Estante do Persona – Outubro de 2021

Arte retangular com fundo vermelho. Ao centro há uma estante de livros branca em formato retangular. Acima dela está escrito ESTANTE em fonte preta. Na primeira prateleira, na divisória esquerda, há o símbolo do Persona (desenho de um olho com a íris vermelha e um símbolo de play no lugar da pupila) ao lado da palavra DO em fonte preta. Na divisória da direita, está escrito PERSONA em fonte preta. Na segunda prateleira, há três divisórias, em que, na do meio, há a capa do livro A Paixão Segundo G.H., de Clarice Lispector. Na terceira e última prateleira, também há 3 divisórias, em que, na da ponta direita, há um troféu com o formato do símbolo do Persona.
A primeira edição do Estante do Persona discute a obra A Paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, e traz indicações dos membros do Clube do Livro (Foto: Reprodução/Arte: Ana Júlia Trevisan e Jho Brunhara/Texto de Abertura: Vitória Silva)

“Há livros escritos para evitar espaços vazios na estante.”

–  Carlos Drummond de Andrade

Para poder valorizar cada vez mais a Literatura, parte tão importante e fundamental da cultura do nosso e de qualquer outro país, o Persona começa, agora, a preencher sua própria estante. 

O mês de outubro marcou o início do nosso Clube do Livro, formado por membros da Editoria, que tem o intuito de promover a leitura compartilhada e encontros para discussão de alguma obra sugerida. Ao final do mês, o Clube ainda se reúne para montar o Estante do Persona, com um comentário que sintetize as ideias sobre a leitura realizada e uma playlist de músicas que se relacionem com a mesma, além de uma indicação de cada membro sobre algum livro marcante ou que mereça ser compartilhado.

Como primeira leitura, o Clube do Livro teve a honra de poder prestigiar uma das maiores autoras da Literatura brasileira. A Paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, é narrado em primeira pessoa pela personagem que tem suas duas iniciais presentes no título da obra. Uma mulher, moradora do Rio de Janeiro, que, ao desempenhar a tarefa de limpar o “quartinho dos fundos” de seu apartamento, mergulha em um fluxo de pensamento contínuo simbolizado por um monólogo de reflexões existencialistas, uma das grandes marcas da escrita da autora. 

E nada mais simbólico do que estrear essa publicação especial num mês com acontecimentos tão marcantes para o meio literário. Além de no dia 29 de outubro ser celebrado o Dia Nacional do Livro, as semanas anteriores também foram marcadas por grandes eventos. No dia 7, ocorreu a cerimônia de entrega do Nobel de Literatura 2021, que foi concedido ao autor Abdulrazak Gurnah. Nascido na ilha de Zanzibar, atual Tanzânia, em 1948, o escritor é especialista em Literatura pós-colonial e na temática de refugiados, colecionando em sua carreira títulos como Paradise e Afterlives

Mais ao final do mês, no dia 20, foi realizada a entrega do Prêmio Camões, para a moçambicana Paulina Chiziane. Tão simbólica quanto a vitória de Gurnah, Chiziane é a primeira mulher a publicar um romance em Moçambique, Balada de Amor ao Vento, em que o fez depois da independência. Com a figura da mulher moçambicana e africana no centro de sua escrita, a autora dedica-se a explorar os problemas enfrentados pela mesma no meio social, e tem como uma de suas obras de maior prestígio Niketche: Uma História de Poligamia, em que uma mulher decide conhecer as outras esposas de seu marido.

No clima desse mês repleto de grandes feitos na Literatura, você confere as indicações do Clube do Livro na primeira edição do Estante do Persona.

Livro do Mês

 A imagem é a foto da capa do livro A Paixão segundo G.H.. Com um fundo na cor creme com linhas de distorção, é possível ver no canto superior direito dunas de areia e edifícios que remetem à arquitetura árabe. Abaixo, está escrito Clarice Lispector em letra cursiva e na cor vermelha e o título do livro em caixa alta e na cor bege. No canto inferior esquerdo, abaixo do título, há o desenho de uma moça branca, com cabelos castanhos longos presos em um rabo de cavalo baixo; ela veste uma blusa azul clara de mangas compridas.
A Paixão segundo G.H. ganhou uma adaptação para o Cinema em 2020, dirigida por Luiz Fernando Carvalho e com Maria Fernanda Cândido no papel principal (Foto: Rocco)

Clarice Lispector – A Paixão segundo G.H. (175 páginas, Rocco)

Publicado em 1964, A Paixão segundo G.H. é um passeio pelo mais profundo íntimo do ser humano. Em seu apartamento no Rio de Janeiro, a protagonista, reconhecida apenas pelas duas iniciais, decide limpar o quarto da empregada, logo após demitir a mesma. O que parece ser uma tarefa banal como tirar pó do armário, desencadeia uma série de reflexões existencialistas e contestações sobre decisões passadas, ao ponto que, ao esmagar uma barata em meio ao processo, G.H. engata em um relato sobre a perda da sua individualidade. 

Conhecida por utilizar recursos como análise psicológica e monólogo interior, o presente livro é o mais puro suco que poderíamos ter da Literatura de Clarice Lispector, que ainda se encontra com o teor de obras de Virginia Woolf e até mesmo A Metamorfose, de Franz Kafka. Os capítulos não possuem marcações definidas, mas funcionam como sequências sistemáticas, em que cada um se inicia com a frase que encerrou o anterior. Esse aspecto cíclico também é notório no início e final do livro, em que a protagonista termina a narrativa chegando ao mesmo ponto que a desencadeou inicialmente, em um retrato perfeito do que é o complexo processo do pensar humano.

Apesar de lançada no século passado, a obra de Clarice também dialoga com produções do presente, como, por exemplo, a série Fleabag, que tem uma protagonista que enfrenta dilemas e conflitos internos na mesma proporção e, coincidentemente, também não tem seu nome revelado para o público. Por mais que, às vezes, seja um pouco repetitiva ou até mesmo de difícil compreensão em certas passagens, é impossível não se encontrar com pelo menos um trecho de A Paixão segundo G.H.. Com grandes sacadas de gênia da autora, pensamentos até então nunca questionados são transpostos em simples palavras ou frases, que encontram-se poeticamente e se tornam tudo que precisávamos ler, mas ainda não sabíamos. “Todo momento de achar é um perder-se a si próprio”.

Dicas do Mês

Capa do livro Desonra, de J.M. Coetzee. Na imagem, vemos diversas linhas em cor vermelha e verde, assemelhando-se a um labirinto. Ao centro, há uma faixa de cor verde. Dentro dessa faixa, na extremidade direita, está escrito J.M. Coetzee, em fonte de cor branca. Abaixo, também em fonte de cor branca, está escrito Desonra. Ainda dentro dessa faixa, na parte inferior esquerda, está escrito Prêmio Nobel Companhia das Letras, em fonte de cor branca. Há uma coroa de louros de cor branca desenhada entre as palavras Prêmio e Nobel.
Lançado em 1999, Desonra foi a obra citada para a vitória de J.M. Coetzee no Nobel de Literatura de 2003 (Foto: Companhia das Letras)

J.M. Coetzee – Desonra (248 páginas, Companhia das Letras)

Desonra foi publicado em 1999, e é considerado o grande clássico de J.M. Coetzee, escritor sul-africano que recebeu o Nobel de Literatura em 2003. A obra foi tão impactante que fez o autor levar o prêmio Man Booker pela segunda vez — ele já havia recebido em 1983, pelo livro Vida e Época de Michael K —, sendo o único a ter recebido duas vezes a honraria. O título original é Disgrace, porém o tradutor José Rubens Siqueira optou por um caminho mais amplo e, talvez, mais poético. Mas, afinal, do que se trata o livro? No mais puro sentido, trata-se de um homem que cai em desgraça. 

Estamos situados em uma África do Sul pós-apartheid, e enxergamos esse cenário sob a visão de David Lurie, professor de Literatura na Universidade da Cidade do Cabo. A percepção afiada de Coetzee nos faz vislumbrar como ninguém a sociedade fraturada que se desenvolveu no país, na qual qualquer relação afetiva verdadeira está fadada ao fracasso. Após uma sucessão de acontecimentos dramáticos, abalando profundamente a vida do professor Lurie, ele se vê obrigado a retornar à propriedade rural da filha, Lucy, a fim de encontrar um ponto de equilíbrio entre a sua formação humanista e as normas sociais pré-estabelecidas. 

Somente nesse cenário precário, muito distante da pacata vida acadêmica que estava habituado, ele entende o verdadeiro significado de brutalidade e sofrimento. Com uma narrativa envolvente, através de capítulos curtos — que mostram a habilidade do escritor na escolha das palavras —, o livro nos mantém presos e estimulados do começo ao fim. Desonra foi adaptado ao Cinema pelo diretor Steve Jacobs, no filme homônimo de 2008, e traz John Malkovich no papel de David Lurie. No Brasil, a editora Companhia das Letras publica a obra completa de J.M. Coetzee. – Bruno Andrade


 Capa do livro Amigo Imaginário. Em frente a um fundo preto, vemos, na parte superior central, as palavras “Amigo Imaginário” em caixa alta, em uma fonte branca e estilizada, e, no canto superior direito, o logo da Editora Record.. Na parte central, vemos uma árvore, com o tronco iluminado e com uma escada pendurada. À frente da árvore, vemos a silhueta preta de uma pessoa, aparentemente uma criança. Ao lado dela, vemos a frase “Autor do best-seller”, em uma fonte branca cursiva e, abaixo, a frase “As Vantagens de Ser Invisível”, na mesma fonte branca, em caixa alta e estilizada do título. Na parte inferior central, vemos as palavras “Stephen” e logo abaixo, “Chbosky”, ambas em caixa alta, na mesma fonte branca estilizada do título.
Com tradução de José Roberto O’Shea, Amigo Imaginário foi publicado em 2019 (Foto: Record)

Stephen Chbosky – Amigo Imaginário (767 páginas, Record)

Se Christopher não construir uma casa da árvore no bosque da cidade antes do Natal, sua mãe e os moradores de Mill Grove morrerão. Pelo menos é o que diz a voz na cabeça do menino, que começou a acompanhá-lo desde que ele desapareceu na mata e retornou seis dias depois, intacto e sem memória do que havia acontecido. Nas quase 800 páginas de Amigo Imaginário, as histórias de Christopher e sua mãe, Kate, se entrelaçam a dos moradores do local e do caso não resolvido que intriga a cidade há décadas.

Do mesmo autor de As Vantagens de Ser Invisível, as semelhanças entre as obras de Stephen Chbosky acabam por aí. Diferente do sensível best-seller, em Amigo Imaginário, o escritor cria uma narrativa assombrosa, cheia de suspense, terror psicológico e fantasia, com muitas metáforas e um forte simbolismo religioso. O excesso de reviravoltas prolonga o livro mais do que o necessário e faz com que o calhamaço se arraste nas páginas finais, mas a habilidade do autor em enganar o leitor, assim como faz com o protagonista, torna os caminhos de Amigo Imaginário surpreendentes e envolventes do início até (quase) o fim. – Vitória Lopes Gomez


Capa do livro Cem Anos de Solidão. Na parte inferior vemos folhas verdes e azuis em um fundo rosa pink. Todo o fundo restante da capa é azul. Na parte central superior lê-se em branco PRÊMIO NOBEL DE LITERATURA. Abaixo lê-se em pink GABRIEL. Abaixo lê-se em verde GARCÍA. Abaixo lê-se em verde MARQUEZ. Abaixo lê-se em branco cem anos de solidão.
Para não se perder na história, recomenda-se que você tenha a árvore genealógica dos Buendía ao lado do livro (Foto: Record)

Gabriel García Marquez – Cem Anos de Solidão (448 páginas, Record)

O colombiano Gabriel García Marquez é um dos escritores mais traduzidos no mundo, e, em outubro de 1982, ganhou o Prêmio Nobel de Literatura pelo conjunto de sua obra. Entre seus manuscritos que refletem sobre os rumos políticos e sociais da América Latina, Cem Anos de Solidão é o livro mais monumental, sendo também considerado o mais importante de sua coleção. Cem Anos de Solidão é muito mais que uma simples narrativa, é uma experiência imersiva nas sete gerações da família Buendía. 

Ambientada em Macondo, acompanhamos a formação, ascensão e queda da cidade fundada por José Arcádio e Úrsula Iguarán, os pais da família Buendía. O apego pelo livro acontece exponencialmente, o passar do tempo nos faz reconhecer os fatos vividos pela estirpe condenada a cem anos de solidão. Denso de informações e acontecimentos, a obra mostra seus personagens relegados à solidão construindo um paralelo indireto com a América Latina.

Cem Anos de Solidão tem um início mais realista que se reflete na última metade mais fantástica, tudo construído com o empenho do autor em não perder a essência em que sua avó materna lhe contava histórias, tornando cada objeto ainda mais vivo. Seu final mostra que a solidão, em todos seus dobramentos, é cíclica e intrínseca ao ser humano. Cien Años de Soledad é, com certeza, um dos melhores livros já escritos. – Ana Júlia Trevisan


Capa do livro Os miseráveis mostra o perfil de uma menina branca e loira de expressão triste. Ao fundo da cena há alguns lampiões e no topo da foto está escrito Os Miseráveis em dourado e Victor Hugo em baixo em branco.
Com tradução no Brasil de Regina Célia de Oliveira, Os Miseráveis apresenta, em suas 1511 páginas, injustiças sociais, revoluções e drama (Foto: Martin Claret)

Victor Hugo – Os Miseráveis (1511 páginas, Martin Claret)

Os Miseráveis é um dos maiores clássicos da Literatura francesa. Publicada em 1862, a narrativa percorre a vida de várias pessoas pobres financeiramente ou de espírito, como forma de Victor Hugo denunciar a injustiça social tão presente na civilização humana. Como protagonista desta trama histórica temos Jean Valjean, um ex-presidiário condenado a 19 anos de reclusão por roubar um pão. Nesse mesmo plano temporal está Cosette, uma menina que vive em um estado deplorável na moradia dos Thénardier, um casal grotesco que extorque as economias da mãe da criança que não pode criá-la.

Após presenciar a morte de Fantine, mãe de Cosette, Jean Valjean parte em busca da residência dos Thénardier para resgatar a menina. A partir daí, o ex-presidiário assume a paternidade da criança. Anos depois, a realidade dos personagens vira de cabeça para baixo. O casal avarento perde todas as suas economias, enquanto que Valjean e Cosette ascendem socialmente. No meio dessa trama de classes, eclodem diversas manifestações sociais.

Inspirado por revoluções como o evento de Junho de 1832 e a Batalha de Waterloo, Victor Hugo relata em seu romance diversos eventos históricos marcantes e simbólicos. Os Miseráveis apresenta como ponta pé inicial personagens em situações de vida deploráveis, que se desdobram em diversas manifestações sociais. Essa teia de narrativas profundas permitiu com que fossem realizadas diversas adaptações da obra, como filmes, peças de teatro e paródias literárias. – Gabriel Gatti


Capa do livro Nomadland. A capa é azul e tem alguns escritos em branco. No topo da capa, lemos “Livro que baseou o vencedor do Oscar de Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Atriz de 2021”. Abaixo, lemos “Jessica Bruder” e “Nomadland”. Abaixo disso: “Sobrevivendo na América no século XXI”. No meio, vemos a foto de um trailer, estacionado em uma estrada de terra e mato, com o azul da capa se mesclando ao azul do céu. Na parte de baixo da capa, também em branco, está o nome da Editora Rocco.
Anos depois de ser publicado, a belíssima história de Nomadland rendeu alguns Oscars, ressaltando a força da Literatura de Não-Ficção dentro da Arte (Foto: Rocco)

Jessica Bruder – Nomadland – Sobrevivendo na América no século XXI (304 páginas, Rocco)

Pelas palavras de Jessica Bruder, nasce a Terra Nômade. Resultado de um trabalho extenso e vivido na pele pela jornalista, o livro de não-ficção se centra nas pessoas que vivem à margem da sociedade, desamparadas pelo governo e invisíveis para o mundo. Sem apontar soluções ou culpados diretos, Nomadland – Sobrevivendo na América no século XXI ruma pelas estradas norte-americanas, na companhia de Linda May, uma senhora de idade que encontra subsídio em empregos braçais e temporários. Sem casa, mas não sem lar, a nômade moderna é um dos inúmeros objetos de estudo da autora, que chegou a viver em uma van, para ter a experiência completa de sua história.

Publicado originalmente em 2017, o livro-reportagem chegou ao Brasil alguns meses atrás, traduzido por Ryta Vinagre e com a célebre frase “Livro que baseou o vencedor do Oscar de Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Atriz de 2021”. Sensível e carregado visual e tematicamente, Nomadland é leitura obrigatória para quem almeja encontrar o meio-termo entre a Literatura e o Jornalismo, usufruindo de conhecimento dos dois campos e, na jornada, criando uma linguagem muito única e singular que não apenas denuncia a irresponsabilidade do Estado para com seus idosos, mas também celebra o senso de comunidade que as dificuldades podem fazer nascer nos indivíduos. Se Chloé Zhao conseguiu emocionar com a vida real ficcionalizada, Jessica Bruder foi a primeira a encontrar esse tesouro. – Vitor Evangelista


Capa do livro Café da Manhã dos Campeões exibe um drinque numa taça.
Um dos maiores best-sellers de Vonnegut também é um de seus livros mais engraçados (Foto: Intrínseca)

Kurt Vonnegut – Café da Manhã dos Campeões (400 páginas, Intrínseca) 

Kilgore Trout é um escritor de ficção científica que descobre que Dwayne Hoover, um vendedor de carros aparentemente normal, está ficando maluco por causa de um de seus livros. Essa é a premissa inicial de Café da Manhã dos Campeões, a obra-prima de Kurt Vonnegut, que aproveita sua história nada convencional para fazer uma crítica bem-humorada e ácida dos comportamentos da sociedade norte-americana. 

Com a presença dos famosos desenhos do autor, é uma leitura extremamente divertida, fluida e repleta de metalinguagem. Kurt Vonnegut escreve com um senso de humor e uma sagacidade tão apaixonantes que é impossível parar de ler. Café da Manhã dos Campeões insere a ampla criatividade da ficção científica em um contexto familiar, aproveitando para mostrar o quanto algumas ideias que tomamos como “inquestionáveis” na sociedade são, na verdade, bem absurdas. Não é engraçado? – Caio Machado 


Capa do livro Alif, o invisível, da autora G. Willow Wilson. No centro da capa está o título do livro, em letras grandes e verde escuras, sob um fundo verde claro. Dentro da palavra “Alif”, escrita em letras curvadas, há pequenos circuitos eletrônicos verdes claros. Abaixo dela, “o invisível” está escrito em letras pretas e retas. Na parte inferior da capa, o nome da autora, em letras maiúsculas e verde escuras, e o logo da editora, Fantástica Rocco, com uma chave estilizada no lugar do “F”. As bordas da capa são estilizadas com padrões quadriculares verde escuros.
Alif é a primeira letra do alfabeto árabe, representada com um único traço vertical (Foto: Fantástica Rocco)

G. Willow Wilson – Alif, o invisível (349 páginas, Fantástica Rocco)

Antes de ficar conhecida como uma das co-criadoras da primeira heroína muçulmana da Marvel Comics, G. Willow Wilson já havia se provado uma das autoras de ficção mais indispensáveis da atualidade. Em Alif, o invisível, seu talento para criar mundos complexos e irresistíveis se faz presente na junção entre o moderno e o místico, na caracterização de uma distopia cyberpunk tão palpável que desafia as distinções entre o real e o imaginário, visível e invisível.

Caçado pelo censor de um estado de exceção não-nomeado do Oriente Médio, o jovem hacker Alif guarda consigo as chaves para a criação do aparato de repressão máximo, fruto da mágoa de seu coração partido. Após sua amada, Intisar, revelar que havia sido prometida a outro homem, Alif cria um programa para ocultar sua presença, na esperança de que ela nunca mais possa vê-lo ou contatá-lo pela internet. Intisar, então, envia um livro misterioso que abre seus olhos para o mundo oculto dos djinn, expandindo o escopo da luta de Alif contra sua própria dor.

Graças à perspectiva única de Wilson, a ficção do livro se transforma junto com seu protagonista desafortunado, assumindo as muitas facetas de um mundo destinado a não se conhecer até que esteja preparado para entender suas muitas diferenças. Seu mundo é construído como um castelo de areia no meio de um deserto, na abundância de detalhes em meio ao desconhecido e na fragilidade da vida de suas personagens, capazes de serem apagadas com um sopro do destino. Alif, o invisível é uma ficção madura e envolvente, e o trabalho de uma escritora no pico de sua criatividade e habilidade. – Gabriel Oliveira F. Arruda


Capa do livro Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf. Dois terços da imagem são compostos por uma ilustração, que mostra uma mulher sentada numa cama lendo um livro. Ela está inclinada para o lado esquerdo da imagem e apoia os cotovelos na cama para segurar o livro na frente dos seus olhos. A mulher ilustrada é branca, tem cabelos curtos pretos e lisos. Ela usa um vestido preto de bolinhas brancas e o livro em suas mãos é num tom de terracota, com uma flor estampando a capa. Atrás dela, existe uma parede com estampa floral de fundo azul escuro, e os travesseiros atrás das costas da mulher também são estampados, bem como a colcha da cama onde ela está. Na linha inferior da capa, existe uma faixa fina branca, onde está escrito “Penguin Companhia” em preto e caixa alta, e no meio das palavras, existe o desenho de um pinguim laranja. Abaixo, existe uma faixa maior preta, onde, primeiro, está escrito “Clássicos” em branco, e logo abaixo, está escrito o nome da autora numa fonte laranja e o nome do livro em branco.
A edição mais popular de Mrs. Dalloway no Brasil é traduzida por Claudio Alves Marcondes (Foto: Companhia das Letras)

Virginia Woolf – Mrs. Dalloway (235 páginas, Penguin Companhia)

A Literatura de Clarice Lispector sabe como ninguém apreciar a companhia de Virginia Woolf. Então, farei as honras de aproximá-las na primeira Estante do Persona. A obra escolhida para figurar ao lado da voz marcante do Modernismo no Brasil é precursora do movimento na Literatura, que ostenta as palavras da autora inglesa como uma das suas maiores e mais importantes obras. Primeiro grande sucesso de Woolf, Mrs. Dalloway não poderia ficar de fora da seleção guiada pela genialidade de Lispector em A Paixão segundo G.H

A referência de Virginia em Clarice já deve sugerir o que esperar do romance, que, como toda boa obra moderna, não tem medo de seguir seu próprio caminho. Estamos falando de uma Literatura radical, que extrai tudo o que pode das palavras através de técnicas narrativas como o fluxo de consciência, discurso indireto livre e narração onisciente, originando assim precisas análises sociais, perfeitos registros históricos e potentes ensaios filosóficos. Para realizar tudo isso, Virgina Woolf precisou de apenas um dia da vida de Clarissa Dalloway na cidade de Londres em 1925. O resto, é história. – Raquel Dutra


Capa do livro Vermelho, Branco e Sangue Azul. A imagem é retangular vertical. O fundo é na cor rosa bebê. Na parte superior, lê-se em azul: “Um romance entre a Casa Branca e o Palácio de Buckingham”. Abaixo, lê-se “Vermelho, Branco e Sangue Azul”. Na parte inferior, há duas ilustrações dos personagens Alex e Philip. Alex está na esquerda. Ele é um homem jovem, negro de pele clara, e veste uma roupa despojada: camisa polo branca, calça jeans, e sapato vermelho. Philip está na direita. Ele é um homem jovem branco, de cabelos ruivos, e veste uma roupa militar britânica. Entre os dois, há o nome da autora, Casey McQuiston. No canto inferior direito, há o logo da editora, “Seguinte”.
Vermelho, Branco e Sangue Azul foi traduzido para o português por Guilherme Miranda (Foto: Seguinte)

Casey McQuiston – Vermelho, Branco e Sangue Azul (392 páginas, Seguinte)

A vida não deveria ser feita só de leituras sérias, e Vermelho, Branco e Sangue Azul se encaixa perfeitamente nessa categoria. Em suas quase quatrocentas páginas, a narrativa que Casey McQuiston desenvolve é extremamente ágil e dinâmica. A história parte de encontros puramente diplomáticos entre Alex Claremont-Diaz, o filho da presidenta dos Estados Unidos, e Philip, o príncipe britânico, que acabam se transformando em um gato e rato enemies to lovers (de inimigos para amantes).

A relação entre Alex e Philip é igualmente insuportável e viciante, e – entre o emaranhado de romance, sexo, drama e a burocracia desse relacionamento – acompanhamos a campanha de reeleição da mãe de Claremont-Diaz e toda a política envolvida em um movimento dessa magnitude. Ao mesmo tempo, Philip precisa se entender com uma família real extremamente tradicional e conservadora. Apesar de se encaixar como uma leitura LGBTQIA+, Vermelho, Branco e Sangue Azul é muito mais que apenas uma história de amor entre a Casa Branca e o Palácio de Buckingham, é uma trama completa e instigante de sentimentos humanos tentando encontrar espaço no cenário diplomático mundial. – Jho Brunhara


A imagem é a foto da capa do livro Alucinadamente Feliz. Um Livro Engraçado Sobre Coisas Horríveis, da autora Jenny Lawson. Ao centro, sob um fundo amarelo que remete a feno, há o desenho de um guaxinim em pé, com os braços dianteiros levantados para cima e um sorriso no rosto. Em cima do seu peito, está escrito ALUCINADAMENTE FELIZ, em caixa alta e fonte branca. Logo embaixo, em Times New Roman e fonte branca, está escrito UM LIVRO ENGRAÇADO SOBRE COISAS HORRÍVEIS. Abaixo disso, está o nome da autora, JENNY LAWSON, novamente em caixa alta e fonte branca.
Amiga próxima do renomado Neil Gaiman, Jenny Lawson se tornou amplamente conhecida por seus relatos no blog The Bloggess (Foto: Intrínseca)

Jenny Lawson – Alucinadamente Feliz: Um Livro Engraçado Sobre Coisas Horríveis (352 páginas, Intrínseca)

Alucinadamente Feliz: Um Livro Engraçado Sobre Coisas Horríveis é o que acontece quando uma pessoa completamente pirada (no melhor sentido da palavra) decide escrever um livro. Jenny Lawson, autora best-seller do The New York Times, teve uma das ideias mais geniais para lidar com seus diversos distúrbios mentais e desgraças do dia a dia: compartilhá-los com o resto do mundo. Pode se esperar que a vida de alguém depressiva altamente funcional com transtorno de ansiedade grave, depressão clínica moderada, distúrbio de automutilação brando, transtorno de personalidade esquiva e um ocasional transtorno de despersonalização, além de tricotilomania (que é a compulsão de arrancar os cabelos), seja um fardo impossível de carregar, mas Jenny consegue como ninguém fazer uso do bom e velho ditado rir para não chorar.

Publicado em 2015, e traduzido para o português por Andrea Gottlieb de Castro Neves, o livro traz em cada capítulo uma história diferente sobre o cotidiano da autora. Abordando desde questões pessoais até o seu casamento, trabalho, família, afeição esquisita por animais empalhados ou qualquer outro puro e simples episódio banal da sua vida, todos carregam uma mesma característica: finais trágicos, ou no mínimo vergonhosos. Isso tudo narrado com um tom irônico e autodepreciativo medido em doses exatas, que transformam qualquer acontecimento horrível em um bom entretenimento. 

O grande prazer de Alucinadamente Feliz é lembrar a cada segundo que se tratam de relatos puramente reais. E, por mais específicos que sejam cada um deles, e por mais particular que seja a mente conturbada de Jenny, é quase natural se encontrar com as maluquices que ela descreve em um mundo em que a cada dia estamos mais malucos. Dessa forma, a moral final da história é apenas uma: você não está sozinho. – Vitória Silva

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