A Terceira Guerra Mundial começa e acaba na impotência

Mais um dos nomes vindos do Festival de Veneza, Terceira Guerra Mundial integra a lista da seção Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Iranian Independents)

Vitória Gomez

A História não se repete, mas costuma rimar.” A sinopse de Terceira Guerra Mundial, por mais extensa que seja, sequer provoca para a experiência completa da obra. Candidato ao Oscar 2023 pelo Irã e parte da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo na seção Perspectiva Internacional, o filme segue Shakib, um trabalhador braçal, sem-teto e sem família, que, ao ser envolvido contra a sua vontade na produção de um longa-metragem, tem uma oportunidade de recomeço. Quando Ladan, a mulher com que se relaciona, vem a seu encontro em busca de ajuda, uma sequência de acontecimentos testa as relações de poder da vida do protagonista.

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Você Tem Que Vir e Ver: a conversa da vida com a arte

Cena do filme Você Tem Que Vir e Ver. Na imagem, os personagens Susana, Daniel, Elena e Guillermo estão juntos em uma varanda de concreto. Suzana, interpretada por Irene Escobar, é uma mulher branca de cabelos loiros escuros com pontas claras na altura dos ombros, ela veste uma camiseta rosa estampada de pequenas flores por baixo de um macacão bege. Daniel, interpretado por Vito Sanz, é um homem branco de cabelos ondulados castanho escuros, ele veste uma calça jeans com uma camisa cinza escura por baixo de um blazer azul marinho. Elena, interpretada por Itsaso Arana, é uma mulher branca com cabelos loiros claros amarrados com uma franja na testa, ela usa óculos arredondados e veste uma calça branca com uma camisa azul escura por baixo de um casaco amarelo. Guillermo, interpretado por Francesco Carril, é um homem branco de cabelos castanhos curtos, ele veste uma bermuda de tons esbranquiçados com uma camisa rosa de mangas longas. Os personagens aparecem na ordem em que foram apresentados da esquerda para a direita. O casal Elena e Daniel olha para trás, enquanto os outros dois estão com as cabeças voltadas para frente.
Participando da seção Perspectiva Internacional, Você Tem Que Vir e Ver é um dos dois filmes de Jonás Trueba na 46ª Mostra Internacional de Cinema, junto de Quem os impede (Foto: Bendita Film Sales)

Jamily Rigonatto 

Um piano emite sons leves que caracterizam todo o plano de fundo da cena com a suavidade misteriosa dos clássicos. A câmera se estabiliza nos rostos dos quatro personagens da história, e é com o foco nas feições brandas que Você Tem Que Vir e Ver revela ter algo para nos contar. Entorpecidos pelas notas musicais, Elena (Itsaso Arana), Daniel (Vito Sanz), Guillermo (Francesco Carril) e Susana (Irene Escobar) parecem virar o lar de todos os questionamentos do existir. O filme, dirigido por Jonás Trueba, faz parte da categoria Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, e desenhado em tons primaveris, se desmancha em um retrato cotidiano e intimista. 

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Os Irmãos de Leila herdam a miséria

Cena do filme Os Irmãos de Leila, mostra uma mulher olhando para um homem. A mulher tem cabelos pretos e usa roupas escuras e olha de lado para o homem, que está encostado e fora de foco.
Protagonista do vencedor do Oscar O Apartamento, Taraneh Alidoosti é figura central de Os Irmãos de Leila, parte da Perspectiva Internacional da 46ª Mostra de SP (Foto: Iris Film)

Vitor Evangelista 

Imagine a família Roy de Succession, mas ao invés de magnatas bilionários, eles são pobretões, sem um tostão furado no bolso e em constante pé de guerra pela mísera das migalhas. Essa é a ambientação do iraniano Os Irmãos de Leila, premiado com o louro da crítica em Cannes e apresentado na 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo na seção Perspectiva Internacional. 

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Para voar, basta Nezouh se decidir

Vencedor do Prêmio do Público da seção Horizontes Extra do Festival de Veneza, Nezouh participa da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo na seção Perspectiva Internacional (Foto: MK2 Films)

Vitória Gomez

Zeina, Mutaz e Hala são os últimos moradores de Damasco e têm horas para sair da cidade sitiada antes que esta seja invadida. A família composta por pai, mãe e filha permaneceu no local durante o cerco, mas encarou a decisão de deixar ou não seu lar quando um míssil abre buracos na moradia e os expõem ao mundo sem a segurança de suas quatro paredes. É através do olhar inocente e esperançoso de Zeina, de 14 anos, que acompanhamos o dilema do trio de Nezouh, que integra a seção Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

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Nada de Novo no Front: um filme de guerra humanista em que falta humanidade

Cena do filme Nada de Novo no Front. No lado direito da imagem, temos um homem branco não identificado, vestindo blusa preta, touca cinza e uma máscara facial branca. Ele está abraçando o ator Felix Kammerer, um homem branco de expressão triste, vestindo um casaco cinza e um capacete preto. Ao fundo, temos algumas estacas e o resto do cenário está desfocado. A cena acontece durante o dia, mas a foto está tratada em preto e branco.
Na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, a nova versão de Nada de Novo no Front, exibida na seção Perspectiva Internacional, mantém a mensagem anti-guerra do material original (Foto: Netflix)

Nathan Nunes 

Nada de Novo no Front é um livro escrito por Erich Maria Remarque, baseado nas suas próprias experiências como veterano alemão na Primeira Guerra Mundial. Publicado em 1929, o texto não demorou a ser transposto para o Cinema, com a adaptação Sem Novidade no Front sendo lançada um ano depois. Dirigido por Lewis Milestone, o longa fez tanto sucesso que venceu o Oscar de Melhor Filme em 1931, consagrando-se como a primeira adaptação literária a conquistar essa honraria, bem como a primeira vitória conjunta da categoria principal com o prêmio de Melhor Diretor. Agora, 91 anos depois, o diretor Edward Berger (Patrick Melrose e Your Honor), em parceria com a Netflix, traz uma nova versão de mesmo nome do material base para o streaming, exibida na programação da 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo na seção Perspectiva Internacional. 

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A Noiva não escolhe lados

A Noiva estreou no Brasil na seção Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: FAUX)

Vitória Gomez

O Cinema político sempre encontrou solo fértil no Brasil. Por aqui, não falta o que retratar: ditaduras, questões trabalhistas, de distribuição de renda, alimentos e moradia, golpes de Estado e por aí vai. Até um dos mais básicos processos democráticos, as eleições e os seus ecos na sociedade brasileira, têm sido tema de poderosas metáforas na produção nacional, com a crescente ameaça à democracia sob a premissa de defesa dos bons costumes e do patriotismo. Voltando os olhos para o outro lado do oceano Atlântico, Sérgio Tréfaut, cineasta brasileiro que viveu em Portugal e na França, joga luz sobre o fenômeno do recrutamento de jovens sobretudo franceses para se juntarem às linhas de luta do Estado Islâmico. Em A Noiva, que estreou no país na seção Perspectiva Internacional da  46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o conflito é pincelado através da vivência de Bárbara, viúva de um jihadista.

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Os batimentos da mudança movem Corações Gentis

Vencedor na seção Generation 14plus do Festival Internacional de Cinema de Berlim, Corações Gentis encanta as telas brasileiras na Perspectiva Internacional da 46ª Mostra (Foto: Accattone Films)

Enzo Caramori

É possível que um sentimento de surpresa arrebate um espectador desavisado ao descobrir que Corações Gentis (2022), representante belga na Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, é um documentário. Essa surpresa, no entanto, está longe de afastar o gênero do longa-metragem dirigido pela dupla de cineastas Olivia Rochette e Gerard-Jan Claes. Nesse híbrido de sensibilidades ficcionais e documentais, o casal de jovens adultos Billie Meeussen e Lucas Roefmans são retratados à beira de transformações em suas aspirações pessoais, com uma emoção vertiginosa e delicada — um típico frio na barriga adolescente — acerca das expectativas sobre o futuro e suas incertezas.

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A ode à memória dos Anos do Super 8: Annie Ernaux se lembra

Presente na 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo na seção Perspectiva Internacional, Os Anos do Super 8 foi exibido na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes (Foto: Les Films Pelleas)

Vitória Gomez

Um dos nomes mais falados da Arte no momento, Annie Ernaux chegou à 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. A escritora francesa recentemente venceu o Prêmio Nobel de Literatura e, ainda em 2022, estende sua atuação à indústria cinematográfica com Os Anos do Super 8, presente na seção Perspectiva Internacional do festival. Ao lado de David Ernaux-Briot, seu filho e co-diretor, Ernaux torna as fitas caseiras da família, registradas em uma câmera Super 8, um documentário maior do que sua vida, se debruçando sobre a essência da memória e da juventude.

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Magdala: os últimos dias de Maria Madalena foram monótonos e sensíveis

Cena do filme Magdala. Da esquerda para a direita na imagem: Jesus Cristo, um homem branco de cabelos escuros e Maria Madalena, uma mulher negra de cabelos escuros. A fotografia capta os dois somente a partir do pescoço, no entanto, é notável que ambos estão desnudos. Jesus e Madalena se olham enquanto encostam as faces. O cenário é a natureza verde.
Magdala foi disponibilizado gratuitamente na plataforma do Sesc Digital durante a 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, como parte da seção Perspectiva Internacional (Foto: Best Friend Forever)

Nathalia Tetzner

Pecadora e santa. Prostituta e apóstola dos apóstolos. São inumeráveis os adjetivos antagonistas que constroem a imagem sagrada de Maria Madalena, a principal devota de Jesus Cristo. Atordoado pelo devaneio sobre os seus últimos dias de vida, o diretor francês Damien Manivel coloca em perspectiva a personalidade mais misteriosa e discutível do Novo Testamento no filme Magdala, participante da seção Perspectiva Internacional na 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo e, previamente, exibido na seção L’ACID do Festival de Cannes 2022.

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O fantasma da gentrificação assombra Distopia

Cena do documentário Distopia. A foto é uma captura de um dos trechos do filme Distopia. Quatro prédios amarelos — parte do conjunto habitacional do bairro do Aleixo — estão sendo demolidos. O prédio da direita cai em meio a fumaça, abaixo se encontram outras habitações e um terreno verde.
O documentário chega à Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo carregando o prêmio HBO Portugal para Melhor Filme da Competição Portuguesa no DocLisboa International Film Festival 2021 (Foto: Bando a Parte)

Enzo Caramori

Se a vida real, capturada em seu fluxo, for passível de ser ficcionalizada para ser compreendida, o documentário português Distopia (2021) é um filme de terror que desde seu início já desmascara os seus monstros. Representando Portugal no repertório da Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o filme introduz o fantasma da gentrificação como o motor dos desterramentos e demolições que atravessam a cidade do Porto, em um retrato de treze anos da vida dos bairros de Bacelo, Aleixo e Fontainhas. Dirigido por Tiago Afonso, a forma documental encontra sua força ao direcionar a câmera tanto aos sujeitos atravessados por essa desterritorialização quanto aos espaços e ruínas, o que constitui uma espécie de anti-documento nessa condição de filmar o que está na iminência de não mais existir.

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