Muito distante de Anastasia Steele, de 50 Tons de Cinza, Dakota Johnson vive agora a heroína Anne Elliot de Jane Austen (Foto: Netflix)
Isabella Lima
“Austen nos dá a fantasia histórica e ainda fornece uma dura ridicularização daqueles que são muito esnobes em suas distinções de classe” é o que escreve Linda Troost e Sayre Greenfield no livro Jane Austen in Hollywood. Publicado entre os anos 1990 e 2000, as autoras acompanharam o auge das adaptações audiovisuais das obras literárias de Jane Austen. De fato, todos esses elementos, juntos da narrativa romântica, encantam os entusiastas da escritora inglesa e foram bem incorporados em Orgulho e Preconceito (2005), Emma (2020), ou até mesmo em As Patricinhas de Beverly Hills (1995), uma adaptação mais reconstruída e modernizada. Ao contrário desses títulos, Persuasão, a nova aposta da Netflix inspirada no livro homônimo de Jane Austen, não conseguiu proporcionar uma experiência capaz de estabelecer conexão com a tradição, nem com a reinvenção da direção inaugural de Carrie Cracknell, nome já conhecido no teatro britânico.
A 26ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo exaltou a democracia brasileira ao possibilitar um painel que discutiu a importância do livre exercício jornalístico (Foto: TV Globo)
Nathália Mendes
No segundo sábado da 26ª Bienal Internacional do Livro, dia 9 de julho de 2022, em São Paulo, três mulheres foram convidadas para falar no painel Ser Jornalista no Brasil. Ainda que Miriam Leitão, Ilze Scamparini e Daniela Arbex sejam notórias escritoras, não parecia ser aquele o objetivo de trazê-las ao debate. Enquanto apresentavam seus formidáveis projetos no mundo dos livros, centenas de olhos e ouvidos aguardavam atentamente por outra discussão: por que diabos suas profissões jornalísticas tinham ganho destaque numa das maiores feiras literárias da América Latina?
Em junho, o Clube do Livro do Persona se reuniu para debater O Parque das Irmãs Magníficas, obra de Camila Sosa Villada que venceu a Feira Internacional do Livro de Guadalajara (Foto: Reprodução/Arte: Ana Clara Abbate/Texto de abertura: Vitória Silva)
“Contar uma história significa levar as mentes no voo da imaginação e trazê-las de volta ao mundo da reflexão.”
– Paulina Chiziane
Em meio à euforia das celebrações do Orgulho, o simbólico mês de junho também deu abertura para importantes reflexões acerca da comunidade LGBTQIA+. O Clube do Livro do Persona sediou uma edição especial aberta aos nossos colaboradores para observar a produção literária da população trans latino-americana. Saindo da Literatura nacional, partimos em uma viagem para conhecer O Parque das Irmãs Magníficas, de Camila Sosa Villada.
Já conhecida nos palcos, telinhas e telões ao redor do país, o primeiro passo da autora em sua caminhada na Literatura ocorreu em 2015, com La Novia de Sandro. Na coletânea de poemas, Camila se propõe a investigar “os mistérios do amor travesti”, temática que se tornaria um dos braços condutores de toda a sua obra. Em 2019, foi a vez de revelar a então leitura do nosso Clube do Livro, um relato semi-biográfico, em que a autora narra seus anos de prostituição no Parque Sarmiento, em Córdoba. Traduzido para mais de 10 idiomas, o livro foi vencedor de prêmios internacionais, como o Finestres de Narrativa (Espanha, 2020) e o Grand Prix de l’Héroïne Madame Figaro (França, 2021).
Construindo uma fortaleza ao lado de um grupo de amigas, fator representativo de uma comunidade que aprendeu a ancorar-se em si mesma, Camila Sosa Villada apresenta um relato cruel do que é ser travesti, em um país que ainda não se equipara à carnificina diária que é essa realidade no Brasil. E se apoia em doses necessárias de realismo fantástico, que, ao invés de amenizar, aprofundam ainda mais as feridas ali expostas. Se for possível resumir bem, a sinopse da narrativa assim o faz: “O romance O Parque da Irmãs Magníficas é isso tudo: um rito de iniciação, um conto de fadas ou uma história de terror, o retrato de uma identidade de grupo, um manifesto explosivo, uma visita guiada à imaginação da autora”.
Ainda entre os feitos literários do nosso especial do Mês do Orgulho LGBTQIA+, o Persona Entrevista abriu as portas para Tobias Carvalho, autor de Visão Noturna e As Coisas, obra que se aprofunda sobre as relações homoafetivas e vencedora do Prêmio Sesc de Literatura, em 2018. Também foi tempo de condecorar um dos protagonistas da expansão da Literatura no projeto, no dia 7 de junho, o autor Mia Couto recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Essa constitui a mais elevada honraria concedida pela Unesp, que tem o objetivo de prestigiar o trabalho de personalidades nacionais e internacionais, que se destacaram por suas contribuições para a arte, a cultura, a sociedade e a promoção dos direitos humanos.
O clima festivo para o meio literário tende a se prolongar no mês de Julho, que teve seu início marcado pelo retorno da Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Mas, para fechar o importante ciclo que passou, fique com as indicações de autores LGBTQIA+ dos integrantes da Editoria em mais um Estante do Persona.
Clara Alves contou em entrevista que Conectadas foi o livro que ela escreveu mais rápido, em cerca de dois meses (Foto: Editora Seguinte)
Ana Nóbrega
Clichê de reparação. Clara Alves dispõe em seu livro Conectadas, publicado em 2019 pela Editora Seguinte, tudo que qualquer menina queer sonhou enquanto assistia à comédias românticas adolescentes em sua infância. Jogos, romance, juventude, cultura pop e a realidade de muitas garotas são alguns dos pontos abordados por Clara em sua obra, feita para garotas jovens que ainda estão se descobrindo em um mundo tão violento, e também para mulheres adultas que foram roubadas de seus clichês juvenis.
Em maio, o Clube do Livro do Persona ferveu no Rio de Janeiro de Lola e João, o centro narrativo de Como se estivéssemos em palimpsesto de putas, a última obra de Elvira Vigna publicada em vida (Foto: Reprodução/Arte: Nathália Mendes/Texto de Abertura: Raquel Dutra)
“a vida é crua, não, moço?”
– Hilda Hilst
Depois de um mês de Abril marcado pelas muitas reflexões que a vida, obra e morte de Lygia Fagundes Telles nos provocaram, o Clube do Livro do Persona sabia que o mês de Maio era de seguir adiante no processo de explorar os substantivos femininos expressos na Literatura brasileira. E como a única regra continua sendo não fugir da complexidade natural que acompanha esse universo, a escolha da vez foi a última obra que Elvira Vigna publicou em vida: Como se estivéssemos em palimpsesto de putas.
A Estrutura da Bolha de Sabão foi a leitura do Clube do Livro do Persona durante o mês de abril de 2022 (Foto: Companhia das Letras/Arte: Ana Clara Abbate)
Nathalia Tetzner
O cenário é um café-da-manhã entre esposa e marido. Ele conta de um amigo físico que mora nas construções góticas de Paris e estuda a estrutura da bolha de sabão. Ela se espanta com a possibilidade de alguém se dedicar em investigar algo que conhece desde seus primeiros anos de vida e que, por isso, sabe que não possui estrutura alguma. O tempo passa e quando o gato do casal sobe na mesa dela, finalmente há uma resposta para sussurrar: “a bolha de sabão é o amor”. Nascia nesse momento A Estrutura da Bolha de Sabão, uma coletânea de contos escrita pela dama da Literatura brasileira, Lygia Fagundes Telles.
Lançado em 2017, Conversas entre amigos completa 5 anos no mês de lançamento da série adaptada (Foto: Editora Alfaguara)
Vitória Lopes Gomez
Frances e Bobbi são melhores amigas que já namoraram. Frances tem uma queda por Nick, e Bobbi, por Melissa. Nick e Melissa são casados. É partindo desse emaranhado que Sally Rooney, em seu livro Conversas entre amigos,encontra terreno fértil para dissecar relacionamentos contemporâneos e seus envolvidos, assim como as dinâmicas sociais e de poder das relações interpessoais modernas. Se a irlandesa escreve, essencialmente, sobre pessoas normais vivendo sua realidade – mesmo que seja uma realidade inventada, somente baseada na vida real da autora ,- essa obra de estreia mostra que, mesmo antes do fenômeno Pessoas normais, Rooney já mostrava a potência de suas histórias fictícias reais.
É muito difícil imaginar o que seria do Cinema, especialmente o gênero de fantasia blockbuster, quase sempre pautado em emoção e espetáculo, sem O Senhor dos Anéis. A trilogia de adaptações comandadas por Peter Jackson e produzidas pela New Line Cinema foi um dos maiores gambitos da história da Sétima Arte, custando quase 300 milhões de dólares e 8 anos de produção, criando uma nova cultura de turismo na Nova Zelândia e assomando juntos dezessete estatuetas no Oscar. Baseados no épico de J.R.R. Tolkien, – por muito dado como inadaptável – os filmes deram nova vida à fantasia e inspiraram uma geração de cineastas a desafiarem os limites técnicos de suas obras.
Entre os dias 31 de março e 10 de abril, o Persona acompanhou o 27º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade (Foto: Reprodução/Arte: Ana Júlia Trevisan/Texto de abertura: Raquel Dutra)
Está aberta a temporada de festivais na cobertura do Persona. Entre os dias 31 de março e 10 de abril, a realização do 27º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade inaugurou o ano para as nossas aventuras cinematográficas. Depois de um 2021 marcado pelo Cinema das mulheres, da cidade maravilhosa, das experimentações e fantasias, 2022 se inicia com a única coisa da qual não podemos fugir: a realidade.
Mas na verdade, o espectro contemplado pelo maior festival de documentários do mundo era muito desejado para integrar o horizonte das nossas experiências. Dessa vez, o anseio se tornou possível graças ao formato de realização do É Tudo Verdade, que aconteceu de forma totalmente gratuita e híbrida, sendo presencialmente nos cinemas das capitais de São Paulo e Rio de Janeiro, e virtualmente através da plataforma de streaming do festival e das dos parceiros Itaú Cultural Play e Sesc Digital.
A seleção é tão vasta quanto o tema que a define: 70 filmes, que entre curtas, médias e longas-metragens, se dividiram nas mostras competitivas e nas demais categorias de exibição (Foco Latino-Americano, Sessões Especiais, O Estado das Coisas, Clássicos É Tudo Verdade). Trazendo o Cinema documental realizado em mais de 30 países, o alcance do É Tudo Verdade é reconhecido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, de forma a classificar diretamente os filmes vencedores dos prêmios dos júris nas Competições Brasileiras e Internacionais de Longas/Médias e de Curtas Metragens para apreciação ao Oscar do ano que vem.
À distância, o Persona selecionou 25 títulos a fim de compreender a seleção de 2022, que elegeu como os homenageados da vez Ana Carolina e Ugo Giorgetti, dois dos nomes mais importantes do Cinema de não-ficção brasileiro. As obras de abertura propuseram uma reflexão sobre o passado, presente e futuro da Sétima Arte, enquanto o encerramento do festival ficou na responsabilidade de um dos premiados pelo público e pelo júri da edição mais recente do Festival de Sundance.
A curadoria do Persona conferiu todos eles, além das obras vencedoras e demais títulos que chamaram a atenção de Bruno Andrade, Enrico Souto, Raquel Dutra e Vitor Evangelista. O resultado dessa aventura você pode conferir abaixo, e em meio a experiências milagrosas, figuras históricas, lutas urgentes e muitas reflexões filosóficas, vale o aviso: não se esqueça que é tudo verdade.
Dificilmente, um texto estará à altura de Maria Bethânia, mas falar da Abelha Rainha será sempre uma necessidade legítima (Foto: Jorge Bispo)
Eduardo Rota Hilário
Não há ser humano no mundo capaz de trilhar um caminho feito todo de luz. Justamente por sermos humanos, a complexidade nos acompanha dia após dia, guiando-nos sempre diante das surpresas e mistérios da vida. Partindo dessa lógica, nossa existência se faz um eterno e heterogêneo jogo de luzes, penumbras e sombras. Nossa Arte, por sua vez, apenas reflete essa humanidade multifacetada, criando possibilidades e universos únicos, por vezes até mais atraentes do que aquilo que, por convenção, resolvemos chamar de ‘realidade’. De todas essas questões, especificamente da última, Maria Bethânia entende bem.