Laura Hirata-Vale
Salém, Dia das Bruxas e uma noite de lua cheia. Nessa receita de poção mágica, faltam somente dois ingredientes para que as irmãs Sanderson voltem à vida: alguém virgem, que acendesse uma vela de chama escura. Na noite de 31 de Outubro de 1993, dentro de um casebre abandonado, Max Dennison (Omri Katz) faz todos os passos do ritual, achando que nada iria acontecer. Dessa forma, as três bruxas retornam do mundo dos mortos, à procura de crianças e adolescentes para devorar. A história de Abracadabra (1993) termina com Winifred (Bette Midler), Sarah (Sarah Jessica Parker) e Mary Sanderson (Kathy Najimy) virando pó com o raiar do Dia de Todos os Santos, para a alegria dos protagonistas.
Porém, 29 anos depois, uma nova narrativa começa. Abracadabra 2 traz – de forma nostálgica e musical – as bruxas mais comicamente assustadoras de volta. Cheio de feitiços, piadas e risadas maléficas, o segundo longa homenageia o original, tentando superá-lo, mas não conseguindo. Em uma outra noite de Dia das Bruxas, com a lua cheia brilhando no céu, uma vela de chama escura é acendida. Seria isso um acidente? O que as irmãs Sanderson vão aprontar dessa vez?
Na história inédita, conhecemos Becca (Whitney Peak), uma garota cujo aniversário é o dia de Halloween. Durante uma visita à Loja de Mágica de Salém – a loja-museu instalada no antigo casebre de Winnie, Sarah e Mary –, a adolescente recebe de seu dono um presente, para fazer um pequeno ritual de magia, que é uma de suas tradições da data. Porém, Becca é pega de surpresa, e o mimo – na verdade – é uma vela de chama escura. E, de forma batida, as três bruxas retornam, com sede de poder e vingança: estariam elas atrás da juventude eterna, ou de outra coisa?
Abracadabra 2 é, em sua essência, um filme muito mais leve do que seu irmão mais velho. O longa original trata temas mais obscuros e pesados, como o assassinato de crianças, além do plano de Max, Dani e Vinessa envolver a morte das irmãs Sanderson. Já o segundo trata a amizade, o perigo da ganância e de sempre querer mais, mais e mais. A fotografia da primeira produção – feita por Hiro Narita, responsável pelo mesmo setor em Querida, Encolhi as Crianças (1989) – era analógica, cheia de texturas e com cores queimadas e alaranjadas, vindas diretamente do Outono. Já seu sucessor, que teve esse campo comandado por Elliot Davis, de Crepúsculo (2008), foi gravado com câmeras digitais, que possuem mais profundidade, mas que tiram o aspecto de cor fantasioso, deixando-o mais real.
Com tons de laranja, vermelho e marrom, o filme captura o meio do Outono de forma caramelada e doce, como a noite de Halloween. Repleto de pessoas fantasiadas como esqueletos, vampiros e – é claro – como o trio de bruxas mais querido dos Estúdios Disney, Abracadabra 2 tem vários pequenos detalhes que nos teletransportam para o ano de 1993. Durante o longa, referências são salpicadas aqui e ali, dando um sabor de nostalgia – e de risadas – para quem assistiu o original anos atrás. Porém, o gosto do caramelo de saudades pode facilmente se tornar enjoativo e até amargo, por mostrar tantos momentos repetidos e recriados, que podem não satisfazer quem tem memórias afetivas do primogênito.
As ideias de Kenny Ortega são reutilizadas no segundo capítulo, dirigido por Anne Fletcher – de Se Ela Dança, Eu Danço (2006) e A Proposta (2009). No primeiro filme, temos a icônica cena musical de I Put a Spell on You; já na sequência, recebemos uma versão repaginada: a faixa da vez One Way or Another, da banda americana Blondie. Além disso, o longa possui a canção original The Witches Are Back – que traz Elton John como um de seus compositores – que mostra toda a versatilidade e vitalidade das bruxas, recém-ressuscitadas. Por ter ficado novamente nas mãos de John Debney, a trilha sonora manteve seu padrão de qualidade e é um dos pontos altos de Abracadabra 2.
Enquanto o primeiro filme teve sua estreia nos cinemas, Abracadabra 2 foi lançado em 2022 diretamente no Disney+, serviço de streaming da Disney. É por esta razão que o longa pôde entrar na lista de indicados ao Primetime Emmys de 2023, na categoria de Melhor Telefilme. Seus concorrentes são Dolly Parton’s Mountain Magic Christmas, O Predador: A Caçada, Orgulho e Sedução e Weird: The Al Yankovic Story. Além dessa indicação, a produção ainda foi lembrada na categoria de Melhor Trilha Sonora em Minissérie, Antologia ou Telefilme – provando a qualidade contínua de sua música, feita pelo veterano John Debney.
Por causa do trabalho de Salvador Pérez, Abracadabra 2 também foi indicado a Melhor Figurino de Fantasia/Ficção Científica, mostrando outro ponto de importância do filme. As cores clássicas de cada bruxa – Winnie e seu verde, Mary e o vermelho, Sarah com o roxo – fazem seu retorno em veludos, brilhos e tecidos esvoaçantes. Botas de bico fino, capas, colares de pedrarias e capuzes voltam à moda, principalmente na noite de Halloween. A receita utilizada por Salvador Pérez para a criação do figurino icônico continuou a mesma, dando um conforto e a sensação de normalidade para quem era fã do primeiro longa.
Ao final, as Sanderson lançam um feitiço para engrandecer seus poderes. Porém, como toda magia tem um preço, Winnie acaba pagando com o que era mais importante para ela: suas irmãs. Assim, a bruxa mais maldosa do trio desiste de ser poderosa e vai ao encontro de sua família. Abracadabra 2 segue a mesma receita de seu irmão mais velho – ressuscitar bruxas más por uma noite –, mas não consegue chegar aos pés dele.
Mesmo usando tantas referências repaginadas – como Winnie voando em uma vassoura, Sarah em um mope e Mary em dois aspiradores de pó robóticos – lembranças afetivas e números musicais bem elaborados, a nova história não se equipara à original, desapontando uma boa parte dos apaixonados pela narrativa. A sequência não consegue segurar o tom de horror infantil, fantástico e cômico presente em Abracadabra, que é considerado não só como um clássico dos anos 1990, mas também como um período de Halloween. O tão aguardado retorno das Irmãs Sanderson trouxe a nostalgia, porém, não trouxe toda a magia da volta anterior.