Vitória Lopes Gomez
A sonhada adaptação da revista em quadrinhos Heavy Metal proposta pelos diretores David Fincher (Seven, Mank) e Tim Miller (Deadpool) ficou na gaveta por anos até a Netflix topar o desafio. No streaming, os dois se juntaram a Jennifer Miller e Joshua Donen (Mindhunter, House of Cards) na produção e a ideia virou Love, Death & Robots, inédita e inovadora na farofa de conteúdos originais da plataforma. O sucesso e a aprovação dos curtas metragens animados garantiram a continuação: mais curta, a segunda temporada da série volta para mais amores, mortes e robôs.
Seguindo o formato antológico, os oito episódios continuam completamente independentes e não limitam as possibilidades. A cada capítulo, universos, elencos e equipes, estilos visuais e até gêneros distintos obedecem à única regra de abordarem ou morte, ou amor ou robôs (ou mais de um no mesmo episódio). Os temas, que aparentemente são o único ponto em comum entre eles, usam da liberdade para explorarem suas próprias narrativas e técnicas e despertam a curiosidade não pelas semelhanças, mas justamente pelas diferenças.
Transitando entre ficção científica, fantasia, terror, suspense e até comédia, têm capítulo, história e visual para tudo quanto é gosto. O instinto de sobrevivência marca a segunda temporada de LD&R, mas, entre distopias futuristas realistas e contos natalinos em stop-motion, nem o tema em comum torna a coletânea previsível.
Episódios tensos e cheios de ação como Gaiola de sobrevivência, estrelado por Michael B. Jordan em um visual característico dos videogames, vêm na sequência de outros calmos e introspectivos, como O gigante afogado, que reflete sobre a natureza da vida e da morte. Ainda, enquanto alguns robôs fogem do controle e voltam-se contra os seres humanos, como em Atendimento automático ao cliente e seu estilo caricatural, em outros, as máquinas ajudam a humanidade e até se envolvem com ela, como no realista Snow no deserto.
Mesmo que alguns conceitos e premissas não sejam inéditas – “inteligência artificial se volta contra seus criadores” é tema de incontáveis produções -, a relação entre humanos e tecnologia acaba sendo retratada de diversas formas em cada capítulo, como o idealizador pretendia que fosse. As diferentes equipes envolvidas na criação, inclusive de lugares distintos do mundo, tornam Love, Death & Robots um compilado de ideias e experimentações, nada coeso, obrigatoriamente inovador e quase sempre divertido – afinal, cada episódio é um.
Para além das distopias em universos intergalácticos, cenários pós-apocalípticos ou com tecnologias avançadas roubando a cena, alguns dos curtas se destacam pela falta desses elementos. Em A grama alta, adaptada de um conto de mistério e terror, e Pela Casa, uma tenebrosa e divertida fábula natalina, as criaturas fantasiosas substituem as máquinas e fogem do óbvio dos robôs que dão nome à série. Ainda que a maratona não compense e a sequência dos capítulos não obedeça uma ordem, os diversos estilos de animação, gêneros e histórias dão fôlego à temporada, que também se beneficiou pela duração mais curta.
A continuação segue aproveitando a vantagem do formato antológico não só na hora de explorar as diferentes narrativas, que ficam sujeitas ao tratamento dos roteiristas e ao gosto do espectador, mas também nas técnicas de animação. De um episódio para outro, vamos do espaço hiper-realista e cheio de detalhes a uma sala de estar em stop-motion: os visuais são um show à parte e, por si só, já tornam Love, Death & Robots tão atraente e chamativa.
Não por menos, a série garante presença no Emmy nos dois anos em que foi exibida. Na edição de 2019 da maior premiação da TV, o capítulo A Testemunha (The Witness) rendeu à primeira temporada o troféu de Melhor Programa Curto de Animação, no Creative Arts Emmy, conhecido como o Emmy Criativo e que premia as categorias técnicas, como direção de arte, figurino, mixagem de som e outros.
Além da conquista no nicho das animações que consagrou a estreia de Amor, Morte & Robôs, o nome traduzido da série, a produção teve mais quatro vitórias em categorias de desempenho individual. Artistas visuais, designers de produção, animadores e outros profissionais levaram para casa prêmios por seus trabalhos nos episódios A Testemunha, Sugador de Almas (Sucker of Souls) e Boa Caçada (Good Hunting) da primeira temporada.
Na 73° edição do Emmy Awards, a antologia foi novamente indicada como Melhor Programa Curto de Animação com o episódio Gelo (Ice), da segunda temporada, e compete com novatas como Robot Chicken, da Adult Swim, Maggie Simpson: O Despertar com Força da Soneca e Era Uma Vez um Boneco de Neve, ambas do Disney+. A continuação de Love, Death & Robots repete os méritos que a concederam a vitória há dois anos e agora, conhecida da premiação, já chega como favorita ao Emmy 2021. Pelo menos nessa categoria, as apostas ficam fáceis.