Melhores discos de Maio/2019

Shantay you stay (David Dagley)

Adriano Arrigo, Egberto Santana, Gabriel Leite e Leonardo Santana

A sua mãe gosta dele. A comunidade LGBT+ ama dele. Assim como a família real britânica e a cantora Lady Gaga. Elton John é um monstro da cultura pop, com três dezenas de discos lançados e uma elogiada cinebiografia saindo do forno. Rocketman (Dexter Fletcher, 2019) já é considerado o primeiro filme de um grande estúdio a retratar o sexo entre dois homens de forma natural e explícita, exigência feita por Elton pessoalmente. Fica a dica de uma discografia que, apesar dos altos e baixos, é brilhante.

Os registros que deixamos abaixo são também recomendações pessoais do Persona. Maio foi um mês de trabalhos muito grandes para seus respectivos públicos e tem música para muitos gostos e tribos. Aproveitem!

 


Flying Lotus – Flamagra

música eletrônica

Com uma discografia até o momento impecável, Flying Lotus lança Flagrama, um dos discos mais intrigante e criativos até esse momento do ano.

Desta vez, o americano conta com parcerias inéditas e inusitadas, como Little Dragon, Solange e David Lynch. Com este último, produziu uma das músicas mais interessante do disco, Fire is Coming.

Aliás, o disco todo possui momentos surpreendentes devido sua grande rotatividade de texturas sonoras. As 27 faixas – que mais parecem uma só – permitem, sem excessos, formar um mosaico (que, inclusive, pode se ver na capa do disco) que ora flertam com a calmaria, ora com o caos. (AA)


Jair Naves – Rente

rock, folk

“Qualquer busca por empatia / a essa altura é ingenuidade / eu me defendo esperando o pior”: essas são as primeiras palavras cantadas por Jair Naves em Rente, seu 3º disco cheio e, de modo peculiar, uma obra conceitual. As canções variam entre a fúria e a impotência e, apesar de ser fácil identificar o objeto delas (“Palanque para o horror / o dia em que o mal triunfou / saúdem o torturador”, versa a pesada “Alívio Cômico / Palanque”), é difícil tirar uma conclusão logo de cara.

Naves é um dos letristas mais talentosos da nossa música – e é ainda jovem. Ele surgiu no underground em 2000 com a banda Ludovic, conhecida pelos shows caóticos e pelos versos ácidos sobre relacionamentos e autopiedade. Sua estreia solo, o EP Araguari, veio 10 anos depois. Dali em diante ele se consolidou como um intérprete de canções densas sobre o amor, o desamor e as armadilhas kafkianas que a vida nos aplica. Por isso sua obra sempre se voltou para o interior. Rente quebra um pouco essa subjetividade ao lidar mais diretamente com as questões sociais e políticas que afligem nós, brasileiros, dia após dia.

Rente é conceitual por convergir a esfera pessoal e a pública a todo momento. A supracitada “Alívio Cômico / Palanque” cita indiretamente o homônimo de Naves ao mesmo tempo em que dispara “Quão forte é o instinto que me faz sobreviver? / Eu ainda existo, não me deixa esquecer”. Na faixa-título, uma dinâmica parecida: “Aproveitando o ensejo / Eu despejo todo o peso que carrego comigo” descamba para “Síndrome do poder pequeno / informação como envenenamento”.

O fato de Jair estar morando fora do país talvez explique a linguagem cifrada que ele escolheu para o novo disco. Vem daí também a impotência, traduzida ora de maneira catártica (“Deus Não Compactua”, “Lampejos de Lucidez”, “O.H.R.E.U.C.S”), ora de maneira contemplativa (“Gira”, “Escalas”). Independentemente disso, todos os arranjos tem homogeneidade e fluidez. Mesmo os momentos mais complexos se resolvem, mérito da entrosadíssima banda (um show provavelmente imperdível!). Em suma, um dos grandes discos do ano, desde já. (GF)


Jamila Woods – LEGACY! LEGACY!

soul, r&b

Excelência negra é um termo que surgiu online para descrever um sujeito que, por suas realizações, honra a comunidade negra. Os artistas e pensadores homenageados em cada uma das faixas do novo disco da americana Jamila Woods, LEGACY! LEGACY!, são facilmente incluídos nesse panteão. Mais madura do que nunca, a cantora de Chicago toma para si o legado desses nomes para guiar um caminho feito de puro orgulho.

Os discursos de Woods são complexos e ganham mais nuances a cada audição. É um disco rico. Mas mesmo a superfície revela a mensagem primordial: a pressão para ser excelente em um mundo de mediocridade branca pode fazer mal. As ramificações dessa percepção rendem elementos como raiva, crítica social e bem-estar, que vão dando cor e textura ao todo.

Não ficando pra trás, a produção preza pelo casamento entre a crueza (complementada pela voz à Erykah Badu da intérprete) e o acessível. Não é um registro para todos, mas todo mundo deveria ouvir. (LS)


Tyler, the Creator – IGOR

rap, hip-hop, soul

Em seu quinto álbum de estúdio, Tyler marca um passo consistente e bem sucedido ao tirar a máscara e mostrar mais um fruto de seu amadurecimento. IGOR é Tyler Okhoma sendo autêntico, livre e fazendo o que sabe de melhor do jeito que ele quer. Não custa nada dizer: o mais diferente e único de sua carreira até o momento.

Apesar de delimitar um diferencial para seu novo projeto, as 12 faixas marcam uma construção de mundo e personagem extremamente bem envolvida entre as transições. E dessa vez, nada de psicopata, hospício ou versos problemáticos, aqui temos uma completa seleção de love songs descrevendo desde a primeira vista da paixão até o fim da relação amorosa. Tudo isso no embalo de uma melodia suave atrás de baterias e vocais distorcidos, com colaborações que vão desde Playboi Carti, Solange, até os já parças Pharrel Williams e Kanye West.

Como o próprio disse e os fãs insistem em contradizer, não é um álbum de rap – e nas poucas rimas, Tyler demonstra que não perdeu o fôlego – nem é nenhum de seus antecessores. É apenas IGOR, então ouça e experience-o como tal. (ES)

Deixe uma resposta