Jump In! e o questionamento da masculinidade tóxica

(Foto: Reprodução)

Júlia Paes de Arruda

Muitos filmes abordam a figura do herói como corajoso por enfrentar seu inimigo. Harry Potter superou sete livros para enfim derrotar Voldemort. Daniel San mostrou sua força vencendo Johnny no torneio. Mas em  Jump In!, o protagonista Izzy é corajoso porque ele prefere pular corda ao invés de lutar boxe.

Jump In! é estrelado por Corbin Bleu, de High School Musical, que vive Izzy Daniels, um boxeador adolescente e incentivado pelo pai (também seu treinador) a ganhar o título da Luva Dourada. Até esse momento, Izzy parece ser apaixonado por boxe e caçoa de sua vizinha Mary (Keke Palmer, de True Jackson) que pula corda como esporte. Isso muda quando a equipe de Mary perde uma das suas participantes e Izzy se oferece no lugar até que arrume outra para a equipe.

A equipe de Izzy e Mary ganhou o nome de Hot Chili Steppers, referenciando a banda Red Hot Chilli Peppers. (Foto: Reprodução)

Durante todo o filme, o boxe é abordado como um esporte restrito a homens. Lado a lado, vemos Izzy percebendo que o sonho de ser um lutador de boxe não é seu e sim de seu pai. Depois da morte da sua esposa, ele encontrou no boxe seu único refúgio. Isso é evidente no dia a dia da família. Mesmo depois do falecimento, o pai tenta manter os mesmos hábitos, como o jantar às sete da noite. Por isso, ele tenta encontrar no filho uma maneira de sentir feliz por momento à custa de um sonho que não o pertence.

Essa situação não é vista apenas em filmes adolescentes. Como Treinar seu Dragão é exemplo disso. Na trama, Soluço tenta seguir os passos de seu pai: o chefe e o melhor viking da vila onde mora. Para isso, ele precisa matar um dragão – cerimônia de passagem de um garoto para um viking. Entretanto, Soluço não considera isso uma ideia viável. Aliás, ao se deparar com um Fúria da Noite, o dragão mais perigoso conhecido, ele não consegue matá-lo. Ao invés disso, ele sente empatia pelo dragão (e até lhe deu um nome: Banguela).

E isso se torna um empecilho para a vila, acostumada ver homens matando dragões e não tratá-los como iguais. Com o decorrer do filme, Soluço consegue mostrar que ser um viking (ou ser um homem, por que não?) não é necessário partir para a agressividade, oprimir seus sentimentos, ou, nesse caso, matar um dragão. Demonstrar fragilidade não te faz menos homem, só te faz um ser humano.

Soluço só se torna um viking de fato quando poupa a vida de Banguela e desconstrói a ideia de masculinidade da vila (Foto: Reprodução)

Dentro da trama de Jump In! há ainda a figura de Rodney Tyler (Patrick Johnson Jr.), um garoto que todos tinham medo por bancar o durão dentro e fora do ringue. Após uma luta contra Izzy, que acaba vencendo, Rodney faz de tudo para que haja uma revanche. Até mesmo divulgar para todos da escola que Izzy não aceitava outra luta por “estar ocupado demais pulando corda”. Alvo de piadas e de risadas (mesmo de seus amigos), Izzy desiste de continuar pulando corda e aceita uma nova luta. No final das contas, ele consegue provar que sentir raiva e partir para a agressão não é a solução, mesmo que a vida esteja com dificuldades. Rodney acaba descobrindo que sentir raiva é exaustante e é mais ainda quando ela se torna seu único refúgio.

Paralelo a essa situação, podemos citar o seriado policial Brooklyn Nine-Nine. A série tem mudado a figura midiática do que é ser um homem. O exemplo mais relevante é o do sargento Terry Jeffords (Terry Crews). Terry tem o estereótipo do cara durão: é forte, musculoso e alto. Entretanto, sua personalidade foge totalmente disso: é um dos personagens mais emotivos da 99ª Delegacia. Ele não sente vergonha de demonstrar seus sentimentos, principalmente envolvendo sua família, e não tem medo de parecer fraco aos olhos de seus colegas.

TERRY LOVES YOGURT (Foto: Reprodução)

Outra figura importante para a série é o capitão Raymond Holt (Andre Braugher). Ele é o cara de mais autoridade no departamento e, além de ser negro, é gay. Isso é de extrema relevância para o enredo já que foi o preconceito com a sua sexualidade que o incentivou a seguir em frente na carreira de policial. E isso não o faz ser menos competente ou menos homem que os outros candidatos.

Charles Boyle (Joe Lo Toglio) e Jake Peralta (Andy Samberg) também são exemplos de como a série aborda a masculinidade saudável. Enquanto Boyle não esconde sua paixão pela gastronomia, algo que seria visto como um hobby feminino, e não hesita em ser um pai atencioso e carinhoso com seu filho; Jake mostra que o estereótipo de “machão” tão idolatrado por ele não afeta sua forma de agir na realidade. O principal exemplo disso é sua relação com sua parceira, Amy Santiago (Melissa Fumero). Ele não a diminui e não a desqualifica no trabalho; mesmo após ficarem noivos, Jake dá seu apoio e tenta manter um relacionamento saudável, demonstrando seus sentimentos e suas preocupações.

“Toda vez que alguém se dispõe a mostrar quem realmente é, o mundo se torna um lugar melhor e mais interessante” (Foto: Reprodução)

Em relação à Jump In!, Izzy Daniels consegue mostrar seu amadurecimento. Ainda que no início ele insiste em reproduzir a ideia da masculinidade tóxica, sua paixão pelas cordas fala mais alto. Além disso, se tornar um alvo de piadas de seus conhecidos não o tornou mais fraco. Ao contrário. Ele se tornou um modelo a ser seguido por sua família, por seus amigos e pelas crianças que escutam sua história. No fim de tudo, Izzy mostrou que pular corda, participar de uma competição e ser o vencedor não o torna “menos homem” que qualquer outro.

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