Andreza Santos
Sem romantização e com muita honestidade, Better Things conta a história de Sam Fox (Pamela Adlon, de This Is Us) uma atriz e mãe solteira de 3 filhas, que se desdobra dia após dia para cuidar delas enquanto trabalha em set de gravações de Hollywood. A série, criada por Louis C.K., mais tarde, foi totalmente passada para as mãos de Pamela, após a demissão de C.K. por comportamento inapropriado.
A produção do canal FX é inteligente, sensível, instigante e engraçada, e com toda essa qualidade já foi reconhecida pelo Emmy mas infelizmente ainda não conquistou a sua estatueta. Com muito coração, Adlon permeia o espaço entre o drama e a comédia muito bem, trazendo várias camadas da relação de Sam com as pessoas à sua volta – principalmente com sua mãe – e a forma como ela leva a vida.
A família de Sam ainda conta com sua mãe super desajustada Phil (Celia Imrie, de O Exótico Hotel Marigold 2) com quem sempre a protagonista está discutindo ou fugindo de suas intromissões desnecessárias. Sam cuida das filhas em tempo integral, que mal reconhecem todo o amor e carinho que a mãe lhes dá, e são extremamente rudes com ela, que tenta entender o comportamento das garotas, sem sucesso.
Better Things traz a melhor faceta de Pamela Adlon, antes mais experiente na dublagem do que nas telinhas, aqui assume a série como protagonista, cocriadora, diretora, produtora e roteirista. O talento dela em todas essas profissões é algo incrível de se ver. A sinceridade afetuosa de Sam é adorável, uma mãe imperfeita que quer ser uma referência para as filhas – e é para Duke, a mais nova. Isso é fruto da vida real de Adlon, que inspirou a série, ela também tem 3 filhas e todas com nome neutro igual Max, Frankie e Duke, suas filhas da trama.
Pamela Adlon tem um poder arrebatador de transformar algo banal em extraordinário. Trazendo assuntos recorrentes de outras tramas com protagonistas femininas fortes, Better Things trata com naturalidade todo assunto complexo que se propõe a debater, como menstruação, envelhecimento, identidade de gênero, adolescência, drogas, família, feminismo e sororidade.
Max (Mikey Madison), é a filha mais velha do trio, ama contar tudo o que acontece em sua vida para a mãe, que sempre lhe deu liberdade tanto para falar de sexo tanto quanto drogas. Com a chegada da vida adulta, Max passa a entender mais a mãe, tendo uma grande evolução no quarto ano, passando de uma garota inconsequente a uma mulher séria e madura para a pouca idade.
Frankie (Hannah Alligood) é a filha do meio, sempre meio deslocada, vemos a jornada de descoberta dela sempre pairar na família desde o fim da primeira temporada, quando surge a questão sobre a identidade de gênero, que é levada a banho-maria durante todo esse tempo. Desde que Sam foi avisada sobre a identidade da filha e uma possível transgeneridade, ela deixa Frankie livre para ser o que quiser, porém, pela complexidade do assunto, ainda não temos todas as respostas, apenas vemos a forma como Sam lida com tudo isso.
Duke (Olivia Edward), é a mais amorosa das três filhas e podemos acompanhar a transição da infância para a adolescência da garota. Ela admira muito a mãe e é a que mais assume a questão espirituosa de Better Things. Tem uma sensibilidade impressionante, isso quando não está gritando palavrões em um estacionamento com as irmãs.
O capítulo mais emocionante da série vem na segunda leva de episódios, intitulado de Eulogy, onde Sam cansa de ser ignorada e pede um pouco de gratidão das filhas. Esse pedido da protagonista leva a cenas muito especiais que nos fazem chorar e rir ao mesmo tempo, e é aonde percebemos a grandiosidade da série e como amamos muito essas mulheres.
O terceiro ano de Better Things pode ser considerado o mais ousado da trama, onde é abordada uma possível bissexualidade de Sam de forma singela, e é também quando vemos a protagonista experimentando coisas novas, por causa de uma crise de meia-idade. A casa de Sam está sempre cheia de amigos, na sua maioria mulheres, onde elas conversam sobre tudo enquanto se divertem contando os problemas da vida.
A produção de Pamela Adlon traz, em sua quarta temporada, um elemento simples porém cheio de significado: a água. Aqui ela vem em forma de chuva, tempestade, piscina e mar, ditando todos os acontecimentos da série, do primeiro ao último episódio, purificando todos os problemas, renovando e trazendo uma maior intensidade para a temporada – a melhor até agora.
Essa leva de episódios poderia ter sido a última, mas, felizmente, a série foi agraciada com mais uma renovação. Ainda não sabemos como Pamela Adlon elevará mais ainda o nível da série na quinta temporada, mas sabemos que será igualmente incrível. O quinto ano está em produção, com previsão de estreia para o primeiro semestre de 2022.
Better Things é uma série preciosa e necessária, que celebra relações, lugares, momentos e mulheres. É nostálgica e muito sincera, tudo de uma vez só. É um retrato da maternidade de forma crua, a vida como ela é sem rodeios nem romantização. Talvez seja por isso que conseguimos nos relacionar tanto com os acontecimentos na vida da família Fox. Afinal, é como a Phil diz “Toda mãe é uma mãe solteira”.