Genius Loci é um pesadelo confuso em uma noite de encontro espiritual

Imagem do filme Genius Loci. Ao centro, o desenho de uma mulher careca, preta e com brincos; ela uma uma regata branca. Ao fundo, é possível ver triângulos recortados em retângulos, formando um caminho.
Presente na categoria de Melhor Curta-Metragem de Animação no Oscar 2021, a alucinação perturbadora de Reine é quase como um sonho agradável para o público (Foto: Reprodução)

Larissa Vieira

Quem nunca teve um sonho confuso, em que formas geométricas, cores e diálogos aleatórios tomam conta de sua noite e fazem você passar o dia, se não a semana, inteiro tentando decifrá-lo? Genius Loci trouxe a vida todos esses sentimentos caóticos durante uma noite na cidade parisiense. O curta-metragem conta a história de Reine, uma jovem francesa, que vive uma viagem metafísica e descobre, em meio ao caos urbano, uma entidade viva que se torna o seu guia espiritual pela noite. 

A perturbadora animação, ao mesmo tempo liberta e se torna quase como uma viagem para o telespectadores, e não só para Reine. Os elementos geométricos representam toda a confusão e complexidade com que a protagonista batalha, e eles são desenhados de maneira brilhante, assim como em nossos sonhos, ou pesadelos. A construção dos míseros, porém extremamente relevantes, diálogos é ainda mais atormentadora porque são neles em que sentimos mais puramente o que a jovem está vivendo. 

Imagem do filme Genius Loci. Ao centro, o desenho de uma casa, cheia de ramificações, como uma árvore, com diferentes cores projetadas sobre ele. Ao fundo, os reflexos da casa contrastam com o fundo preto.
A construção geométrica, as cores e todos os sons tornam Genius Loci uma animação perturbadoramente brilhante (Foto: Reprodução)

O curta-metragem merece destaque na lista de indicados ao Oscar 2021 de Melhor Curta-Metragem de Animação, já que, além de um enredo e diálogos muito bem construídos, Genius Loci traz uma animação bem trabalhada, nos mínimos detalhes. Cada forma geométrica edifica os 16 minutos da obra, sendo que qualquer pequeno quadrado pode ser a representação de um grande problema. Além disso, o trabalho com as cores é extremamente minucioso, também carregando uma relevante importância em cada pincelada na tela. 

O filme é quase como um quadro, já que todos seus desenhos são feitos em uma aquarela, muito bem pintada, que poderia estar exposto no Louvre. Ao mesmo tempo em que a animação francesa é colorida e livre, ela é dura e rígida ao contrastar com a precisão da geometria; o que causa uma confusão ainda maior, não só em Reine, mas também em quem assiste e vive o pesadelo. Ainda, as personagens ao redor da protagonista são estruturadas de maneira brilhante, visto que são nelas em que a produção faz a crítica ao racismo e ao machismo, por exemplo. 

Outra construção brilhante do curta-metragem são todos seus elementos sonoros, que conseguem espelhar algo que quase nenhuma outra obra conseguiu: os sons de nossos sonhos. Cada batida dos sons faz você emergir na alucinação de Raine e cria aquele sentimento de angústia e desespero que vivemos durante uma noite de sono bem dormida, porém conturbada em seu subconsciente. A narração de Nadia Moussa que surge em alguns instantes, principalmente nos primeiros minutos, também é essencial para elaborar o ritmo que a obra carrega, te prendendo na história, mesmo que lentamente, logo de cara.

Imagem do filme Genius Loci. Na imagem é possível ver 2 sombras: do lado direito a de um cachorro, com seus olhos vermelhos e ao lado esquerdo, de uma mulher com seus olhos verdes.
O encontro final de Reine é como o despertar de um pesadelo para o espectador (Foto: Reprodução)

Dirigido por Adrien Merigeau, Genius Loci, indiretamente, traz muito sobre a cultura francesa; não só em representar a noite parisiense e seus protagonistas, mas por toda sua estrutura poética. O curta-metragem é uma obra-prima em meio às indicações da categoria do Oscar 2021. É por isso que a produção foi um tremendo sucesso nos festivais internacionais, recebendo 26 troféus. 

Genius Loci, portanto, é uma viagem espiritual que precisamos viver, assim como Raine teve que viver. Todo o caos, confusão e alucinações são difíceis de encarar, porém necessários. A imagem e sonoridade do curta-metragem carregam também facilmente o peso da indicação da Academia, que deve levar em conta o brilho da produção, mesmo ao lado de histórias mais concretas e doloridas dos concorrentes, como Se Algo Acontecer… Te Amo e Yes-People

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