“Decididamente, eu sei ser animada, sei ser amável, agradável, afável. E esses são apenas os ‘As’. Só não me peça para ser simpática. Simpatia não tem nada a ver comigo.”
— A menina que roubava livros
No universo dos livros, o feminino assume diversas formas e possibilidades. Seja através da histórica objetificação pelos autores homens, do ato de roubar a cena mesmo quando a narrativa é secundária ou da tão sonhada materialização como protagonista, as personagens mulheres sempre trazem um dimensionismo inigualável para as tramas.
Em pleno mês de Março, período em que celebramos o Dia Internacional da Mulher – ainda marcado pelas lutas por direitos iguais em 2024 –, o Persona coloca em destaque as vozes femininas da Literatura atual. Debatendo amor, autoconfiança, gênero, desejos e prazeres, os livros selecionados revelam o melhor das autoras mais influentes do século.
Partindo de romances leves, passando por estreias até obras que trazem perspectivas históricas sobre o feminismo, a Editoria ressalta a batalha por um mundo mais justo no maior estilo girl power. Confira abaixo a nossa curadoria de obras escritas por mulheres que engrandecem o debate nesse mês especial.
Em 1986, cinco crianças encontram um corpo mutilado na floresta cercado por homens palito desenhados com giz, um crime que mudaria o rumo da cidade de Anderbury. Essa é a premissa de O Homem de Giz, livro de C. J. Tudor lançado há cinco anos, em 2018, que se tornou um título muito popular entre os amantes de mistério. A narrativa cheia de reviravoltas faz com que o leitor mergulhe com interesse nas páginas para desvendar o caso de assassinato. Como um bom exemplo do gênero, ninguém está a salvo – todos os personagens têm seus motivos para se tornarem suspeitos desse crime hediondo.
A edição do Clube do Livro de Abril marca o vigésimo encontro do grupo de leitores do Persona. Depois de caminharem por autores e, principalmente, autoras, que expandiram todos os limites das perspectivas, foi a vez de dar de cara com a marcante figura do rock brasileiro, Rita Lee, em Rita Lee: uma autobiografia. Falecida no dia 8 de Maio de 2023, a contemplação da obra da artista se formata em tons de saudosismo e admiração.
Em pequenos relatos que caminham desde a infância até a vida adulta agitada, o texto encara a distinção das fases em períodos curtos, palavras estrangeiras e gírias paulistanas. Através da óptica completamente única, a autoria de cada termo quase grita Rita Lee. Direta e reta como sempre, seus afetos, vivências, tristezas e o que mais houver cantam em notas vibrantes e extremamente características.
Além da voz da “padroeira da liberdade” – apelido pelo qual gostava de ser chamada –, o escrito conta com os pitacos do jornalista Guilherme Samora, representado pela aparição de um fantasma chamado Phantom. A figura aparece em determinados trechos para indicar algum detalhe ou data esquecidos pela artista, e contribui para aumentar a sensação de autenticidade dos capítulos.
Publicada em 2016, a obra foi consagrada no mesmo ano com o título de Melhor Biografia do Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), a artista também foi lembrada por suas contribuições no universo musical durante a cerimônia. Em 2017, o livro apareceu entre os indicados da categoria de Melhor Biografia da estatueta oferecida pela Academia Brasileira de Letras (ABL), o Prêmio Jabuti.
O relato é o primogênito da segunda autobiografia de Rita, intitulada Rita Lee: outra autobiografia. A caçula chegou ao mundo em Maio, pouco tempo depois da morte da autora, e carrega em 192 páginas memórias que contemplam os momentos da cantora com a descoberta do câncer de pulmão durante o período pandêmico.
Mesmo se seu RG não estampasse a capa do livro, o escolhido do mês não poderia ter sua assinatura confundida com a de nenhuma outra literata. Marcado por originalidade e cheio de personalidade, o ato de ler e viver Rita Lee foi e sempre será um presente. Para homenagear as múltiplas sensações provocadas pela eterna Rainha, ficam nossas dicas literárias especialmente para os que têm cor de Tutti Frutti no Estante do Persona de Abril de 2023.
No último ano, a editoria de Literatura foi uma das áreas que se consolidou no Persona. A parceria com a Companhia das Letras recebeu uma melhoria, nos tornando Parceiros Fixos. Como resultado, mais de 30 livros foram resenhados em 2022, e a grande maioria foram obras lançadas pela editora. Nós também ficamos de olho em eventos literários, como o Nobel de Literatura, e nosso Clube de Leitura e Estante do Persona se revitalizaram. Como um balanço do que foi o ano passado para o projeto – e para a Literatura no mundo –, chegamos com Os Melhores Livros de 2022.
Dos dias 2 ao 10 de Julho, membros da nossa Editoria cobriram a 26ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que ocorreu no Expo Center Norte. Dentre os destaques, a Homenagem a José Saramago – que completaria 100 anos em 2022 –, feita por Andréa Del Fuego, José Luís Peixoto e Jeferson Tenório, e a presença de Paulina Chiziane e Valter Hugo Mãe, marcaram a última edição do festival.
O evento, na verdade, teve dupla celebração: além do centenário do único escritor de língua portuguesa a receber o Nobel de Literatura, 2022 também marcou o bicentenário da Independência do Brasil. Dessa forma, a celebração se deu na forma de reconhecimento da identidade linguística, que une continentes através do idioma em comum, e contou também com a presença do presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa.
Em Maio, a Companhia das Letras publicou a tradução O rei pálido, romance póstumo de David Foster Wallace, finalista do Pulitzer em 2012 e que estava em processo de tradução desde 2014. Pela mesma casa editorial, Sátántangó, do húngaro László Krasznahorkai, finalmente chegou ao mercado editorial brasileiro. Eterno favorito ao Nobel de Literatura, esse é o primeiro livro do autor publicado no país.
E, falando da premiação, 2022 foi o ano de Annie Ernaux. A escritora francesa foi a grande vencedora do Nobel de Literatura, e foi tema do nosso Clube do Livro meses antes de sua consagração. Em Novembro, ela veio ao Brasil para participar da Festa Literária de Paraty (Flip), onde dividiu uma mesa com Geovani Martins, autor de Via Ápia. Além das entrevistas com os escritores Tobias Carvalho e Daniel Galera, o Persona também foi representado no podcastClubeRádio Companhia, da Companhia das Letras, no papo sobre os 10 anos de lançamento de Barba ensopada de sangue, de Galera.
Abaixo, você confere a lista das obras que marcaram os membros da Editoria e nossos colaboradores no ano de 2022, com gêneros e estilos para todos os gostos. Seja qual for a sua escolha, o Persona segue defendendo a pluralidade, irreverência e emancipação propiciada pelos livros. Boa leitura!
“Um livro deve ser o machado que partirá os mares congelados dentro de nossa alma.”
— Franz Kafka
Julho foi o mês do Persona se infiltrar ainda mais nos entremeios literários: dos dias 2 ao 10, membros da nossa Editoria cobriram a Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que ocorreu no Expo Center Norte. Dentre os destaques, a Homenagem a José Saramago – que completaria 100 anos em 2022 –, feita por Andréa Del Fuego, José Luís Peixoto e Jeferson Tenório, e a presença de Paulina Chiziane e Valter Hugo Mãe, marcaram a última edição do festival.
Neste ano, o evento teve dupla celebração: além do centenário do único escritor de língua portuguesa a receber o Prêmio Nobel de Literatura, 2022 também marca o bicentenário da Independência do Brasil. Assim, a celebração se deu na forma de reconhecimento da identidade linguística, que une continentes através do idioma em comum. O evento contou também com a presença do presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa.
Contudo, Julho também foi um período de indigestas – porém necessárias – reflexões. Após a repercussão nacional dos absurdos que envolveram o direito ao aborto legal de uma menina de 11 anos em Santa Catarina, a questão ganhou ainda mais enfoque quando, ao final de Junho, a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubou a decisão judicial de 1973 que garantia a legalidade do aborto em todo o território nacional. As discussões se nortearam no aspecto de direitos fundamentais que, a princípio, pareciam resguardados, mas que, a bem da verdade, precisam de constante vigilância.
É nesse contexto que o filme dirigido por Audrey Diwan, com a mesma temática, chegou aos cinemas brasileiros integrando o Festival Varilux de Cinema Francês, em uma adaptação cinematográfica do marcante relato da francesa Annie Ernaux. Assim, não foi difícil escolher para o Clube do Livro do Persona a obra O Acontecimento.
Baseado em um episódio biográfico, o livro conta a história de uma jovem de 23 anos que engravida e, sem poder contar com o apoio do namorado ou da própria família, precisa fazer um aborto. Ilegal na França da época, ela vive praticamente sozinha o acontecimento que, quarenta anos depois, revive no livro.
Refletindo sobre a onipresença da lei e seu imperativo sobre os corpos femininos, Ernaux mostra uma faceta literária que mistura a ficção com a não-ficção. Agora, para fechar – ou ampliar – um importante momento de reflexões, deixamos as indicações de mais um Estante do Persona.
Drive My Car, história que abre Homens sem mulheres, foi incrivelmente adaptada para o Cinema pelo diretorRyûsuke Hamaguchi, em um filme de quase três horas com trechos inspirados em mais dois contos da mesma obra, Sherazade e Kino. Após suas quatro indicações no Oscar, vencendo na categoria de Melhor Filme Internacional, o tão aguardado longa chegou ao Brasil no dia 1º de abril, através da plataforma MUBI.
No único encontro do mês, os membros do Clube do Livro debateram as nuances da obra, observando sua melancolia – que perpassa as sete histórias do livro –, a maneira a qual o autor reproduz homens quebrados e falidos em seus textos, e, principalmente, a forma como Murakami retrata o gênero feminino em seus contos.
Além do escritor japonês, outro nome que se destacou no meio literário em Março foi o de Abdulrazak Gurnah. Ao final do mês, a Companhia das Letraslançou Sobrevidas, a primeira obra lançada no Brasil do tanzaniano vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 2021. A publicação dá início a uma série de quatro lançamentos do autor que a editora deve entregar futuramente. Entre eles, além de Sobrevidas, estão Paradise (finalista do Booker Prize de 1994), By the Sea e Desertion.
A editora também montou uma campanha de arrecadação de fundos, junto ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), para as vítimas na Guerra da Ucrânia; por esse motivo, o livro Contos de Odessa, do ucraniano Isaac Bábel, passou a ser vendido no site da editora com mais de 65% de desconto, sem a cobrança de frete, cujo valor integral das vendas será entregue ao CICV. A obra clássica do autor captura o dia a dia na Ucrânia do século XX.
Como uma despedida de viagem – mas com o retorno breve e já agendado –, você fica agora com as dicas de leitura que os membros do Clube do Livro deixaram no Estante do Persona, as quais se pode ler no carro, deitado, no smartphone, ou como bem entender.
“As coisas mais difíceis de falar são as que nós mesmos não conseguimos entender“, define muito bem Elena Ferrante no que vem a ser o prólogo de seu terceiro romance. Lançado no Brasil em 2016 pela editora Intrínseca, A filha perdida traz o pseudônimo italiano, aclamado por suas personagens femininas e reverenciado por sua honestidade cortante, numa proposta de encarar com honestidade o que talvez seja um dos principais aspectos da experiência da mulher na sociedade – e também um dos assuntos mais intocáveis desde o início dos tempos -: a maternidade.
Pois é, 2021 chegou ao fim. Depois de 12 meses envolto em cada movimento do universo cultural, o Persona inicia as despedidas do ano ao pé de sua Estante e conclui a terceira edição de seu Clube do Livro. Este que, no mês de dezembro, teve a oportunidade de conhecer a Literatura de uma das autoras mais relevantes da atualidade, e de admirar o legado deixado por duas das mais importantes escritoras dos últimos tempos. É que em meio à leitura coletiva de A filha perdida e ao mistério aclamado que existe ao redor do nome best-seller de Elena Ferrante, o Persona se juntou ao resto do mundo para a despedida de bell hooks e Joan Didion.
No dia 15, eternizamos bell hooks como a artista, professora, teórica, pesquisadora e escritora, que dedicou mais de 50 anos de sua vida a estudos e políticas interseccionais sobre educação, gênero, raça, classe e economia. Referência do feminismo negro, ativista antirracista e estudiosa do amor, o pseudônimo de Gloria Jean Watkins nasceu no interior de um Estados Unidos segregacionista e morreu num planeta que ainda tem muito o que superar, mas que, através de sua existência, tem muito mais conhecimento sobre como fará suas revoluções.
Já no dia 23, o mesmo era lembrado sobre Joan Didion, quando reconhecemos a necessidade de compreender o mundo em que vivemos e os humanos que o habitam. Ao usar seu olhar e suas palavras para registrar e interpretar as transformações culturais e políticas da sociedade norte-americana na segunda metade do século XX, a californiana construiu uma carreira de mais de 60 anos, que entre muitos ensaios, alguns romances e outros roteiros, transformou o Jornalismo e a Literatura para todo o sempre.
Assim, o contexto literário de dezembro se tornou grandioso, mas Elena Ferrante deu conta de o acompanhar. No embalo do lançamento da adaptação cinematográfica – já muito celebrada pela direção da estreante Maggie Gyllenhaal, que chegou à Netflix no último dia do mês -, o Clube do Livro do Persona decidiu mergulhar nas praias do sul da Itália junto de Leda (vivida no Cinema por Olivia Colman) e nos dramas profundos de A filha perdida.
Para o último mês de 2021, reverenciamos o trabalho de mulheres que tanto fizeram pelo nosso passado, presente e futuro, e introduzimos a edição de dezembro do Estante do Persona. Entre as indicações literárias da nossa Editoria e o comentário sobre a leitura do mês, vibra a honestidade visceral de uma história cuja autora tem coragem de dizer o que nós não temos – em perfeita harmonia com o poder revolucionário das vozes que vieram antes dela.
“O coração da justiça é dizer a verdade, vermos a nós mesmos e ao mundo como somos, em vez de como gostaríamos que fôssemos.”
“Há livros escritos para evitar espaços vazios na estante.”
– Carlos Drummond de Andrade
Para poder valorizar cada vez mais a Literatura, parte tão importante e fundamental da cultura do nosso e de qualquer outro país, o Persona começa, agora, a preencher sua própria estante.
O mês de outubro marcou o início do nosso Clube do Livro, formado por membros da Editoria, que tem o intuito de promover a leitura compartilhada e encontros para discussão de alguma obra sugerida. Ao final do mês, o Clube ainda se reúne para montar o Estante do Persona, com um comentário que sintetize as ideias sobre a leitura realizada e uma playlist de músicas que se relacionem com a mesma, além de uma indicação de cada membro sobre algum livro marcante ou que mereça ser compartilhado.
Como primeira leitura, o Clube do Livro teve a honra de poder prestigiar uma das maiores autoras da Literatura brasileira. A Paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, é narrado em primeira pessoa pela personagem que tem suas duas iniciais presentes no título da obra. Uma mulher, moradora do Rio de Janeiro, que, ao desempenhar a tarefa de limpar o “quartinho dos fundos” de seu apartamento, mergulha em um fluxo de pensamento contínuo simbolizado por um monólogo de reflexões existencialistas, uma das grandes marcas da escrita da autora.
E nada mais simbólico do que estrear essa publicação especial num mês com acontecimentos tão marcantes para o meio literário. Além de no dia 29 de outubro ser celebrado o Dia Nacional do Livro, as semanas anteriores também foram marcadas por grandes eventos. No dia 7, ocorreu a cerimônia de entrega do Nobel de Literatura 2021, que foi concedido ao autor Abdulrazak Gurnah. Nascido na ilha de Zanzibar, atual Tanzânia, em 1948, o escritor é especialista em Literatura pós-colonial e na temática de refugiados, colecionando em sua carreira títulos como Paradisee Afterlives.
Mais ao final do mês, no dia 20, foi realizada a entrega do Prêmio Camões, para a moçambicana Paulina Chiziane. Tão simbólica quanto a vitória de Gurnah, Chiziane é a primeira mulher a publicar um romance em Moçambique,Balada de Amor ao Vento, em que o fez depois da independência. Com a figura da mulher moçambicana e africana no centro de sua escrita, a autora dedica-se a explorar os problemas enfrentados pela mesma no meio social, e tem como uma de suas obras de maior prestígio Niketche: Uma História de Poligamia, em que uma mulher decide conhecer as outras esposas de seu marido.
No clima desse mês repleto de grandes feitos na Literatura, você confere as indicações do Clube do Livro na primeira edição do Estante do Persona.
O termo cultura do cancelamento é tão novo quanto as pessoas que o levam a sério. Atribuído à atitudes consideradas erradas, o ato de cancelar alguém busca anular sua voz, e apagar quaisquer de suas contribuições. O que fazer, entretanto, quando o indivíduo digno de ser cancelado está morto há 83 anos? Para Matt Ruff, autor de Território Lovecraft, o certo é não fazer nada que se assemelhe ao cancelamento. Eis o impensável: ele raciocina e entende, adivinhem só, que nem tudo é simples como dois mais dois são quatro.