Vitória Lopes Gomez
Menos de duas semanas antes do fim da segunda temporada de The Mandalorian, a Disney+ anunciou 10 novas séries originais do universo Star Wars. O furor com as novas produções, com os nomes inéditos e antigos sendo divulgados, teasers e teorias agitaram as redes sociais por dias, o que poderia distrair a excitação para a finale da pioneira dos live-action. Felizmente, a série prova, mais uma vez, que é grandiosa e se consolida como uma das melhores produções da franquia bilionária criada por George Lucas.
Na temporada de estreia, Mando (Pedro Pascal), um solitário caçador de recompensas, se afeiçoa pela Criança, uma criaturinha da mesma espécie do Mestre Yoda, e desiste de sua missão para resgatá-la das forças imperiais que a capturaram. Após passar por poucas e boas para protegê-la e, no processo, criar uma relação de pai e filho, o mandaloriano é oficialmente encarregado de encontrar outros da espécie e que possam acolhê-lo. No segundo ano da série, continuamos viajando a galáxia a bordo da Razor Crest, acompanhando Din Djarin (o nome real do Mando) e o Bebê Yoda em busca de alguém apto para treinar o pequeno, que precisa aprender a controlar seus poderes.
Com uma primeira temporada aclamada, inclusive indicada ao prêmio de Melhor Série Dramática no Emmys 2020, o desafio para a continuação é, não só manter a alta qualidade, mas superá-la Na nova leva de episódios, mantendo a proposta de explorar personagens e cantos marginalizados do universo Star Wars, o showrunner e roteirista Jon Favreau dá sequência ao arco principal e ao uso do estilo road movie, para abrir caminhos e introduzir novos rostos e arcos secundários, que aprofundam os personagens e a narrativa de The Mandalorian.
O estilo adotado confere dinamismo à série e cai bem com o faroeste espacial. Logo no primeiro episódio, O Xerife, por exemplo, Din Djarin viaja a Tatooine em busca de outros de seu clã. Lá, ele se depara com o xerife Cobb Vanth (Timothy Olyphant), que veste uma armadura mandaloriana para proteger a população, o que é proibido pela doutrina e causa tensão entre ele e Mando. A luta, porém, é interrompida pelo dragão que assola o local e, após negociarem, os dois se unem e unem tribos inimigas para derrotarem o monstro, reinstaurando a paz. Em troca, o viajante e a Criança, que tenta ajudar com seus poderes (mas ainda não sabe controlá-los), deixam o planeta com a armadura, sem terem encontrado a ajuda que precisavam.
Vivendo ‘na estrada’ e trocando favores por informações, Mando faz inimigos e aliados no caminho. Em uma de suas paradas, ele recebe ajuda de outros mandalorianos, liderados por Bo-Katan (Katee Sackhoff), para salvar o Bebê de uma ameaça local, mas também entra em conflito com o reforço: diferentemente dele, os personagens tiram o capacete da armadura, contrariando tudo que aprendemos sobre os guerreiros até então. O encontro, além de indicar um novo rumo para a jornada, mostra mais das diferentes vertentes da doutrina, que não foram exploradas na primeira temporada, e revela crenças e posicionamentos de Mando. Assim, conhecemos cada vez mais do protagonista, que agora até fala mais, e do que o move, além da sua devoção à missão e à Criança.
Com a ausência dos grandes embates maniqueístas típicos da space opera dos filmes, The Mandalorian se encontra no momento pós guerra, cenário que a primeira temporada conseguiu explorar tão bem. Sem espaço para coincidências em uma galáxia tão grande, seja pela afeição de Favreau ao universo Star Wars, seja pela linha do tempo em que se passa, a série passa cada vez mais a trazer elementos já conhecidos da franquia. A armadura de Boba Fett e o xerife Cobb Vanth no primeiro episódio, e a aparição de Bo-Katan são só um pouco do que o restante da temporada reintroduz.
Depois de ter reencontrado Cara Dune (Gina Carano) e Greef Karga (Carl Weathers) e o trio descobrir os planos de Moff Gideon (Giancarlo Esposito) para a Criança, em, O Cerco, episódio que revigorou a dinâmica entre os veteranos, a urgência da missão de Mando aumenta. E é pela sugestão da mandaloriana líder das Corujas Noturnas que Djarin ruma a Corvus para procurar a Jedi Ahsoka Tano (Rosario Dawson). Por lá, ele a ajuda a destituir uma magistrada tirana que domina a cidade e como espólio, leva uma lança de puro Beskar, um raro e poderoso metal.
Mesmo com mais uma aparição familiar , menções ao passado da Jedi e lutas com sabre de luz, o ponto alto do episódio é o Bebê Yoda. Ahsoka, que consegue se comunicar com o pequeno, conta a Mando sobre o passado de Grogu, o verdadeiro nome da Criança. Após ser treinado por muitos mestres, a criaturinha foi salva antes do massacre dos Jedi pelas mãos de Anakin Skywalker, e, por isso, não aprendeu a dominar os seus poderes corretamente. Ela, porém, se recusa a ensiná-lo, por temer que a ligação de Grogu com Mando possa interferir no treinamento e levá-lo por um caminho sombrio.
Depois de mais de uma temporada nos apaixonando pelo Bebê Yoda, Favreau e Filoni finalmente revelam mais sobre ele, que virou uma verdadeira sensação na internet e tornou o momento ainda mais esperado. Agora, Mando tem de ir a Thyton para Grogu se reconectar com a força e achar um Jedi para treiná-lo. Mesmo que a temporada inteira tenha girado em torno desse objetivo, quando a conclusão da missão e a despedida se aproximam, cada momento dos dois juntos se torna ainda mais especial, ainda que doa no coração.
Como nada é tão simples e a série requer um vilão a altura, Moff Gideon estava se preparando para recuperar seu objeto de estudo. Em A Tragédia, um episódio frenético que encaminha um ritmo ainda mais acelerado para o restante da temporada, temos o retorno de Fennec Shand (Ming Na-Wen) e de Boba Fett (Temuera Morrison), que lutam com Mando. Fett foi uma das aparições mais comemoradas pelos fãs. O brilho que a volta do caçador de recompensas rouba do protagonista só é deixado de lado quando tropas imperiais de Gideon chegam para capturar Grogu. Fett e sua parceira, em troca da armadura que estava em posse do mandaloriano, ajudam-no a proteger a Criança, que, mesmo assim, é levada.
Din Djarin, que não era de muitos amigos e preferia agir sozinho, agora tem de recorrer a seus aliados para salvar o pequeno. A profundidade que o personagem ganha se torna clara e, por ser desenvolvida aos poucos e discretamente, mostra como Mando evoluiu em seu tempo com a Criança, a ponto de questionar suas próprias crenças e tomar atitudes extremas para salvá-lo. No penúltimo episódio da temporada, O Que Acredita, escrito e dirigido por Rick Famuyiwa, o mandaloriano aceita a ajuda de inimigos e inclusive tira o capacete, o que escancara ainda mais a urgência da situação.
Em um confronto final em que tudo está em jogo, a conclusão da temporada é de tirar o fôlego, grandiosa como a série pede. Na missão de resgate a bordo da nave imperial, Mando, finalmente, fica cara a cara com Moff Gideon e tem de recuperar Grogu e o Sabre Sombrio, que havia prometido a Bo-Katan em troca de sua ajuda. Claramente desesperado, ele aceita levar só o pequeno, mas o vilão parte para a luta, rendendo um dos combates mais tensos e memoráveis de The Mandalorian. O mandaloriano, que saiu vencedor, resolve poupar a vida de Gideon, mas o que restou das forças imperiais encurrala o protagonista e seus aliados e aparentemente, não há escapatória.
Quando tudo parece dar errado, uma nova esperança surge. Usando de um fanservice mais do que justificado, R2D2 e Luke Skywalker, com seu potencial de Jedi atingido, chegam para o resgate do grupo e de Grogu, que finalmente acha alguém para treiná-lo. Com a missão cumprida, Mando e a Criança se despedem em (mais) um momento de partir o coração, finalizando excepcionalmente o arco principal da série. Porém, enquanto os próximos passos de Grogu estão garantidos e os de Djarin e The Mandalorian parecem incertos, revela-se que o Sabre, que Bo-Katan deseja empunhar para reivindicar Mandalore, está em posse de Mando, que o conquistou em batalha e, portanto, tem direito ao trono do planeta.
Não só o CGI do rosto de Mark Hamill, que reviveu seu personagem mais marcante, mas os efeitos visuais continuam um show por si só. Desde as paisagens e diferentes habitantes da galáxia, às lutas e cenas de ação, embaladas pela trilha sonora fenomenal do veterano Ludwig Goransson, que agora usa menos toques eletrônicos e mais orquestras, a parte técnica de The Mandalorian mostra porquê levou tantos prêmios no Creative Emmys 2020. A direção, que segue na proposta de diversificar nomes, entrega tons diferentes que condizem com as mudanças de atmosfera e ritmo dos episódios e tornam cada capítulo ainda mais único e indispensável.
Após um segundo ano que aprofundou personagens e a relação entre eles e conectou a série com o universo da franquia, a terceira temporada tem muitos possíveis caminhos pelo qual seguir, podendo explorar ainda mais da doutrina mandaloriana e dos conflitos por poder em Mandalore, além de introduzir personagens novos. A torcida é para que a série mantenha a sua autenticidade e atenha-se a proposta de inovar e dar espaço aos habitantes da galáxia não explorados no cinema, sem recorrer às aparições por fanservice ou se perder ao servir como outdoor para introduzir e promover spin-offs. Afinal, não falta território a ser explorado em The Mandalorian, que já cansou de provar que é uma das melhores produções Star Wars.