Cineclube Persona – Fevereiro de 2021

Arte retangular em cor azul bebê. No canto superior esquerdo foi adicionado o texto "cineclube persona" em fonte branca. Ao centro, está o logo do Persona. No canto inferior direito, foi adicionado o texto "fevereiro 2021" em fonte preta. Espalhadas pela arte, foram adicionadas quatro fotografias, dentro de molduras em tom roxo: uma foto do filme Malcolm & Marie, uma foto da cantora Karol Conká, uma foto do filme Nomadland, e uma foto da série Cidade Invisível.
Destaques de Fevereiro de 2021: Cidade Invisível, Nomadland, Malcolm & Marie e a passagem de Karol Conká pelo BBB 21 (Foto: Reprodução/Arte: Ana Júlia Trevisan/Texto de Abertura: Vitória Silva)

Em um contexto ainda atingido pela pandemia de covid-19, a largada da temporada de premiações foi dada mais tardiamente em 2021. O mês de Fevereiro se encerrou com o polêmico, e nem tão aclamado, Globo de Ouro. Nesse ano atípico, os filmes elegíveis poderiam ter sido lançados no próprio mês do evento, e muitos dos que chegaram nos minutos finais acabaram concorrendo e, até mesmo, levaram a estatueta para casa. Foi o caso de Nomadland, que conquistou duas das categorias principais e é uma das principais apostas para o Oscar 2021.

Mais uma vez, a Netflix está com tudo entre os concorrentes da temporada, mas com candidatos nem tão promissores. Relatos do Mundo, produzido pela Universal Pictures, chegou esse mês ao catálogo e ganhou duas indicações ao Globo, porém sem sucesso, enquanto o complicado Malcolm & Marie não conquistou nem uma nomeação. Por outro lado, I Care A Lot (Eu Me Importo) foi um dos grandes lançamentos do mês e surpresas da noite, e deu a primeira estatueta de Rosamund Pike.

Fora do universo dos tapetes vermelhos, o serviço de streaming entregou o controverso capítulo final da saga de Lara Jean, com Para Todos Os Garotos 3: Agora e Para Sempre, e seu maior produto nacional até agora, com a estreia da série Cidade Invisível. Fevereiro também foi um mês para a Apple TV+ trazer grandes lançamentos, a nova temporada de Dickinson foi mais uma vez bem recepcionada pela crítica, assim como o documentário Billie Eilish: The World’s a Little Blurry, que se aprofunda na vida da estrela em ascensão Billie Eilish.

Nesse extenso período de isolamento, observar o cotidiano alheio nunca foi tão interessante. Pudemos ver novamente Selena Gomez se estabanar na cozinha com seu reality show Selena + Chef, da HBO Max. E, em terras brasileiras, a luta pela saída da Karol Conká do BBB 21 conseguiu unir a nação de uma forma nunca antes vista nos últimos tempos.

Cineclube de Fevereiro traz os grandes lançamentos do mês do mundo audiovisual. Aqui você confere os filmes aclamados e massacrados pelo público, séries que terminaram de ter seus episódios exibidos (WandaVision há de aguardar o seu momento), e grandes produções televisionadas. Tudo isso com a curadoria da Editoria e colaboradores do Persona.

Cinema

Cena do filme Relatos do Mundo. No primeiro plano da imagem, à esquerda, temos Johanna, uma menina de mais ou menos doze anos, baixa e de cabelos loiros, vestindo um vestido puído e um chale marrom com uma faixa vermelha. À direita, temos o Capitão Kidd, um homem branco, de mais ou menos sessenta anos, de barba grisalha, vestindo um colete preto, calça, casaco e um chapéu velhor marrons e montando um cavalo marrom. Com a mão direita, ele puxa um cavalo preto, que vem atrás, carregando sacos na sua lombar. Ao fundo, temos vários homens usando vestimentas semelhantes a do Capitão Kidd, espalhados pelo campo de grama batida e terra, cavalos e carroças carregadas de sacos. Em último plano, temos a silhueta de montanhas.
Relatos do Mundo foi indicado ao Globo de Ouro 2021 nas categorias de Melhor Trilha Sonora e Melhor Atriz Coadjuvante, para Helena Zengel (Foto: Reprodução)

Relatos do Mundo (News of the World, Paul Greengrass)

“Um faroeste com Tom Hanks” é sinopse suficiente para atrair qualquer um. Ainda mais em um catálogo cheio de opções “tanto faz” da Netflix. Relatos do Mundo, que se não fosse uma pandemia estaria em todas as salas de cinema ao invés do streaming, chamou atenção do espectador – e até do Globo de Ouro -, mas não atende a expectativa que cria. Para além da descrição superficial, na trama, que se passa após a Guerra de Secessão, o Capitão Jefferson Kyle Kidd (Tom Hanks) viaja o sul dos Estados Unidos lendo notícias aos moradores locais. 

Quando topa com Johanna (Helena Zengel), uma menina alemã capturada e criada pelo povo indígena Kiowa, ele decide que é seu dever percorrer mais de 600 quilômetros para levá-la em segurança à sua família biológica. Apesar do leque de possibilidades que o contexto histórico abre para a narrativa, como a proibição do porte de armas no sul e a recente abolição da escravatura, consequências da guerra para os derrotados, o diretor Paul Greengrass opta pelo óbvio: explorar a inevitável relação emocional que se formará entre os dois ao longo da jornada. Nem a profissão de Kidd, que logo de cara desperta a curiosidade, evolui para além de um pano de fundo. 

Mesmo com os bang-bangs em escassez e com a previsibilidade da narrativa, que não surpreende nem no final, o espectador só não se decepciona pelas performances de Tom Hanks e Helena Zengel, que trabalham bem seus personagens e, com os nuances de cada um, despertam certo interesse. O trabalho do cinematógrafo Dariusz Wolski também se destaca, com uma fotografia que torna as paisagens fim de mundo típicas do gênero deslumbrantes. Embora não chegue nem perto de atingir todo o seu potencial, Relatos do Mundo é uma boa para aqueles que se contentam em apreciar o veterano de Hollywood em ação e descobrir mais do talento da revelação mirim alemã. – Vitória Lopes Gomez


Cena do filme Nomadland. A imagem é ampla e se situa em um deserto. No chão, existe uma grama seca e o céu está colorido em tons de azul, rosa e lilás, enquanto o sol se põe. No canto direito, vemos uma mulher carregando uma lamparina, vestindo um casaco preto e caminhando em direção ao lado esquerdo da imagem. Ao fundo da imagem, existe uma tenda e alguns carros estacionados.
A produção mais aclamada do ano está sofrendo censura na China, país de origem de sua realizadora (Foto: Reprodução)

Nomadland (Idem, Chloé Zhao)

Qualquer pessoa que assuma a difícil tarefa de falar sobre Nomadland certamente ficará sem palavras. O drama mais aclamado da temporada é de um cinema que é algo além, que, valendo-se de sutileza e precisão magistrais, conta a história de uma vítima de um colapso econômico de uma cidade do interior de Nevada em sua jornada por sobrevivência – tanto física quanto emocional. O grande vencedor do Globo de Ouro e do Critics Choice Awards (e, com fé, de todas as outras premiações que os seguirem até o Oscar) é baseado em um livro homônimo de Jessica Bruder, que foi adaptado e dirigido pela genial e já lendária Chloé Zhao

Não satisfeita em conduzir brilhantemente cada detalhe da base do filme, Zhao também dirige a grandiosa Frances McDormand, que compõe, com destreza e delicadeza, cada nota da peça principal da orquestra de Nomadland e uma das melhores atuações que você vai assistir na vida, sentida direta, física e silenciosamente no nosso coração. Muito, muito, muito longe de cair numa obra torturante, as alegrias do filme também são genuínas e, depois de um ano vivendo no isolamento social, elas são especialmente belas, nos lembrando de como é boa e importante a vida em comunidade.

Desde sua concepção mais original até sua transposição para o cinema que envolve aspectos como a escrita, a direção, a atuação e produção, o longa é uma orquestra regida por mulheres que estão em perfeita sintonia. Elas, em domínio pleno de seus ofícios, estão em outro nível, outra vibração, outra dimensão, e bondosamente as compartilham conosco através do Cinema. – Raquel Dutra


Cena do Filme Host. Na imagem está representada uma tela de uma videoconferência feita pelo zoom, com cinco telas de computador. Da direita para esquerda, e de cima para baixo, a primeira tela, uma mulher de expressão assustada que possui cabelos loiros numa maria chiquinha e pele clara. Na segunda, uma mulher assustada com a mão no rosto, ela possui cabelo castanho longo e pele clara. Na terceira, uma mulher com o rosto parcialmente na tela, ela possui traços asiáticos, usa óculos, cabelo preto liso e pele clara. Na quarta, uma mulher com a mão na testa e expressão aflita, ela tem cabelos castanhos ondulados e pele morena. Na última tela, apenas uma mão está representada, apontando para um corredor escuro.
Host insere horror ao horror que são as reuniões online (Foto: Reprodução)

Host: Cuidado Com Quem Chama (Host, Rob Savage)

Investindo em um formato atual e inteligente, já visto antes em filmes como Amizade Desfeita, Buscando… e na série de comédia Modern FamilyHost, além de ter sido gravada durante a pandemia, possui uma narrativa contada a partir da tela de um notebook, mas, não se engane, os pontos positivos do filme acabam aí. Com uma história, personagens e sustos apenas ficando no plano básico, o filme de terror desperdiça todas as oportunidades para se destacar nesse formato.

Apesar de se passar inteiro numa tela e num contexto curioso, com os personagens no meio do isolamento social, o erro da obra é não sair da guia da reunião feita no Zoom. Mesmo com o estilo clichê de terror mais simples, onde os personagens morrem um por um em cenas cheias de tensão, a história não investe em detalhes ou nos recursos que o ambiente online oferece, com a única indicação desse formato sendo o aumento no volume da tela.

A trama acontece a partir de uma sessão (online) espírita que dá errado, e o terror se faz com momentos de susto rápido, estilo joguinho do labirinto do exorcista com direito a demônios de cara feia, e uma justificativa preguiçosa para a razão dos acontecimentos sobrenaturais. Host fica na sombra de obras que foram gravadas dessa mesma forma, e, infelizmente, a desculpa do isolamento não justifica a chatice de mais esse meeting na vida da gente. – Isabella Siqueira


Foto promocional do filme Nova Ordem Espacial. Os quatro personagens principais, da esquerda para a direita: Bubs (Yoo Hae-Jin), um robô humanóide usando uma camiseta amarela e apoiando um arpão no ombro; a capitã Jang (Kim Tae-ri), usando uma jaqueta batida por cima de uma camiseta vermelha e segurando um rifle futurista apontado para baixo; Tae-ho (Song Joong-Ki), o piloto, com uma jaqueta e camisa azuis e uma arma apontada para frente e, por fim Park Tiger (Jin Seon-kyu), o engenheiro, usando uma camiseta amarela velha por baixo de suspensórios e com uma machadinha apoiada em seu ombro.
Os sucateiros astronautas da Nova Ordem Espacial dão charme e identidade à produção sul-coreana da Netflix (Foto: Reprodução)

Nova Ordem Espacial (Seungriho, Jo Sung-hee)

Lançado no início do mês pela Netflix, Nova Ordem Espacial é considerada a primeira space opera sul-coreana, narrando as desventuras de um grupo de sucateiros espaciais desajustados à bordo da nave Victory, que encontram, por acaso, uma andróide capaz de mudar o mundo.

A direção de arte é uma amálgama de diferentes referências visuais que vão desde Star Trek até Cowboy Bebop, mas que são remixadas de maneiras inovadoras. O filme é ancorado por uma narrativa emocional que, apesar de não ser nada original, nos faz ter apego ao seu elenco de personagens problemáticos e desiludidos, com destaque para Kim Tae-ri (A Criada), no papel da capitã Jang, e Song Joong-Ki como Tae-ho, o piloto com um passado sombrio.

Como todo bom bando de aventureiros, a tripulação da Victory passa por inúmeros perrengues na sua busca por fazer dinheiro no futuro brutal e apocalíptico de 2092, passando por caçadas em espaçonaves e tiroteios em bares inundados por neon. Apesar de indulgir em vários clichês do gênero, Nova Ordem Espacial nunca perde de vista sua mensagem de rebeldia e esperança hopepunk: bilionários e corporações estão matando a Terra e a união da classe operária é a única maneira de impedi-los. Possivelmente usando espaçonaves. E lasers. Gabriel Oliveira F. Arruda


Cena do filme Para Todos os Garotos 3: Agora e Para Sempre. Na imagem a protagonista Lara Jean, interpretada por Lana Condor, está em uma tenda de casamento com a decoração de luzes e flores. A atriz está no centro da imagem, ela veste um vestido rodado azul e segura um anuário na cor azul. Lana Condor é uma atriz do Vietnã e possui cabelo escuro, e na foto o seu cabelo está preso.
Em Para Todos os Garotos 3: Agora e Para Sempre, Lara Jean vai para Coreia do Sul e para Nova York (Foto: Reprodução)

Para Todos os Garotos 3: Agora e Para Sempre (To All The Boys: Always and Forever, Michael Fimognari)

Se despedir de algo é realmente dolorido, mas algumas despedidas são necessárias. Nesse mês, tivemos que dar tchau para Lara Jean e Peter Kavinsky, e a finalização da história dos dois adolescentes trouxe mais fofura para a Netflix. Trazendo inveja aos solteiros no Valentine’s Day, Para Todos os Garotos 3: Agora e Para Sempre estreou no dia 12 de fevereiro, e acredito que cumpriu as expectativas. 

A história do último filme pode ser um pouco enjoativa, os protagonistas escondem problema,  ficam enrolando para uma conversa franca, e a espera pela aprovação nas universidades faz com que o futuro do casal fique indeciso. O filme, que era para ser leve, acaba sendo puxado e cansativo para uma comédia adolescente romântica.  Mas é aquela história que todo mundo já conhece e no final dá tudo certo. 

Nessa última adaptação, a produção supera os outros filmes, tendo até animações em alguns momentos deixando o filme com uma estética graciosa.  Porém, a conclusão da história não ganha como a melhor, esse prêmio já pertence ao primeiro. Não dá para negar o desejo por esse amor irreal de Lara e Peter, só queremos que eles sejam felizes agora e para sempre bem longe de novas adaptações. – Ana Beatriz Rodrigues


Imagem do filme Tim Maia. Num palco, o ator Babu Santana, um homem gordo e negro, de cabelos crespos num penteado black power, interpreta Tim Maia. Ele veste uma camisa preta com o peito desabotoado e um blazer também preto. Ele está ao centro da imagem, cantando com um microfone à sua frente. Ao fundo, pode-se ver um baterista desfocado e a iluminação se dirige ao artista. A imagem é colorida em tons de marrom e amarelo.
O filme que retrata a vida de Tim Maia, de 2014, foi resgatado pela Netflix em fevereiro (Foto: Reprodução)

Tim Maia (Mauro Lima)

A cinebiografia do Rei do Soul Brasileiro, protagonizada pelo campeão moral do BBB 20, foi um dos resgates do mês da Netflix. O filme de 2014 foi adaptado do livro Vale Tudo – O Som e a Fúria de Tim Maia, de Nelson Motta, através do roteiro e direção de Mauro Lima (Meu Nome Não É Johnny) e da atuação do querido Babu Santana, acompanhado de um elenco de peso vindo da televisão brasileira.

Sem rodeios, Tim Maia é desenhado na tela com toda a potência que era, tanto criativa, quanto autodestrutiva. O texto não poupa os problemas do artista com álcool e drogas, não apaga seu brilho, ousadia, nem sua personalidade explosiva. Também não disfarça as situações externas que agravaram os problemas de Tim, que é interpretado enquanto jovem de forma morna por Robson Nunes. 

Babu, por sua vez, nasceu para vivê-lo, e faz tudo com tanta beleza que o filme mais parece uma homenagem à existência grandiosa de Tim Maia em toda sua complexidade. Os mais de 120 minutos podem assustar, mas quem quiser mergulhar pode ir sem medo. O filme tem ritmo, tem enredo, tem beleza visual e tem personagens que seguram a responsa de reviver um dos maiores artistas do Brasil. – Raquel Dutra


Cena do filme Saint Maud. Nela vemos Maud, uma mulher jovem, branca e de cabelos castanhos, se olhando no espelho. Ela veste uma túnica marfim, maior que seu tamanho e toca seu crucifixo, pendurado no pescoço. Uma de suas mãos está enfaixada. Na cena, ainda vemos uma torneira, o contorno do espelho e prateleiras brancas atrás dela.
Saint Maud conseguiu várias indicações ao BAFTA 2021 (Foto: Reprodução)

Saint Maud (Idem, Rose Glass)

Saint Maud é um filme de sensações. Maud, a protagonista, interpretada com a cautela sacra de Morfydd Clark, é uma enfermeira particular obcecada em salvar a alma de sua paciente atual, uma mulher fadada à morte por sua doença degenerativa. A atmosfera de terror sobrenatural é abafada o tempo todo pela direção calculada de Rose Glass, estreante no ramo e que ainda assina o roteiro do filme.

Nada interessado em se enveredar ao terror gráfico, Saint Maud investiga os temores da personagem principal, sua busca por Deus e os martírios auto impostos para ficar mais próxima Dele. Até que ponto a religião significa prazer, e onde a linha da dor se sobrescreve? Pode ser que os noventa minutos não respondam diretamente às questões de Maud nem do público, mas a experiência de limpeza espiritual do filme faz valer a investida. E a cena final marca a fogo nossa mente. – Vitor Evangelista


Cena do filme Music. Maddie Ziegler está no centro da imagem. Ela é uma garota branca, de cabelo castanho claro e comprido, preso em duas tranças. Ela usa um fone de ouvido azul e amarelo. Do busto para cima, usa uma camiseta branca. O sol bate levemente em seu rosto, e ela olha pra cima.
Sia foi extremamente criticada por sua postura diante às críticas a Music (Foto: Reprodução)

Music (Idem, Sia)

O filme de estreia da cantora australiana não merece mais do que um parágrafo no hall de fevereiro. Music, em teoria, acompanha a personagem de Maddie Ziegler, uma garota autista não-verbal, depois que perde a avó e precisa viver com a irmã, uma ex-dependente química vivida por Kate Hudson. Entretanto, o musical escrito, dirigido e produzido por Sia é um desastre ofensivo e horrendo. Ziegler é neurotípica, e sua escalação é um desrespeito com a comunidade neurodiversa. O filme é terrível, com números musicais sem noção e desconexos com a trama. As atuações são medíocres, mesmo que Leslie Odom, Jr. esteja presente (sim, o ator incrível de Hamilton e Uma Noite em Miami…). Não há absolutamente nada de positivo nessa tragédia. Gaste seu tempo com algo mais útil, como contar quantos grãos de arroz existem em um pacote de 1kg. – Caroline Campos


Cena do documentário Billie Eilish: The World's A Little Blurry. Na imagem, Billie Eilish e sua mãe estão sentadas em um sofá. À esquerda, está a mãe de Billie, uma mulher branca de cabelos longos e castanhos claros, ela veste uma blusa cinza e está com o rosto virado em direção à filha. À direita, está Billie Eilish, uma mulher branca de cabelos castanhos escuros e compridos, ela veste um moletom vermelho e está falando com o rosto virado em direção à mãe.
A relação de Billie com sua família é um dos pontos mais aconchegantes do documentário (Foto: Reprodução)

Billie Eilish: The World’s a Little Blurry (Idem, R. J. Cutler)

Billie Eilish é uma das maiores revelações recentes do meio musical. Em paralelo com o lançamento de seus novos singles e videoclipes, a vencedora de cinco Grammys lançou, em parceria com a Apple TV+, sua primeira obra cinematográfica, sob direção de R.J. Cutler. O documentário Billie Eilish: The World’s a Little Blurry retrata o processo criativo do seu grandioso álbum WHEN WE ALL FALL SLEEP, WHERE DO WE GO? e os desenrolares da turnê do mesmo.

Diferente de outras produções de mesma temática, o filme tem um aspecto caseiro e nada ensaiado, apresentando o ponto de vista de familiares de Billie diante de sua carreira e escolhas profissionais. A cantora também não hesita em mostrar seus problemas pessoais, que vão desde algumas questões e desilusões amorosas, que toda adolescente passa, até seu enfrentamento diante da síndrome de Tourette

Billie Eilish: The World’s A Little Blurry é um convite de entrada para a mente conturbada e inovadora de Eilish. Poder passear por sua trajetória e ideias criativas nos ajuda muito a entender como uma jovem californiana alcançou o estrelato apenas gravando músicas direto do quarto do seu irmão mais velho. – Vitória Silva


Cena do Filme Judas e o Messias Negro. A imagem mostra o personagem Fred Hampton, interpretado por Daniel Kaluuya, um homem negro, ao centro e de costas. Ele tem os cabelos crespos curtos, veste uma jaqueta de couro, e está levantando a mão direita com o punho fechado em um púlpito. À sua frente, existe uma multidão de pessoas o assistindo e de pé repetindo o gesto.
Judas e o Messias Negro pode ser o filme responsável pelo Oscar de Daniel Kaluuya (Foto: Reprodução)

Judas e o Messias Negro (Judas and the Black Messiah, Shaka King)

Assim como o bordão de Fred Hampton, seu personagem central e líder político do partido dos Panteras Negras no auge da luta por direitos civis dos EUA da década de 60, Judas e o Messias Negro é revolucionário. Na narrativa, ao mostrar a história pelo olhar “do vilão” (com muitas aspas) traidor Bill O’Neal, que entregou a vida do líder ao FBI; no paralelo das histórias bíblicas, cooptadas pelo ocidente branco; nas escolhas de abordagem, que não suavizam estruturas de poder.

Conduzido pelas atuações inacreditáveis do messiânico Daniel Kaluuya – vencedor do Globo de Ouro e do Critics Choice Awards – e do perdido levado à loucura Lakeith Stanfield, o drama biográfico combina carga emocional – quase sempre segurada pela interpretação impecável de Dominique Fishback – com pontas de documentalismo, sem balela de neutralidade ou medo de ser radical. Tudo aqui é muito sincero em sua intenção de defender a memória de uma das facetas mais importantes da história recente da América, que é alvo de muito preconceito e desonestidade.  

Todos os elogios se estendem ao restante do elenco afiado, à direção de arte que fala por si só, à fotografia explícita e cúmplice, ao roteiro atento e à instância de produção, que carimba a importância de se ter os próprios grupos contando sua história. E se a narrativa é condizente à uma parábola para algo que aconteceu dois mil anos atrás, quem dirá permanecer fiel ao que se vê 60 anos à frente. Judas e o Messias Negro não se fecha em si, é verdadeiro no micro e no macro, retratando como as estruturas de poder reagem às movimentações que ameaçam rui-las. – Raquel Dutra


Cena do filme Minari. Uma família de sul-coreanos está na foto. Da esquerda para a direita: Jacob usa um boné vermelho, camisa de mangas compridas branca e calça marrom; David, um menino de 8 anos, está do busto para cima. Seu cabelo é preto e cobre sua testa; Soonja, uma senhora, usa uma camisa branca com figuras amarelas. Seu cabelo é castanho e curto; Monica, uma mulher adulta, usa blusa vermelha, e seu cabelo é preto e comprido; Anne, uma jovem, usa blusa branca com listras amarelas, azuis e vermelhas. Seu cabelo é preto e comprido. Ao fundo, vemos folhagens verdes.
Minari é quase uma autobiografia de seu diretor (Foto: Reprodução)

Minari – Em Busca da Felicidade (Minari, Lee Isaac Chung)

As memórias de Lee Isaac Chung germinaram em uma belíssima obra sobre sonhos e raízes. Minari possui uma trama simples – acompanhamos uma família sul-coreana na tentativa de se estabelecer em uma fazenda no Arkansas durante os anos 80. Ponto. Seria só isso se não fosse a ternura e a delicadeza com que a história do jovem David, sua irmã, seus pais e sua avó é contada. Jacob, chefe da família Yin, se dedica a sua plantação intensamente enquanto tenta conciliar seu papel de pai, suas aspirações e as brigas recorrentes com Monica. O casal é interpretado por Steven Yeun, dono de muitos corações com seu Glenn em The Walking Dead, e Yeri Han, que possui um ar contido e severo, sempre em contradição com o marido.

A luz brilhante de Minari, no entanto, é o nome mais novo que sobe os créditos. Alan Kim, com seus 8 aninhos, caiu no choro ao ganhar o prêmio de Melhor Jovem Ator no Critics Choice Awards. Não é para menos – o garotinho entrega um personagem multifacetado, que enfrenta a sombra da morte ao mesmo tempo que caminha pelos prazeres da infância. E não há nada melhor do que seu relacionamento com a avó recém-chegada da Coréia, vivida por Youn Yuh-jung. Quando os dois estão em tela, as lágrimas correm, sejam elas de gargalhadas ou de emoções extremas. Soonja se redescobre em David, que tem dificuldade de entender o porquê de só a avó dele falar palavrão e não assar cookies.

O roteiro, também assinado por Chung, é sutil em entregar o sonho americano almejado por Jacob. No ano seguinte à vitória de Parasita no Oscar, primeiro filme estrangeiro a alcançar a categoria máxima do homem dourado, Minari surge com a força de seus personagens e a universalidade de sua história. E, com todos os méritos, está sendo reconhecido nessa temporada de premiações. Ao lado do forte Nomadland,  o longa de Lee Isaac Chung tem tudo para conquistar estatuetas. Wonderful, wonderful minari. – Caroline Campos


Cena do filme Eu Me Importo. No centro da imagem, a atriz Rousamand Pike, mulher branca com cabelo curto e loiro, veste uma blusa vermelha e segura uma xícara na cor vinho. O fundo da imagem é um quadro branco com diversos retratos de idosos.
O elenco do filme conta também com Peter Dinklage, de Game Of Thrones (Foto: Reprodução)

Eu Me Importo (I Care a Lot, J Blakeson)

Eu Me Importo oscila entre ser instigante e, em outros momentos, até um pouco tedioso. Pelo sucesso nas redes sociais, a espera de um filme mais envolvente pode decepcionar um pouco. O enredo é algo que te faz ansiar muito mais pelo final, que foi justo com a obra mas pode não ter sido o que o público esperava. O longa retrata um esquema de golpes em idosos a partir de curadoria organizados por Marla Grayson (Rosamund Pike) e sua companheira Fran (Eiza González). Essa história começa a dar errado quando elas tentam cometer esse crime com uma idosa que não é tão boazinha quanto parece. 

Além de roubar idosos, Rosamund Pike acabou tomando para si o Globo de Ouro, que poderia facilmente pertencer a Maria Bakalova em seu papel na sequência de Borat. O filme teria tudo para ser um dos melhores, porém o envolvimento da protagonista com a máfia é estranhamente vergonhoso e a trama se perde ao decorrer dos minutos. 

O ápice da narrativa chega quase no encerramento e a reviravolta é atropelada. Mesmo assim, essa história é uma daquelas que faz o público se apaixonar pelo vilão. Expondo verdades grotescas de um sistema que não cuida de idosos, I Care a Lot finaliza com um desfecho vingativo para a protagonista  por se importar demais com si mesma. – Ana Beatriz Rodrigues


Imagem do filme Malcolm & Marie, ambientada no quarto do casal protagonista. A fotografia está em preto e branco. Na imagem, Zendaya, que interpreta Marie, está sentada na lateral de uma cama de casal, com as pernas abertas. Zendaya é uma mulher negra, com cabelos compridos, ela veste uma regata branca e um quimono. Sentado ao chão, entre as pernas de Zendaya, está John David Washington, que interpreta Malcolm. John é um homem negro, de cabelos curtos e barba rala, ele veste uma camisa branca, gravata, calça e sapato social.
Malcolm & Marie foi um dos primeiros filmes gravados durante a pandemia (Foto: Reprodução)

Malcolm & Marie (Idem, Sam Levinson)

Dirigido por Sam Levinson, mente criadora por trás de Euphoria, Malcolm & Marie retrata o relacionamento entre um cineasta e uma atriz, que têm seus nomes intitulados na produção e são interpretados por John David Washington e Zendaya, respectivamente. Com apenas os dois personagens compondo o elenco, a trama se ambienta na casa deles, após a noite de estreia do filme de Malcolm nos cinemas.

Remetendo muito a linha narrativa de História de um Casamento, por mostrar uma relação fragilizada pelas divergências e conflitos do casal, a produção se arrasta até o último segundo. O que poderia se resumir em uma cena de 20 minutos, acaba resultando em mais de uma hora de diálogos agressivos e exaustivos, com raras exceções, de um namoro totalmente destrutivo para ambos.

Filmado no contexto da pandemia de covid-19 e do isolamento social, os conflitos por detalhes mínimos podem ser bem compreensíveis para o atual momento que estamos vivendo, mas não convencem. Em compensação, a química entre os protagonistas é algo inegável, e um dos poucos fatores que captam a atenção, juntamente com a brilhante interpretação de Zendaya, que é uma desejável surpresa na corrida para o Oscar 2021. – Vitória Silva


Cena do filme Estados Unidos Vs. Billie Holiday. Nela vemos Andra Day, uma mulher negra. Seus cabelos estão presos e há uma flor branca em sua cabeça. Ela veste um vestido preto e seus braços estão abertos. À sua frente há um microfone. O fundo da imagem é preto.
A atriz e cantora Andra Day venceu o Globo de Ouro de Melhor Atriz – Drama pelo papel de Billie Holiday (Foto: Reprodução)

Estados Unidos Vs Billie Holiday (The United States vs. Billie Holiday, Lee Daniels)

Drama biográfico, essa é a definição original do filme Estados Unidos Vs Billie Holiday, que traz parte da história de uma das maiores cantoras de jazz do mundo. A trama relata a perseguição feita pela agência americana de narcotráfico à cantora após dar voz à canção Strange Fruit, que tem em suas entrelinhas um protesto sobre o linchamento de pessoas negras. Uma história necessária de ser contada teve o desprazer de receber a direção clichê de Lee Daniels, que apagou parte da personalidade de Billie em sua própria biografia. O trunfo da produção, sem dúvidas, é a atriz e cantora Andra Day.

Andra encarna Holiday de forma visceral. A preparação da atriz é pensada nos detalhes, como a voz rouca por causa do cigarro. As cenas nas quais a personagem usa drogas, Day ultrapassa atuação nos fazendo identificar a diferença entre prazer e dor. Os momentos referentes à prisão também se tornam memoráveis graças a atriz que se doa por inteira e de forma poderosa à narrativa. Seu olhar fixo ao cantar músicas que exigiam uma maior atenção acerta em cheio quem está assistindo ao filme. Andra Day é impecável do começo ao fim, e sem ela Estados Unidos Vs Billie Holiday não chegaria às premiações. – Ana Júlia Trevisan

 

TV

Foto de Karol Conká no estúdio depois de ser eliminada do BBB 21. Karol é uma mulher de 35 anos, negra, de cabelos trançados e com os lados da cabeça raspados. Ela usa blusa branca e brincos em forma de trapézio, de cor creme. Ela sorri olhando para o lado e segura um microfone com a mão direita. O fundo do cenário é azul, e no canto inferior direito está o logotipo da Globo, cinza no formato da bola e colorido dentro, com o Ao Vivo em cinza destacado acima.
Abuso psicológico não é entretenimento (Foto: Reprodução)

Eliminação de Karol Conká (BBB 21, Rede Globo)

Aconteceu. O país se mobilizou nas semanas iniciais do Big Brother Brasil 21 com um objetivo único em mente: precisamos tirar a cantora da casa mais vigiada do Projac. Fatores não faltaram para Karol cair na desgraça dos espectadores, teve xenofobia contra Juliette, teve bifobia contra Lucas Penteado e teve abuso psicológico com todo e qualquer um que se opusesse à curitibana.

A água bateu quando, junto de Lumena, Nego Di e Pocah, ela causou a desistência de Lucas do programa, antes mesmo do segundo paredão. A partir daí, Jaque Patombá (sarcástico apelido dado no Twitter e que virou consenso na internet) cavou a própria cova, mas não sem antes enforcar seu estimado Gabinete do Ódio. Para começar, o otimismo transformou-a em Líder, indicando Sarah, que puxou e eliminou o Inimigo do Riso. Karol então caiu de bunda no Paredão seguinte, que fez história no reality. Eliminada com 99,17% dos votos, Karol Conká foi embora. Tchau, Mamacita.

A Globo mexeu seus palitos, teve comercial longo demais, teve roteiro no Mais Você e teve bateção de ponto no Faustão e no Fantástico. Karol saiu e acabou. Não existe espaço para linchamento, ameaça ou o racismo escancarado que tirou Lumena da casa e tem tudo para fazer o mesmo com Projota daqui alguns dias. O BBB21 mobilizou o Brasil como o até então imbatível BBB20 não havia conseguido. Será mesmo que foi por conta do senso de justiça social, ou apenas uma maneira ‘legitimada’ de propagar preconceito? A resposta é clara. – Vitor Evangelista


Fotografia da cantora Britney Spears. Ela aparenta ter por volta de 20 anos quando a foto foi tirada. É uma mulher branca, de cabelos loiros, e traços suaves. A mão de uma pessoa está arrumando seu figurino e ela olha diretamente para a câmera. Ao fundo, há o espelho do camarim desfocado com as luzes acesas.
O documentário Framing Britney Spears é um episódio da série The New York Times Presents, transmitida originalmente pela FX on Hulu (Foto: Reprodução)

Framing Britney Spears (The New York Times Presents, FX on Hulu)

O mundo está de olhos em Britney Spears há muito tempo. O Clube do Mickey foi só uma pontinha do que o futuro guardava para a estrela em ascensão. O sucesso estrondoso de seu debut, que deslanchou sua vida como pop star, cravou na história seu título de Princesa do Pop, e, nos anos seguintes, Spears governou como tal e cresceu como pessoa. Porém, assim como um pai controlador e ciumento, o mundo – e principalmente os Estados Unidos – não aceitaram que sua garotinha não era mais uma garotinha

De repente, as mesmas vozes que gritavam eu te amo passaram a gritar palavras de ódio, a duvidar da índole de Britney, de seu caráter, e até da capacidade de criar seus filhos. Seu corpo foi questionado, sua sexualidade, seu rosto, seu envelhecimento, seus relacionamentos, sua carreira e sua maternidade. A imprensa e os tabloides de fofoca não a deixavam em paz; o machismo transbordava nos comentários sobre sua vida; as produções midiáticas zombavam de todas as suas características físicas e psicológicas; e sua família ainda enxergava na filha uma máquina de fazer dinheiro. Assim como qualquer pessoa tem seus limites, Spears também tem. O resto da história você já sabe: uma cabeça raspada e um guarda-chuva, e um processo judicial para retirar as liberdades individuais da cantora e entregar para seu pai. 

Framing Britney Spears, do The New York Times, é apenas uma minúscula fração de desculpas que a imprensa estadunidense e mundial deve à Britney. Já vimos alguns tabloides se desculparem, e muitos dos telespectadores que atiraram pedras no passado hoje as recolhem com vergonha. Mas as consequências prevalecem: a tutela de seu pai Jamie Spears, que controla a vida da artista, a colocou em uma condição quase literal de marionete. A justiça é lenta e às vezes parece estar do lado de Jamie, enquanto Britney apenas pede pela sua liberdade, então cabe a nós assumirmos essa luta, também por outras pessoas que se encontrem na mesma situação mas não sejam famosas. É o mínimo a fazer por tudo que o mundo deve à Spears. #FreeBritney – Jho Brunhara


Cena da série Cidade Invisível. Nela vemos a atriz Alessandra Negrini, uma mulher adulta, branca e com cabelo castanho comprido. Ela usa um vestido azul e uma capa com diversos detalhes. Ao redor da atriz há várias borboletas na cor azul voando. Essa cena ocorre dentro de uma sala de necrotério na cor cinza, com detalhes em azul-escuro e com as janelas e porta de vidro.
A trama da série é inspirada em uma história de Carolina Munhóz e Raphael Draccon, com adaptação de roteiro de Carlos Saldanha (Foto: Reprodução)

Cidade Invisível (1ª temporada, Netflix)

Após Bom dia, Verônica, a Netflix acertou em outra produção brasileira. Cidade Invisível chegou prometendo levar o folclore brasileiro ao mundo com Marco Pigossi e Alessandra Negrini. Os sete episódios conseguem viciar, e a abstinência da série chega rápido com o final, que deixa diversas dúvidas. Mas, antes do encerramento, a produção acumulou diversos pontos positivos. A trama foi bem desenvolvida, e a mistura de suspense, investigação e o folclore mostrou um ótimo resultado. 

O sucesso no Brasil e no mundo foi garantido, entretanto, as ocupações em diversos Top 10 vieram também com várias críticas. O folclore brasileiro é fruto das culturas nativas do nosso país, porém há falta de representatividade indígena na produção e no elenco da série. Além disso, os gringos vão continuar só conhecendo o Rio de Janeiro e São Paulo se todos os grandes produtos não saírem desse eixo. E Cidade Invisível era uma ótima oportunidade para explorar as outras regiões do país. 

Mesmo com esses grandes erros, assistir à série pode ser uma boa experiência. Conhecer uma Cuca sem ser um jacaré gigante, e o Boto ser mais bonito do que imaginaríamos, pode trazer uma maior curiosidade sobre histórias que escutávamos quando éramos crianças. Os efeitos especiais também são incríveis, e a representação do Curupira com seu cabelo de fogo é surpreendente. Em Cidade Invisível, ficamos encantados com a Iara, demos risada com o Saci e nos apavoramos com o Corpo Seco. Porém, a melhor sensação é saber que mais pessoas possam conhecer as histórias do nosso país.  – Ana Beatriz Rodrigues


Cena da segunda temporada da série Dickinson. À direita, Emily, interpretada por Hailee Steinfeld, vestida com um vestido simples e branco, olha preocupada para Sue, interpretada por Ella Hunt, à esquerda. Diferente de Emily, Sue usa um vestido dourado suntuoso, com o cabelo armado para cima. Ela olha sem entender para Emily enquanto segura suas mãos. A cena se passa dentro de uma sala de estar, com as janelas fechadas por cortinas semitransparentes e a iluminação suave de uma lareira iluminando as duas figuras.
Emily e Sue se distanciam cada vez mais durante a segunda temporada de Dickinson, em mais de uma maneira (Foto: Reprodução)

Dickinson (2ª temporada, Apple TV+)

A segunda temporada de Dickinson, a romantização anacrônica da vida de Emily Dickinson, terminou no final de fevereiro, após uma série de críticas positivas que conquistaram os almejados 100% no Rotten Tomatoes e uma renovação antecipada para a terceira temporada ainda em 2020. A queridinha dos assinantes da Apple TV+ voltou com tudo e mais um pouco.

Com ainda mais enfoque na estética irreverente e rebelde, a showrunner Alena Smith consegue usar as lacunas na vida da reclusa poeta (interpretada por Hailee Steinfeld) para tecer uma narrativa poderosa e até mesmo surreal sobre a natureza da fama, da arte e do motivo pelo qual perseguimos ambas. Assombrada pelo fantasma de Ninguém e pela figura carismática e traiçoeira de Sam Bowles (Finn Jones), Emily terá de decidir que tipo de poeta ela quer ser, e o que ela está disposta a dar em troca dessa fama. A figura reinventada de Sue Dickinson (Ella Hunt) também é um dos pontos chaves da temporada, se desenvolvendo sutilmente ao longo dos 10 episódios e culminando em alguns de seus momentos mais explosivos e emocionantes.

Um elenco de personagens secundários extremamente bem desenvolvidos e aparições especiais de figuras como o Ceifador (mais uma vez interpretado por Wiz Khalifa) e o fantasma bêbado e com tesão de Edgar Allan Poe (Nick Kroll) ajudam a cimentar essa comédia familiar esquisita e extremamente bem escrita como um dos carros chefes do streaming da Apple. – Gabriel Oliveira F. Arruda


Cena da série Mr. Mayor. Nela, vemos o prefeito Neil, interpretado por Ted Danson, numa sala de aula, sentado com os jovens na mesa e fazendo um sinal de positivo com a mão direita. Neil é um homem branco, idoso e de cabelos grisalhos. Ele usa óculos de grau com armação redonda e preta e veste um terno cinza claro com gravata azul.
Mr. Mayor acaba sem qualquer desfecho ou ponta solta, então é possível que a série retorne ainda esse ano com uma parte 2 da temporada (Foto: Reprodução)

Mr. Mayor (1ª temporada, NBC)

Mr. Mayor foi idealizada como um spin-off de 30 Rock, mas o projeto não foi para frente. Muitos anos depois de sua concepção original, a dupla imbatível Tina Fey e Robert Carlock reformulou o núcleo da comédia e escalou Ted Danson, recém-saído do Bom Lugar, como o prefeito de Los Angeles e protagonista dessa sitcom da NBC.

O resultado é frustrante. Para ser justo, Mr. Mayor tem todos os atributos para ser uma comédia de sucesso, só que dez anos atrás. O texto é óbvio demais e moderno demais, tem TikTok, tem cancelamento, tem a bobeira que a TV aberta dos EUA adora adotar e chamar de refinado. Ted Danson fala e se move em cena exatamente igual a como fazia em The Good Place, nem o figurino muda. 

A comédia é uma grower em potencial (quando o amor cresce ao passar dos episódios), mas o rápido contrato de 9 capítulos na temporada inicial não parece um bom sinal para a produção. Dedos cruzados para Tina Fey acordar com boas ideias para um eventual ano dois e colocar Mr. Mayor nos eixos. Por agora, é melhor reassistir 30 Rock e Unbreakable Kimmy Schmidt. – Vitor Evangelista


A cantora Selena Gomez, uma mulher branca, de cabelo moreno, está sorrindo na cozinha de sua casa, usando um vestido vermelho com detalhes de flores. Atrás dela, há uma parede de tijolos brancos e um fogão com uma panela rosa, uma forma azul e alguns potes. A cantora apoia a mão em uma tábua e há uma caneca rosa ao seu lado. Suas unhas estão pintadas de branco.
Nossa Palmirinha texana está linda (Foto: Reprodução)

Selena + Chef (2ª temporada, HBO Max)

Selena + Chef foi um sucesso e a HBO Max resolveu nos presentear com mais uma temporada. Nesta segunda parte, os chefes ainda tentam aprimorar os dotes culinários de Selena Gomez, mas os desastres na cozinha para fazer bons pratos não mudam. E a atração mais esperada continua: o “papa”, como a cantora chama seu avô, participa dos dez novos episódios da série. Após quase perder um dedo e ganhar uma conta no Instagram especialmente para suas exóticas facas de cozinha, Selena está de volta para entreter mais um pouco. 

Necessariamente remoto, leve, diferenciado e perfeito para relaxar a mente sozinho ou com a família, o programa persiste em seu formato certeiro. De praxe, a cantora não deixa de reverter seus trabalhos à uma boa causa. A cada final de episódio, a texana ainda pede para um chef apoiar uma organização de caridade de sua escolha e a mesma doa uma quantidade de dinheiro para diferentes necessidades. Se existe um fato sobre Gomez é que ela jamais deixará de apoiar causas em que acredita, seja nos palcos, cinemas e até mesmo na cozinha.

O mais notável da série é o público ter o privilégio de conhecer melhor Selena. A cantora é restrita e não aparece muito em suas redes sociais, não dá as caras a não ser que seja a trabalho. O programa dá espaço para entrar na casa dela e ter contato com a artista, amigas e familiares em um bom bate-papo dos renomados chefs de cozinha que, além de questões culinárias, sempre a questionam sobre sua vida pessoal. Até mesmo ligar para Taylor Swift, uma de suas melhores amigas, através do FaceTime, o programa já proporcionou. Para quem a quer conhecer melhor, Selena + Chef é um prato cheio. – Giovana Guarizo


Cena da série Por Trás de Seus Olhos. Na imagem, a personagem Adele, interpretada por Eve Hewson, está ao centro. Ela é uma mulher branca, de olhos azuis, cabelos lisos escuros e curtos e veste uma camisa branca por baixo de um avental. Ela segura uma faca com a mão direita e a apoia no ombro esquerdo. Ela olha para fora da imagem, à esquerda, e está em cima cozinha. Atrás dela, é possível observar um conjunto de armários e uma pia, desfocados. A imagem é toda colorida em tons de cinza e azulados
Por Trás de Seus Olhos, suspense protagonizado por Eve Hawson, filha do vocalista do U2, é a sensação do momento da Netflix (Foto: Reprodução)

Por Trás de Seus Olhos (Behind Her Eyes, Minissérie, Netflix)

Surpresa nem sempre é boa e não só de reviravoltas se faz um suspense, e Por Trás de Seus Olhos está aí pra comprovar isso. A produção da Netflix baseia-se no best-seller homônimo de Sarah Pinborough e se vende como um suspense psicológico, entregando, na verdade, uma base em fantasia que não cola e um humor que não vira, falhando, assim, com boa parte dos pressupostos do gênero.

Ritmo, roteiro bem dosado e direção segura são elementos que a minissérie desconhece. As estonteantes Eve Hawson e Simona Brown seguram até onde dá o roteiro esquisito e criam uma dinâmica para suas personagens que segue até a última cena, sendo a verdadeira joia do suspense. Tom Bateman, entretanto, não consegue superar a limitação do texto e imprimir verossimilhança da terceira parte do triângulo amoroso que fundamenta a história. 

Se você valoriza o inesperado acima de tudo e gosta de narrativas que jogam pela janela todas as crenças que você constrói sobre elas, o play pode até valer a pena, desde que você esteja com paciência para relevar a falta de liga da minissérie. Se você não dispensa algo bem amarrado que gradativamente chega ao ápice, talvez não de forma tão surpreendente mas mais fiel à história que o suspense construiu entre o primeiro episódio e a reviravolta final, é melhor não perder seu tempo e (re)assistir Little Fires Everywhere. – Raquel Dutra


Cena da série How To Get Away With Murder. Na imagem estão, da esquerda para a direita, os personagens Asher, Connor, Laurel e Michaela, ao fundo de uma sala de aula. Asher é um homem branco, de cabelos castanhos curtos, ele veste um terno, uma camisa xadrez e calça social. Connor é um homem branco, de cabelos castanhos escuros lisos e barba rala, ele veste uma camisa azul, jaqueta e uma calça social. Laurel é uma mulher branca de cabelos castanhos lisos escuros e compridos, olhos azuis, ela veste um terno cinza escuro, blusa preta e calça marrom. Michaela é uma mulher negra, de cabelos pretos, lisos e compridos, ela veste blusa branca com flores, terno bege e uma calça jeans.
O detestável esquadrão de Annalise Keating (Foto: Reprodução)

How to Get Away With Murder (6ª temporada, Netflix)

A terrível última temporada de How to Get Away With Murder finalmente chegou ao catálogo da Netflix. Uma narrativa que já não tinha nada a oferecer há um bom tempo foi extraída até o último segundo para entregar capítulos medíocres do início ao fim.

Pegando o gancho do ano anterior, os roteiristas não se esforçaram nem um pouco para entregar uma conclusão decente, e apenas reciclaram casos do passado. O cansativo conflito com os Castillo, o retorno do fantasma do Sam (Tom Verica), e familiares que surgem apenas para atrapalhar tudo. E, mais uma vez, o mundo todo está contra Annalise Keating (Viola Davis) e os malas dos seus alunos não se dispõem nem a ajudar. 

A brilhante atuação de Viola Davis não necessita de mais elogios, e entrega pela sexta vez um dos únicos pontos altos da temporada. Ao seu lado, uma das principais motivações para se enfrentar cada um dos episódios é a performance majestosa de Cicely Tyson, e sua última atuação em vida, que rendeu a única indicação da série ao Emmy 2020. Para quem já chegou até o quinto ano da série, o melhor a se fazer é assistir o mais rápido possível para se livrar dessa bomba.  – Vitória Silva


Foto do Hotel Cecil. O hotel é bege, com uma grande placa vermelha no que anuncia HOTEL CECIL - LOW DAILY WEEKLY RATES - 700 ROOMS. A fachada está desgastada e o céu no fundo é azul.
Vez ou outra, o documentário tentar culpar a pobreza de Skid Row pelos problemas do hotel (Foto: Reprodução)

Cena do Crime – Mistério e Morte no Hotel Cecil (Crime Scene: The Vanishing at the Cecil Hotel, Minissérie, Netflix)

A história é conhecida: em 2013, a jovem Elisa Lam desapareceu em Los Angeles sem deixar nenhuma pista. Ela estava hospedada no infame Hotel Cecil, localizado no centro da cidade e famoso pelas mais variadas formas de violência que já ocorreram em seus quartos. Alguns dias depois, os hóspedes notaram a falta de pressão e o estranho gosto da água. Elisa estava morta na caixa d’água do hotel. O desenrolar chocou a todos – polícia, mídia, stalkers, teóricos da conspiração. Não cabe aqui os detalhes da história, extremamente triste, de Elisa.

O que poderia ter sido um documentário interessante sobre a canadense se tornou um desrespeito. Ao invés de elucidar os fatos e prestar uma homenagem, o diretor Joe Berlinger criou suspenses desnecessários, enrolou até o limite por quatro episódios, e o pior: deu voz aos detetives fanáticos e desesperados da internet. Por trás do estranho desaparecimento de Elisa, os “detetives” criaram milhares de teorias, argumentos e passaram a ignorar provas, atrapalhar a investigação e acabar com a vida de pessoas aleatórias que eles supuseram estar envolvidas. Para terminar de massacrar a sua minissérie, Berlinger ainda chamou os youtubers e teóricos para darem seus depoimentos. O diretor resolveu dar mais palco às pessoas que, em nome da justiça por Elisa, atormentaram a vida de seus familiares e dos investigadores.

O resultado foi desastroso. A linha narrativa é brega, confusa e de mau caráter. Principalmente após introduzir o vídeo bizarro da jovem no elevador do hotel, Joe Berlinger dá espaço para a chamarem, novamente, de “arma biológica”, “possuída” e outras suposições enterradas da época. O último episódio, com os relatos mais sensatos, não consegue corrigir a tentativa estúpida de retratar o acidente através de terceiros, de pessoas que achavam ter alguma ligação com a garota, ignorando todo o impacto do acontecimento na vida de quem realmente a conhecia e a amava. Que Elisa esteja em paz. – Caroline Campos


Cena da série Amigas Para Sempre, print de tela, Max e Tully estão na cama e discutem sobre o que realmente é a relação deles. Max está de costas para a câmera sem camisa e Tully aparenta estar confusa.
De volta para os seriados, Katherine Heigl é uma das protagonistas da série (Foto: Reprodução)

Amigas Para Sempre (Firefly Lane, 1ª temporada, Netflix)

Amigas Para Sempre mostra a amizade duradoura e complicada de Tully Hart (Katherine Heigl) e Kate Mularkey (Sarah Chalke), sendo baseada no romance Firefly Lane de Kristin Hannah. A série se passa nos anos 2000, momento decisivo na vida das duas. Tully está tendo problemas em seu programa de TV e sofre também uma reviravolta amorosa. Já Kate está se divorciando de Johnny (Ben Lawson), com quem dividiu os últimos 15 anos e têm uma filha adolescente, além de tentar voltar ao mercado de trabalho. A narrativa é complementada com flashbacks das décadas de 70 e 80, revelando mais sobre os altos e baixos das amigas. Entretanto, algumas lembranças são confusas ou mesmo vagas, tornando o roteiro desconexo, sem falar que a série enrola bastante nos seus 50 minutos de cada episódio. 

Apesar desses problemas com o roteiro, é uma produção gostosa de assistir, com direito a riso, reflexão, choro e conforto. Cabe também o aviso de que há gatilhos, como cenas de estupro e aborto espontâneo, deixando a vibe mais pesada em alguns momentos. Nota-se também o desejo da Netflix de atrair um público na casa dos 30-40 anos, pois mostra temas bem pertinentes a essa geração, entretanto, todo o contexto com o passado das personagens traz identificação a qualquer idade. É fácil recordar vivências parecidas ou se imaginar nas situações.  – Mauê Salina Duarte

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