O rei pálido é o The Office existencialista de David Foster Wallace

Finalista do prêmio Pulitzer, O rei pálido chegou ao Brasil em março de 2022 e foi um dos recebidos do Persona na parceria com a editora (Foto: Companhia das Letras/Arte: Ana Clara Abbate)

Bruno Andrade

“Autor aqui. Ou seja, o autor de verdade, o ser humano vivo que segura o lápis, não alguma persona narrativa abstrata. […] Este aqui sou eu enquanto pessoa real, David Wallace, quarenta anos, RG 975-04-2012, que me dirijo a você da minha casa dedutível em Formulário 8829 no número 725 do Indian Hill Blvd., Claremont 91 711 CA, neste quinto dia da primavera de 2005, para lhe informar o seguinte: Tudo aqui é verdade. Este livro é real de verdade” (pág. 79-80).

O tédio é o pássaro que choca os ovos da experiência”, escreve Walter Benjamin no ensaio O narrador. Mesmo que o tédio ressoe no cotidiano, talvez seja no imprevisível best-seller de Byung-Chul Han que diversas sensações contemporâneas tenham sido melhor delimitadas. Em Sociedade do Cansaço (2010), o filósofo sul-coreano traça um poderoso diagnóstico dos nossos tempos: cada época tem suas “enfermidades fundamentais”; enquanto a passada sofreu com crises biológicas, a atual sofre com adoecimentos neuronais (depressão, síndrome de Burnout, TDAH, etc.). Estamos mentalmente debilitados, quebrados por um excesso de positividade.

A resposta original a essa condição é uma reação existencial, mas não exatamente algo espetacularizado, e sim o silêncio, o ócio, a “capacidade de refletir” em contraste a um mundo que exige discursos infinitos, respostas imediatas e desejos efêmeros. Mas como não confundir reflexão com o tédio? Numa sociedade dominada pela indústria cultural, sentir-se entediado não seria, por si só, uma reivindicação da consciência? Esse é o objeto da tese que David Foster Wallace expõe no inacabado O rei pálido (2011), romance publicado após sua morte.

Continue lendo “O rei pálido é o The Office existencialista de David Foster Wallace”

Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades é a autocrítica de Alejandro G. Iñárritu

O longa foi exibido no Festival de Veneza e teve uma pré-estreia presencial no Brasil, na seção Perspectiva Internacional da 46ª Mostra SP (Foto: Netflix)

Bruno Andrade

O que parece ser unânime em relação a Alejandro González Iñárritu é que ele nunca se esforça em agradar. Disso surgem virtudes e defeitos: ele pode criar obras originais e autênticas, com refinado valor estético, mas também pode cair no escárnio, na decepção, na epopeia que pode ser o ego de um diretor. Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades parece ser o meio termo entre essas duas situações. Com uma trama que se propõe a traçar a história de um renomado jornalista e documentarista mexicano, Silverio Gama (Daniel Giménez Cacho) – personagem marcado por uma profunda crise existencial –, o longa integrou a seção Perspectiva Internacional da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

Continue lendo “Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades é a autocrítica de Alejandro G. Iñárritu”