Dante Zapparoli
A quarta temporada de What We Do in the Shadows tinha a faca e o queijo na mão, desde os colegas de quartos vampiros voltando de suas jornadas separadas que os fariam evoluírem como mortos-vivos até a apresentação de conceitos como família, amor e outras construções sociais as quais estamos acostumados – e que são estranhas para seres centenários. No entanto, o queijo foi jogado fora e a faca parece mirar em uma desvalorização ainda maior dos subplots femininos de Nadja (Natasia Demetriou) e em temáticas com contextos racistas, como com Marwa (Parisa Fakhri).
No final da terceira temporada, é exibido um cliffhanger no qual o grupo de cinco vampiros se separam em jornadas diferentes. Nos planos iniciais, Guillermo (Harvey Guillén) seguiria para Al Qolnidar juntamente com seu mestre, Nandor (Kayvan Novak), quando ele finalmente se transformaria em um sanguessuga, às margens do Rio Tigre. No entanto, por mudanças de última hora, ele acaba sendo encaixotado para Londres, juntamente com Nadja.
Já Laszlo (Matt Barry) e Colin Robinson (Mark Proksch) permanecem em Staten Island, sendo que o segundo está em uma forma diferente das apresentadas nas outras temporadas: após seu aniversário de 100 anos, Colin renasce, saindo do peito do antigo sugador de energia que morava na casa. Essas fragmentações fizeram com que as expectativas para os possíveis desentendimentos da quarta temporada ficassem altas. No entanto, como a maioria das plotlines de What We Do in the Shadows, o que realmente aconteceu foram reencontros cômicos e sem muitas implicações de que qualquer um dos conflitos anteriores seriam resolvidos.
O início da quarta temporada mostra que todas as jornadas que tomaram parte na trama passada fracassaram: a volta para casa de todos eles vêm por meio do caos e da necessidade de retornar a um lugar já conhecido. Pela primeira vez, vemos que os personagens têm o intuito de mudar as coisas ao redor deles. Algo que não era comum nos anos anteriores, em que o máximo que ocorreria durante a trama era a evolução de títulos que envolviam Guillermo indo de familiar para guarda-costas devido sua descendência Van Helsing.
Agora, é possível ver que as falhas passadas deram um ar de esperança e de mudança para a casa: Nadja procura abrir seu próprio negócio, Nandor está em busca de uma esposa e Laszlo está disposto a se tornar um pai para Colin Robinson. Quem sobra, no final, é Memo, que acaba exercendo o papel de babá, contador e padrinho de casamento.
Um novo personagem que aparece nas confusões dos vampiros é o Djinn (Anoop Desai), invocado por Nandor, em uma tentativa de trazer à vida suas 37 esposas. O plano do vampiro setecentista é que a busca por amor, sua principal trama da terceira temporada, era inútil; ele já havia se apaixonado antes, quando ainda era vivo. No entanto, não lembrava quem era sua paixão. Então, procura nos meios mágicos uma maneira de encontrá-la novamente.
Como esperado, a busca por um cônjuge não dá muito certo. O homem crê que o primeiro passo para conseguir ter um casamento concreto é a escolha do seu padrinho – que se torna Guillermo – e apenas depois desse assunto ter sido checado na sua listinha de afazeres é que a pessoa com quem ele se casaria seria escolhida. Das 37 esposas, fossem elas homens ou mulheres que o vampiro centenário havia tido durante sua vida, ele não se lembrava de quem amava.
Então, uma de suas primeiras ideias é fazer com que suas esposas passem por testes para ver qual seria a melhor dentre elas – e, quando falham, ele pede para o Djinn que elas voltem a morrer. A única esposa que sobrou, que seria a pessoa perfeita para Nandor, foi Marwa. Vários outros pedidos feitos pelo sanguinário ex-saqueador eram assuntos fúteis: o maior pênis do mundo, mudar cada centímetro dela para que o agradasse e para que a moça tivesse os mesmos interesses e gostos que ele. Durante o decorrer da série, é impossível não sentir um amargor na boca ao ver como a personagem, dentre todas as personalidades femininas, é tratada.
Além desse caso mais aparente, ainda há toda a linha voltada para a boate de Nadja, que, assim como a história de Marwa, apresenta apenas acontecimentos ruins ou de caráter irresponsável da personagem. A vampira é retratada como uma mulher alcoólatra que desistia de maneira muito fácil de seus objetivos – diferentes das figuras masculinas da série. Não são poucas as vezes em que vemos ela errando ou destruindo tudo ao seu redor.
Nadja chega a abandonar o Conselho Vampírico Mundial ao recusar sua ideia de uma boate vampírica, o que faz com que ela sinta o interesse de voltar a Staten Island e montar seu próprio negócio. O problema referente a como a história dela é contada começa quando os episódios, que deveriam explorar sua maneira de lidar financeiramente e estruturalmente com o seu novo negócio, começam a ter menos espaço na trama do que os plots adjacentes. Enquanto Nadja tentava construir e achar financiamento para que a boate fosse construída, Nandor arranjava uma esposa e Laszlo cuidava de uma criança – a maneira como a narrativa seguia não era bem definida e deixavam a mulher com a menor participação dentro deles.
Então, temos as cenas dela caindo no meio das apresentações, brigando com Laszlo e perdendo as performances de Colin Robinson para a boate, comercializando demais os convidados ressuscitados momentaneamente. Tudo que ela faz parece ter um contraponto que diminui todo seu esforço. Até seu último ato é considerado falho – enquanto vemos que Laszlo, nesse caso, Jack Daytona realizou a mesma ação de forma bem sucedida com uma temporada de diferença.
Também vemos a volta de alguns personagens já recorrentes nas temporadas anteriores, como Guide (Kristen Schaal), que retorna para tentar guiar os vampiros para um rumo mais ‘sério’. Ela apresenta uma maior participação no desenvolvimento da história, mostrando que durante sua pós-vida ela havia se envolvido com o próprio Van Helsing.
Toda a apresentação desse segredo se torna interessante ao apresentar que ela, ao se aproximar e ter relações românticas e sexuais com o caçador de vampiros, acabou por ter toda sua mente apagada. Isso abriu espaço para que muitas teorizações sobre um possível envolvimento de Nandor e Guillermo surgissem. Diferente do que algumas críticas trazem, toda a tensão construída com Guide dando em cima do familiar por ser um descendente do famoso caçador de vampiros é desconfortável – principalmente quando, com o andar dos episódios, descobrimos que o sentimento não é recíproco.
Com as concepções de amor e trabalho já tiradas de jogo, sobrou o conceito de família – que é explorado, principalmente, com as interações de Guillermo, Laszlo e Colin Robinson. A questão familiar apresentada na quarta temporada de What We Do in the Shadows gira em torno do crescimento e desenvolvimento rápido do vampiro de energia que veio a falecer previamente.
O Bebê Colin Robinson, ou Garoto, foi o produto que saiu do peito do vampiro de mesmo nome – é importante ressaltar que a diferenciação de nomes acompanha o personagem por um bom tempo durante a temporada, sendo usado para separar a persona em desenvolvimento do antigo homem que, até então, estava morto. No entanto, é perceptível que há uma alta comparação entre ambos, já que deveriam – até certo ponto – serem um só.
Todo o crescimento dele é voltado para interesses que são tediosos para as pessoas ao seu redor, como Roblox, curiosidades aleatórias ou pior: musicais. Esses assuntos são as formas principais da criança vampírica mostrar que ainda existe dentro dele um vampiro de energia – mesmo que Laszlo tenha dado a si mesmo a missão de transformar essa versão de Colin Robinson em uma pessoa interessante.
Esse relacionamento criado pelo grupo é um dos pontos altos da quarta temporada, construído de forma pertinente e bem desenvolvida até o último episódio da trama – em que tudo tem seu desfecho e respostas são dadas aos conflitos abertos. É com essa finale que também atingimos o ponto principal da série: a sensação de que tudo sempre volta a ser como era antes. Após ver Colin crescer e se transformar novamente no vampiro de energia tediante de antes, Nandor encontrar e perder o amor por seu próprio egoísmo, Nadja voltar a ser uma pessoa sem poder algum em suas mãos, voltamos ao ponto inicial das outras temporadas de What We Do in the Shadows – nada muda.
A quarta temporada do seriado sofreu vários vazamentos de episódios, o que fez com que a experiência de acompanhar o lançamento fosse algo inacreditável – ninguém nunca teria certeza se os capítulos seriam assistidos em sites duvidosos por links compartilhados por perfis do X (antigo Twitter) ou pelas transmissões da Hulu. Mas isso não impediu que a série fosse indicada para prêmios, como o Emmy.
Atualmente, a série está presente em quatro indicações diferentes: Melhor Design de Produção Para Um Programa Narrativo (Meia Hora), com o episódio The Night Market; Melhor Edição de Imagem Para Uma Série de Comédia com Uma Câmera, para o episódio Go Flip Yourself; Melhor Edição de Som Para Uma Série de Comédia ou Drama, com o episódio The Night Market; e, por fim, Melhor Figurino de Fantasia/Sci-Fi, com o episódio The Wedding – categoria a qual ganhou o Emmy de 2022.
Os figurinos apresentados neste ano foram ainda mais diversos e criativos do que nas temporadas anteriores e são, com certeza, um dos maiores pontos positivos. Desta forma, é um forte candidato para essa categoria, na qual concorrem outras obras como Abracadabra 2, A Casa do Dragão, Obi-Wan Kenobi, Senhor dos Anéis: Anéis do poder e O Mandaloriano.
Por mais que a temporada não tenha sido tão presente e forte como a primeira e segunda, ainda conseguiu trazer parte da essência caótica que é a existência de seres – quase – imortais. Além disso, o novo ano apresentou algo que Nandor já lidava há um tempo: a noção de que a imortalidade não é uma dádiva, mas sim parte da maldição de ser vampiro.
Ainda, essa leva de episódios conseguiu fechar com uma possível mudança de ares – que levara há uma temporada de muitas insinuações de virgindade, culpa religiosa e noções de traição e relacionamentos. E é claro que todo esse desenvolvimento de personagens não seria esquecido na sequência da série, principalmente pontos importantes como: os dois desejos restantes de Nandor, Não é? … Não é?