The Car segue a estrada do precursor, mas dessa vez, o Arctic Monkeys observa a lua de longe

The Car é um novo capítulo para a banda Arctic Monkeys, que mostra um lado introspectivo e reflexivo do grupo (Foto: Domino Records)

Leandro Santhiago

Desde seu álbum de estreia até o clássico indie AM, de 2013, o Arctic Monkeys havia se estabelecido como uma força gigantesca do rock mainstream, lotando estádios internacionalmente e lançando hits atrás de hits, como é o caso de Fluorescent Adolescent e R U Mine?. O quarteto de Sheffield, até então, cultivou a fama de trazer ao público um som mais enérgico e potente, liderado pela instrumentação rock clássica com a tríade de guitarras, baixo e bateria. No entanto, um piano dado de presente ao vocalista Alex Turner fez com que o grupo expandisse seu vocabulário musical e entrasse em uma nova etapa sonora.

A energia acumulada até o momento foi o combustível para a viagem até o espaço na qual vemos Tranquility Base Hotel & Casino, um passeio lunar regado pela sonoridade dispersa – ainda que coesa – emprestada da psicodelia das décadas de 1960 e 1970. Em The Car, o sétimo disco da banda, a poeira levantada pela decolagem do som espacial de seu precursor assentou. Nesse último lançamento, o grupo traz canções mais reclinadas e relaxadas, quase como um descanso depois da viagem proporcionada pelo sexto disco, ainda que com um sabor melancólico e nostálgico de fundo.

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10 anos depois, Because The Internet ainda ecoa no cenário do hip-hop

Capa do álbum “Because The Internet” de Childish Gambino. A capa é uma fotografia do cantor. É um homem negro, de olhos escuros, e veste uma camisa em tons de rosa e laranja e coqueiros verdes. Ele está encarando a câmera, com uma feição séria. O fundo da foto é rosa, do lado direito, e laranja, do lado esquerdo.
Childish Gambino foi uma das inspirações para a criação de Miles Morales, o Homem-Aranha (Foto: Glassnote Records)

Amábile Zioli

O mix de gêneros, ritmos e estilos pode ser uma ferramenta muito utilizada no meio musical. Encontrar o equilíbrio e não pender para o exagero, no entanto, é uma tarefa que poucos conseguem alcançar. Em 2013, Donald Glover, sob o pseudônimo de Childish Gambino, lançava seu segundo álbum de estúdio, Because the Internet, e mostrava ao mundo que entendia de tudo um pouco.

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Dulcineia explora a música como a conexão, inspiração e destino de um artista em busca de sua identidade

Cena do filme Dulcineia. Na imagem estão os dois protagonistas Hugo e Dulcineia andando de bicicleta. Hugo é um homem de meia idade com cabelos lisos, longos e presos. Ele tem uma barba preta que cobre seu rosto enquanto anda de bicicleta. Dulcineia é uma mulher branca de cabelos castanhos longos. Ambos estão em uma rodovia movimentada e muito iluminada por postes e reflexos da água em poças formadas pela chuva. Estão usando capas de chuva, Dulcineia uma capa vermelha e Hugo uma capa transparente.
Junto a Dulcineia, mais de 20 filmes portugueses integram a 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Bando à Parte)

Henrique Marinhos

Dirigido e roteirizado pelo cineasta português Artur Serra Araújo, Dulcineia conta a história de Hugo, um contrabaixista de jazz que decide tirar um ano sabático e voltar a Porto, sua cidade natal, em busca de equilíbrio e inspiração. No entanto, como o fio condutor da trama, a sinfonia se desenvolve lentamente em torno de um mistério como um pianista famoso, que toca uma música que o protagonista vem escrevendo na sua cabeça há anos, mas nunca conseguiu colocá-la no papel.

A obra está presente na 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, na seção Perspectiva Internacional, e mistura elementos de romance, suspense e uma quase fantasia. Suas referências também são diretas e bem-vindas, construindo uma base sólida para o desenvolvimento da narrativa: Dom Quixote, que influi o nome da personagem Dulcineia (Alba Baptista) e sua relação com Hugo (António Parra); a própria cultura de Porto, retratada em belas imagens e diálogos; e o jazz, a paixão e a expressão de Hugo e dos demais músicos que ele encontra em sua nova jornada de autoconhecimento. 

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FEELS: o mar de sentimentos do Soul Cinematográfico

Capa do álbum de FEELS, é um design gráfico de uma mulher astronauta, que parece estar flutuando pelo espaço. Ela leva sua mão direita ao capacete. O desenho de um arco-íris atravessa o desenho na diagonal desde o canto inferior esquerdo ao canto superior direito
FEELS, primeiro álbum da cantora Snoh Aalegra, foi lançado em outubro de 2017 (Foto: Joseph McDermott)

Isabela D’Avila

Quando Prince te convida para comer donuts, mesmo que seja às quatro da manhã em uma cidade totalmente desconhecida, você vai. Essa foi a primeira das  muitas outras experiências inesperadas vividas por Snoh Aalegra com o artista, que decidiu por espontânea vontade orientar a cantora, depois de se apaixonar por sua voz. Assim como ele, talvez depois de ler esse texto e ouvir algumas músicas de Aalegra, você também se apaixone por uma das vozes mais envolventes da cena do R&B atual. 

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Nós somos os escolhidos de Jon Batiste

Capa do CD WE ARE, de Jon Batiste. Imagem quadrada e colorida com fundo vermelho. Mostra Jon Batiste, um homem negro, de cabelos curtos e cavanhaque, vestindo um sobretudo vermelho e amerelo. Ele está de pé, olhando para frente. No canto inferior direito, escrito em inglês em uma fonte pequena, lê-se “dedicado aos sonhadores, profetas, contadores de histórias e verdades que se recusam a nos deixar cair totalmente na loucura”
Depois de anos de esnobadas absurdas, a justiça foi feita: com o fascinante projeto WE ARE, Jon Batiste é o 11º artista negro a conquistar o Grammy de Álbum do Ano em 64 anos (Foto: Verve Records)

Enrico Souto

Nem Olivia Rodrigo, nem Billie Eilish, nem Lil Nas X e nem Justin Bieber. A noite de 3 de abril de 2022 foi de Jon Batiste. Nesta nossa realidade bizarra em que o artista mais indicado de uma premiação é considerado azarão, o jazzista de Louisiana embaraçou todas as apostas ao se consagrar como o maior vencedor do Grammy 2022, saindo da cerimônia com 5 dos 11 gramofones que concorria, incluindo o cobiçado Álbum do Ano, categoria mais importante do evento. O trabalho contemplado foi WE ARE, seu aclamado oitavo álbum de estúdio. E, apesar de competir com grandes nomes, não há outra conclusão ao mergulhar no projeto: o prêmio só poderia ser dele.

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Summer of Soul… ou, Quando o Sonho se Tornou Possível

Cena do filme Summer of Soul. Na fotografia retangular colorida, vemos centenas de pessoas negras vestindo roupas populares nos anos 1960, que são camisetas listradas, blusas com golas grandes e óculos redondos. As três mulheres negras que estão à frente da fotografia possuem cabelos crespos e grandes, de cor preta, e vestem respectivamente uma camisa preta com uma blusa azul sobre os ombros; uma camiseta listrada; e uma blusa de couro marrom com detalhes em cor branca.
Vencedor do BAFTA de Melhor Documentário, Summer of Soul (…Or, When the Revolution Could Not Be Televised) é o favorito na mesma categoria do Oscar 2022 [Foto: Hulu]
Bruno Andrade

O ano é 1969. Seria mais um verão qualquer, não fosse as mais de 300 mil pessoas reunidas em seis finais de semana consecutivos nos Estados Unidos, envoltas por música, dança e fortes discursos indignados que sucederam o assassinato de Martin Luther King Jr. (após uma sequência de homícidios políticos com motivações racistas, de Malcolm X à posterior morte de Bobby Kennedy – e tantos outros). Mas ao contrário do que se possa imaginar, não se trata do famigerado festival de Woodstock, pois esse, apesar de dominar a cultura popular, aconteceu em somente quatro dias (15 à 18 de agosto de 1969). A 160 km dali, no antigo bairro periférico do Harlem, estava acontecendo uma revolução não televisionada. Indicado ao Oscar 2022 na categoria de Melhor Documentário, Summer of Soul (…ou, Quando a Revolução Não Pôde Ser Televisionada) traz à tona os registros do Festival Cultural do Harlem, um marco histórico na Música que se seguiu esquecido; até agora.

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Gold-Diggers Sound: Leon Bridges tem o poder de parar o tempo

Gold-Diggers Sound, terceiro álbum de estúdio de Leon Bridges e figura marcada nas categorias de R&B do Grammy 2022, ainda recebeu versão Deluxe com uma faixa extra (Foto: LisaSawyer63/Columbia Records)

Enrico Souto

“Nós não paramos, mas o tempo sim”. Há uma conduta inusitada nessa afirmação, não? Bem, é assim que Leon Bridges escolhe abrir Motorbike, o segundo single do seu terceiro álbum de estúdio, Gold-Diggers Sound. É comum que o tempo seja entendido, tanto na Arte quanto no inconsciente coletivo, como uma entidade intocável, totalmente fora da nossa compreensão e controle, que existe independente da nossa capacidade de percebê-lo, e que é efêmero por definição. Ou seja, que se vai apaticamente, e quem não o acompanha é fatalmente suprimido. 

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Em Vulture Prince, Arooj Aftab nos ensina a lidar com a dor

Centralizada está a cantora, com um microfone em sua mão direita, na parte esquerda da imagem. Seus olhos estão apontando para o canto inferior direito, a parte do rosto dela que está na parte esquerda da imagem não é reconhecível. No canto superior esquerdo está escrito “Arooj Aftab” com “Vulture Prince” logo abaixo.
Vulture Prince, o terceiro álbum da carreira de Aftab, a vê retornar a suas raízes e lidar com a dor da perda de pessoas importantes (Foto: New Amsterdam Records)

Frederico Tapia

Nascida em 1985 na cidade de Riyadh, na Arábia Saudita, mas criada em Lahore, no atual Paquistão, e atualmente radicada em Nova York, nos Estados Unidos, Arooj Aftab começou a ser conhecida durante os anos 2000 com rendições de músicas de outros artistas, como por exemplo Hallelujah, de Leonard Cohen. Ela se formou no Berklee College of Music em Produção Musical, Engenharia de Som e Composição de Jazz após se mudar para os EUA em 2005. Em 2021, ela lançou seu terceiro álbum de estúdio, Vulture Prince, e conquistou duas indicações ao Grammy 2022, tornando-se a primeira mulher paquistanesa a ser indicada à premiação estadunidense. Uma das indicações é como Artista Revelação, uma das principais categorias do prêmio, e a outra como Melhor Performance de Música Global por Mohabbat.

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KEYS: a chave para ser inesquecível é aceitar a si mesmo

Capa do álbum de Alicia Keys. Em uma capa toda azul escura, Alicia está ao centro, envolvida em um tecido azul escuro, atrás de uma fechadura que é maior que seu próprio corpo. Apenas a parte de cima de seu corpo aparece, pois suas pernas e pés estão por trás da fechadura. Ela é uma mulher negra de pele mais clara, está usando brincos dourados grandes em formato de cadeado e um anel dourado, está com cabelo preso puxado para baixo e está usando pouca maquiagem. Ao canto superior esquerdo da capa, está escrito o nome do álbum, KEYS, na vertical, em letras douradas. No canto inferior direito, temos uma chave dourada, que em sua parte de cima contém as letras A e K, que são as iniciais da cantora.
Capa de KEYS, oitavo álbum de estúdio da cantora Alicia Keys, lançado em dezembro de 2021 (Foto: RCA Records)

Isabela D’Avila

Cada pessoa é composta por diversas versões. Algumas delas são apreciadas, e outras, nem tanto. Assim, alguns conseguem conter partes de si mesmo, mostrando ao mundo só aquilo que ele teoricamente desejaria ver. Alicia Keys, em seu novo projeto, rescinde com essa ideia, lançando 26 faixas em uma proposta diferente daquela que vem apresentando em sua trajetória. Aos que não gostam quando um artista muda ou alcança novos patamares musicais, cuidado! Este disco contém altas doses de ousadia. 

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5 anos de Remonta: só Liniker e os Caramelows sabem o quanto dói

Em 2015, Liniker e os Caramelows lançaram o EP Cru com as faixas Zero, Louise de Brésil e Caeu (Foto: Let’s GIG)

Ana Júlia Trevisan

“Eu não quero mais saber de desamor”: Liniker abre Remonta, seu primeiro disco, lançado em 2016, sendo categórica e exteriorizando seu pedido de ‘basta!’. A cantora araraquarense de, na época, apenas 21 anos, não estava sozinha nessa viagem imersiva e sentimentalista. É ao lado da banda Caramelows, que contava com a voz de Renata Éssis, o contrabaixo elétrico de Rafael Barone, a guitarra de William Zaharanszki, a bateria de Péricles Zuanon, o trompete Márcio Bortoloti, as teclas de Fernando Travassos, as percussões acústicas de Marja Lenski e (ufa!) o saxofone de Éder Araújo; que Liniker dá luz às suas composições. O amor visceral é usado como a substância vital na construção do trabalho que transformou a artista numa das maiores representantes da dita Nova MPB.

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