Lua Azul: um fenômeno não acontece uma vez só

Cena do filme Lua Azul. A imagem mostra uma jovem em primeiro plano, de costas e posicionada à esquerda. Ela é branca, tem cabelos lisos castanhos presos numa trança, e olha para frente. À frente dela, existe uma mesa onde uma família faz uma refeição. O lugar é alto e tem vista para montanhas.
Carregado de uma indigesta fábula sobre relações de poder permeadas por questões de gênero, Lua Azul compõe a Competição Novos Diretores da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Patra Spanou)

Raquel Dutra

A cineasta romena Alina Grigore é precisamente misteriosa ao nomear seu primeiro filme. No evento celeste da Lua Azul e na trama narrativa de Lua Azul, o que manda é o paradoxo que existe entre a riqueza de seus significados e a simplicidade do seu significante. E de fato, o que o drama traz para a 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, depois de sair com o prêmio máximo do Festival Internacional de Cinema de San Sebastián 2021, é um fenômeno em todos os sentidos. 

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Capitães de Zaatari não acerta o gol que precisava

Imagem retangular, retirada do filme Capitães de Zaatari. O cenário é uma tarde em um acampamento de refugiados, com casebres construídos dos lados da rua de terra. No centro, em foco, vemos um grupo de seis garotos. Primeiro, à esquerda, um garoto usando um boné preto para trás, e vestindo uma camiseta laranja e branca e uma calça preta. Do seu lado esquerdo, está outro garoto, de cabelos raspados, vestindo uma camiseta preta e laranja e uma calça preta. Ele está prestes a cumprimentar um garoto mais alto, que aparenta ser mais velho. Esse é Mahmoud, ele usa um boné de aba curva azul, e veste uma calça preta e uma camiseta azul da seleção de futebol italiana. Mais atrás dele, está outro menino, menor, de cabelo raspado, que usa uma camisa azul e calça preta. Mais à esquerda, está Fawzi, um garoto da mesma altura de Mahmoud, que usa um boné vermelho, uma bermuda azul, e veste uma camiseta branca com detalhes em vermelho, e com a logo da banda Rolling Stones, uma boca mostrando a língua, estampada em seu centro. Por último, do lado esquerdo de Fawzi, está um garoto, que veste uma camisa azul e verde estampada e uma bermuda jeans, enquanto segura uma bola de futebol na mão direita. O grupo de garotos sorriem, conversando entre si.
Compondo a Competição Novos Diretores, da 45ª Mostra internacional de Cinema em São Paulo, falta audácia em Capitães de Zaatari (Foto: Dogwoof)

Enrico Souto

A conjuntura instável e precária que refugiados no mundo todo se encontram nunca foi tão grave. São um dos grupos mais vulneráveis socialmente, agrupando pais e mães que se sujeitam aos trabalhos mais ímpios para sustentar suas famílias, e uma juventude que não vê perspectiva de um crescimento saudável. Nesse contexto, qual o papel que o esporte exerce? O futebol pode adquirir uma função transformadora e emancipatória para essas pessoas? Questões importantíssimas, mas que nunca são tratadas com a devida atenção por Capitães de Zaatari, documentário egípcio que é exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

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Medusa, meretriz, monstro, mulher

Cena do filme Medusa. A atriz Mari Oliveira está no centro. Ela é uma mulher negra, de cabelos escuros e presos e usa uma blusa rosa. Seu rosto está com uma espécia de argila verde e ela espalha com as duas mãos. Ao fundo, vemos a cabeceira da cama e uma parede com fotos.
Medusa agraciou a seção Mostra Brasil da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, mas apenas em sessões presenciais (Foto: Bananeira Filmes)

Caroline Campos

Por Poseidon, Medusa foi violentada. Por Atena, foi castigada, seus cabelos viraram cobras e seu olhar se tornou mortal. Por Perseu, a já criatura foi decapitada e transformada em arma de guerra. Pela História e pela Arte, foi vilanizada, perseguida e satirizada. Mas, no Brasil de 2021, Medusa foi a escolhida por Anita Rocha da Silveira para intitular seu segundo longa-metragem, que, presente na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, honra, com moldes trágicos e atuais, a trajetória da bela sacerdotisa amaldiçoada.

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Pedregulhos e o poder silencioso dos oprimidos

Cena do filme Pedregulhos. A imagem mostra um homem e um menino, ambos indianos, em pé sobre um chão de areia, a uma certa distância um do outro. No fundo há uma pequena cabana com diversos produtos pendurados. O cenário é seco, mas com verde nas copas de algumas árvores.
Pedregulhos integra a Competição Novos Diretores da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Rowdy Pictures)

João Batista Signorelli

Um pai, um filho, e uma árida paisagem. Estes são os três protagonistas de Pedregulhos, longa indiano selecionado para representar o país na corrida pelo Oscar de Melhor Filme Internacional em 2022, e que está em exibição na programação da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. O filme parte de um pai alcoólatra que retira o filho da escola, forçando-o a acompanhá-lo na procura da mãe, que fugiu de casa devido à violência doméstica sofrida pelas mãos do marido. 

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Quem tem medo de Jennifer Check?: Garota Infernal e o verdadeiro inimigo

Cena do filme Garota Infernal. Megan Fox, que interpreta Jennifer Check, é uma mulher branca, de olhos azuis e cabelos pretos. Jennifer é uma adolescente no colegial. Ela se olha no espelho de um armário azul marinho, típico dos colégios estadunidenses. O espelho é arredondado com strass prata e rosa em sua volta. Na lateral superior esquerda e na lateral inferior direita do espelho estão colados dois adesivos de desenhos orgânicos, também em rosa. Não se vê nada na cena além da vista do rosto de Jennifer refletido no espelho e o fundo azul marinho do armário.
Fracasso comercial, Garota Infernal pouco a pouco se restabeleceu como terror cult feminista (Foto: Fox/Dune Entertainment)

Ayra Mori

Se em 2009 Garota Infernal foi considerado um crasso fracasso, após uma década de seu lançamento o filme se restabeleceu como Terror cult feminista à frente de seu tempo. Escrito por Diablo Cody, dirigido por Karyn Kusama e protagonizado pela dupla Megan Fox e Amanda Seyfried, Garota Infernal é um estudo de caso sobre como um roteiro perspicaz, um enquadramento subversivo da câmera e personagens autoconscientes são capazes de transfigurar o olhar masculino predominante no gênero, pondo em foco a perspectiva feminina quanto às violações do corpo através de Jennifer e, bem, “O inferno é uma garota adolescente”.

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A liberdade como sacrifício em O Cão que Não Se Cala

Cena do filme O cão que não se cala. Na foto em preto e branco, há um homem branco com o braço direito levantado, segurando-se em uma fina barra de ferro acima de sua cabeça. Ele possui cabelos curtos e lisos de cor preta, barba de cor preta, e veste uma blusa de cor cinza. Ele está dentro da parte de carga de um pequeno caminhão, coberto por uma lona de cor cinza clara. Atrás dele, há uma mulher branca olhando desconfiada, cuja roupa constitui-se em uma blusa com listras cinzas e uma macacão cinza. Mais ao fundo, há mais dois homens brancos, onde o primeiro, à esquerda, veste uma jaqueta de cor preta e possui cabelo preto, e o segundo, à direita, veste também uma jaqueta preta e utiliza um boné de cor branca.
Compondo a seção Perspectiva Internacional da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, O Cão que Não Se Cala é um retrato fantástico de uma vida comum (Foto: Oh my Gomez)

Bruno Andrade

Pense naquele famoso discurso de paraninfo intitulado Isto é água, proferido por David Foster Wallace aos formandos do Kenyon College em 2005. Nele, lemos que a “verdadeira liberdade requer atenção, consciência, disciplina, esforço e a capacidade de se importar genuinamente com os outros”. Pronto, esse pequeno trecho pode muito bem apresentar a ideia por trás de O Cão que Não Se Cala (El Perro que No Calla, no título original), filme argentino exibido na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, dirigido e co-roteirizado por Ana Katz.

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O outro lado do Mar Infinito atormenta uma geração

Cena do filme Mar Infinito. Na imagem, o personagem Miguel está debaixo d’água e conectado por um aparelho de oxigênio que sai do lado esquerdo da imagem. Ele é um homem branco de cabelos castanhos, está sem camisa e com o corpo e braços flutuando sozinhos, virado de lado. A máscara de oxigênio está presa no alto e lados de sua cabeça
Jorge Quintela fotografa um jovem abandonado pela própria espécie através de lentes precisamente calmas, na produção que integra a Competição Novos Diretores na 45ª Mostra Internacional de São Paulo (Foto: Bando à Parte)

Nathália Mendes

Submerso nas águas de uma piscina qualquer, Pedro Miguel (Nuno Nolasco) abre os olhos e enxerga um azul sem fim. A vastidão do desconhecido é iluminada por feixes de luzes brilhantes vindas de um mundo acima do seu, enquanto as bolhas de seu oxigênio flutuam ao redor e ele só está ali, existindo. Não há como imaginar que esse momento é mais uma tentativa do protagonista em enfrentar sua aquafobia, mas sim que o mesmo estaria tão intrinsecamente conectado com a premissa de Mar Infinito. O longa estreou na Competição Novos Diretores na 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo como um filme de ficção intergalático em que um jovem luta por um lugar com a humanidade fora do planeta, mas é, na verdade, a solidão de uma geração sem rumo, afogada por uma incerteza esmagadora.

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Lavoura Arcaica: tradições podem destruir uma família

Cena do filme Lavoura Arcaica em que aparece toda a família sentada à mesa, com quatro membros de cada lado e o pai ao centro como o patriarca.
20 anos depois de seu lançamento, os simbolismos familiares de Lavoura Arcaica permanecem fortes (Foto: Núcleo Luiz Fernando Carvalho)

Gabriel Gatti

Toda família se constrói em cima de tradições e costumes passados de geração em geração. Muitos desses hábitos sofrem modificações conforme os tempos avançam, mas em alguns casos há resistência daqueles cegados pelas crenças pavimentadas em sua mente. Essa relação familiar complicada é o que motiva André (Selton Mello) a abandonar o lar e partir rumo ao desconhecido em busca daquilo que realmente acredita. A premissa de Lavoura Arcaica se desenvolve em uma trama complexa e profunda durante 2 horas e 43 minutos de filme.

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Vire-se, seus sonhos serão frutificados no Deserto Particular

Cena do filme Deserto Particular, mostra uma mulher dentro do carro, escuro e com apenas seu nariz e cabelo iluminados pelo poste da rua.
Submissão do nosso país para o Oscar 2022, Deserto Particular estreou na seção Mostra Brasil da 45ª Mostra de SP (Foto: Pandora Filmes)

Vitor Evangelista

A tarefa de selecionar, entre uma vastidão de olhares e marcas, um único filme para representar o país mundo afora não é nada fácil. Afinal, qual a fórmula secreta para a submissão perfeita? Quais atributos um longa nacional deve possuir para, de fato, ser o “mais brasileiro” possível? Em 2022, a missão é de Deserto Particular, bela produção comandada por Aly Muritiba e presente na seção Mostra Brasil da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

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Já que Ninguém me Tira pra Dançar: eu também quero ser Leila Diniz

Cena do documentário Já que Ninguém me Tira pra Dançar. Ao centro está Leila Diniz. Uma mulher branca de cabelos curtos. Ela está de braços abertos. Veste um sutiã com lantejoulas e ombreiras também com lantejoulas e fios. Em segundo há dezenas de homens. A imagem está em preto e branco
Realizado em 1982 e remasterizado em 2021, o documentário inédito tem sua estreia na seção Mostra Brasil da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (Foto: Nova Era Produções)

Ana Júlia Trevisan

“Toda mulher quer ser amada/Toda mulher quer ser feliz/Toda mulher se faz de coitada/Toda mulher é meio Leila Diniz.” Os trechos compostos por Rita Lee pressupõem toda a graça e grandiosidade de Leila Diniz. Atriz brasileira, Rainha das Vedetes e transgressora pela liberdade feminina, Leila é representante de Todas as Mulheres do Mundo. Com estreia marcada para acontecer durante a 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, Já que Ninguém me Tira pra Dançar é o documentário sobre Leila Diniz dirigido por sua amiga e também atriz Ana Maria Magalhães. 

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