Meia década de I Never Learn: amar dói, mas a gente sobrevive

(Foto: Reprodução)

Jho Brunhara

A tristeza é contagiosa, talvez até mais que a felicidade, e em uma geração que valoriza tanto estar na bad, certos álbuns são indispensáveis para madrugadas em que o fundo do poço é o único local possível da terra para se estar. Em maio, o arrebatador I Never Learn, terceiro álbum de Lykke Li, completou cinco anos. A cantora do hit I Follow Rivers se mudou da Suécia para Los Angeles após um término, onde passou dois anos escrevendo o disco. O resultado foram nove músicas poderosas, cruas e destruidoras.

Crua. Talvez não exista palavra melhor para definir a sonoridade do álbum. Os instrumentos raspados, a voz sem modulação ou nitidez, os ruídos do estúdio antes de No Rest For The Wicked e Sleeping Alone. Um coração partido talvez seja uma das piores coisas que alguém pode vivenciar a nível sentimental, e é uma dor que vibra na mesma frequência que a voz de Lykke ao longo das faixas.

I Never Learn abre o álbum carregada de nostalgia e anuncia: “o amor dele queima como um relâmpago”. Ouso dizer que essa é uma das melhores músicas já feitas. A forma como a melodia se encaixa com os instrumentos e a poesia metafórica – outro detalhe presente em quase todo o álbum –, é como se em apenas três minutos e seis segundos os sentimentos presentes na paixão e na desilusão fossem capaz de se condensar em uma canção.

Mais de uma vez ao longo das faixas, Lykke se questiona de suas decisões e repassa todo o relacionamento na sua cabeça. Como nós, meros mortais, que enfrentamos dias e noites refletindo o que poderíamos ter feito de diferente, e se é que poderíamos ter mudado alguma coisa. Algumas coisas são inevitáveis, ou irreversíveis, como canta em Gunshot.

As fases de um coração partido se assemelham ao luto, e se a música título é um anúncio de um ciclo que enfrentamos toda vez que nos apaixonamos, as outras faixas percorrem todos os períodos, da negação à aceitação. Talvez o que faça esse disco tão diferente não só dos outros da cantora, que uma vez já cantou que a juventude não conhece a dor, é que em nenhum momento Li projeta a dor ou o fim em outra pessoa. “Em um mar de culpa, sob as estrelas caídas”.

“O amanhã demora tanto, o esquecimento é tão longo” (Foto: Josh Olins)

O sofrimento quando somos forçados a nos desprender de outra pessoa é venenoso. Quanto mais nos fixamos a ele, mais somos intoxicados. Mais nos convencemos que o amor de verdade não existe, e que essa vida serve apenas para nos condenar a tristeza eterna e o arrependimento por todas as decisões – mesmo que isso não seja verdade.

A forma com que esse sentimento é capturado em músicas como Love Me Like I’m Not Made of Stone e Never Gonna Love Again quase que colocam Lykke cantando diretamente para quem ouve. E ficamos refém da ação de concordar. O amor verdadeiro dói como um tiro. “Dessa vez eu não posso correr, porque eu nunca mais vou amar de novo”.

Enquanto caminha pelas fases do luto e processa tudo o se sentiu e ainda sente, a aceitação se aproxima, ainda que o medo do futuro seja preocupante. Se a promessa da faixa anterior era que seria impossível amar de novo, em Heart of Steel a alma de Li implora que seu coração não se feche ao amor para sempre apenas porque se encontra destruído agora. Como no filme Me Chame Pelo Seu Nome, as palavras do pai de Elio se consolidam assim como as da cantora. “Mas se obrigar a não sentir nada para que não se sinta alguma coisa, que desperdício.” Não vale a pena se privar do amor apenas por uma decepção.

A grandiosidade de I Never Learn se faz pela sua simplicidade. Por sua produção crua e verdadeira, consistente com os sentimentos que quer transmitir. Quando se ouve o disco com o coração partido, é impossível não se identificar com a atmosfera que ele carrega. E talvez seja doloroso estar imerso na tristeza, mas dói da mesma forma que é necessário para se seguir em frente. A negação não cura ninguém. 

Talvez nunca vamos aprender a amar da forma certa, sem se entregar rápido demais ou correr e machucar quem amamos. Talvez ninguém saiba realmente como conduzir os sentimentos. Mas enquanto a arte existir, ela servirá de refúgio para que possamos absorver esses sentimentos, entendê-los e nos entender.

De forma despretensiosa, Lykke Li soube transformar sua dor em músicas poderosas, densas e cheias de reflexões. Jamais saberemos quantas almas vagantes na tristeza das desilusões amorosas foram auxiliadas por esse álbum, mas é certo que o amor é um dos sentimentos mais frágeis que existem, e também um dos mais fortes. Tudo é um processo. Principalmente amar, mas esquecer também. Ou apenas aprender a viver com a ausência.

We never learn.

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