Faz escuro quando Eu Vejo Você em Todos os Lugares

A imagem é uma cena do filme Eu Vejo Você em Todos os Lugares. Nela, há uma mão de um senhor apoiada em uma poltrona, com a mão de uma jovem tocando-a.
O filme de Bence Fliegauf integra a seção Perspectiva Internacional da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Fraktál Film)

Vitória Silva

De todos os dilemas que transpassam a humanidade, o diretor e roteirista Bence Fliegauf selecionou sete dos mais particulares e angustiantes para compor sua nova produção. Compondo a seleção da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, Eu Vejo Você em Todos os Lugares acompanha narrativas completamente distintas e desconexas, ambientadas em relacionamentos entre familiares, amigos e amantes, e que permeiam um peculiar caleidoscópio da substância humana. 

O longa, de certa forma, dá continuidade para outra obra do diretor, Rengeteg, escolhida para representar a Hungria no Oscar de 2003. A ligação é notória no próprio título original do filme de 2021: Rengeteg – Mindenhol Látlak. No entanto, esta de agora, ambiciosa demais ou talvez não o suficiente para instigar o público da mesma maneira que a que levou o diretor à disputa da estatueta mais relevante para o Cinema.

As sete histórias são divididas em esquetes, que duram em torno de 10 minutos. Sem um contexto prévio do que está sendo apresentado, elas funcionam como um ciclo, em que a primeira cena também é a última apresentada, e o que nos estimula a acompanhar até o desfecho final. De início, vemos uma conversa entre pai e filha sobre uma negligência familiar que culminou na morte da mãe. A atuação hipnotizante de Lilla Kizlinger, que foi reconhecida no Festival de Berlim como Melhor Coadjuvante, acaba por dar a falsa impressão de que as narrativas que virão em seguida podem ser tão interessantes quanto essa. 

A imagem é uma cena do filme Eu Vejo Você em Todos os Lugares. Nela, há uma mulher branca, com cabelos loiros com franja e usando uma argola com o rosto e o olhar voltado para o lado esquerdo.
Eu Vejo Você em Todos os Lugares não é a primeira vez do diretor na Mostra, que já esteve presente na 29ª edição, por seu filme Traficante (Foto: Fraktál Film)

Mas o que surge acaba por permear um aspecto ora banal, como a discussão entre namorados, ora bizarro demais, como o dilema da dificuldade de um casal engravidar. Os diálogos também por vezes são capazes de sustentar as pequenas histórias de Forest – I See You Everywhere, que necessitam entregar um impacto nos poucos minutos concebidos para cada uma, que, ao mesmo tempo, parecem ser mais longos do que a realidade. Além do aspecto da agressividade que atravessa grande parte das discussões, o filme tem como fio condutor o destino final de todas elas: a morte, que é o que está em todos os lugares. 

São essas peculiaridades da produção húngara que criam uma barreira para identificação com cada história, ao passo que o mais próximo que conseguimos atingir nessa conexão é na discussão entre uma mãe religiosa e seu filho ateu. Não fosse pela atuação e o estilo de filmagem com planos fechados e que acompanham o movimento de cada um dos personagens, remetendo a um formato documental, seria difícil acreditar que o que está tentando ser retratado ali é uma partícula da realidade cotidiana. 

A beleza do título de Eu Vejo Você em Todos os Lugares não condiz com sua narrativa sórdida e que entrega poucas respostas para muitos questionamentos. O excesso de morbidez presente no realismo da trama provoca uma bola de neve de angústias, que não deixa as devidas reflexões para nos compensar desse desgastante processo. Os cenários noturnos e a câmera movimentada são apenas um acréscimo para tornar a experiência proporcionada por Bence Fliegauf ainda mais cansativa. 

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