Lê Almeida e a cena independente que cresce com o noise rock brasileiro

Entre efeitos saturados, riffs de guitarra e som propositalmente barulhento, Lê Almeida vem movimentando o cenário independente do Rio de Janeiro.

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Lê Almeida (segundo da direita pra esquerda) e banda do projeto solo (Foto: Isabela de Souza)

Angelo Cherubini e Daniel Sakimoto

Carioca da baixada fluminense, Lê Almeida começou sua carreira musical tocando bateria em diversas bandas. Atualmente, ainda participa de vários projetos musicais, seja como guitarrista e vocalista, como baterista ou mesmo produtor. Em sua carreira solo, o músico possui dois álbuns e alguns EPs, todos gravados e produzidos pelo próprio Lê, em seu Escritório, onde o multi-instrumentista grava e produz não apenas suas obras, mas também de diversas outras bandas.

Podemos citar Treli Feli Repi, Gaax, Top Surprise como exemplos de grupos musicais que tiveram seus trabalhos produzidos por Lê e carregam em seus respectivos álbuns o selo Transfusão Noise Records, atribuído pelo músico-produtor.

Em torno do eixo Escritório, Transfusão Noise Records e o próprio Lê Almeida, vem surgindo um cenário independente à parte, com características do indie, do rock clássico e do noise rock.

Em seu primeiro álbum, batizado de Mono Maçã, Lê Almeida explora desde pesados power chords a riffs dançantes ao longo de 23 faixas de puro noise. No álbum seguinte, o Paraleloplasmos, o músico trata do término de um longo relacionamento com faixas mais densas, porém ainda com as linhas de guitarra contagiantes.  E nesse ano, Lê Almeida lançou Mantra Happening, numa experiência que fala de libertação espiritual. Conversamos com o artista para saber mais do cenário e de seus projetos!

Lê, de onde você acredita ter surgido seu interesse por música? Quais são suas influências?

Com certeza foram nos vinis do meu pai, tinha muita coisa de classic rock: Led Zeppelin, Kiss, Ozzy. Eu ficava encantado com capa, o som e toda a estética. Mais tarde eu conheci uns amigos da mesma faixa etária que eu que estavam começando a tocar, comecei tocando bateria. Nessa fase fui descobrindo outros sons que eram de outra onda. Pavement, Sonic Youth, Superchunk. Daí se abriu um novo mundo pra mim.

Essas influências te acompanham nos teus trabalhos até hoje?

Com certeza, ainda hoje escuto Kiss e todos esses classic rocks, mas Pavement é a banda que mais une eu e os caras que tocam comigo.

Quais foram seus primeiros projetos?

Eu toquei bateria por muitos anos com o Léo, meu amigo até hoje, numa banda chamada Siameses, que teve alguns baixistas até se firmar com o Evandro, que também é meu amigo até hoje. Já tivemos inúmeras bandas! Depois do Siameses, eu toquei bateria em diversas outras bandas como Tratamento Experimental, Purpose, Rosemary Skin. Daí fui aprendendo a tocar guitarra com o Leo e com o Edimo, outro amigo que teve bandas comigo, e ambos possuíam estilos diferentes e únicos de guitarra. Sozinho eu gravei um disco como Coloração Desbotada, tocando guitarra e cantando, mas antes disso eu já tinha montado a Tape Rec, também como vocalista e guitarrista.

A Tape Rec grava pela Transfusão, né? Como foi a fundação da TNR?

Todas as bandas já faziam parte da Transfusão. De 2004 pra 2005 a gente tinha várias bandas e eu era a pessoa que mais se repetia nessas bandas.  Fizemos uma festa de fim de ano com esse nome, Transfusão Noise, inspirado no filme Trainspotting. Na época eu via muitos filmes mas esse teve um impacto sinistro em mim. A gente não tinha muito lugar pra tocar e a maneira que eu via de se manter uma banda era gravar discos. E foi aí que eu comecei a curtir gravar e uma piração foi levando a outra!

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Lo-fi or die: a mágica acontecendo n’O Escritório (Foto: Isabela de Souza)

Acompanhando um pouco a cena, percebe-se que, como acontece com você, as pessoas de diversas bandas diferentes costumam trabalhar juntas. Em quais projetos você está envolvido atualmente?

Eu andei saindo de algumas bandas. Atualmente, passei a me dedicar mais ao meu projeto solo do ano passado pra cá, mas ainda toco guitarra e canto na Cosmos Amantes, faço algumas baterias no Gaax, e gravo com o Treli Feli Repi, mas não tem rolado nada desses projetos recentemente. Tenho trabalhado numa banda nova chamada Bolden, que é um trio, com sons mais acelerados.

Além da música você também tem o Cracolagem, que é seu projeto de colagens, quer comentar um pouquinho dele?

Cracolagem é só o nome do perfil no Tumblr. Eu gosto muito de fazer colagens. Comecei como algo terapêutico, sozinho pra preencher a cabeça. É uma coisa boa, produtiva, rende capas de discos e cartazes pra shows! De uns dois anos pra cá eu passei a fazer exposições, já vendi algumas originais e tô pra estrear numa galeria online.

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Colagem de Lê Almeida, usada como capa de seu álbum Paraleloplasmos (Foto: Reprodução)

Como você define esse cenário que se desenvolve em torno de você e do Escritório?

Parece um seriado real!! Estamos no terceiro ano de atividades e uma série de pessoas já fez parte, ajudou e foi embora ou foi pra outra onda. Mas de qualquer forma sempre tem algo novo sendo produzido TODO DIA!

O Escritório surgiu no meio do ano de 2013, entre julho e agosto. Já era uma ideia minha de muito tempo ter um lugar onde pudesse se produzir livremente em qualquer horário. Antes isso era feito na minha casa.

Você define com algum nome em específico esse cenário que vem se montando?

Não sei definir o cenário não. O cenário é uma roda, vai e vem, gira a todo o tempo. O Escritório, por outro lado, é um catalisador, faz com que as pessoas queiram formar bandas, gravarem e produzirem. Eu nunca achei que o Escritório fosse mudar tanto as coisas pra melhor!

Agora falando um pouco do Mantra Happening, como foi o processo de produção deste novo álbum? Influências em especial?

Com certeza foi o disco mais divertido que gravei. O disco é composto por ideias que eu já tinha desenvolvido mas nunca tinha colocado em prática pois eu estava atrás do momento perfeito! As faixas principais surgiram depois da gente ter feito a trilha sonora pro Over The Edge, no MIS. É um filme clássico, contestador e jovem dos anos 70. A gente tava fazendo uma turnê do Paraleloplasmos (disco anterior ao Mantra Happening) tocando em um monte de cidades e fomos ficando mais entrosados.  A partir dessas sessões a gente foi formando umas faixas instrumentais e vez ou outra tocávamos algumas dessas faixas. Minha cabeça pra som foi mudando, passei a ouvir muito Dub, Hawkwind, Coltrane, Scientist, umas coisas mais longas e fui pensando numas letras que fossem mais soltas, frases, tipo cantos de roda ou orações.

O Paraleloplasmos tem como o tema final de relacionamento. Do que se trata o Mantra Happening?

O disco fala sobre libertação espiritual e de fato eu e os caras da banda passamos por coisas assim: parentes doentes, vida agitada, e etc. Acontece que no som a gente conseguia manter a leveza, o bem estar. Até a imagem da capa passa essa ideia de leveza espiritual.

Como vão funcionar os desdobramentos do lançamento de Mantra Happening? CD físico, vinil, clipe?

Vai sair em CD e cassete. Embora o disco só tenha 5 faixas ele é muito grande para um LP, teria que ser duplo. Nessas versões físicas vai ter um vasto material gráfico entre frases de harmonia e  letras.

Planos para o futuro de Lê Almeida?

Sim! Pro futuro eu tenho um outro álbum já gravado, fiz todo sozinho e agora estamos experimentando novos métodos de masterização com ele. Esse deve sair no meio do ano. A ideia é fazer o escritório crescer sempre! Agora em abril eu vou morar o mês todo em São Paulo, fazendo residência num estúdio grande. Mas devo voltar algumas vezes pro Rio no meio disso.

 

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