Bruno Andrade
De um lado, Truman Capote; um dos maiores expoentes do chamado novo jornalismo, autor de A sangue frio (1965) — livro que, como ele próprio anunciou, inventou o “romance de não-ficção”. Do outro, Tennessee Williams, nome de peso entre os dramaturgos do século XX, conhecido por criar obras transcendentes e tendo recebido duas vezes o prêmio Pulitzer. O que ambos tinham em comum? Além do fato de terem sido escritores consagrados, possuírem nomes iniciados pela letra T e terem sido homossexuais em um Estados Unidos repressivo, os dois foram amigos. No documentário Truman & Tennessee: Uma Conversa Pessoal, que compõe a seção Perspectiva Internacional da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, a diretora Lisa Immordino Vreeland estabelece um diálogo possível entre esses dois gigantes.
Mesclar duas biografias pode ser perigoso, ainda mais quando as duas personalidades biografadas tem seus nomes fincados na cultura popular. Todavia, as conexões estabelecidas pela diretora são suficientes para, no mínimo, ver sentido no que está sendo feito. Composto basicamente por imagens de documentos pessoais e gravações de entrevistas — em especial as mesmas duas entrevistas que os escritores concederam a David Frost —, o longa possui narrações em off de Jim Parsons e Zachary Quinto, que dão voz a Capote e Williams, respectivamente.
Parece que a tônica que direciona Truman & Tennessee: An Intimate Conversation é a reverência. No entanto, o documentário nunca vai além do conhecimento popular sobre esses dois autores, deixando a desejar na investigação — algo que poderia ter sido feito com êxito devido ao formato empregado no filme. O longa funciona como uma espécie de leitura de diários, a fim de criar a “conversa pessoal” do título, e deixa em evidência que, embora fossem majoritariamente amigos, Truman Capote e Tennessee Williams eram, às vezes, rivais.
Diferente de Williams, Capote passou por seus últimos dias como um autor improdutivo, tendo como última obra publicada Música para Camaleões, lançada em 1980, quatro anos antes de morrer. No entanto, este livro (que, inclusive, foi dedicado a Tennessee Williams) foi composto por artigos publicados ao longo de sua carreira, trazendo o seguinte trecho no prefácio: “Minha vida — a artística, pelo menos — poderia ser registrada num gráfico preciso, como a evolução de uma febre: os picos e os pontos mais baixos, os ciclos claramente definidos”. Ao que tudo indica, a diretora atentou-se a essa declaração no tratamento das cenas, deixando Truman Capote como um autor que almejava a fama e o sucesso, sempre presentes em jantares de gala, enquanto Williams foi um autor atormentado, que trazia na escrita sua válvula de escape — como “um simples impulso”, segundo ele próprio.
Lisa Immordino Vreeland já documentou a vida de sua avó, a editora de moda Diana Vreeland, e do fotógrafo Cecil Beaton. Entretanto, o que funcionou em seus filmes anteriores não funciona aqui. Apesar das brilhantes adaptações cinematográficas que as obras de ambos receberam — como Bonequinha de Luxo (1961) e Um bonde chamado Desejo (1951) —, Capote e Williams não eram artistas visuais, o que estabelece uma dificuldade considerável ao serem representados nas telas.
A simples exposição de entrevistas e fotografias, com narrações em off, não é capaz de contemplar todas as nuances das obras e da vida particular dos escritores. Ao fim de Truman & Tennessee, temos uma vaga ideia do que foi esboçado pela diretora ao longo dos 86 minutos de exibição; porém, predomina a sensação de que imagens contendo as duas personalidades foram simplesmente colocadas lado a lado, deixando seus paralelos reféns do senso comum.