A TV é um território onde não se pode errar, mesmo com as produções desastrosas sempre existindo, inclusive na história recente. Nesse sentido, criou-se um lugar seguro de gêneros em que se pode transitar. Tais segmentos definem uma moda em seu respectivo tempo: os anos 2000 foram férteis para as séries de ‘casos da semana’ com House, Supernaturale CSI nadando de braçada; atualmente, as antologias tem seu lugar ao sol com o sucesso estrondoso de Black Mirror e seus filhos como Love, Death & Robots.
Porém, toda moda, na verdade, é cíclica. As antologias retomam Além da Imaginaçãoe Contos da Cripta, enquanto o que moldou a Televisão no início deste século bebe de Columbo, série dos anos 1970 que catapultou o gênero de investigação como o conhecemos. Respeitando o intervalo de, pelo menos, duas décadas entre tendências, assim como a estética y2k, Poker Face promete ser a precursora de um possível movimento de retorno.
Spice Girls, TLC, Destiny’s Child, o que não faltava nos anos 90 eram girlbandspara a gente admirar e sonhar com um reencontro. A série Girls5eva traz essa realidade para o grupo fictício de mesmo nome e conta a história dos dias atuais de quatro mulheres que um dia fizeram muito sucesso com seu grupo musical, mas hoje vivem realidades bem diferentes.
Preparem a pipoca de microondas e gelem as garrafas de coca-cola, pois o Emmy 2021 está batendo à porta. A 73ª edição dos prêmios da Academia de Televisão acontece no dia 19 de setembro, e no ano em que a pandemia judiou das séries consagradas do Oscar da TV, o Persona traz um conteúdo completo e multifacetado, abrangendo, entre séries de comédia e drama, animações, programas de competição, de variedades, documentários, telefilmes, séries limitadas e antologias, 72 produções que concorrem ao Emmy desse ano.
Lendo esse compilado, você fica por dentro de tudo que está rolando na premiação, sabe em quem apostar (pode ir em Ted Lasso, confia em mim) e ainda descobre quais foram os esnobados e injustiçados da vez. Começando pelo gênero da Comédia, muitas vezes erroneamente tido como o menos importante da seleção, a série da Apple TV+ com o técnico bigodudo sai na frente em todas as corridas que disputa.
A benevolência de Lasso, por outro lado, rivaliza de maneira harmoniosa com a acidez de Hacks, seriado do HBO Max que encontra em Jean Smart um veículo de sagacidade, mau humor e um estudo sobre a mudança da Comédia na TV. Simplesmente imperdível, assim como sua colega de emissora, The Flight Attendant, dramédia misteriosa que tira Kaley Cuoco da vida nerd de The Big Bang Theory, e a coloca dentro de aviões em viagens longas, recheadas de alcóol e até um assassinato.
Na lista mais fraca em anos, Melhor Série de Comédia iluminou a brilhante Pen15 e todo seu humor cringe, mas ainda não o bastante para que as soberbas Anna Konkle e Maya Erskine apareçam na lista principal de atuação. Quem também se sobressai da mediocridade é a sétima temporada de black-ish, sitcom que se mantém firme e forte com o casal protagonista figurando em suas respectivas disputas.
Cobra Kai surpreendeu (e o cheque da Netflix caiu) com a menção na categoria principal, e O Método Kominsky conseguiu ser indicado pela terceira vez. A surpresa, no entanto, ficou com a lembrança de Emily em Paris, na briga que poderia ter indicado obras mais pomposas, como Dickinson (completamente esnobada) ou Zoey e sua Fantástica Playlist (que abocanhou algumas menções técnicas). A ausência de comédias de nome, a exemplo de What We Do in the Shadows, Atlanta, Insecure, Barry e The Marvelous Mrs. Maisel, abriu espaço para que a seleção de 2021 se diferenciasse do esperado.
Reconhecidas somente com suas brilhantes atuações estão o final de Mom, o final de Shrill e o final de Shameless. O começo de Kenan foi agraciado com a menção de seu personagem-título Kenan Thompson, que também aparece como um dos favoritos ao prêmio de Ator Coadjuvante, dessa vez por Saturday Night Live. A corrida masculina, de fato, enxergou uma superlotação do elenco de Ted Lasso, que faz companhia a Thompson e ao brilhante Bowen Yang, na disputa da honraria.
Com Insecure fora do período de elegibilidade, a pontinha de Issa Rae em A Black Lady Sketch Show rendeu à atriz uma indicação como Convidada. A série-filha de black-ish, grown-ish, recebeu a primeira nomeação de sua existência, pela Fotografia da terceira temporada, enquanto Girls5eva, esperando ser lembrada na categoria principal, só ouviu o nome de Meredith Scardino como Melhor Roteiro. Fecham a seleção de Comédia as esquecidas B Positive, The Politician e Made for Love.
Na parte das séries animadas, Big Mouth retorna com a quarta temporada na esperança de sua joia rara Maya Rudolph vencer novamente o Emmy de Performance de Voz, enquanto South Park foi reconhecido, pela primeira vez em sua longa jornada pela TV, pelo episódio especial da pandemia. Outra queridinha da Academia é Love, Death + Robots, que voltou com um ano mais curto, mas igualmente satisfatório.
No maior prêmio da noite, 8 dramas batalham pelo reconhecimento sem a sombra de Succession. O suprassumo da quarta temporada de The Crown pode, finalmente, colocar um Emmy de Melhor Série na estante da Netflix. Aliás, o amor pela chegada da Lady Di e da Dama de Ferro emplacou a produção à frente em todas as seis categorias de atuação, além de Roteiro e Direção. Ano passado, Schitt’s Creek provou que é muito possível um único nome clamar todos os troféus do gênero. Será que a criação de Peter Morgan repetirá esse legado?
Na cola da família real, a segunda temporada de The Mandalorian continua o fenômeno nerd, envelopado numa trama de faroeste espacial e ainda conta com a fofura de Grogu, o nome do batismo do nosso filhinho Baby Yoda. O ano 2 da série do Disney+ encheu de nomes as categorias de atuação, além de Roteiro e Direção, mas a ausência de Pedro Pascal em Ator Principal é mais uma vez sentida. Outro nome popular da disputa é The Handmaid’s Tale, que depois de um ano fraco, renasce poderosa.
Com 10 nomeações apenas para o elenco, a quarta temporada trouxe novo ar aos pulmões calejados da trama de June, que sai de Gilead e começa, lentamente, é claro, a tocar o terror. This Is Us, única representante da TV aberta na disputa, bateu ponto, mas sem chance alguma de sair coroada. Bridgertonperformou aquém do esperado, e além de aparecer em Série e Direção, iluminou o boa pinta Regé-Jean Page na categoria principal.
The Boys, por outro lado, surpreendeu com a lembrança em Série e Roteiro, mas que falta faz o nominho de Anthony Starr entre os Melhores Atores de 2021. Quem marca presença lá é o lendário Billy Porter, que busca finalizar seu ciclo em Pose repetindo a vitória do ano inicial. Por falar em Pose, o terceiro ano fez história colocando Mj Rodriguez na briga de Atriz, tornando a querida Blanca Evangelista a primeira pessoa trans indicada em uma categoria de atuação principal.
Para fechar a lista das 8 melhores, temos Lovecraft Country. Criada por Misha Green, a original HBO foi cancelada logo antes do Emmy anunciar suas 18 nomeações. Além de aparecer em disputas principais de Série, Ator, Atriz e Atriz Coadjuvante, a série nomeou o eterno Michael K. Williams como Melhor Ator Coadjuvante, pelo visceral papel de Montrose. O ator, que já deu vida a personagens imortais mas nunca venceu um Emmy, foi encontrado morto no começo do mês, poucos dias antes da cerimônia. Antes de seu falecimento, Williams já era considerado favorito na disputa.
Os Especiais de Euphoria, impedidos de concorrer nas categorias grandes, abocanharam menções no Emmy Criativo (que esse ano acontece em 11 e 12 de setembro). Perry Mason conseguiu emplacar Matthew Rhys e John Lightown, ao passo que Ratched foi reconhecida por seu melhor atributo: a interpretação sobrenatural de Sophie Okonedo. The Umbrella Academy figurou em listas técnicas, In Treatment voltou após o hiato de uma década para dar o reconhecimento para Uzo Aduba em seu primeiro papel como protagonista, e a aparição de 90 segundos de Don Cheadle em Falcão e o Soldado Invernal foi o bastante para a Academia nomeá-lo como Convidado.
No campo dos Especiais de Variedades (Pré-Gravados), temos 3 destaques. Friends: The Reunion, aguardado reencontro do elenco da maior Comédia da TV, indicou Courteney Cox ao Emmy pela primeira vez. Dos 6 amigos, Monica era a única deixada ao relento pela Academia, sem qualquer menção nos dez anos de rodagem da sitcom. Bo Burnham: Inside coroou seu criador em todas as áreas imagináveis, desde o roteiro até as criações sonoras e musicais.
Hamilton, musical gravado do Disney+, apareceu em tudo onde teve direito: foram reconhecidos o trabalho estonteante de Lin-Manuel Miranda e a entrega feroz de Leslie Odom, Jr., além da verdade impressa por Philippa Soo e o fogo dos olhos e da voz de Renée Elise Goldsberry, o jeito canastrão de Jonathan Groff, o ar despojado de Daveed Diggs e a inocência descomunal de Anthony Ramos. Todos eles, aliás, concorrem nas categorias de Série Limitada ou Antologia ou Telefilme. Hamilton, entretanto, é caracterizado como um Especial de Variedades.
O ponto dos Telefilmes também cai em uma regra de disputa com o Oscar. Aqui, se a obra foi sequer considerada para nomeação em Cinema, ela automaticamente está fora da disputa da TV. 2021 se provou uma safra fraca para a categoria que premiou o volumoso Má Educação ano passado. Agora, o prêmio ficará entre o romântico O Amor de Sylvie, o sincero Tio Frank, o necessário Robin Roberts Presents: Mahalia, o burocrático Oslo e o bem-aventurado Natal com Dolly Parton.
Sem o nome de Minissérie no título, a disputa de Série Limitada ou Antologia é mais acirrada do Emmy 2021. WandaVision é a campeã de nomeações, mas suas chances de vitória podem ser eclipsadas pelo caráter super-heróico da produção, que lida com pontos importantes de saúde mental, como luto e depressão, ao mesmo tempo em que homenageia a TV como gênero e formato. Tudo isso encapsulado na fórmula Marvel e com o confeito da atuação mirabolante de Kathryn Hahn no papel da vizinha enxerida/vilã formidável.
Campeã dos prêmios de inverno, O Gambito da Rainha alcançou a façanha de ser reconhecida em todas as Guildas e Sindicatos da indústria, mas a estreia lá no fim de 2020 parece distante demais para os louros da Academia, seu passo final antes de encerrar as atividades e depois de vencer o Globo de Ouro, o Critics Choice Awards e o SAG. Outro nome importante do ano éI May Destroy You, que rendeu 4 merecidas nomeações para sua estrela máxima, Michaela Coel, além de lembrar, ainda bem, da performance irretocável de Paapa Essiedu, como Ator Coadjuvante.
The Underground Railroad, estreia de Barry Jenkins na TV, performou abaixo do merecido, lembrado apenas em categorias técnicas, em Série e em Direção. A esnobada de Thuso Mbedu nunca será perdoada, Academia! Enquanto a produção do Amazon Prime Video sofre como a única sem indicações de atuação, Mare of Easttown fecha a lista que batalha pelo disputado prêmio de Série Limitada, entregue à incomparável Watchmen em 2020. Protagonizada por uma faminta por aclamação Kate Winslet, a trama investigativa cresce para além de seu molde detetivesco, dando a seu elenco momentos dignos e que ficarão marcados para suas carreiras: Jean Smart, Evan Peters, Guy Pearce, Angourie Rice e, em especial, Julianne Nicholson, todos arrasam nesse time de estrelas.
Fora da lista principal, se destacam a atuação de Ewan McGregor em Halston e a de Cynthia Erivo em Genius: Aretha. O tato inimitável artístico de Steve McQueen em Small Axe foi completamente ignorado, assim como a destreza de Ethan Hawke, que estrelou, escreveu e produziu The Good Lord Bird, tudo para ser deixado de fora da categoria de Melhor Ator, essa que nomeou o trabalho libertino de Hugh Grant em The Undoing. Protagonista de edições passadas, Fargo ficou limitada à disputas técnicas, e A Maldição da Mansão Bly foi nomeada como uma das melhores edições de som do ano.
Ufa! A lista é gigantesca e o nível de qualidade do conteúdo do Persona é maior ainda. Na extensa e complexa cobertura do Emmy 2021, esse compilado dos indicados à premiação coroa um trabalho de pesquisa e informação, mas não para por aqui. A diversidade na lista do prêmio da Academia deve ser celebrada e espalhada, assim como os incríveis nomeados da edição. Para mergulhar de vez, é só rolar a página e ler o que a Editoria e os Colaboradores destacaram nesta temporada de premiações.
Já estamos cansados de reclamar da situação do país em meio a esse turbilhão de confusões, esquemas e agressões vindas da politicagem brasileira. Será que a Arte ainda é capaz de nos fazer esquecer de toda essa bagunça no mundo exterior? Ou é ela que nos mantém sãos? Bem, não há resposta certa para isso. Junho chegou, Junho foi embora e a leva de filmes e séries que marcaram a metade do ano não poderia ter sido mais diferente uma da outra.
No mundo cinematográfico, onde alguns poucos irresponsáveis arriscam ir aos cinemas, as produções foram escassas e não muito chamativas. Os apaixonados pelo medo e pelo horror ganharam de presente duas bombas: Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônionão é um fracasso completo, mas abala o ânimo dos fãs da franquia com uma trama fraca e pouco impressionante. Por outro lado, para quem pensava que não poderia ser pior, Espiral: O Legado de Jogos Mortaisse esforçou para entregar um dos piores filmes da saga de Jigsaw. Não foi dessa vez que o deus da carga dramática te abençoou, Chris Rock.
Os streamings, pelo menos, nos garantiram um pouco mais de diversão. A nova animação do Disney+ pode ter uma narrativa marcada pela simplicidade, mas não falha em emocionar o espectador com a sua fofura. Estamos falando de Luca, que conta com os dois monstros marinhos mais carismáticos desde o peixão apaixonado de A Forma da Água, lá em 2017. Pelas mãos da dona Netlfix, Carnaval foi lançado e conseguiu o feito de nos fazer fechar a cara só de ouvir o nome da melhor festa do ano. Mesmo assim, nessa altura do campeonato, dá vontade de pular um bloquinho, não é?
Lin-Manuel Miranda emplacou mais um hit e trouxe os musicais de volta ao cinemas com Em um Bairro de Nova York, que encantou a crítica com suas coreografias e o protagonismo de Anthony Ramos – não, não é o ator da Globo. No entanto, faltou tato por parte da produção do filme, que foi duramente criticada pela falta de representação entre o elenco principal de afro-latinos no bairro de Washington Heights. Apesar de Miranda se pronunciar “verdadeiramente arrependido”, o resto dos envolvidos protagonizou um show de horrores ao comentar a polêmica. Complicado, Rita Moreno.
Na parte da TV, o cenário foi mais positivo. No Brasil, O Caso Evandro chocou tanto que até ganhou episódios extras, com informações importantíssimas que só foram descobertas pela repercussão do documentário. Colônia, original do Canal Brasil, ganhou casa no Globoplay, dando voz e rostos aos temas do livro Holocausto Brasileiro, de Daniela Arbex.
O Amazon Prime Video finalmente investiu nas produções nacionais, entregando DOM e Manhãs de Setembro. A primeira leva a periferia e o tráfico em discussões que perpassam temas sociais, enquanto a segunda finalmente dá a Liniker um papel de atuação. A artista canta e encanta, se firmando como um símbolo de poder e resistência nesse Mês do Orgulho.
Fora do radar nacional, We Are Lady Parts inovou as típicas narrativas musicais que estamos acostumados, Grey’s Anatomy finalizou seu 17º ano na união da ficção de Meredith com a pandemia do mundo real e RuPaul’s Drag Race Down Under se provou a pior temporada do reality de competição de drag queens. Original do Hulu, mas com exibição do Paramount+ no Brasil, The Handmaid’s Tale finalmente entregou um ótimo capítulo neste livro de sofrimentos que é a vida de June.
A Netflix continuou Lupine nos deu uma overdose de Elite. Além da estreia do quarto ano da sacanagem espanhola do Ensino Médio, fomos agraciados com curtas especiais, que não agregaram muito, mas foram agradáveis de acompanhar. O HBO Max aterrissou por aqui e duas de suas melhores produções acabaram em Junho: Hackscoroa o talento inestimável de Jean Smart na comédia e Legendary continua na construção de seu maravilhoso império. É sério, vejam Legendary.
O Mês do Orgulho coloriu a arte desse Cineclube de Junho, com o azul-claro da bandeira trans se prostrando como resistência. Uma das melhores séries da história, Pose, deu um tristonho tchau, através de uma terceira temporada cautelosa, calorosa e cheia de paixão. Para além de ser ‘apenas’ a produção com o maior elenco trans da história da TV, a obra-prima do FX se livrou das amarras narrativas que uma história LGBT pode se colocar, dando suficiente material para que MJ Rodriguez, Dominique Jackson, Indya Moore, Billy Porter e cia cravem seus nomes para a eternidade.
O Persona fecha o primeiro semestre com um Cineclube mais modesto que o habitual (é que o frio de Junho congelou até a gente). A conclusão do Mês do Orgulho não deixa dúvidas: o nosso papel, como espectadores e divulgadores de conteúdo, é o de prestigiar, aclamar, indicar e celebrar essas joias raras. Agora, é só chegar junto da Editoria e dos Colaboradores para conferir tudo o que falamos sobre o Cinema e a TV no sexto mês de 2021.