Com uma direção que dá medo, A Bruxa de Blair é um clássico que nunca perde a essência

A imagem mostra Heather Donahue com uma touca cinza. O foco da imagem é o rosto de Heather, uma mulher branca, de olhos azuis que aparenta estar assustada. Ela está chorando com a câmera focada em seu olho direito (esquerdo para quem lê a imagem). Heather está com as sobrancelhas arregaladas. O fundo da imagem é preto.
Uma fita VHS gravada com uma câmera amadora, um grupo seleto de atores desconhecidos, edição com cortes básicos, cenários reais, 81 minutos de imagens de péssima qualidade e assim nasceu um dos melhores filmes de terror de todos os tempos (Foto: Haxan Films)

Gabriel Gomes Santana

Há exatos 22 anos, uma relíquia cinematográfica colocava pânico em todos os amantes de Cinema. A Bruxa de Blair, icônico filme de terror em formato de documentário ficcional, aterrorizava o público pelo seu conteúdo macabro e tão simples que, de fato, brincava com o “real”. Se hoje em dia as pessoas reconhecem a grandeza de franquias como Atividade Paranormal e REC, elas certamente devem agradecer à produção de A Bruxa de Blair por ter inspirado este modelo de gravação.

Revolucionária na arte de found-footage (subgênero de terror filmado em primeira pessoa), a trama lançada no fim da década de 1990 é considerada um marco dos filmes de terror. Apesar da frustrante tentativa de um remake lançado em 2016, a clássica essência da primeira versão perpetua os diferentes desfechos possíveis e segue com o intuito de dar ao espectador uma visão pessoal sobre os acontecimentos finais da trama. 

Dispondo de um orçamento baixíssimo, os diretores Daniel Myrick e Eduardo Sánchez tiveram que apostar na criatividade e improviso de roteiro para investir em uma história cativante – e o investimento valeu a pena. Muitos críticos até hoje categorizam o filme como uma obra de poucos recursos com ideias geniais. Eu discordo. Acredito que apesar da estrutura simples, há uma infinidade de recursos pelos quais a equipe técnica soube demonstrar êxito e, claro, a genialidade das ideias acabou sendo um diferencial assombroso.

A foto é um cartaz que exibe os retratos com os perfis dos três atores: Heather, Joshua e Michael respectivamente (da esquerda para a direita). As imagens estão “em preto e branco” (sem cores). Heather é branca, tem cabelo castanho e olhos azuis. Joshua é branco, tem olhos azuis e usa boné. Michael é branco, tem olhos castanhos e usa boné. Joshua e Michael são barbados. Há uma frase embaixo dos retratos
A produção fez o público pensar que os protagonistas estavam mortos, criando cartazes que buscavam o paradeiro dos atores; a mãe de Heather recebeu um telefonema desconhecido desejando condolências à suposta morte de sua filha (Foto: The Guardian)

Seguindo o bom e velho clichê, o enredo conta a história de três jovens que se aventuram para descobrir se a lenda da Bruxa de Blair é verdadeira. Para isso, eles resolvem acampar na floresta de Burkittsville (Maryland/EUA) e documentar todo o tipo de material que possa sustentar, através de evidências sobrenaturais, a lenda local. Quando eles percebem que prosseguir com as filmagens não era boa ideia, já é tarde demais. Um fato curioso é que, após a estreia do filme, Myrick e Sánchez recomendaram que os protagonistas “sumissem” da mídia temporariamente, dando margem a diversas interpretações sobre o paradeiro dos atores.

A versatilidade do elenco na improvisação das cenas é um ponto de destaque fortíssimo. Para começar, os personagens têm o mesmo nome dos atores (Heather Donahue, Joshua Leonard e Michael Williams) e esse é um elemento poderoso para que a equipe se sinta à vontade nos sets de filmagem. Com a intenção de gerar maior realismo cênico, a direção compôs diversas ocasiões “surpresas”, sem que os atores tivessem um contato prévio com o roteiro e, assim, as reações e sensações sombrias acabaram sendo ainda mais espontâneas.

Poucas obras de terror e horror conseguem atingir o sucesso obtido por A Bruxa de Blair. O motivo principal não está no clímax de sua narrativa ou na atuação de seu elenco, mas sim na forma arquitetônica na qual a mesma foi produzida. Sim, os diretores pensaram em tudo. Durante o processo de produção cinematográfica, é comum que todas as decisões finais, ou pelo menos a maioria delas, passem pelo aval de quem dirige a equipe. Mas, neste caso, todos os detalhes foram minuciosamente planejados com a intenção de promover o trabalho espetacular deste longa-metragem.

Foto de Daniel Myrick e Eduardo Sánchez respectivamente (da esquerda para a direita). Myrick aparece sorrindo na foto. Ele é branco, de olhos azuis e cabelo castanho claro. Myrick está vestindo uma camisa azul marinho e uma jaqueta de couro preta. Sánchez por sua vez é mais alto que Myrick e aparece sorrindo, apoiando a mão no ombro de Myrick. Sánchez é latino, com olhos castanhos escuros, tom de pele clara, cabelo comprido e costeletas. Sanchez está com uma blusa cinza.
Os diretores Eduardo Sánchez e Daniel Myrick no festival de Sundance em 1999, ano de lançamento do filme (Foto: Sundance Film Festival)

Apesar de ter sido lançada em 1999, The Blair Witch Project começou a ser gravado dois anos antes e um de seus produtores, Eduardo Sánchez, ainda naquela época (estamos falando de um momento que na internet era “tudo mato”), tinha em mente a criação de um site para a divulgação da produção. Lá, era possível ter acesso à lenda na qual o filme se baseia. Em outras palavras, o mérito de Myrick e Sánchez foi ter criado uma atmosfera tão assustadora que fosse capaz de integrar o público, tornando-o uma testemunha onisciente dos gritos e desesperos macabros que se sucedem ao longo da obra.

Se me permite o trocadilho infâme, essa obra-prima deveria se chamar Os Bruxos de Blair, já que devemos ao menos admitir que seu trabalho foi bem executado. Afinal, uma produção que custou apenas 60 mil dólares e arrecadou cerca de 250 milhões, inquestionavelmente deve ser classificada como bruxaria, magia, feitiço ou qualquer outro substantivo que dá nome a um feito tão inédito quanto este.

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