Lagum: tem gente que só começa Depois do Fim

Capa do álbum Depois do Fim, da banda Lagum. Quatro homens estão centralizados na imagem, distantes, sentados em uma janela em cima de um telhado. A casa na qual o telhado está, queima em chamas, com fumaça e fogo aparecendo nos cantos. Os homens aparentam estar tranquilos, conversando no local, que está anoitecendo e sendo iluminado apenas pelas chamas.)
A estética de casa em chamas aparece no terceiro álbum de estúdio da banda Lagum e aponta para um recomeço pós destruição (Foto: Sony Music)

Luiza Lopes Gomez

Angústias, perdas, negação e reencontro. Estas são algumas das palavras que caracterizam e são usadas como base para a criação do terceiro álbum da banda mineira Lagum. Depois do Fim é lançado como um olhar diferenciado sobre o mundo e traz à tona questões filosóficas talvez nunca aprofundadas nos últimos discos – pelo menos, não na mesma intensidade. A chegada do projeto recorre a jornadas internas em meio ao entendimento do despertar depois do fim, abordando temáticas como o destino e o acaso, a saudade, o reconhecimento pessoal e esclarecimentos internos na mente de um jovem reflexivo. 

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Escrevemos nos muros o que sentimos na Pele

Cena do documentário Pele, de 2021. A imagem mostra um apoio de viaduto, em que a metade inferior possui um grafite de uma mulher deitada, em tons de vermelho, com cabelos pretos. Em frente ao grafite, há uma mulher branca, de cabelos escuros e roupas pretas praticando ioga
No meio de uma avenida movimentada, pode-se achar um momento de calma (Foto: Embaúba Filmes)

Laura Hirata-Vale

O toque pode ser áspero, macio, quente ou gelado. Pode ter uma sensação seca ou hidratada. O maior órgão do corpo humano é a pele e é por meio dela que é possível não só sentir a dor e a temperatura, mas também as conexões se formarem, os pelos eriçarem e os sentimentos se aflorarem. É na pele que escrevemos lembretes, tatuamos frases, desenhos e lembranças. Os muros e as paredes das cidades também passam por um processo parecido: por meio de escritos, desenhos e lambe-lambes, as superfícies das florestas de concreto se colorem, e são aquecidas e resfriadas com o passar do dia. No documentário Pele (2021) – dirigido por Marcos Pimentel, produzido pela Tempero Filmes e distribuído pela Embaúba Filmes – a relação entre o meio urbano, a arte e a manifestação de ideias é explorada de forma simples, musical, cotidiana e cheia de denúncias. 

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Mussum, o Filmis: o samba e o humor brasileiro agradecem

Maior estreia nacional em 2023, Mussum, o Filmis integrou a programação da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Downtown Filmes)

Vitória Gomez

Mussum, o Filmis chegou às telas em uma safra fértil para as personalidades brasileiras: alguns meses depois de Nosso Sonho, junto do documentário Elis e Tom, Só Tinha de Ser com Você e Meu Nome é Gal, e pouco antes de Meu Sangue Ferve por Você. Haja cultura e diversidade em um ano em que, independentemente dos desempenhos individuais de cada obra, o Cinema nacional mostrou a potência que é – e que poderia ser ainda maior com políticas públicas que verdadeiramente valorizassem esse potencial. Para melhorar, a envolvente cinebiografia do sambista, ator e comediante Mussum, eternamente conhecido pelo seu papel como um dOs Trapalhões, arranca risadas fáceis e, não por menos, estreou com seis Kikitos do Festival da Gramado na bagagem, além de passagens pelo Festival do Rio 2023 e pela 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, na seção Mostra Brasil.

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Não há nada de vazio em um Domingo à Tarde

Cena do filme O Vazio de Domingo à Tarde. Na imagem, Gisele Frade, uma mulher branca que interpreta Mônica, retira a  maquiagem em frente a um espelho com moldura branca. Ao lado direito do espelho, há fotos do rosto de Mônica com hematomas. Além disso, há uma taça de vidro e um demaquilante para a remoção da maquiagem na mesa em que a personagem está.
O longa-metragem, presente na 47ª Mostra Internacional de Cinema, marca a estreia de Gisele Frade como atriz nas telonas (Foto: André Carvalheira)

Guilherme Machado Leal

A metalinguagem é uma das formas de se contar histórias no audiovisual. A partir dela, discussões sobre a arte dentro da arte são inúmeras e não possuem uma maneira específica de abordagem. Por exemplo, em Pânico 3, os personagens gravam um filme slasher enquanto vivenciam o subgênero em suas vidas pessoais. As narrativas autorreferenciais são importantes porque tiram o foco do exterior e priorizam o processo de criação em detrimento à finalidade dele. É nesse lugar que O Vazio de Domingo à Tarde, dirigido por Gustavo Galvão, se encontra. 

O longa, que estreou na seção Mostra Brasil da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, acompanha a história de Mônica (Gisele Frade), uma atriz conturbada com a sua carreira e vida pessoal, que se entrelaçam e a tornam uma só. Tendo como ponto de partida a sua relação com o trabalho, a personagem trava uma batalha interna entre o seu eu pessoal e o lugar de prestígio que ocupa no imaginário daqueles que a admiram. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que a protagonista passa por essa jornada, Kelly (Ana Eliza Chaves), uma adolescente que almeja o estrelato, possui a artista como inspiração e fará de tudo para entrar no mundo da atuação.

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O documentário da Xuxa tem sorte de ter a Rainha dos Baixinhos como estrela

Foto promocional de Xuxa, o Documentário. Na imagem, a silhueta da Rainha dos Baixinhos aparece como uma sombra em meio ao cenário todo iluminado e colorido em tons quentes. Ao fundo, a icônica nave da Xuxa está aberta ao lado de dois X gigantescos. Em meio às escadas, uma grande camada de fumaça faz com que a apresentadora pareça estar nas nuvens de seu próprio planeta.
Xuxa, o Documentário se tornou a obra do gênero mais assistida da plataforma Globoplay (Foto: Blad Meneghel)

Nathalia Tetzner

Celebrando 60 anos de vida em 2023, Maria da Graça Meneghel entrega a figura estelar da Rainha dos Baixinhos nas mãos da roteirista Camila Appel e dos diretores Pedro Bial, Cássia Dian e Mônica Almeida que, em Xuxa, o Documentário, resgatam os momentos cruciais do maior fenômeno da história do entretenimento brasileiro. Dividido em apenas cinco episódios liberados semanalmente pela plataforma de streaming Globoplay, o seriado tenta o impossível: compilar décadas de uma trajetória estratosférica. E, com as cortinas do espetáculo despencando na frente do espectador, o produto final cai, mas não sem atirar o brilho da fantasia de volta. 

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Nosso Sonho é coisa de Cinema

Nosso Sonho esteve entre os cotados para representar o Brasil como Melhor Filme Internacional no Oscar 2024 (Foto: Manequim Filmes)

Vitória Gomez

Se o Cinema é um modo divino de contar a vida, as cinebiografias são a vida passando na frente dos nossos olhos. No entanto, assim como acontece com os documentários, realidade e ficção se misturam e o ponto de vista sempre se sobressai. Por que não usar isso a seu favor? É o que Nosso Sonho: A História de Claudinho e Buchecha faz: o longa-metragem que reconta a trajetória da maior dupla de funk nacional abraça de vez o sentimento e mostra que, por trás das coreografias inusitadas e das letras contagiantes, o que prevalecia era a amizade entre os dois.

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Casamento às Cegas perde essência na terceira temporada e gera desgaste com momentos incômodos

Foto do cenário onde é gravado o reality show Casamento às Cegas. O casal Camila Queiroz e Klebber Toledo, apresentadores do reality, estão ao centro da imagem, à frente do cenário. Ela é uma mulher branca de cabelo liso castanho e usa um vestido na cor azul com pedras brilhantes. Klebber é um homem branco de cabelo liso castanho e barba rala, o rapaz veste um terno preto, mesma cor de sua calça e unhas, que estão pintadas. O casal está de lado e se abraçando. Ele olha para a companheira, enquanto ela olha para frente. Ao fundo há uma parede na cor verde água, e uma porta na cor preta com o número três inscrito, este na cor dourada.
Casamento às Cegas mantém apresentadores para condução da terceira temporada (Foto: Netflix)

Gustavo Alexandreli

Amor às cegas dá casamento?” – a gente espera que sim. É com este questionamento e o coro entoado na sequência que a dupla de apresentadores e um dos casais mais amados das telinhas, Camila Queiroz e Klebber Toledo, instiga o público a acompanhar a trajetória dos candidatos à união eterna na terceira temporada do reality Casamento às Cegas Brasil, da Netflix.

Adaptada da atração estrangeira Love Is Blind, também da plataforma de streaming estadunidense, o experimento virou sucesso no Brasil desde a sua estreia, em Outubro de 2021. Dominando pautas nas redes sociais nos primeiros anos e dando visibilidade aos aventureiros no experimento, a atual temporada parece já estar sendo compreendida também pelos participantes.

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A serena onda de vida de La Parle

Cena do filme La Parle. A imagem é em preto e branco. Em uma cozinha, aparecerem, esquerda para a direita: Fanny Boldini, Simon Boulier, Kevin Vanstaen e Gabriela Boeri
Co-produzido pelas brasileiras Claraluz Filmes e Kinoteka, junto à francesa Les Films Bleus, La Parle é fruto da residência cinematográfica feita por Claude Lelouch – o diretor de Um Homem, Uma Mulher (1966) e de Os Miseráveis (1995) [Foto: Pandora Filmes]
Laura Hirata-Vale

Lar de navegantes, marinheiros e piratas, os oceanos sempre tiveram sua importância para a Humanidade. Os sete mares foram protagonistas na compra de especiarias e temperos, em descobrimentos e guerras. Além de água, sal e matéria orgânica, eles são compostos por mistérios, histórias e lendas; sereias, tubarões gigantes e os mais diversos monstros habitam-nos. Porém, mesmo com suas peculiaridades obscuras, pode-se encontrar no mar um dos fenômenos mais belos da Terra: as ondas. Cristalinas e salgadas, elas são responsáveis pela trilha sonora e por parte da paisagem das praias.

E se as ondas existissem para nos lembrar de que ainda estamos vivos?

É com essa reflexão sobre as ondas do mar que começa o drama franco-brasileiro La Parle. Dirigido, roteirizado e protagonizado pela brasileira Gabriela Boeri, e pelos franceses Fanny Boldini, Kevin Vanstaen e Simon Boulier, o longa é situado em Guéthary, cidade na Costa Basca Francesa, e gira em torno da lenda de La Parle, uma onda mística, responsável por revirar sentimentos e emoções. Vivendo um verão litorâneo e europeu, cada integrante do quarteto tenta aproveitar o sol, saborear o sal e respirar a maresia de sua maneira. Gabriela reflete sobre saudades de seu país natal; Fanny teme e evita um resultado; Kevin tenta terminar a montagem de seu filme, enquanto Simon usufrui das diversões praianas, e torce para que os amigos se juntem a ele e consigam descansar.

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Em Vai Ter Troco, as diversas facetas do brasileiro são representadas na dinâmica patrão x empregado

Cena do filme Vai Ter Troco. Nela, observa-se as personagens Zildete (à esquerda) e Tonha (à direita). Ambas estão com um uniforme cinza com faixas brancas, além de usarem uma espécie de touca branca. Zildete usa óculos.
Em Vai Ter Troco, Nany People e Evelyn Castro esbanjam carisma com suas personagens Zildete e Tonha (Foto: Amaia Produções)

Guilherme Machado Leal

A música Xibom Bombom do grupo As Meninas é marcada pelo padrão de vida de pobres e ricos. Nela, os versos “Quero me livrar dessa situação precária” e “onde o pobre cada vez fica mais pobre e o rico cada vez fica mais rico” explicitam um tema recorrentemente abordado na cultura brasileira: a desigualdade social. Produtos audiovisuais sobre esse assunto são vastos, mas o que diferencia Vai Ter Troco de tudo que já foi explorado? O filme dirigido por Maurício Eça (A Menina que Matou os Pais) é centrado em duas protagonistas carismáticas: Tonha (Evelyn Castro), uma mulher com pavio curto, e Zildete (Nany People), uma senhora dócil e piedosa. Juntas, elas trabalham na casa dos ricaços Sarita (Miá Mello) e Afonso (Marcos Veras) – um casal superficial à décima potência. 

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Atravessando gerações, O Homem Cordial está sempre à espreita

Cena do filme O Homem Cordial. A cena se passa durante a noite em um bar, desfocado ao fundo. No primeiro plano, vemos à esquerda um homem branco de cerca de 50 anos, com cabelos e barba grisalhos, vestindo uma jaqueta preta e com a mão apoiada em um balcão. Do lado esquerdo, vemos uma mulher negra de cerca de 25 anos, com cabelos escuros presos em tranças, vestindo uma jaqueta jeans. Os dois olham para frente, para algo que está fora do quadro.
A semelhança do título com o conceito sociológico do Homem Cordial não é mera coincidência (Foto: O2 Play)

Vitória Gomez

Na tentativa de entender o Brasil da década de 1930, com as aspirações nacionalistas e a valorização da cultura brasileira, o sociólogo Sérgio Buarque de Holanda propõe a ideia do “homem cordial”. O conceito definia um cidadão movido pelo coração, afeto e pelo sentimentalismo em detrimento da razão, que extrapola o âmbito pessoal e o aplica no coletivo. Para Buarque de Holanda, essa seria a razão pela qual o brasileiro adota uma figura paternalista, familiar e passional. No entanto, é a mesma pessoa que se esconde por trás da face da cordialidade até que a hostilidade tome conta. Mais de oito décadas depois, O Homem Cordial busca a revitalização dessa ideia durante uma única e violenta noite em São Paulo.

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