Lucifer está de volta e dessa vez em dobro

“Nunca fui expulso de qualquer lugar antes na minha vida. Bem, exceto o Céu, claro” (Foto: Reprodução)

Anna Clara Leandro Candido

Entre o céu e o inferno. Essa é a posição que a Terra ocupa, proporcionando um local estratégico para o encontro de anjos e demônios e, quem sabe, até mesmo do Diabo em pessoa. É nesse cenário em que a série da Netflix, Lucifer, desenvolve sua trama. Após se cansar do Inferno e decidir tirar férias em Los Angeles, Lucifer (Tom Ellis) tornou-se dono de uma boate, tio, consultor civil da polícia e par romântico da detetive Chloe Decker (Lauren German). Agora, na primeira parte da quinta temporada, o Anjo das Trevas favorito de todos retorna do Submundo para agraciar o público com seu carisma e finalizar alguns assuntos inacabados. Acompanhados de uma linda ambientação e trilha sonora, os personagens voltam à ativa com todo seu glamour para agradar os fãs.

Ao fim da temporada anterior, Lucifer foi obrigado a voltar para o Inferno e impedir que os demônios fizessem mais uma de suas revoltas. Foi frustrante para os fãs verem-no partir após Chloe finalmente descobrir sua verdadeira identidade como Senhor do Submundo e (muito, muito, muito tempo depois) aceitá-lo como realmente é. Por isso, o novo ano evita alongar a instabilidade na relação amorosa dos dois, proporcionando ao público algumas cenas de um dos casais mais queridos.

Outro acerto foi consertar a enrolação que muitos dos episódios traziam desde o início da série. Depois da obrigação de fazer o quarto ano com apenas 10 episódios, os showrunners aprenderam a ser mais objetivos. Mesmo os especiais que, inicialmente, parecem não acrescentar nada a história, provam sua importância no fim. A trama, no entanto, não se desprende da sua antiga fórmula de investigação policial/problemas celestiais, o que pode incomodar o espectador que assiste a série buscando por uma abordagem mais filosófica dos temas apresentados. Não que prejudique a obra, muito pelo contrário, isso é estratégico. Lucifer já provou inúmeras vezes ter uma base de fãs gigante e fiel, portanto o objetivo é justamente inovar dentro do padrão já estabelecido e amado.

O romance mais esperado da série finalmente tem início na 5ª temporada (Foto: Reprodução)

Inovações essas que chegaram de duas formas nesse novo ano: através de clichês e assuntos relevantes para a sociedade. A obra utiliza da já conhecida narrativa do irmão gêmeo do mal para resgatar Lucifer do Inferno e levá-lo de volta para à Terra. Por ser uma série sobre o divino, o tema se encaixa bem e traz um bom antagonista para o início da trama. Algo já batido dentro de produções televisivas, mas se o público não aplicar a lógica ou o criticismo à narrativa e aproveitar o show como ele é pensado para ser (um entretenimento), não incomoda realmente o espectador.

Contudo, um clichê da própria série, que foi ressuscitado no show, acabou por estagnar uma das melhores personagens da trama, a demônio Mazikeen (Lesley-Ann Brandt). A jornada de Maze em busca de uma alma, e um lugar/alguém para chamar de seu, já foi diversas vezes explorado, mas nunca bem trabalhado ou finalizado. Ela então trilha mais uma vez esse caminho, agora procurando saber de sua mãe e lutando contra seus demônios do passado. Mas, de novo, não chega a lugar algum, deixando o desfecho de sua jornada para a segunda parte da temporada. Infelizmente, essa reciclagem de motivação para a personagem limita muito seu crescimento em Lucifer e poda seu potencial para realizar cenas épicas das quais sabemos que Maze é capaz.

Mas, a jornada dela não foi desperdiçada. Pelo contrário, abriu a porta para um dos assuntos mais relevantes que a série trouxe. Tanto a Dr. Linda (Rachael Harris) quanto Mazikeen tornam-se as protagonistas de uma conversa sobre maternidade na adolescência, adoção, abandono e estabilidade psicológica e emocional de ambas as partes: filha e mãe. Maze representa na história a filha deixada pela mãe, a vontade de reencontrá-la, de se conectar com alguém e as dores que uma criança carrega por isso. Já Linda traz a visão da mãe que, por ser muito jovem, teve de fazer a difícil escolha de deixar seu bebê para a adoção.

A amizade de Maze e Linda é um dos grandes acertos da história no decorrer das temporadas (Foto: Reprodução)

Além disso, os outros personagens foram bem trabalhados dentro de suas próprias jornadas. A trajetória de Chloe foi um dos focos dessa temporada de Lucifer, pois, agora que tem consciência de que vive em um mundo onde demônios e anjos existem, ela participa mais ativamente das grandes cenas de ação celestiais. É interessante vê-la trocar de lugar com Lucifer para variar, pois agora é ela quem está lidando com um mundo do qual não entende. Fato que leva Chloe várias vezes ao consultório da doutora Linda, proporcionando várias conversas engraçadas e esclarecedoras. Ela até mesmo passa a ver seus casos como um reflexo da própria vida, atitude essa que era muito mais comum ao seu parceiro.

Acredito, porém, que o destaque deva ir para o próprio Lucifer. Desde o início, a série aborda a jornada do Diabo tentando descobrir como é ser um humano. Após tanto tempo convivendo e lidando com assuntos mundanos, como sentimentos de amor e afeto pelos outros, era inegável de que ocorresse um amadurecimento em sua personalidade. Ele não perdeu o charme ou ímpeto por causar problemas e ser, bom, o Príncipe do Mal. Mas Tom Ellis consegue mostrar através de sua performance e escolha de palavras o quanto o personagem cresceu com o passar dos anos, deixando o público ainda mais cativado por ele.

O Príncipe das Trevas em seu trono (Foto: Reprodução)

O ator sempre foi um dos pontos alto de Lucifer, mas nessa temporada Tom Ellis consegue expandir ainda mais seu talento ao interpretar Michel. É um desafio para qualquer um interpretar gêmeos, pois são duas pessoas que apenas compartilham do mesmo rosto, não sendo só o nome que muda, mas sim o jeito de andar, a postura e as palavras. Tom consegue fazer tudo isso e mais um pouco. Michel é invejoso, é um personagem que sempre quis provar ser o melhor e faz de tudo para conseguir, mas ele também é amargurado e carrega o peso que seu medo de falhar o proporciona. Ellis é capaz de transmitir essa análise do personagem só com sua atuação e maneira de fazê-lo se portar, tornando-se uma joia ainda mais brilhante para a série.

Lucifer voltou com todos os prós que arrebataram tantos fãs no decorrer dos anos. Numa história de fantasia que não requer qualquer lógica para cativar as pessoas, feita para entreter e divertir seu espectador. Graças ao maravilhoso elenco da série e suas histórias divertidas, ela é capaz de continuar por um bom tempo encantado as pessoas. Mas isso não significa que o público não mereça inovações e um bom show. Se mais assuntos que conectem realidade e ficção forem introduzidos na trama, eles podem muito bem melhorá-la cada vez mais.

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