Em Sincerely, Kali Uchis expõe suas vulnerabilidades com lirismo denso, mas não foge da estética habitual

Na capa do álbum, Kali Uchis, mulher latina de 30 anos, aparece deitada sobre uma superfície rosa e brilhante que se assemelha a uma flor. Ela usa uma lingerie de cetim e sapatos que lembram sapatilhas de bailarina. Está com o cabelo solto. Ao fundo, uma tela exibe uma versão ampliada de sua expressão facial no momento da foto, como um reflexo projetado.
“Sincerely”, álbum lançado dia 9 de maio de 2025 (Foto: Capitol Records)

Talita Mutti

Uma garota que, aos 17 anos, foi expulsa de casa pode não ter muitas perspectivas de um futuro de sucesso. Afinal, viver sem a família, dormindo no banco de trás de um carro, não parece uma situação propícia para formar um gênio da música. No entanto, para quem sonha e entende seu propósito no mundo, isso pode ser apenas mais um obstáculo da vida. Se Kali Uchis, aos 23 anos, disse em Isolation, álbum lançado em 2018, que precisamos ser nossos próprios heróis e esperar o sol nascer depois da tempestade, hoje, aos 30, com uma carreira consolidada e sua própria família formada, ela prova que as flores cresceram em Sincerely, lançado em 9 de maio de 2025. Continue lendo “Em Sincerely, Kali Uchis expõe suas vulnerabilidades com lirismo denso, mas não foge da estética habitual”

Rua do Medo: Rainha do Baile faz pastiche de clássicos, mas sem replicar os motivos da honraria

Cena do filme Rua do Medo: Rainha do Baile Na imagem, o assassino do filme encara alguém para matar. Ele segura um machado com cabo de madeira, que está sujo de sangue na lâmina. O personagem usa uma capa de chuva vermelha e uma máscara dourada semelhante à do teatro grego.
Nova história acontece após os eventos do segundo filme da franquia (Foto: Netflix)

Davi Marcelgo 

O avassalador sucesso da trilogia Rua do Medo, em 2021, resultou na aposta de um quarto filme para a franquia: Rua do Medo: Rainha do Baile, dirigido por Matt Palmer. Inspirado em uma série de livros infantojuvenis de mesmo nome, a história em três partes concebida por Leigh Janiak era assumidamente uma homenagem ao slasher e ao folk à la A24. Ainda que as três obras tenham caído no gosto do público, nunca foram exemplares de uma boa reprodução dos códigos dos subgêneros que se inspira e esse lançamento da Netflix segue pelo mesmo caminho.  Continue lendo “Rua do Medo: Rainha do Baile faz pastiche de clássicos, mas sem replicar os motivos da honraria”

Para santificar Ethan Hunt, Missão: Impossível – O Acerto Final renega a singularidade da franquia

Aviso: O texto contém alguns spoilers

Cena do filme Missão: Impossível - O Acerto FinalNa imagem, Ethan Hunt está debaixo d’água em posição fetal enquanto é carregado pelas águas. A superfície está congelada e o personagem está quase encostado no gelo. A imagem é fotografada com o ângulo invertido: a superfície do mar está no canto esquerdo, como uma parede. Ethan Hunt ao centro, enquanto o lado direito é a água em tons escuros. Ele é um homem na faixa dos 60 anos, de pele clara e cabelos escuros. Está sem roupa e apenas usa uma sunga.
Oitavo filme da franquia foi exibido no Festival de Cannes 2025 (Foto: Paramount Pictures)

Davi Marcelgo

Depois de Christopher McQuarrie conceber o melhor filme da franquia, o cineasta trava a impossível missão do novo superar o antecessor. Tarefa que o faz aderir à rebeldia: não por incapacidade, mas por opção. Missão: Impossível – O Acerto Final conclui o embate entre Ethan Hunt (Tom Cruise) e a Entidade, renunciando as convenções da saga e investindo na crença que o público possui no Cinema. Na trama, o agente e sua equipe precisam reunir as forças remanescentes para impedir que a Entidade destrua o mundo ou obrigue as principais nações nucleares a fazê-lo.  Continue lendo “Para santificar Ethan Hunt, Missão: Impossível – O Acerto Final renega a singularidade da franquia”

JPEGMAFIA e Flume mergulham na experimentação musical e flertam com o delírio em We Live In A Society

Aperto de mão entre duas pessoas, uma de pele preta e outra de pele branca, com fundo branco.
“We Live In A Society”, lançado dia 2 de maio (Foto: Flume)

Talita Mutti

O processo de construção de um projeto musical pode levar tempo e exigir muito estudo, principalmente quando se trata de um álbum que precisa carregar um conceito e coerência entre as faixas. Em um EP (Extended Play), há apenas a junção de algumas músicas que não necessariamente seguem um sentido conceitual, mas que apresentam um novo estilo ou funcionam como um teste fora do habitual do artista. JPEGMAFIA e Flume parecem ter brincado um pouco com essa definição em ”We Live In A Society”, lançado em maio de 2025. Os dois já haviam colaborado anteriormente em “How To Build A Relationship, para uma das faixas da mixtape Hi This Is Flume. Mas, desta vez, encontramos uma curta sessão musical entre dois artistas que pode ser proveitosa, peculiar e altamente experimental.

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Thunderbolts* busca a morte do cinema de herói, mas a Marvel não aceita

Aviso: O texto contém alguns spoilers

O cenário é um elevador, com cinco personagens enquadrados. À esquerda está o Guardião Vermelho, ele está usando o uniforme e o capacete vermelho. Logo atrás dele está Fantasma usando roupas pretas, e com o rosto descoberto. Seu cabelo está caindo na altura dos ombros. Ao seu lado direito está o Soldado Invernal com um rosto sério, cabelo repartido e usando roupas pretas. Ao seu lado está o Agente Americano, ele está com seu uniforme azul, com partes em branco e vermelho em referência à bandeira dos Estados Unidos. Ele usa uma máscara, também azul. A sua frente, do lado direito da tela está Yelena, com seu cabelo loiro repartido e seu uniforme acinzentado.
Os Thunderbolts são os novos Vingadores (Foto: Marvel)

Guilherme Moraes

Próximo ao novo filme dos Vingadores, o grupo de anti-heróis, liderados por Yelena (Florence Pugh), chega para suprir a ausência de figuras marcantes do UCM (Universo Cinematográfico Marvel), como a Viúva Negra, o Homem de Ferro, o Capitão América, entre outros. Contudo, surpreendentemente, o longa não se conforma em ser apenas uma peça que alimenta a cultura do hype, ele, ao menos, busca ser uma obra audiovisual, com ideias e que pensa em sua forma. Nesse sentido, Thunderbolts* intriga ao propor a morte do cinema de heróis, porém, é boicotado pela própria Marvel.

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No tapete azul, a elegância encontra o luxo nas silhuetas, acessórios e cores neutras do dandismo

A colagem retrata oito pessoas negras posando com elegância em um tapete azul decorado com pequenos motivos dourados, em um evento de gala repleto de glamour, como o Met Gala. Ao fundo, uma parede azul com estrelas douradas e uma multidão de fotógrafos registra o momento. Cada pessoa exibe um visual sofisticado, que une referências históricas, afrofuturismo e o dandismo negro. À esquerda, a primeira pessoa chama atenção com um chapéu preto de aba larga, óculos escuros, casaco longo preto estruturado e aberto, revelando um conjunto prateado brilhante composto por um top decotado e calça de cintura baixa. Com porte firme, segura um charuto com atitude. Ao seu lado, a segunda pessoa ostenta um volumoso cabelo afro e veste uma camisa clara estampada com logotipos, combinada com gravata vinho e shorts xadrez bege. O look é completado com sapatos robustos bordô e meias altas, remetendo a um estilo escolar de luxo com irreverência.A terceira pessoa surge com um vestido branco justo adornado por longas franjas de contas vermelhas que caem pela frente. Usa um casaco de couro preto curto, luvas pretas e o cabelo está penteado em um coque baixo elegante. A quarta pessoa traz imponência com um terno escultural de ombros exagerados, com listras pretas e vermelhas, camisa branca e gravata listrada. Usa um chapéu redondo e um monoculo decorativo, evocando a estética vitoriana com toques afrofuturistas. A quinta pessoa esbanja leveza em um conjunto off-white com corset e saia ampla fluida, com mangas longas e translúcidas. Os cabelos soltos em ondas naturais e o colar de pérolas complementam o ar etéreo e refinado. Ao lado, a sexta pessoa se destaca com um conjunto de couro marsala com textura que lembra pele de réptil. A peça une um casaco longo de cauda dramática e calça ajustada. Um chapéu estruturado com aba alta e curva finaliza o visual com teatralidade e elegância.Na sequência, a sétima pessoa ostenta uma túnica branca bordada com pedras e uma capa azul royal fluida, combinando elementos de realeza e religiosidade. A barba aparada e o cabelo curto complementam o visual imponente. Por fim, a oitava pessoa exibe um terno branco com detalhes dourados e franjas pendentes na lateral da calça. Usa uma boina branca e um broche reluzente, mantendo uma postura confiante e sofisticada.
Neste ano, o código de vestimenta foi “Sob medida para você” (Arte: Sinara Martins)

Sinara Martins 

Durante a noite da primeira segunda-feira de Maio, o Museu de Arte Moderna (MOMA), em Nova Iorque, deu espaço a cerimônia do Met Gala, um dos eventos mais aclamados do universo fashion. Para este ano, o dandismo negro se destaca como uma construção estética e política. 

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A noite é negra e dos Pecadores

Cena do filme Pecadores. Na imagem, os personagens Fumaça (à esquerda) e Fuligem (à direita) estão de costas enquanto observam o pôr do sol no horizonte. O céu está escuro, com muitas nuvens e o sol ao fundo, laranja, perdendo sua luz. Os dois personagens são irmãos gêmeos e interpretados pelo ator Michael B. Jordan. Fumaça veste um terno e usa uma boina. Fuligem também veste terno, mas usa um chapéu de abas retas. Não é possível identificar as cores das roupas, pois não há luz nos personagens.
Pecadores é o quinto filme de Ryan Coogler com Michael B. Jordan no elenco (Foto: Warner Bros.)

Davi Marcelgo

Há mais de um século, no coração da Europa, F. W. Murnau dirigia o clímax de Nosferatu (1922), ocasião em que o vampiro, tomado pelo desejo, esquece o perigo de existir sob a luz do sol, falecendo ao amanhecer. O terror expressionista tem um quê de LGBT+, pois as vivências da comunidade, quanto mais em 1922, eram consumadas à noite – essa interpretação existe sobretudo porque o diretor tinha relações homoafetivas. E que pavor seria ao dia descobrirem o Drácula dentro de você. 

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Em Kansas Anymore (The Longest Goodbye), Role Model dá a devida despedida ao amor do passado

Capa do álbum Kansas Anymore (The Longest Goodbye) do Role Model. A imagem em preto e branco mostra um Tucker vestindo um casaco de couro e um chapéu de cowboy, de perfil, com o olhar voltado para baixo. O nome do artista e o título do álbum estão escritos em branco e amarelo.
O deluxe já acumula mais de 12 milhões de streamings nas plataformas digitais (Foto: Interscope Records)

Isabela Nascimento

Em Fevereiro deste ano, Tucker Pillsbury lançou o deluxe do seu disco mais recente, Kansas Anymore (The Longest Goodbye). A sua nova versão traz quatro músicas inéditas, colocando o ponto final na sua última história de amor.  A versão original foi lançada em Julho de 2024, como seu segundo álbum de estúdio, Kansas Anymore. Nessa produção, o cantor traz uma nova versão de si mesmo, abandonando sua persona rapper apresentada no seu primeiro disco, Rx (2022). Nesse novo projeto, o americano se apresenta como um artista de pop rock, com influências do country atual. Essa troca de estilo fez público conhecer o outro lado de Pillsbury e ajudou a chamar uma fanbase mais engajada.

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2.ª temporada de Ruptura atualiza o conto de Orfeu e Eurídice enquanto lida com a crise existencialista

Em primeiro plano está Mark, coberto de sangue em seu rosto e sua gola. Ao fundo, desfocada, está Hellen. Ambos estão em um corredor iluminado de vermelho. Mark esta de costas para Helen, que olha em direção a Mark.
A série revigora o conto de Orfeu e Eurídice (Foto: Apple TV+)

Guilherme Moraes

Depois do grande sucesso da temporada de estreia, a expectativa para a sequência de Ruptura era enorme. No entanto, apesar da ansiedade dos fãs, Severance (no original) retornou três anos depois, um tempo considerável levando em conta a velocidade com que se produz séries atualmente para agradar a demanda do público. Contudo, se o preço para uma produção de qualidade é o tempo, então que se espere mais alguns anos para a continuação, pois a 2.ª temporada mantém o nível, ao colocar Mark S. (Adam Scott) e outros internos em crise existencialista, sem perder de vista as críticas ao sistema capitalista e as jornadas de trabalho.

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Antônio Bandeira – O Poeta das Cores não faz jus ao artista

Cena do filme Antônio Bandeira - O Poeta das CoresNa imagem, o pintor Antônio Bandeiras está pintando um quadro abstrato com o fundo azul claro e linhas pretas da obra. Ele é um homem negro, na faixa dos 40 anos, de cabelos curtos e grisalhos. Usa um cavanhaque e bigode que está brancos. Nas mãos ele segura um pote e um pincel da cor vermelha. Está vestindo uma blusa de manga comprida, que está arregaçada nos cotovelos, da cor vermelha e uma calça marrom. O cenário é um quarto, do lado esquerdo há uma porta com quadros em branco dentro e outros desenhos que estão pendurados em uma parede. No canto direito, há uma mesa com potes e pinceis.
O pintor viveu anos na Europa e retornou para o Brasil no final dos anos 1950 (Foto: Sereia Filmes)

Davi Marcelgo

A execução de um filme é guiada, por muitas vezes, pela noção de unidade entre forma e conteúdo, ou seja, de que maneira o diretor e demais artistas transpõem história ou roteiro através da linguagem do Cinema. O documentário Antônio Bandeira – O Poeta das Cores é um exemplo de insucesso quando pensamos nessa ideia. Dirigido por Joe Pimentel e apoiado pelo sobrinho do biografado, o longa não consegue transmitir por suas imagens a grandiosidade de Bandeira – e às vezes nem pelo conteúdo. 

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