A luz no fim do túnel do Grammy 2022

Arte retangular. O fundo é um degradê roxo e lilás. Da esquerda para a direita, foram adicionadas as imagens de 4 artistas segurando troféus vencidos na cerimônia do Grammy. No canto esquerdo, foi adicionada a imagem do artista Jon Batiste. Ele é um homem negro adulto de pele retinta. Ele tem cabelo crespo curto. Ele está sorrindo. Ele usa uma blusa preta de gola com detalhes prateados. Ao lado direito dele, foi adicionada a imagem da artista Doja Cat. Ela é uma mulher adulta negra de pele clara. Seu cabelo é preto e liso, com penteado em coque. Ela usa um vestido decotado rosa que mostra os ombros. Ela sorri. Ao lado direito dela, foi adicionada uma imagem da artista SZA. Ela é uma mulher negra adulta. Seu cabelo é preto, liso e comprido. Ela usa um vestido bege com flores coloridas. Ela sorri. Ao lado direito dela, foi adicionada uma imagem da artista Olivia Rodrigo. Ela é uma mulher jovem amarela, de ascendência filipina. Ela tem cabelo preto liso comprido. Ela usa um vestido preto que mostra os braços e o peito. Ela usa dois colares, rosa e roxo escuro. Ela sorri, mostrando a ponta da língua.
Os sorrisos que iluminaram o sombrio Grammy 2022: Jon Batiste, o melhor nome para assinar o disco consagrado como o Álbum do Ano; Doja Cat e SZA, as hitmakers que foram premiadas pela primeira vez; e Olivia Rodrigo, que aos 19 anos, encerrou um ano de ouro com seu título de Artista Revelação (Foto: Reprodução/Arte: Jho Brunhara)

Raquel Dutra

Como uma de suas metáforas musicais favoritas, o Grammy encerrou a caliginosa caminhada que o levou até a sua 64ª edição ao fim luminoso da noite do dia 3 de abril de 2022. Sob os holofotes da MGM Grand Garden Arena, no glamour de Las Vegas, cantores, compositores, produtores e instrumentistas se reuniram, junto da Academia de Gravação, para reconhecer “o melhor da Música” realizada entre o dia 1 de setembro de 2020 e 30 de setembro de 2021 e submetida à consideração da premiação. No palco, brilharam os nomes de Jon Batiste, Olivia Rodrigo, Doja Cat, SZA, Bruno Mars e Anderson .Paak, que com suas celebrações fervorosas e feições vitoriosas, encerraram um período que aconteceu exatamente de acordo com uma das leis mais fundamentais da natureza que produz tais fenômenos – antes da luz, vem a escuridão. 

E assim foi como tudo começou, quando o Grammy anunciou seus indicados da vez no dia 23 de novembro de 2021. Dentre os considerados para os títulos de maior prestígio da música mundial, a Academia de Gravação incluiu alguns dos mais infames nomes da Indústria: Louis CK e Lukasz Gottwald (vulgo Dr. Luke, já numa tentativa de se disfarçar) e Marilyn Manson, três homens que acumulam acusações e investigações graves e públicas de assédio, abuso e violência sexual contra mulheres. Diferentemente do que significou para boa parte do público da premiação, que questionou a atitude, a resposta apresentada pelo presidente da Academia não entendeu a situação como um problema.

Não vamos restringir as pessoas que podem enviar seu material para consideração. Não analisaremos a história das pessoas, não analisaremos seus antecedentes criminais, não analisaremos nada além da legalidade dentro de nossas regras, se essa gravação para este trabalho é elegível com base na data e em outros critérios. Se for, eles podem enviar para consideração.”
– Harvey Mason Jr., CEO da Academia de Gravação, em entrevista ao The Wrap

A crise de imagem do Grammy vem questionando a legitimidade e relevância da premiação há pelo menos cinco anos e parece só se aprofundar: a audiência de 2022 foi a segunda pior da história, ficando atrás apenas do ano passado (Foto: Grammy)

Assim, o nome do agressor de Abby, Rebecca, Dana e Julia foi o vencedor do prêmio de Melhor Álbum de Comédia com Sincerely Louis CK, que faz piada das acusações já assumidas e confirmadas pelo mesmo; o agressor de Ke$ha (que inclusive já usou o espaço do próprio Grammy para ecoar suas denúncias) também esteve dentre os nomeados para a principal categoria da premiação, pela sua controversa participação em Planet Her, de Doja Cat; e o nome do agressor de Evan Rachel Wood apareceu dentre os indicados a Álbum do Ano e Melhor Álbum de Rap, pela sua participação no naturalmente polêmico Donda, de Kanye West.

Por coincidência, ali também estava mais um dos maiores problemas do ano para a premiação que procura, nos últimos 4 anos, ampliar o acesso de artistas mulheres em gêneros de predominância masculina. Depois do vexame de 2018, o Grammy realizou diversas mudanças nos sistemas de indicações e votos e entregou um 2019 repleto de marcos positivos e avanços importantes para o trabalho de mulheres na música. No rap, Cardi B foi a primeira mulher a vencer o prêmio de Melhor Álbum, mas a conquista não foi mantida nos próximos anos, restringindo o conhecimento das rappers às canções e deixando de notar seus trabalhos completos. 

Com a chance de fazer diferente em 2022, a Academia de Gravação não foi capaz de escolher um disco sequer para concorrer ao principal prêmio de rap. Das 4 mulheres nomeadas por suas canções e performances (Cardi B, Doja Cat, Megan Thee Stallion e Saweetie), nenhum foi chamado ao palco como vencedor. Nos fazendo agradecer a mínima atitude de não completar as honras do disco que atrela um dos nomes mais culturalmente relevantes da Música ao perturbador histórico de um dos maiores agressores da Indústria, o Grammy não só deixou de contemplar artistas mulheres como usou o espaço que tinha para tal a fim de reconhecer os homens que a agrediram.

No formato adotado recentemente pelo Oscar, o Grammy não televiosiona a entrega dos prêmios de todas as suas 86 categorias, transmitindo ao vivo apenas as gerais e dos gêneros country, R&B, pop e algumas de rap, deixando de fora as de rock e música alternativa (Foto: Rich Fury/Getty Images)

Lá, alguns favoritismos foram superados e tendências foram criadas. O prêmio máximo não completou a história de Terror que envolvia os méritos de Kanye West em Donda, mas optou por honrar o nome de Tyler, The Creator. Com CALL ME IF YOU GET LOST, definido pela crítica não só como um dos melhores discos do ano, como também o melhor de sua carreira, o rapper de 31 anos agora tem uma sequência de três discos nomeados e dois premiados na honraria máxima do seu gênero. 

Já para os prêmios de canção e performance, a Academia aproveitou a ausência de Marilyn Manson para apreciar Kanye West, consolidando sua relação conturbada com o rapper que saiu como o maior vencedor do gênero da noite depois de ser proibido de se apresentar na premiação. As vitórias foram nas categorias de Melhor Canção de Rap (por Jail, ao lado do outro gigante Jay-Z) e Melhor Performance de Rap Melódico (com Hurricane, sua parceria com o veterano Lil Baby e o badalado The Weeknd). Na última, outro marco: a primeira vez em que o astro canadense é citado e premiado pelo Grammy depois dos eventos de 2021, quando a premiação desconsiderou completamente o impacto de After Hours como um dos discos mais vendidos do ano na hora de definir os nomeados. 

Completando as categorias do gênero, o novato Baby Keem venceu Melhor Performance de Rap com o apoio de seu primo Kendrick Lamar, um dos nomes mais fortes do gênero, que participou do single family ties, do elogiado álbum de estreia do rapper, impulsionando sua vitória no Grammy. A ascensão, no entanto, acarretou mais uma desconsideração pelas mulheres, na única categoria do Grammy 2022 com mais de uma indicada.

Na categoria de Melhor Álbum Urbano, o vencedor foi o favorito Bad Bunny, já nas demais latinas, a brasileira Eliane Elias assina o Melhor Álbum de Jazz e o cubano Alex Cuba é o dono do Melhor Álbum de Pop – não deu pra Selena Gomez (Foto: Rich Fury/Getty Images)

A forma como a Academia lidou com suas escolhas de 2022, obviamente, aprofundou a crise de imagem que questiona a sua legitimidade e relevância há pelo menos 5 anos. Depois das respostas nada satisfatórias do presidente, a organização se viu na necessidade de reproduzir uma auto-propaganda ao vivo, no meio da cerimônia de entrega dos prêmios. O significado de rostos como os de H.E.R. estampou o lema “eu sou a Academia”, como forma de tentar recuperar a imagem de quem realiza a premiação e ilustrar os avanços de representatividade do Grammy.   

Mas no nome de artistas como H.E.R., eles se mostraram, mais uma vez, vazios. Vista como uma das mais promissoras da música estadunidense, recordista de premiações mas também alvo de controvérsias (por dividir seus vocais com Chris Brown, agressor de Rihanna, em seu disco mais recente), a jovem de apenas 24 anos acumulou 8 indicações e venceu 1. Dentre nomeações à categoria principal, em R&B, trilhas sonoras e até música cristã, seu gramofone de 2022 veio pela vencedora do Oscar 2021 Fight For You, canção de Judas e o Messias Negro, na categoria de Mehor Performance de R&B Tradicional, numa vitória que não compensa seus esforços em limpar a barra da Academia e ressocializar artistas em favor à gravadora.

Ainda no R&B, existe outra evidência: Jazmine Sullivan e Heaux Tales. O grandioso quarto registro da artista, que é uma força do gênero norte-americano, foi eleito o Melhor Álbum de R&B, mas na condição de destaque da crítica dentre os discos de 2021, não foi considerada para o prêmio principal. Seu single, Pick Up Your Feelings, apareceu em Melhor Canção de R&B e venceu em empate a categoria de Melhor Performance de R&B, com quem os queridinhos do ano – que também foram a pedra no seu sapato na categoria -, Silk Sonic em Leave The Door Open

A cerimônia também trouxe uma apresentação destoada de John Legend com artistas ucranianas cantando uma música do estadunidense, além de mostrar, virtualmente, um discurso do presidente Volodymyr Zelensky (Foto: Mario Anzuoni/Reuters)

E de tanto Bruno Mars e Anderson .Paak cantarem para alguém deixar a porta aberta, o Grammy 2022 os recebeu como se fosse em casa. Com 100% de aproveitamento de sua estreia na premiação, Silk Sonic venceu as 4 categorias em que concorria. Nas principais, o duo levou Gravação do Ano, com sua produção à altura do título para um dos maiores hits de 2021. Mas em Canção do Ano, é preciso dizer que a dupla foi beneficiada pela preguiça dos votantes do Grammy em ponderar as diferenças das categorias que ele mesmo inventou de separar.

Afinal, são dois prêmios diferentes por uma razão. Enquanto a de canção ressalta os méritos dos compositores das letras musicais de destaque do ano, a de gravação contempla o conjunto da obra, para notar, além dos compositores e intérpretes, os produtores e demais profissionais que foram responsáveis pelo sucesso sonoro da música. Assim, as faixas que atendem os dois requisitos apresentam, essencialmente, propostas diferentes, e por isso, dificilmente contemplam as duas categorias de premiação ao mesmo tempo. 

Mas o Grammy não se importa. Para além da razão mais óbvia de aproveitar a oportunidade para premiar mais de um trabalho, a Academia simplesmente acreditou que versos como “O que você está fazendo?/Onde você está?/Oh, você tem planos?/Não diga isso” e “Eu estou bonito demais para ficar sozinho” eram o suficiente para suceder a força de I Can’t Breathe, a vencedora de 2021. As lamentações libidinosas de Mars e .Paak foram entendidas como superiores à algumas das verdadeiramente melhores composições do ano, expressas nas músicas de Brandi Carlile, Alicia Keys, Billie Eilish, e Lil Nas X.

Lil Nas X, um dos maiores sucessos musicais dos últimos anos, lançou seu primeiro disco no ano passado, repetindo o sucesso de seu EP de estreia para alcançar 5 indicações em 2022 – mas diferente do saldo de 2019, agora saiu sem nenhum gramofone (Foto: Rich Fury/Getty Images)

No restante do Big 4, as coisas foram melhores – mas não por isso mais tranquilas. O título de Artista Revelação de 2022 parecia ser de Olivia Rodrigo junto com sua drivers license e a decepção amorosa que rasgou seu coração lá em janeiro de 2021, o que posteriormente se transformaria em sua estreia estrondosa através de SOUR. Sucessora natural de Billie Eilish e perfeita representação da tão desejada nova era do Grammy, agora muito mais aberto à nova geração e sensível ao espectro do trabalho musical de mulheres, Olivia angariou 7 indicações. Delas, fez bingo nas categorias principais, foi notada pelo clipe de good 4 u em Melhor Vídeo Musical e apareceu em 2 de pop, onde aconteceu seu maior – e mais controverso – triunfo. 

No meio de divas como Billie Eilish e Doja Cat, e veteranos como Justin Bieber e Ariana Grande, a novata ascendeu com o título de Melhor Álbum de Pop Vocal e Melhor Performance de Pop Solo. Aplaudida pelos seus companheiros de categoria, a questão foi na internet: o mesmo público que a jogou ao estrelato e aproveitou ao máximo seus singles enérgicos não se deu por satisfeito com as primeiras apresentações ao vivo da artista. Aos 18 anos, Olivia nunca fugiu de entoar suas músicas diante do público que a recebeu, inicialmente, com tanto carinho, apesar das dificuldades que encontrava em um início de carreira que exigiu tanto dela. Então, a jovem artista literalmente perdia o fôlego em suas primeiras performances, que agitavam os palcos e os públicos de suas estreias em premiações. 

Só que à medida que seus vídeos viralizavam com críticas ao seu desempenho, Rodrigo assumia de vez o pop-rock que expressou da melhor maneira possível seus desabafos adolescentes – e que exigia todo o ar de seus pulmões e toda a força de sua sustentação vocal. Mas quando ela encerrou o primeiro ato de sua carreira com uma dedicação expressiva para entregar o seu melhor no palco mais importante da música, sua primeira fanbase não soube reconhecer seus avanços e potencial de entrega à Arte que escolheu. Do outro lado, acontecia o que realmente merecia a nossa atenção, e a Academia, mais uma vez, recebia e identificava os méritos de uma nova artista para além de suas pompas, burocracias, tradições e preconceitos.

Se você veio aqui falar mal de Olivia Rodrigo, você veio ao lugar errado (Foto: Rich Fury/Getty Images)

Outro exemplo disso será, felizmente, atrelado ao nome de Doja Cat e SZA. Representantes femininas e negras de grande importância no rap, pop e R&B, a dupla dona de um dos maiores sucessos de 2021 se consagrou com a segunda vitória de mulheres em Melhor Performance Pop em Duo/Grupo, desde que a recente categoria foi implementada no Grammy há 10 anos. Queridas sucessoras e companheiras do título alcançado por Lady Gaga e Ariana Grande pela primeira vez em 2021, as vozes de Kiss Me More também venceram seus primeiros Grammys na ocasião, transformando o momento um dos mais especiais da noite com a simpatia e espontaneidade de algumas das artistas mais bem-sucedidas da geração.

E se o assunto são os mais queridos do público e da crítica que finalmente tiveram seu reconhecimento devido no Grammy, 2022 também brilhou o nome de Jack Antonoff. A assinatura do produtor e compositor sempre aparece nos melhores trabalhos da Música pop e alternativa, mas estreou na premiação da Academia bem longe disso em 2013, premiado como Canção do Ano e Artista Revelação junto da banda fun.. Desde então, acumula 17 indicações, dentre as quais a de Álbum do Ano de 2018 por Melodrama, de Lorde, e de 2019 por Norman Fucking Rockwell!, de Lana Del Rey. Sua principal dupla, no entanto, é Taylor Swift, com quem venceu o prêmio máximo de 2017 e 2021 por 1989 e folklore.

Em 2022, seu trabalho incansável ao lado de Clairo, Del Rey e Lorde não teve uma recepção tão positiva na Academia e na crítica, mas trouxe sua vitória na categoria que era sua por direito. A comemoração não foi ao lado de Swift, sua companhia frequente na cerimônia, que sequer compareceu à premiação com sua indicação única para evermore, mas sim com St. Vincent, outra colaboradora frequente de Antonoff, A artista também saiu vencedora da noite, na categoria de Melhor Álbum de Música Alternativa por Daddy’s Home, repetindo a parceria de sucesso que levou o Grammy de Melhor Canção do gênero por Masseduction em 2019.

Dá pra acreditar que Billie Eilish saiu do Grammy 2022 sem nada? (Foto: Rich Fury/Getty Images)

Já no rock, a predominância indiscutível foi de Foo Fighters, que apesar de vencer as 3 categorias do gênero (Melhor Álbum por Medicine at Midnight, Melhor Canção por Waiting On A War e Melhor Performance por Making a Fire) não compareceu à cerimônia. A banda passa pelo luto do baterista Taylor Hawkins, que faleceu no dia 25 de março. Fenômeno do rock que produziu o trabalho de mais destaque do gênero do último ano, a banda deu conta de suceder as honras de Fiona Apple em 2021 com Fetch the Bolt Cutters, mas se envolveu num cenário não muito bom em meio aos demais indicados da categoria, que vindo de uma igualdade para artistas mulheres indicadas do ano passado, não lembrou de nenhuma roqueira em 2022.

Mas as homenagens devidas foram prestadas, com destaque maior para a performance de Billie Elish. Na companhia fiel de seu irmão FINNEAS (controversamente indicado a Artista Revelação de 2022 depois de vencer tudo o que tinha direito com ela em 2020), a força do pop aproveitou o flerte com o rock manifesto em Happier Than Ever, seu disco mais recente, também honrado pela Academia nas categorias principais assim como foi seu álbum de estreia, para referenciar o trabalho de Hawkins com Foo Fighters. A grande vencedora de 2020 saiu de mãos abanando de 2022, mas sua passagem pela edição sempre será lembrada pela sua tremenda apresentação em que homenageou a estrela do rock.

A emoção não foi diferente durante o In Memoriam, que reverenciou a memória dos nomes que faleceram no último ano através da interpretação magnífica que os teatrais Leslie Odom, Jr., Rachel Zegler, Cynthia Erivo, Ben Platt trouxeram para as canções de Stephen Sondheim (Foto: Recording Academy)

É por movimentações complexas como essa que o Grammy 2022 surpreendeu as expectativas de uma edição desmotivada, e que a grande vitória da noite teve um brilho e um gosto especial. Afinal, quando o nome mais indicado da noite foi chamado ao palco para receber o prêmio de Álbum do Ano, a cerimônia ganhou um novo significado. Com a grandiosidade de WE ARE, Jon Batiste contrariou as apostas, venceu favoritismos e se transformou no primeiro artista negro a vencer o prêmio em 14 anos, e o 11º na história das 64 edições da premiação.

Em 2022, ele acumulou 11 indicações, das quais venceu 5. O seu desempenho nas nomeações era por si só impressionante, já que mesmo com uma carreira consistente no jazz, soul e R&B norte-americano, havia sido lembrado pela Academia apenas 3 vezes nos últimos 5 anos, bem longe das categorias principais. Mas sua habilidade em conduzir a premiada trilha sonora de Soul colocou o pianista em outro nível de visibilidade, impulsionando o seu oitavo disco nos ouvidos da Academia. 

Numa performance mágica e hipnótica, Jon Batiste parecia prenunciar sua própria vitória. Depois que ele transformou a cerimônia da Academia em uma festa ao som de FREEDOM, nenhuma outra reação foi possível ao artista e ao público quando que ele recebeu seu prêmio máximo: as lágrimas não tiveram espaço em meio à manifestação de alegria do seu mais sincero e brilhante sorriso – e que felicidade é imaginar que essa será a cena do Grammy 2022.

Nas categorias audiovisuais, Andra Day venceu por sua compilação para Estados Unidos Vs Billie Holiday, Soul e O Gambito da Rainha empataram em Trilha Original e Bo Burnham (?) bateu Leslie Odom, Jr., Jennifer Hudson e H.E.R. pela canção principal de Inside [Foto: Matt Winkelmeyer/Getty Images]
Entre seus altos e baixos, o ano de 2022 demonstrou que a situação do Grammy diante da nova geração da Música, indo desde os artistas até os meios de consumo e produção, é muito mais complexa do que uma mera questão de audiência, dinâmica e/ou administração. Sequer é sobre a ideia heterogênea e inalcançável de reconhecer “o melhor da Música mundial”. Perdida em seus caminhos, assim como o público que a acompanha, a premiação da Academia de Gravação tem dificuldade em entender que, diferente de toda a tradicionalidade que tenta manter, a movimentação cultural atual vai em direção da Arte acessível – e a protagonista disso é o seu objeto tão venerado, a Música. 

No protagonismo das principais vitórias de 2022, vê-se a necessidade da Academia de ampliar o acesso de artistas mulheres, jovens, não-brancos e fora dos Estados Unidos, e de preparação do público do Grammy, para saber apreciar o triunfo desses artistas ante aos nomes já devidamente considerados pela na premiação. Basta a Academia e seu público enxergarem, através do brilho de sorrisos como os de Jon Batiste, ou da alegria de presenças como a de SZA, ou do poder de personalidades como Jazmine Sullivan, ou da preciosidade do reconhecimento de artistas como Arooj Aftab, a luz que iluminou a 64ª edição da premiação – nada além de um reflexo.

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