Em Má Educação, Almodóvar alude a Hitchcock em um conto sobre sexualidade e denúncia

Aviso de gatilho: o texto a seguir trata sobre temas sensíveis como abuso sexual e homofobia.

À esquerda o Padre Manolo com uma batina branca de padre. Ele encara o personagem de Ignacio, olhando de cima para baixo em uma posição de poder. À direita o personagem Ignacio, com uma batina vermelha. Ele encara o padre de volta, olhando de baixo para cima. Ambos são iluminados por uma luz amarelada. A luz vem da direita para a esquerda, e a origem dela está fora do plano
“Acho que acabei de perder a fé neste momento. Sem fé, não acredito em Deus nem no inferno. Se não acredito no inferno, não sinto mais medo. E, sem medo, sou capaz de qualquer coisa” (Foto: Warner Sogefilms)

Guilherme Moraes

Em Má Educação, o diretor Pedro Almodóvar evidencia os maus-tratos que alguns garotos sofrem na Igreja e, nesse quesito, fala com propriedade. A fita deixa clara a hipocrisia dentro de um lugar que se vende como mantenedor dos ‘bons costumes’, mas que, às escondidas, casos de pedofilia já foram registrados. No entanto, apesar do filme prometer ser uma denúncia, ele se torna muito mais do que isso ao longo da trama, adentrando em um conto investigativo ‘hitchcockiano que explora o efeito dos abusos e da marginalização em certos grupos sociais.

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A Sociedade da Neve mostra a complexidade desesperadora da sobrevivência humana

A foto é uma cena do filme A Sociedade da Neve. A foto mostra 14 dos 16 sobreviventes sentados na frente da fuselagem do avião. Estão sentados na neve, alguns em cima da lataria ou de malas. O horizonte atrás do avião mostra as cordilheiras dos Andes
A tragédia já teve outras quatro adaptações para o audiovisual (Foto: Netflix)

Amabile Zioli

Adaptar a história de uma tragédia real para o audiovisual sempre envolve muita responsabilidade. Depois de reduzir os acontecimentos catastróficos da Tailândia de 2004 a um clichê dramático hollywoodiano em O Impossível,  J. A. Bayona se redimiu com A Sociedade da Neve, trazendo para as telas, mais uma vez, mas sob outra perspectiva, a tragédia ocorrida nos Andes em 1972. A produção espanhola foi aclamada internacionalmente, o que rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional e Melhor Maquiagem e Penteados.

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El mal querer: em novas roupagens, Rosalía apresentou o flamenco para novas gerações há 5 anos

Capa do álbum El Mal Querer da cantora Rosalía. Nele, a cantora está acima de uma nuvem aos céus, envolta por um círculo de correntes de ouro brilhantes. Seus braços estão pendurando aréolas que seguram longos panos brancos que vão até seus pés. Ela está despida e ao centro está uma luz branca. Logo acima de sua cabeça estão estrelas em formato de um círculo e uma pomba branca voando. No centro inferior da imagem está escrito Rosalía em negrito e ao lado El Mal Querer.
El mal querer é baseado em um livro do século XIII de um autor desconhecido (Foto: Columbia Records)

Henrique Marinhos

A cantora, compositora e produtora Rosalía nasceu em Sant Esteve Sesrovires, na Catalunha, em 1992 e se tornou um fenômeno da música pop com o lançamento de seu segundo álbum, El mal querer, há 5 anos. A obra conceitual mistura elementos do flamenco, pop e urban com vocais e visuais esplendorosos e surpreendentes para um projeto de conclusão de curso na Escola Superior de Música da Catalunha. 

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Terra e tradição se abrem sob os pés da família de Alcarràs

Imagem retangular que mostra uma cena do filme Algarràs. Uma família branca está em pé, todos virados de lado, olhando na direção esquerda da imagem. O fundo tem montanhas e plantações verdes.
Exibido na Competição Novos Diretores da 46ª Mostra Internacional de São Paulo, o longa não esquece que uma tradicional família agricultora na Europa sempre conta com o trabalho braçal de imigrantes pretos (Foto: MUBI)

Nathália Mendes

Eu não canto pela voz, […] por quem canto é por minha terra, terra firme, casa amada”, dizem os versos cantados por Rogelio (Josep Abad), patriarca dos Solés que protagonizam Alcarràs, longa de Carla Simón exibido na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, na Competição Novos Diretores. A obra, uma coprodução espanhola e italiana, conta como uma família de agricultores no interior da Catalunha se vê sendo expulsa de sua propriedade após anos cultivando pêssegos naquela terra. E não há nada que se possa fazer. Diante das perdas inevitáveis, Rogelio acompanha em silêncio, assistindo com olhos carregados de tristeza a tradição de gerações se desfazer, bem como sua própria família.

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Você Tem Que Vir e Ver: a conversa da vida com a arte

Cena do filme Você Tem Que Vir e Ver. Na imagem, os personagens Susana, Daniel, Elena e Guillermo estão juntos em uma varanda de concreto. Suzana, interpretada por Irene Escobar, é uma mulher branca de cabelos loiros escuros com pontas claras na altura dos ombros, ela veste uma camiseta rosa estampada de pequenas flores por baixo de um macacão bege. Daniel, interpretado por Vito Sanz, é um homem branco de cabelos ondulados castanho escuros, ele veste uma calça jeans com uma camisa cinza escura por baixo de um blazer azul marinho. Elena, interpretada por Itsaso Arana, é uma mulher branca com cabelos loiros claros amarrados com uma franja na testa, ela usa óculos arredondados e veste uma calça branca com uma camisa azul escura por baixo de um casaco amarelo. Guillermo, interpretado por Francesco Carril, é um homem branco de cabelos castanhos curtos, ele veste uma bermuda de tons esbranquiçados com uma camisa rosa de mangas longas. Os personagens aparecem na ordem em que foram apresentados da esquerda para a direita. O casal Elena e Daniel olha para trás, enquanto os outros dois estão com as cabeças voltadas para frente.
Participando da seção Perspectiva Internacional, Você Tem Que Vir e Ver é um dos dois filmes de Jonás Trueba na 46ª Mostra Internacional de Cinema, junto de Quem os impede (Foto: Bendita Film Sales)

Jamily Rigonatto 

Um piano emite sons leves que caracterizam todo o plano de fundo da cena com a suavidade misteriosa dos clássicos. A câmera se estabiliza nos rostos dos quatro personagens da história, e é com o foco nas feições brandas que Você Tem Que Vir e Ver revela ter algo para nos contar. Entorpecidos pelas notas musicais, Elena (Itsaso Arana), Daniel (Vito Sanz), Guillermo (Francesco Carril) e Susana (Irene Escobar) parecem virar o lar de todos os questionamentos do existir. O filme, dirigido por Jonás Trueba, faz parte da categoria Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, e desenhado em tons primaveris, se desmancha em um retrato cotidiano e intimista. 

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As realidades do 27º Festival É Tudo Verdade

Arte retangular horizontal de fundo azul com estrelas azul claro. Lê-se o texto: “as realidades do 27º Festival É Tudo Verdade It’s All True”. Foi adicionado o olho do Persona no canto inferior direito, com a íris em azul claro.
Entre os dias 31 de março e 10 de abril, o Persona acompanhou o 27º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade (Foto: Reprodução/Arte: Ana Júlia Trevisan/Texto de abertura: Raquel Dutra)

Está aberta a temporada de festivais na cobertura do Persona. Entre os dias 31 de março e 10 de abril, a realização do 27º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade inaugurou o ano para as nossas aventuras cinematográficas. Depois de um 2021 marcado pelo Cinema das mulheres, da cidade maravilhosa, das experimentações e fantasias, 2022 se inicia com a única coisa da qual não podemos fugir: a realidade.

Mas na verdade, o espectro contemplado pelo maior festival de documentários do mundo era muito desejado para integrar o horizonte das nossas experiências. Dessa vez, o anseio se tornou possível graças ao formato de realização do É Tudo Verdade, que aconteceu de forma totalmente gratuita e híbrida, sendo presencialmente nos cinemas das capitais de São Paulo e Rio de Janeiro, e virtualmente através da plataforma de streaming do festival e das dos parceiros Itaú Cultural Play e Sesc Digital. 

A seleção é tão vasta quanto o tema que a define: 70 filmes, que entre curtas, médias e longas-metragens, se dividiram nas mostras competitivas e nas demais categorias de exibição (Foco Latino-Americano, Sessões Especiais, O Estado das Coisas, Clássicos É Tudo Verdade). Trazendo o Cinema documental realizado em mais de 30 países, o alcance do É Tudo Verdade é reconhecido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, de forma a classificar diretamente os filmes vencedores dos prêmios dos júris nas Competições Brasileiras e Internacionais de Longas/Médias e de Curtas Metragens para apreciação ao Oscar do ano que vem.

À distância, o Persona selecionou 25 títulos a fim de compreender a seleção de 2022, que elegeu como os homenageados da vez Ana Carolina e Ugo Giorgetti, dois dos nomes mais importantes do Cinema de não-ficção brasileiro. As obras de abertura propuseram uma reflexão sobre o passado, presente e futuro da Sétima Arte, enquanto o encerramento do festival ficou na responsabilidade de um dos premiados pelo público e pelo júri da edição mais recente do Festival de Sundance.

A curadoria do Persona conferiu todos eles, além das obras vencedoras e demais títulos que chamaram a atenção de Bruno Andrade, Enrico Souto, Raquel Dutra e Vitor Evangelista. O resultado dessa aventura você pode conferir abaixo, e em meio a experiências milagrosas, figuras históricas, lutas urgentes e muitas reflexões filosóficas, vale o aviso: não se esqueça que é tudo verdade.

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Bella Ciao!: La Casa de Papel dá adeus com uma última guerra e muitas emoções

cena de La Casa de Papel. No centro da imagem está o Professor, um homem alto, com barba e cabelos longos e lisos (ambos castanhos), usa óculos de grau de armação preta e tem algumas marcas de expressão em seu rosto. Ele veste roupas sociais: uma camisa cinza suja e rasgada, dobrada até os cotovelos, uma gravata preta também desgastada, e uma calça com cinto, também pretos. Formando um corredor ao seu lado estão alguns militares, todos com o uniforme padrão completo e com armas de grande porte em suas mãos. Todas as pessoas na imagem estão sérias. Ao fundo, vê-se prédios e o céu azul.
Entrando oficialmente no assalto de cabeça erguida, o Professor tenta uma última jogada para salvar seus companheiros (Foto: Netflix)

Gabrielli Natividade da Silva 

O primeiro episódio de La Casa de Papel veio ao ar em 2017, e agora, 5 anos depois, uma das séries mais conhecidas e adoradas da Netflix chega ao fim. A quinta temporada foi dividida em dois volumes (o primeiro lançado no dia 3 de setembro, e o segundo exatos três meses depois), e seguiu a narrativa deixada pela anterior: a gangue ainda estava no Banco da Espanha, depois do assassinato de Nairóbi e da chegada conturbada de Lisboa ao assalto, enquanto o Professor lutava com a fúria da inspetora Sierra e do coronel Tamayo. Só a menção desses pequenos fatos leva à conclusão de que coisas grandes estariam prestes a acontecer para finalizar a produção com chave de ouro e, de fato, aconteceram.

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O leite derramado de Mães Paralelas

Cena do filme Mães Paralelas. Nela estão Ana e Janis de costas, em ordem. Ana é uma jovem branca de cabelo curto estilo joãozinho platinado. Ela veste uma jaqueta esportiva azul marinho com detalhes em vermelho nas laterais. Ela segura uma taça de vidro âmbar em direção à Janis, que está à esquerda. Janis é uma mulher branca de meia idade com cabelo castanho médio iluminado e ondulado. Sua roupa é coberta pelo cabelo. O fundo é uma parede verde musgo com retratos de ancestrais emoldurados por molduras vermelhas.
Após abrir o Festival de Veneza em 2021, Mães Paralelas foi indicado à duas categorias do Oscar 2022: a de Melhor Atriz e Melhor Trilha Sonora Original (Foto: El Deseo/Netflix)

Ayra Mori

Duas mães, duas Espanhas, dois paralelos. Uma mãe dá à luz a uma criança nascida do amor. Outra, à uma criança nascida da dor. Uma Espanha segue sem culpas do passado sombrio do Franquismo. Outra carrega consigo os traumas geracionais de vestígios mortais dos ossos inidentificáveis que jazem em covas ilegítimas. Firmado pelos opostos, em Mães Paralelas (no original, Madres Paralelas) Pedro Almodóvar posiciona passado e presente, ambos em confronto entre si. O longa dá sequência ao universo melodramático deslumbrante – mas cru – do cineasta espanhol, desta vez, como manifesto político. O leite já foi derramado e o resquício azedo de sua sujeira continua incrustado nos rejuntes do país. Resta, aceitá-lo.

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Um Forte Clarão não passa de uma fagulha

 Cena do filme Um Forte Clarão exibe uma pessoa, à distância, parada em uma rua vazia durante a noite. Ela está de costas, levando uma mala em uma das mãos. As poucas luzes dos postes estão acesas, iluminando somente parte da rua. À esquerda, vemos casas enfileiradas e, à direita, um muro branco.
Ruas escuras são uma constante no longa que integra a Competição Novos Diretores da Mostra de SP (Foto: Tentación Cabiria)

Caio Machado 

Morar em cidade pequena pode ser pacífico, sem o estresse e o ritmo frenético das capitais, mas também pode ser um verdadeiro tédio por causa da rotina limitante e da falta de coisas diferentes para fazer. No caso de Um Forte Clarão, filme exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o marasmo serve como um pretexto para que os personagens contem histórias e tenham experiências inexplicáveis. 

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A harmonia da vida em Armugan

Cena do filme Armugan, em preto e branco. Vemos um homem baixinho, careca e barbudo sentado em uma cama. À esquerda, vemos um homem com cabelo comprido, barba grande e alto também sentado na cama. Ambos são brancos e estão na meia idade. Vestem roupas adequadas para o clima da região montanhosa.
Duas pessoas vivem isoladas no filme que integra a seção Perspectiva Internacional da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Shaktimetta, La Bendita Produce)

Caio Machado

Vivemos a vida à sombra do grande mistério da morte. Por mais que as religiões tentem explicar o que acontece conosco depois que o coração para de bater, só saberemos a verdade quando chegar a hora. Armugan, filme exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, utiliza a sutileza visual para elaborar um conto impactante sobre como o ser humano se apoia em lendas para conseguir lidar com a finitude da existência. 

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