Em um Japão não muito distante, na tentativa de lidar com o envelhecimento da sociedade e aliviar o sufocamento econômico promovido pela política neoliberal, é criado um programa que encoraja cidadãos idosos a serem voluntários de eutanásia. A política em torno do projeto é simples: encurtar institucionalmente a vida dessas pessoas, oferecendo uma recompensa de 100 mil ienes pelo sacrifício, que podem ser gastos livremente com o objetivo de fornecer o necessário para um “último desejo”. Esse é o enredo de Plano 75 (Plan 75), a distopia necropolítica dirigida e roteirizada por Chie Hayakawa, que integra a Competição Novos Diretores da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
Zeina, Mutaz e Hala são os últimos moradores de Damasco e têm horas para sair da cidade sitiada antes que esta seja invadida. A família composta por pai, mãe e filha permaneceu no local durante o cerco, mas encarou a decisão de deixar ou não seu lar quando um míssil abre buracos na moradia e os expõem ao mundo sem a segurança de suas quatro paredes. É através do olhar inocente e esperançoso de Zeina, de 14 anos, que acompanhamos o dilema do trio de Nezouh, que integra a seção Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
Está aberta a temporada de festivais na cobertura do Persona. Entre os dias 31 de março e 10 de abril, a realização do 27º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade inaugurou o ano para as nossas aventuras cinematográficas. Depois de um 2021 marcado pelo Cinema das mulheres, da cidade maravilhosa, das experimentações e fantasias, 2022 se inicia com a única coisa da qual não podemos fugir: a realidade.
Mas na verdade, o espectro contemplado pelo maior festival de documentários do mundo era muito desejado para integrar o horizonte das nossas experiências. Dessa vez, o anseio se tornou possível graças ao formato de realização do É Tudo Verdade, que aconteceu de forma totalmente gratuita e híbrida, sendo presencialmente nos cinemas das capitais de São Paulo e Rio de Janeiro, e virtualmente através da plataforma de streaming do festival e das dos parceiros Itaú Cultural Play e Sesc Digital.
A seleção é tão vasta quanto o tema que a define: 70 filmes, que entre curtas, médias e longas-metragens, se dividiram nas mostras competitivas e nas demais categorias de exibição (Foco Latino-Americano, Sessões Especiais, O Estado das Coisas, Clássicos É Tudo Verdade). Trazendo o Cinema documental realizado em mais de 30 países, o alcance do É Tudo Verdade é reconhecido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, de forma a classificar diretamente os filmes vencedores dos prêmios dos júris nas Competições Brasileiras e Internacionais de Longas/Médias e de Curtas Metragens para apreciação ao Oscar do ano que vem.
À distância, o Persona selecionou 25 títulos a fim de compreender a seleção de 2022, que elegeu como os homenageados da vez Ana Carolina e Ugo Giorgetti, dois dos nomes mais importantes do Cinema de não-ficção brasileiro. As obras de abertura propuseram uma reflexão sobre o passado, presente e futuro da Sétima Arte, enquanto o encerramento do festival ficou na responsabilidade de um dos premiados pelo público e pelo júri da edição mais recente do Festival de Sundance.
A curadoria do Persona conferiu todos eles, além das obras vencedoras e demais títulos que chamaram a atenção de Bruno Andrade, Enrico Souto, Raquel Dutra e Vitor Evangelista. O resultado dessa aventura você pode conferir abaixo, e em meio a experiências milagrosas, figuras históricas, lutas urgentes e muitas reflexões filosóficas, vale o aviso: não se esqueça que é tudo verdade.
“Agora vamos deixar você feia, minha mãe disse”. As primeiras palavras do livro de Jennifer Clement, Reze pelas mulheres roubadas, são marcadas pela dor – e é exatamente nesse sentimento que a livre adaptação cinematográfica de Tatiana Huezo se pauta. A Noite do Fogo, presença fortíssima na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, é um filme de muitas cicatrizes, todas elas compondo a grande ferida aberta e pulsante de cores e dores que é a América Latina.
Todas as memórias são imperfeitas, incompletas, limitadas. Um som, um gesto, uma visão, tudo se dissolve passado o seu momento de existir, e sobrevivem apenas em uma reconstituição nebulosa registrada em nossa mente. Uma memória pode não traduzir com exatidão os eventos vivenciados por um indivíduo, o que não quer dizer em nenhuma hipótese que ela é sem significado. As lembranças representam ideias que, muitas vezes, não somos capazes de traduzir em linguagem, mas que, ainda assim, sentimos, e sentindo sabemos que aquilo é significativo. Do mesmo modo que uma memória paira em nossa mente, Memoria, exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, é uma obra enigmática e impossível de ser descrita com precisão, mas que, talvez por isso mesmo, está repleta de significados.
A conjuntura instável e precária que refugiados no mundo todo se encontram nunca foi tão grave. São um dos grupos mais vulneráveis socialmente, agrupando pais e mães que se sujeitam aos trabalhos mais ímpios para sustentar suas famílias, e uma juventude que não vê perspectiva de um crescimento saudável. Nesse contexto, qual o papel que o esporte exerce? O futebol pode adquirir uma função transformadora e emancipatória para essas pessoas? Questões importantíssimas, mas que nunca são tratadas com a devida atenção por Capitães de Zaatari, documentário egípcio que é exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
O longa de estreia de Bahman Tavoosi não poderia ser mais sensível. Celebrando tanto os 50 anos da morte de Che Guevara quanto a vida e o legado da professora Julia (Barbara Flores), o filme funciona como uma homenagem às memórias de ontem. Os Nomes das Flores é parte da Competição Novos Diretores da 44ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.