Animais Fantásticos e Onde Habitam: Um início promissor para a nova saga

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Guilherme Reis Mantovani

Quando a tela se apagou, as luzes se acenderam e os créditos de Harry Potter e as Relíquias da Morte Parte 2 começaram a subir, um sentimento emocionalmente devastador incidiu sobre a geração que cresceu ao lado de Harry, Rony e Hermione; uma sensação agridoce, que fundia a alegria de ter compartilhado um universo tão rico e encantador, e a tristeza de deixar uma parte preciosa de nossa infância em Hogwarts para sempre.

No entanto, visando extrair mais conteúdo desta franquia – um dos principais produtos culturais do século XXI –, eis que novos projetos são colocados em prática cinco anos após o término cinematográfico da saga: o horroroso (em termos de enredo) e contraditório Harry Potter e a Criança Amaldiçoada, uma peça de teatro exibida em Londres, que viria a ser adaptada para um livro-roteiro, e o surpreendente Animais Fantásticos e Onde Habitam, dirigido por David Yates, que esteve à frente dos quatro últimos filmes da saga d’O Menino que Sobreviveu.

 

Ambientalizado em Nova York no ano de 1926 e roteirizado por J.K. Rowling (apesar de conhecermos a capacidade da consagrada autora, é admirável constatar que o roteiro praticamente atinge a excelência, dado o fato de que este é o primeiro trabalho de Rowling no ramo), o filme narra a história de Newt Scamander (Eddie Redmayne), um magizoologista britânico detentor de uma maleta repleta de animais mágicos. Após uma troca acidental de bagagens com o “no-maj” (um “trouxa”, como estamos costumados) Jacob Kowalski (Dan Fogler), algumas criaturas acabam fugindo e causando transtorno cidade afora. Acompanhado por Jacob, pelas irmãs bruxas Tina (Katherine Waterston) e Queenie (Alison Sudol), Newt tenta recuperar os animais – tarefa esta que ganha contornos mais perigosos, dada a perseguição por parte de membros do Ministério da Magia dos Estados Unidos e dos recentes ataques promovidos pelo famigerado e temível bruxo do leste europeu, Gellert Grindelwald (Johnny Depp).

O que poderia se configurar em uma premissa simples para a essência do filme, ganha traços mais complexos ao longo da projeção ao expor temas como a segregação fomentada por discursos de ódio e até, em certo momento, a relação compulsiva entre politicagem e a grande imprensa. O teor político, tão presente em Harry Potter, portanto, dá as caras também em Animais Fantásticos de forma velada, mas profunda.

Visualmente, o filme revela-se um primor, com técnicas que se relacionam com o teor da narrativa, se complementam com a trilha sonora e fomentam a qualidade estética, à exceção de poucas cenas em que o CGI soa um tanto exacerbado. Os cenários a céu aberto são, em sua maioria, nublados ou enevoados. A paleta de cores é dessaturada e escura, o que evidencia um clima sombrio muito similar aos últimos filmes de Harry Potter. O figurino e o design remetem de forma verossímil à Nova York dos anos 20, e casa muito bem com o contexto social do período, com referências visuais e subjetivas à Grande Depressão e à Lei Seca, revelando uma maturidade – num sentido histórico – não tão presente na saga de Potter. Além disso, é simplesmente maravilhosa a sequência de cenas em que conhecemos o interior da maleta de Newt Scamander, onde vislumbramos os animais que intitulam o filme e seus diferentes habitats, com transições leves, orgânicas e esteticamente impecáveis… concluo que, mesmo após cinco anos, Rowling definitivamente continua com seu talento de nos impressionar com sua inventividade e criatividade.

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O elenco é, sumariamente, um acerto generalizado: Redmayne se sai muito bem no papel do protagonista ao manter sempre um olhar baixo e fugaz, além de uma postura contida, revelando características importantes de seu personagem apenas com suas expressões corporais, como a introspectividade e a inocência. O ator, no entanto, se solta quando necessário: sempre ao se deparar com alguma de suas criaturas, exibe um brilho no olhar contundente e uma expressão fascinada, que denota, de forma muito cativante, um forte apego pelas mesmas. Waterston exibe uma Tina insegura e temerosa num primeiro momento, mas corajosa quando se vê obrigada a encarar situações controversas. Kowolski, personagem de Fogler, é engraçado na medida certa, revelando-se um bom alívio cômico, além de ser uma representação evidente do próprio público: não detentor de sangue mágico, impressiona-se com as revelações e situações que lhe são apresentadas gradativamente. Sudol como Queenie, Farrel como Graves, Miller como Credence e Depp como Grindelwald – em rápida participação – completam o excelente time de atores.

O filme, no entanto, não é um acerto completo. O final do segundo ato, ao deixar um pouco de lado o tom “aventuresco” – característica primordial do longa até então –, perde o ritmo e se desacelera, prolongando-se em alguns momentos (sobretudo nas cenas envolvendo justamente a recaptura dos animais mágicos), que apesar de serem empolgantes e jocosas, poderiam ter sido abreviadas ou evitado clichês, como uma sequência envolvendo uma barata e um bule de chá. Outra problemática recai sobre a ação envolvendo o Obscurus, já no final do filme: a destruição involuntária de parte de Nova York por Credence é longa e ligeiramente exagerada.

Contudo, o maior mérito do filme está no fato de conseguir fazer uma ponte concisa e coerente com o vastíssimo universo de Harry Potter (a memorável melodia da famosa Hedwig’s Theme se faz presente aqui, e é simplesmente emocionante ouvi-la no cinema após tanto tempo) e se apresentar, simultaneamente, como uma obra independente, com personagens já inseridos no meio em que a trama se desenvolve, sempre trabalhando um jogo inteligente de causa e efeito para movimentar a história. Desta forma, Animais Fantásticos e Onde Habitam se mostra preparado para abarcar um público totalmente novo, mas também agradar os fãs antigos e oferecer uma continuação digna ao mundo que nos foi apresentado pelo bruxo de cicatriz em forma de raio que vivia num armário sob a escada.

Um comentário em “Animais Fantásticos e Onde Habitam: Um início promissor para a nova saga”

  1. Animais Fantásticos e Onde Habitam se tornou em uma das minhas histórias preferidas desde que li o livro, quando soube que seria adaptado a um filme, fiquei na dúvida se eu a desfrutaria tanto como na versão impressa. Já conhecia o livro, eu li faz muito tempo e é um dos meus preferidos. Gostei muito de Animais Fantásticos e Onde Habitam, conhecia a história e realmente gostei. Super recomendo.

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