Thuani Barbosa
Diversão, momentos família, intrigas de uma vilã descontrolada e até criaturas místicas. Tudo isso é o que você vai encontrar em The Loud House: O Filme, tão digno da realeza que, se The Crown fosse uma animação, seria essa. Por mais que seja uma narrativa infantil recheada de bom humor, boas amizades e todas as grandes lições que se espera desse tipo de produção, a história conta com reflexões de ‘gente grande’, como insegurança e a importância do apoio familiar. A família barulhenta vai conquistar espaço no seu sofá!
Lançado em 2021, a animação é dirigida por Dave Needham e vem de uma parceria entre a grande produtora de conteúdo infantojuvenil Nickelodeon e o streaming mais amado do Brasil, Netflix. A estreia não foi estrondosa, nem chegou a ficar no top 10 nacional, porém a produtora do desenho tem grandes planos, incluindo seu próximo lançamento preparado para este ano, um live action especial de Natal, contando com a presença de Brian Stepanek como Pai.
A trama se inicia com o que muitos veem como o personagem principal, Lincoln Loud (a dublagem original contou com Grant Palmer, Collin Dean e Sean Ryan Fox; e Wirley Contaifer dá voz ao garoto em português), ajudando sua família no decorrer do dia, mas, ao final, o menino é ofuscado pelas conquistas das irmãs e se sente menos especial por não ter um talento exclusivo. Assim, Lincoln decide procurar seus ancestrais e vai para a Escócia. No país da gaita de fole, kilts e golfe, ele encontra no Lago Loud sua essência de ajudar as pessoas no papel de duque.
O longa tem muito carisma, mas, ainda assim, deixa a desejar pois tem partes mal exploradas, como o momento em que o protagonista passa a ajudar a cidade e rapidamente se torna duque, algo de extrema importância para a criação do ideal monárquico e a conquista do garoto, porém, ao contrário disso, o que se vê são dois minutos de ajuda e dez de canto e vangloria sobre ele. O ego repentino do nobre cuidador do povo se vai com a mesma rapidez que chegou, com as intrigas plantadas pela vilã Morag (dublada por Michelle Gomez na voz original), que, apesar de pertencer a uma animação, é sem sentido de uma maneira escrupulosa, a tornando irreal até mesmo para um desenho. Morag tem muito a aprender com Mãe Gothel, a vilã de Enrolados, esta sim sabe ser má, uma personagem bem construída com um motivo forte para justificar seus crimes, que se mantém potente, intimidadora e com grande personalidade.
Mas comparar criações da Disney com quaisquer outras é um enorme erro. Uma vez que a gigante cinematográfica tem um histórico de trazer personagens complexos e com referências ocultas para programas infantis há muito tempo. Talvez a falta de personalidade de alguns personagens de The Loud House se dê devido à sobrecarga de originalidade que as irmãs Loud – Lori, interpretada originalmente por Catherine Taber e na versão brasileira por Carina Eiras; Leni é dublada por Liliana Mumy e por Jullie; Luna, por Nika Futterman e Mariana Torres; Luan, Cristina Pucelli na voz original e Gabriela Medeiros; Lynn e Lucy são interpretadas por Jessica DiCicco; Lana, Lola e Lily são Grey Griffin e Lisa é Lara Jill Miller – carregam, cada uma com sua especialidade, que acabam tirando o brilho dos demais. O único que consegue se sobressair entre elas é Lincoln porque, de um jeito ou de outro, está sempre dando suporte com grandes feitos, mas mantém uma característica submissa e facilmente dispensável.
O diretor Dave Needham já participou de várias produções animadas, como Trolls, O Poderoso Chefinho e PéPequeno, e traz uma característica forte das demais criações: o imaginário. Por mais que seja uma trama para crianças, a presença de criaturas místicas ou até imaginárias não é obrigatória, mas Dave usa e abusa de tal feito. Com a presença de dragões, feiticeiras e fantasmas, a história fica mais atrativa e divertida, o que compensa o enredo vago e sem grandes emoções, produzido por Kevin Sullivan e Chris Viscardi. A pequena dragão-fêmea Lela traz uma pitada de fofura, mas o que desenvolve o interesse de verdade é a fantasma de Lucy (interpretada por Jessica DiCicco na voz original e Tônia Mesquita na dublagem brasileira), a irmã gótica trevosa, que deixa o telespectador com vontade de descobrir mais sobre a família fantasmagórica.
Em contrapartida, a criatividade usada na trilha sonora criada por Philip White e Christopher Lennertz é incrível, repleta de canções animadas e que não saem da cabeça, que ajudam a segurar o ânimo do espectador no decorrer dos 87 minutos de filme. Já a grandiosidade do castelo super detalhado é um admirável trabalho de Karen Malach, em alguns momentos pode-se lembrar dos gráficos de (Des)encanto, uma vez que, quando o palácio é observado de longe, sua qualidade diminui não empobrecendo o efeito da imagem mas dando outras proporções.
Mesmo com a quantidade de problemas para suprir a necessidade criativa de quem vê, o produto audiovisual consegue entregar a mensagem de amor e amizade fortemente presente no âmbito familiar, mesmo com os sentimentos conflituosos e um dragão enfeitiçado tentando ameaçar a união. O jeito gentil e cuidadoso de Lincoln Loud conquista qualquer coração que tenha uma pitadinha de carinho, e vê-lo com medo de não ser o suficiente deixa pessoas em prantos, mas é um ótimo modo de ensinar as crianças o quão especiais elas são, todas com suas individualidades. Deixando um legado de amor próprio, amizade e família feliz, os Loud nos mostram que somos todos diferentes e isso não diminui nosso valor, pois somos todos preciosos com cada característica única.