Lara Ignezli
O MCU (Universo Cinematográfico Marvel, do inglês original Marvel Cinematic Universe) completa em 2018 dez anos de existência. Desde que nasceu, 28 (isso mesmo, vinte e oito) filmes foram lançados e 0 (isso mesmo, zero) tiveram como personagem principal uma mulher. A primeira fase se iniciou com Homem de Ferro (2008), a segunda em 2013 com o lançamento de Homem de Ferro 3 e a terceira — e atual — vem em 2016 com Capitão América: Guerra Civil.
Durante a primeira fase, no segundo filme da franquia de Tony Stark, Viúva Negra debuta como personagem secundária e se torna a única vingadora dois anos depois em Os Vingadores. Scarlett Johansson foi fortemente aclamada pelo público desempenhando o papel, mas a personagem não possui um filme solo — apesar de sua história de fundo extremamente complexa e bem escrita nas histórias em quadrinhos.
Natalia Romanova é natural da União Soviética e seu contexto histórico é a Segunda Guerra Mundial. Após a morte dos pais, ela é treinada com um grupo de órfãs de guerra para se tornar uma espiã mortal no Projeto Viúva Negra. Experimentos biotecnológicos são brutalmente realizados em seu corpo para que seu físico e psicológico se desenvolvam de forma sobre-humana e para que seu envelhecimento seja retardado. Após anos de tortura a fio, Natalia se torna a agente Natasha Romanoff.
Esse treinamento, retratado nas HQs, aparece brevemente em Os Vingadores: A Era de Ultron (2015), quando a personagem começa a se envolver romanticamente com Bruce Banner, o Hulk. Um dos procedimentos realizados no Projeto Viúva Negra foi a esterilização, considerada importante porque o lado racional de um espião deve sempre se sobrepor ao emocional, e ter um filho era equivalente a ter uma fraqueza.
Ao invés de trabalhar os danos psicológicos que esse plano de fundo acarretou em Natasha enquanto ser humano, o fato foi superficialmente abordado para interferir no relacionamento amoroso da personagem. Ter sido torturada afeta não Natasha Romanoff, super-heroína, mas Natasha Romanoff, namorada de Bruce Banner.
Depois de oito anos sendo apenas um suporte para os personagens principais, a super-heroína recebeu a merecida atenção: seu filme solo começou a ser produzido. Apesar de não ter uma data de estreia, Jac Schaeffer já foi confirmada como roteirista do longa. Parabéns, Marvel. Você não faz mais do que sua obrigação.
Dentre todos os filmes já produzidos pela marca, apenas um se encaixa na categoria de protagonismo feminino: Elektra (2005), o fracasso atemporal. O longa, concebido como um spin-off de Demolidor: O Homem Sem Medo (2003), foi dirigido por Rob Bowman e roteirizado por Raven Metzner, Zak Penn e Stu Zicherman; e brutalmente massacrado pela crítica.
O descaso já começa na ordem cronológica, considerando que Elektra teria morrido em Demolidor e ressuscitado apenas para viver a história de seu próprio filme. Além disso, a super-heroína é designada a realizar tarefas sem um motivo aparente e é sucumbida ao — já previsível — instinto maternal. Completamente desprezando a lógica, os roteiristas de Elektra exploraram a personagem de forma rasa em uma produção que tinha como único objetivo aprofundá-la como pessoa.
A luz no fim do túnel?
A Marvel vem, aos poucos, cedendo espaço para as mulheres. Personagens secundárias estão sendo mais aprofundadas e produções vem sendo realizadas não só para o cinema como para plataformas de streaming, em formato de séries.
Para começar, as mulheres de Pantera Negra (2018) são o maior destaque da produção. O exército de Wakanda é comandado por Okoye (Danai Gurira), a melhor guerreira wakandense. A comandante é extremamente leal ao seu governo e estrela diversas cenas de luta da trama, além de ter uma personalidade forte por trás de suas poucas palavras.
Paralelamente à figura de soldado da personagem, ela também possui um relacionamento amoroso com um dos governantes, mas isso é perfeitamente deixado em segundo plano.
Além de Okoye, a Shuri (Letitia Wright), irmã do T’Challa, é responsável por absolutamente toda a tecnologia desenvolvida em Wakanda, inclusive o traje do Pantera Negra. Nas HQs ela já até tirou uma com a cara do Tony Stark por ter um conhecimento sobre gadgets (equipamentos tecnológicos criados para facilitar uma função útil do cotidiano) muito superior ao do gênio, bilionário, playboy, filantropo — e insuportável — Homem de Ferro.
Fechando a santíssima trindade com chave de ouro: Nakia (Lupita Nyong’o). Seria covardia condensar a personagem a apenas interesse amoroso de T’Challa. Nakia é uma rebelde que defende, durante todo o filme, o que acredita. Enquanto Okoye faz isso no corpo a corpo e Shuri através da criação de novas tecnologias, Nakia avança com os ideais. Não hesita em se posicionar politicamente em momento algum.
Junto à Netflix, a Marvel lançou Jessica Jones em 2015 e a série já teve sua terceira temporada confirmada. Apesar de não ser cinematográfica, a produção desempenha um papel extremamente importante quanto à representatividade feminina. Jessica corrompe estereótipos usando e abusando de whisky, sexo casual, palavrões, calças jeans e jaquetas de couro: seu toque feminino para o universo Marvel.
Além do protagonismo de Jones, em março do ano que vem, Capitã Marvel entrará para o catálogo das produções cinematográficas da marca. O longa é protagonizado por Brie Larson e dirigido por Anna Boden e Ryan Fleck e é uma esperança para toda uma geração de mulheres que, desde pequenas, pagam ingresso do cinema para assistir aos homens salvando o mundo de novo e de novo.
Texto interessante, mas perdeu a chance de abordar outros filmes com grandes heroínas femininas, como por exemplo, Mulher Maravilha ou Atômica, e mostrar como é possível sim a Marvel fazer um filme excelente e rentável com protagonistas femininas.