Kimi No Na Wa: quando o enredo faz a diferença

Egberto Santana Nunes

Troca de corpos sempre foi um tema razoavelmente explorado pela sétima arte. É difícil não pensar em filmes como De Repente 30 e Se eu fosse você, clássicos do estilo “sessão da tarde”, quando se trata dessa temática. Mais difícil ainda é inovar e entreter ao mesmo tempo, sem se apegar à fórmula já desgastada desse lugar comum. Esse é um dos desafios enfrentados pelo diretor Makoto Shinkai em seu mais recente longa-metragem animado, Your Name (Kimi no na Wa, no original em japonês), lançado nos cinemas japoneses em 2016, adaptação do mangá homônimo lançado no mesmo ano.

A trama se concentra na vida de Mitsuha Miyamizu, estudante do ensino médio que vive no campo com sua avó e sua irmã, indo para escola diariamente com sua motocicleta. Em oposição, temos na cidade a vida de Taki Ichibana, também aluno do colegial, que enfrenta em seu cotidiano a lotação do trem e um trabalho de meio período como garçom. Vidas extremamente diferentes e distantes, se não fosse pela troca de corpos que os dois realizam entre si, levando a uma jornada de descobertas e encontros entre os dois.

A história em si parece boba, mas foi responsável por arrecadar mais de US$ 281 milhões no mercado internacional, ultrapassando os 275 milhões de A Viagem de Chihiro. Parte dessa popularidade foi por conta, inicialmente, do nome do diretor. Responsável por sucessos como 5 Centímetros por Segundo (2007) e O Jardim das Palavras (ambos disponíveis na Netflix), Makoto Shinkai é conhecido pelo intenso trabalho artístico de seus cenários. Além disso, depois da aposentadoria de Miyazaki, ele passou a ter lugar nas listas dos melhores diretores de animações no Japão.

Eu sei que a história está legal, mas olha como esse céu ficou bonito

Em comparação com 5 Centímetros por Segundo, Shinkai se mostrou bem mais consistente na realização do anime. Se em ambos a questão da distância é discutida, mas por diferentes óticas (seja pelo tempo, em Kimi no na Wa ou espaço no outro), a diferença se encontra agora no tratamento dos elementos que formam o todo: a animação e a história. Enquanto no anime de 2007 os traços se destacam mais que a história, sendo essa mal interligada, no seu último trabalho uma harmonia entre esses dois fatores, juntamente com a trilha sonora, é alcançada.

Editado pelo próprio Shinkai, o diferencial do roteiro se encontra exatamente nesse cargo. Através do equilíbrio desses elementos, com trilha sonora, animação e história sendo construídas lado a lado, a entrega do espectador à história dos personagens é quase que automática e nem percebemos o tempo e as reviravoltas passarem. Os incríveis cenários falam por si só sem o auxílio dos diálogos, e a música chega para tirar ou colocar o fôlego no desenvolvimento. Inclusive, vários dos cenários desenhados foram baseados em locais reais do Japão, e quando colocados lado a lado fica até difícil dizer qual é o real.

Para que inventar se eu posso desenhar o que estou vendo?

Para compor as músicas do anime, foi contratado o grupo de rock japonês Radwimps. Além dos instrumentais, são feitas três canções pela banda, que servem para mostrar a passagem do tempo e o crescimento dos personagens. A trilha sonora é muito bem colocada durante as cenas, acompanhando passo a passo as sensações e emoções dos personagens. Assim como o enredo, que em sua primeira metade foca mais na comédia para depois partir para o drama, a música também muda nessas partes, entrando sintonia com o conjunto da obra.

A cereja do bolo são as rimas visuais – semelhança de cenas colocadas em diferentes momentos durante a história. Um recurso tão comum em clássicos do cinema como 2001 – Uma Odisseia no Espaço, e que aqui é devidamente aproveitado, não só nas cenas, mas também nas ações dos personagens. Como se trata de troca de corpos esse efeito é esperado, mas não é simplesmente jogado sem pensar, e sim feito com cuidado e inteligência para captar a nossa atenção e ver o quanto estamos imersos na obra.

A eterna – e desnecessária – disputa feita pelos fãs entre Hayao Miyazaki e Makoto Shinkai se acirrou ainda mais com a chegada de Your Name nos cinemas brasileiros. O diretor ainda não conseguiu levar a estatueta de ouro para casa, mas o reconhecimento e bilheteria internacionais foram prêmios garantidos. Shinkai mostra com inteligência como sair dos clichês do tema, com a pura imaginação e fantasia que apenas os desenhos japoneses podem proporcionar.

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