao Brasil aos dois meses de idade, com seus pais de origem judaica que fugiram do país devido à perseguição durante a Guerra Civil Russa. Inicialmente residente em Maceió, em sua infância e pré-adolescência, a autora passou por Recife e pelo Rio de Janeiro, e, por onde trilhava seu caminho, carregava consigo sua paixão pelos livros. 

Após ingressar na Faculdade Nacional de Direito, em 1941, trabalhou como redatora da Agência Nacional e, posteriormente, do jornal A Noite, dando seus primeiros passos no universo da escrita. Não demorou muito para que mergulhasse de vez nele, e publicou seu primeiro romance em 1944, com o título Perto do Coração Selvagem. A obra estreante retrata uma perspectiva sobre o período da adolescência e, logo de cara, fez com que Clarice abrisse novos horizontes na Literatura nacional. 

Quebrando todo e qualquer paradigma literário da época, Lispector abandona noções de ordem cronológica e funde um lirismo único a sua forma de representar ações e emoções humanas, traços que se tornaram mais do que característicos de toda a sua carreira. Não à toa, a produção foi agraciada pelo Prêmio Graça Aranha, e, mais tarde, a autora colecionaria outros títulos de referência, como Laços de Família (1960) e A Hora da Estrela (1977), em que este último ainda ganhou uma adaptação para as telonas, em 1985.

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Estante do Persona – Outubro de 2021

Arte retangular com fundo vermelho. Ao centro há uma estante de livros branca em formato retangular. Acima dela está escrito ESTANTE em fonte preta. Na primeira prateleira, na divisória esquerda, há o símbolo do Persona (desenho de um olho com a íris vermelha e um símbolo de play no lugar da pupila) ao lado da palavra DO em fonte preta. Na divisória da direita, está escrito PERSONA em fonte preta. Na segunda prateleira, há três divisórias, em que, na do meio, há a capa do livro A Paixão Segundo G.H., de Clarice Lispector. Na terceira e última prateleira, também há 3 divisórias, em que, na da ponta direita, há um troféu com o formato do símbolo do Persona.
A primeira edição do Estante do Persona discute a obra A Paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, e traz indicações dos membros do Clube do Livro (Foto: Reprodução/Arte: Ana Júlia Trevisan e Jho Brunhara/Texto de Abertura: Vitória Silva)

“Há livros escritos para evitar espaços vazios na estante.”

–  Carlos Drummond de Andrade

Para poder valorizar cada vez mais a Literatura, parte tão importante e fundamental da cultura do nosso e de qualquer outro país, o Persona começa, agora, a preencher sua própria estante. 

O mês de outubro marcou o início do nosso Clube do Livro, formado por membros da Editoria, que tem o intuito de promover a leitura compartilhada e encontros para discussão de alguma obra sugerida. Ao final do mês, o Clube ainda se reúne para montar o Estante do Persona, com um comentário que sintetize as ideias sobre a leitura realizada e uma playlist de músicas que se relacionem com a mesma, além de uma indicação de cada membro sobre algum livro marcante ou que mereça ser compartilhado.

Como primeira leitura, o Clube do Livro teve a honra de poder prestigiar uma das maiores autoras da Literatura brasileira. A Paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, é narrado em primeira pessoa pela personagem que tem suas duas iniciais presentes no título da obra. Uma mulher, moradora do Rio de Janeiro, que, ao desempenhar a tarefa de limpar o “quartinho dos fundos” de seu apartamento, mergulha em um fluxo de pensamento contínuo simbolizado por um monólogo de reflexões existencialistas, uma das grandes marcas da escrita da autora. 

E nada mais simbólico do que estrear essa publicação especial num mês com acontecimentos tão marcantes para o meio literário. Além de no dia 29 de outubro ser celebrado o Dia Nacional do Livro, as semanas anteriores também foram marcadas por grandes eventos. No dia 7, ocorreu a cerimônia de entrega do Nobel de Literatura 2021, que foi concedido ao autor Abdulrazak Gurnah. Nascido na ilha de Zanzibar, atual Tanzânia, em 1948, o escritor é especialista em Literatura pós-colonial e na temática de refugiados, colecionando em sua carreira títulos como Paradise e Afterlives

Mais ao final do mês, no dia 20, foi realizada a entrega do Prêmio Camões, para a moçambicana Paulina Chiziane. Tão simbólica quanto a vitória de Gurnah, Chiziane é a primeira mulher a publicar um romance em Moçambique, Balada de Amor ao Vento, em que o fez depois da independência. Com a figura da mulher moçambicana e africana no centro de sua escrita, a autora dedica-se a explorar os problemas enfrentados pela mesma no meio social, e tem como uma de suas obras de maior prestígio Niketche: Uma História de Poligamia, em que uma mulher decide conhecer as outras esposas de seu marido.

No clima desse mês repleto de grandes feitos na Literatura, você confere as indicações do Clube do Livro na primeira edição do Estante do Persona.

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Enquanto eu não te encontro: uma narrativa de acaso com o amor e encontro com a representatividade

Fotografia da capa e contracapa do livro Enquanto eu não te encontro, fundo roxo e amarelo com nuvens, título do livro e um desenho de um casal com braços abertos na capa, e na contracapa desenho de personagens na boate.
A capa e contracapa do livro contam com ilustrações dos ambientes e personagens que fazem parte da história, e também exalta pessoas nordestinas, já que foi ilustrada por Renata Nolasco, uma artista LGBT e potiguar (Foto: Editora Seguinte)

Monique Marquesini 

Uma mudança para a cidade grande, encontros e desencontros, cultura nordestina, amizades, música pop, autoconhecimento e protagonistas LGBTQIA+: essas são algumas características do livro de estreia de Pedro Rhuas. Lançado em julho de 2021 pela Editora Seguinte, o título curioso Enquanto eu não te encontro guarda a simplicidade de um romance adolescente junto da amplitude de novas descobertas para um garoto gay, nordestino e calouro na universidade.

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Não há túmulo que enterre a (des)temida Noite na Taverna

Cena do filme Noite na Taverna. Fotografia retangular. Ao fundo, vemos o ambiente noturno de uma taverna. Uma mesa com cinco homens ocupa toda a imagem. Os homens parecem dialogar, vestem roupas semelhantes e aparecem em poses diferentes. No centro da mesa, observamos uma garrafa de vinho, taças, uma escultura e outros objetos.
Inigualável livro brasileiro, que desperta o interesse do público há mais de 100 anos, Noite na Taverna ganhou um curta-metragem em 2014 (Foto: ZYRé produções)

Eduardo Rota Hilário

Senhores, em nome de todas as nossas reminiscências, de todos os nossos sonhos que mentiram, de todas as nossas esperanças que desbotaram, uma última saúde!”. Repleto de exclamações, minúcias descritivas e momentos reflexivos, o livro Noite na Taverna nasceu postumamente, em 1855 – cerca de três anos após a morte da mente brilhante que o criou. Escrita sob o pseudônimo de Job Stern, a obra de Álvares de Azevedo, grosso modo, acompanha uma noite de bebedeira e boemia entre Solfieri, Bertram, Gennaro, Claudius Hermann e Johann, cinco conhecidos personagens da Literatura brasileira. Ambientada em uma libertina taverna, espécie de bar da época, não tarda nessa novela o surgimento das narrativas mais absurdas, tétricas e bizarras.    

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Entre o vírus e o verme, morre aos poucos um país

Capa do livro Entre o vírus e o verme se esgueiram poemas. Fotografia quadrada. Ao fundo, uma parede de tijolos expostos, de cor cinza, apoia o livro. Na parte superior da capa, pode-se ler “Entre o vírus e o verme se esgueiram poemas” em letras tortas, de cor verde claro, com exceção de “vírus” e “verme”, grafados em branco. No centro da capa, sobre um fundo verde escuro, há um losango verde claro com a imagem do novo coronavírus, fazendo alusão à bandeira do Brasil. No canto inferior esquerdo da capa, lê-se “André Plez” em letras brancas. Sob o livro, há um apoio de madeira.
Novo livro de André Plez, Entre o vírus e o verme se esgueiram poemas aborda temas urgentes com uma lírica que se assume engajada (Foto: Editora Penalux)

Eduardo Rota Hilário

Um Brasil à deriva, sem controle sobre a pandemia de covid-19 e diariamente deturpado pelo desgoverno de Jair Bolsonaro: esse é o cenário que ambienta o novo livro de André Plez. Lançado em 2021 pela Editora Penalux, Entre o vírus e o verme se esgueiram poemas expõe, já na capa, aqueles que serão dois verdadeiros inimigos do país. É justamente nesse primeiro contato imagético que nos deparamos com uma bandeira nacional sem o clássico céu estrelado, coberto pelo tenebroso novo coronavírus, enquanto vestígios de vermes, metáfora para o abominável Presidente da República, emergem do fundo esverdeado de nosso maior símbolo pátrio.

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