Melhores discos de Fevereiro/2019

A audiência para a regulamentação dos ‘trenzinhos da alegria’, em fevereiro na Câmara Municipal de Fortaleza, rendeu o momento mais brasileiro do ano (Reprodução)

Egberto Santana Nunes, Gabriel Leite Ferreira, Leonardo Teixeira e Vinicius Silveira

Só depois do Carnaval. O sucesso da cantora Lexa não poderia ser mais verídico, já que nem a nossa curadoria resistiu à maior festa do mundo e acabou se atrasando. Pedimos desculpas.

Abaixo você confere os sons que embalaram o fevereiro do Persona e que, um mês depois, ainda valem o play.

O batismo de Angel ilustra a capa de seu primeiro álbum, lançado pelo selo especializado em jazz Internacional Anthem. (Foto/Reprodução)

Angel Bat Dawid – The Oracle

jazz, experimental

The Oracle é o primeiro trabalho da clarinetista, compositora e multi-instrumentalista Angel Bat Dawid.  Residente de Chicago onde ela comanda uma loja de discos e eventualmente realiza eventos com músicos da região, ela é dona de um talento que culmina numa experiência de 43 minutos de pura introspecção e conhecimento.

Do mais puro underground, ela produziu, mixou, e gravou quase todos os instrumentos e vozes sozinha, e usando apenas seu celular. Centrado num jazz experimental, cada música segue um trejeito próprio. Mistura de instrumentos, vozes distorcidas, spoken-word, ambient e um destaque para um free jazz louco de 15 minutos com participação do baterista Asher Shimizo Gamedze – a única participação entre os solos da artista.

Com vozes duplicadas e um leve piano de fundo, a terceira faixa What Shall I Tell My Children Who Are Black simplesmente distorce como um coral o início do poema de mesmo nome, dando tons de um hino religioso e profundo.  Um encontro entre Alice Coltrane e Miles Davis. As faixas flertam entre o inconsistente e agitado barulho do jazz, e o espiritual e místico das vozes e gravações. No seu todo, uma maneira única da música negra voltar para o passado, moldar o futuro e alcançar novos padrões. Precisamos de mais Angels.

Coloque os fones de ouvido e deixe-se levar. (ES)


Ariana Grande – thank u, next

pop

O sucesso não pára. 2018 foi um ano pra lá de produtivo para Ariana Grande, mas nada que se compare à fase atual da cantora. Isso porque a princesinha do pop conseguiu, nas últimas semanas, emplacar 3 músicas no top 3 da principal parada americana — um gostinho que até então só os Beatles sentiram. Tanta popularidade vem acompanhada de uma carga pessoal fortíssima, já que thank u, next passa longe do pop descartável que muita gente espera do gênero.

A nova empreitada de Ariana é uma coleção de confissões e desabafos sobre diversos temas, mas o que dá liga ao todo é o tratamento sombrio depositado nessas vivências. Mais madura do que nunca, Grande seus fantasmas de frente  e deixa bem claro: é dona de sua narrativa. Destaque para ghostin, faixa que traduz com maestria a desilusão nos amores contemporâneos. (LT)


Jards Macalé – Besta Fera

MPB, experimental

Apesar de nome intrínseco à Tropicália, o carioca Jards Macalé sempre esteve à margem. Junta-se a nomes fundamentais como Sergio Sampaio, Tom Zé e Arthur Verocai no que se denomina “artistas malditos” da nossa MPB. Mas, a julgar por Besta Fera, isso nunca foi problema pra ele; muito pelo contrário.

Seu 12º disco de estúdio – o primeiro de inéditas desde 1998 – bebe da mesma fonte que os últimos trabalhos de Elza Soares. Com produção de Kiko Dinucci e Romulo Fróes, Besta Fera usa e abusa de arranjos tortos e sujos que casam perfeitamente com as letras pessimistas. “Chegamos ao limite da água mais funda”, canta Jards em “Trevas”, single que tem uma peculiaridade irônica bem apontada pela Vice: é uma adaptação do poeta inglês Ezra Pound, notório simpatizante do fascismo.

Besta Fera não é explicitamente político como Mulher do Fim do Mundo. A militância se dá mais pelo clima opressivo que predomina, seja na produção, nos arranjos ou nas letras. E não há solução para nosso aparente afogamento. (GF)


Jessica Pratt – Quiet Signs

folk

Jessica Pratt pode ter nascido em 1987, mas seu DNA musical é de tempos muito mais remotos. O minimalista Quiet Signs poderia ter saído na década de 60, qual sua semelhança com as obras de Joni Mitchell e Nick Drake. A produção seca e o número limitado de instrumentos (violão, guitarra, piano, órgão e sintetizadores) remete aos clássicos do folk, bem como à psicodelia. Há algo de pastoral em Quiet Signs. Perfeito para dias nublados. (GF)


Offset – FATHER OF 4

hip – hop, trap

Em seu primeiro álbum solo, o integrante do grupo Migos, Offset, mostra um lado diferente do usual, daquele que já conhecemos dos seus trabalhos anteriores, como Culture e Culture II. Offset sempre foi integrante mais envolvido em problemas relacionados à polícia e à drogas. Esse passado conturbado, faz com que mesmo nas músicas do trio, onde a proposta dos últimos trabalhos é claramente mais pop e visa mais o mainstream, o rapper tenha versos mais carregados de dor e mais agressivos que os de seus companheiros, e isso se mostra escancarado neste álbum solo.

Produtor da maioria das faixas, Metro Boomin, junto com Southside decidiram dar mais destaque aos graves dos baixos e 808’s, do que nos usuais loops de guitarra e synths, fazendo com que o vocal tenha mais domínio sobre a melodia e menos sobre a bateria. Esse encaminhamento se encaixa perfeitamente na proposta do álbum, algo mais pessoal e menos comercial, onde a voz do artista fica mais evidente.

Claro que não faltaram rimas sobre Glocks e Lamborghinis, porém, nesse trabalho, Offset mostrou que, além de desenrolar no storytelling, também sabe falar de sentimentos como vergonha, arrependimento, dor, ansiedade e paranoia. Como já adiantado pelo nome e pela capa, onde Offset aparece com seus quatro filhos, em um cenário parecido com o Egito ancestral, o projeto é dedicado à seus filhos. A faixa que leva o nome do disco é um pedido de desculpas, onde Offset relata as dificuldades de ser pai jovem, usando letras como “Had a baby as a kid, mama kicked me out/ Had to go and hit a lick, tryna put food in your mouth”. (VS)

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