Mamãe, Mamãe, Mamãe é uma memória agridoce

O filme faz parte da Competição Novos Diretores da 44ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Divulgação Imprensa)

Jho Brunhara

A infância é uma das fases mais misteriosas da vida. A formação da personalidade enquanto a inocência guia as descobertas do que o mundo é feito; a insegurança diante de um mundo tão grande; o filtro moral ainda tão recente e frágil. Mamãe, Mamãe, Mamãe, longa argentino da 44ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, é uma captura muito preciosa desse universo do que é ser uma criança, em contraponto com um trauma tão severo como a morte. 

Sol Berruezo Pichon-Rivière, de apenas 24 anos, é a criadora desse pequeno mundo. Em seu primeiro filme, Mamá, Mamá, Mamá, acompanhamos a história de uma mãe que acaba de perder uma de suas filhas afogada na piscina de casa. Enquanto tenta se recuperar do choque, recebe a visita de sua irmã, que traz suas filhas Leoncia (Matilde Chiabrando), Manuela (Camila Zolezzi) e Nerina (Chloé Cherchyk). Elas, se juntam à Cleo (Agustina Milstein), irmã da menina que faleceu. 

Cleo é um reflexo dos sentimentos de sua mãe (Foto: Divulgação Imprensa)

Com 65 minutos de duração, Mamãe é um filme pequeno sobre algo muito maior. Apesar do luto ser a base para a trama, logo vemos que não se trata apenas disso, mas sim de contar algumas minúcias da infância, quase como assistir fitas VHS antigas com gravações pessoais. Mesmo com pouca idade, todas as meninas convencem na atuação, o que dá ainda mais essa sensação de realidade. O sentimento de família é o que dá o norte para o curto longa, mais por parte da proximidade de Cleo com suas primas.

O silêncio diz muito aqui. A mãe, distante, passa o tempo todo no quarto deprimida. Cleo não chora, mas o assunto paira no ar o tempo todo, como um fantasma mesmo, que só as duas parecem enxergar, mas ninguém quer falar sobre. Como A Ghost Story (2017) já mostrou antes, o luto às vezes é quieto e silencioso. Mamãe dá pequenas dicas de como a tragédia de perder a irmã pode impactar o futuro da garotinha, mas não é isso que importa aqui, e sim o presente com suas primas. 

Entre pequenas cenas sobre o acontecimento, o dia-a-dia da casa preenche a tela. As brincadeiras, a união das meninas, a primeira menstruação de uma delas e como a prima mais velha presta auxílio e aconselhamento, os diferentes estágios da segunda infância até a adolescência. Sol Berruezo combina um universo doce e precioso com uma tragédia triste, mas talvez essa seja sua melhor forma de mostrar do que realmente se trata a vida, e o irreversível amadurecimento. 

A chegada da avó de Cleo que traz também a filha de sua empregada, Aylín (Siumara Castillo), adiciona mais uma camada à irmandade das meninas (Foto: Divulgação Imprensa)

Mamãe, Mamãe, Mamãe traz a sensação de se reviver memórias da infância, de reencontrar aqueles pequenos momentos de inocência, angústia e alegria. Mesmo dividindo a tristeza, o carinho se sobressai, e o coração se aquece. Somos lembrados que coisas ruins e terríveis acontecem, mas que é mais fácil enfrentá-las sem estar sozinho, com as pessoas que consideramos nossa família. 

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