Macabro e memorável, A Bruxa completa 5 anos

Fotografia do filme A Bruxa. A foto é retangular e retrata uma floresta escura. No meio da imagem existem três silhuetas de costas. A central pertence a uma mulher e as outras duas pertencem a dois bodes. De frente para essas figuras, há uma fogueira. Sobre essa fogueira, existem sete corpos de mulheres que flutuam formando um arco. A fogueira é a única fonte de luz da imagem e ilumina fracamente algumas árvores ao fundo, dando uma aparência amarelada para o todo.
A Bruxa, ainda que tenha dividido opiniões do público quando lançado, é “tenso” e “instigante”, como definiu o Rei do Terror Stephen King em suas redes sociais (Foto: A24)

Mariana Nicastro

Plena Idade Média. Um casal de camponeses e suas crianças curiosas. Um lenhador. Uma casinha ao lado de um bosque e uma bruxa que o habita. Parece mais um conto de fadas dos Irmãos Grimm, certo? Bom, na verdade trata-se de A Bruxa, lançado no Brasil em março de 2016. Inventivo, misterioso e incômodo, o filme de terror utiliza da temática das bruxas para compor uma trama bem elaborada e assustadora. Com isso, ele tornou-se capaz de se destacar notoriamente no gênero e ainda ser alvo de discussões e elogios 5 anos após sua estreia.

Escrito e dirigido por Robert Eggers, também conhecido pela sua obra mais recente O Farol (2019), A Bruxa é um filme incomum, que divide opiniões desde sua aparição nos cinemas. Esse fator ocorre devido a escolha de Eggers em fugir de histórias de terror convencionais e optar por uma trama lenta, que intriga com sua estranheza e depende da imersão do telespectador para total aproveitamento. Dessa forma, ela pode decepcionar quem recorre à obra em busca de um terror físico, repleto de sangue e sustos. 

Contudo, mesmo que desvie das convenções do gênero que entregam um terror mais óbvio e instantâneo, o cineasta ainda consegue desenvolver excepcionalmente bem uma atmosfera aterrorizante. Assim, o filme flui de forma misteriosa, alimentando aos poucos o medo de quem o assiste. Ele, de fato, sempre sugere muito mais do que expõe, mas elabora crescentes situações bizarras, que se encaminham para um desfecho arrepiante.

Fotografia de um trecho do filme A Bruxa. Nela, estão retratados em uma sala de jantar escura os personagens do filme sentados à uma mesa de madeira. Todos os filhos estão orando com as mãos unidas e olhos fechados, diante de tábuas com alimentos. A câmera encontra-se logo atrás da personagem Katherine (Kate Dickie), registrando sua silhueta. Logo à esquerda está Thomasin, interpretada por Anya Taylor-Joy, uma garota latina de pele clara, e ao seu lado está Caleb, interpretado por Harvey Scrimshaw, um menino branco de cabelos curtos. Sentados à direita de Katherine estão as crianças Mercy, interpretada por Ellie Grainger, e Jonas, interpretado por Lucas Dawson, uma menina e um menino branco, respectivamente. As meninas usam vestidos de época e os filhos, blusas de manga comprida. O pai está de frente para a câmera, no outro extremo da mesa, e tem os braços abertos, palmas das mãos erguidas para cima e olhos fechados. Ele é interpretado por Ralph Ineson, um homem branco de cabelos longos e barba. A escassa luz que permite a visualização dos personagens provém de uma vela acesa na mesa. Além dos atores, ela revela uma escada simples de madeira, no canto direito.
A fotografia escura e o enquadramento fechado utilizados nas cenas ambientadas dentro da casa contribuem para sensações de incômodo e aprisionamento (Foto: A24)

Ambientado em uma Nova Inglaterra do século XVII – com direito a cenários e figurinos realistas da época, que contribuem para a imersão na história –, o filme retrata o deslocamento forçado de uma família para um novo lar. Ela é composta por William (Ralph Ineson), Katherine (Kate Dickie) e seus filhos Caleb (Harvey Scrimshaw), Mercy (Ellie Grainger), Jonas (Lucas Dawson), o bebê Samuel e a filha mais velha (e protagonista) Thomasin (Anya Taylor-Joy). Anya, antes mesmo de viver Beth Harmon no sucesso da Netflix O Gambito da Rainha, já brilhava em sua estreia em longas-metragens como A Bruxa

Após uma breve ambientação e introdução dos personagens e do local onde a história acontecerá, a obra embarca em uma sequência de eventos perturbadores que jamais entregam o que está por vir, tornando inesperado e imprevisível o futuro da trama. The Witch aborda os pavores e crenças da época, na qual a bruxaria era fortemente temida e combatida pela religião cristã e pelas autoridades. Por sua vez, a baixa saturação na fotografia de Jarin Blaschke, os cenários escuros da floresta e da casa, e o isolamento dos personagens constroem com maestria um ambiente inquietante e desconfortável, que se perpetua por todo o longa. 

Além desses fatores, há também diversas referências em segundo plano e mensagens subentendidas que permitem interpretações diversas e dão uma identidade única ao filme. Algumas podem passar despercebidas e assim valem uma nova assistida à obra, sob outras perspectivas. Sem entregar demais e sem estragar a experiência de quem ainda não o assistiu: A Bruxa se torna ainda mais rico ao inserir alguns detalhes que remetem a histórias antigas de bruxas, contadas através dos séculos, e outros que aludem à Bíblia e simbologias cristãs.

Fotografia de um trecho do filme A Bruxa, em formato retangular. Ela retrata a personagem Thomasin, no centro da imagem, interpretada pela atriz Anya Taylor-Joy. Anya é uma menina jovem, latina de pele clara. Ela tem o rosto oval, cabelos loiros, longos e lisos. Tem olhos grandes, espaçados e castanhos, uma boca pequena e um nariz médio. Há alguns respingos de sangue em seu pescoço. Atrás dela existem tábuas de madeira. A foto é escura e seu rosto é fracamente iluminado por uma luz amarelada.
O filme conta com diversas referências à religião e heresias, como o próprio nome da protagonista Thomasin sugere, considerando que “Sin” significa pecado, em inglês (Foto: A24)

Quanto às interpretações que surgem diante desse olhar mais aprofundado sobre o filme, cabe citar suas críticas ao comportamento da sociedade baseado em dogmas religiosos e às intolerâncias decorrentes disso. Isso é feito ao representar a repressão de desejos e vontades de alguns membros da família em contraste com a heresia, ousadia e liberdade do paganismo, que ganham destaque no terceiro ato. 

Assim, A Bruxa fornece elementos marcantes e rios de pequenos acontecimentos macabros que deságuam em um mar de tensão e medo conforme ele avança. O filme se consagra como uma memorável criação do gênero, fornecendo 93 minutos de inquietação, curiosidade e horror. Logo, torna-se essencial na lista de quem é um admirador do terror e de histórias de bruxas, e merece ser lembrado como um clássico.

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