Status positivo: Perlimps se emancipa em viagem sensorial

Cena do filme animado Perlimps. A cena mostra uma raposa e um urso crianças no escuro. A raposa laranja segura uma lanterna em direção ao seu rosto, enquanto o urso branco e preto tem luzes saindo de seus olhos, iluminando sua frente.
Exibido no Festival de Cinema de Animação de Annecy, Perlimps integra a Mostra Brasil e marca o retorno de Alê Abreu à Mostra de SP, em sua 46ª edição (Foto: Vitrine Filmes)

Vitor Evangelista

Na floresta colorida que preenche com entusiasmo a tela de Perlimps, uma das animações mais aguardadas da 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, dois agentes secretos duelam por um bem em comum. Do Reino do Sol, Claé (Lorenzo Tarantelli) é uma raposa que insiste em se identificar como lobo, enquanto Bruô (Giulia Benite), nascida no Reino da Lua, representa uma miscelânia selvagem, assumindo a forma de um urso com rabo de leão. À primeira vista inimigos, os bichinhos entendem que apenas com a união será possível derrotar o inimigo invisível.

Ou melhor dizendo, camuflado. Para além das árvores altíssimas que escondem o império verde das flores e folhas, está assentada uma fábrica fedorenta e fumacenta, comandada por gigantes monstruosos e imbatíveis, cada vez mais próximos do coração da Mãe Natureza. Sob a direção, o roteiro, o desenho de produção e a montagem de Alê Abreu, o mundo fantástico e imaginativo do filme é embasado pelas cores e pelo poder dos sons.

Cena do filme animado Perlimps. A cena mostra uma floresta colorida e cheia de flores brancas. Vemos 3 animais, uma águia idosa, de bengala apontando para as crianças raposa e lobo, que olham para ela.
Antes de se chamar Perlimps, a obra tinha o título de Viajantes do Bosque Encantado (Foto: Vitrine Filmes)

No departamento comandado por André Hosoi e O Grivo, a experimentação proveniente da música é quem orienta os oitenta minutos de rodagem. Complementado a aventura, o texto de Abreu, verborrágico e intensamente presente como mapa dos bichinhos, trabalha em harmonia à maneira com que a produção extrapola o uso da luz do sol, a brisa do ar e a refrescância da água. Perlimps se debruça sobre a técnica da animação 2D de maneira a fazer quem assiste se infiltrar naquela mata sem medo de picada de mosquito ou de pisar em poças de lama.

Quase uma década depois de O Menino e o Mundo e sua indicação ao Oscar, o cineasta retorna aos já costumeiros traços vívidos e dançantes muito mais centrado e vibrante quanto a história que quer contar e a maneira de fazê-lo. Os pequeninos e folclóricos ‘perlimps’ que batizam o longa são o objeto de busca dos protagonistas em favor da liberdade das garras de um futuro desolado pela ganância e pelo capital. Única voz adulta em destaque do elenco, o veterano Stênio Garcia desempenha o papel do sábio ancião que remexe a cabeça dos protagonistas, clareando suas ideias e some logo na sequência.

Cena do filme animado Perlimps. A cena mostra o urso e a raposa olhando para o horizonte, de costas para a imagem. A imagem tem muitos tons de amarelo e marrom, mostrando uma paisagem fosca e não nítida.
No time de produção, vemos os nomes de Laís Bodanzky, Luiz Bolognesi e Ernesto Soto Canny, enquanto lembramos da dubladora Giulia Benite pelo papel de Mônica nas obras de Daniel Rezende (Foto: Vitrine Filmes)

As metáforas para a guerra e o descaso com a natureza e com a vida humana bebem de fontes já consagradas na Sétima Arte, mas o que diverge Perlimps do óbvio é a emancipação que o longa presta ao papel de cair nos clichês. Gotas de Lucas – Um Intruso no Formigueiro se misturam ao imaginativo Arthur e os Minimoys, além da inspiração fantasmagórica de Onde Vivem os Monstros assombrar os personagens principais à maneira de se moverem e reagirem ao nefasto mundo do homem. Por vezes distante de uma abordagem mais sisuda sobre os males que infecta e cutuca, o filme de Alê Abreu deixa a marca única de um status positivo, veredito repetido com entusiasmo pelas crianças-animais em seus tecnológicos walkie-talkies

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