Nathália Mendes
Paulo Freire nos contou que para educar é necessário coragem, e ele de certo se orgulharia do desafio que Sr. Bachmann e Seus Alunos enfrentam no sistema educacional alemão. Amor e humanidade são as únicas linhas guias no documentário de Maria Speth, que acompanha uma classe de alunos por meio ano letivo, sem entrevistas ou roteiros pré-estabelecidos. E é com uma neutra observação que o longa de quase 4 horas chega à 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, para nos lembrar de que a educação não muda o mundo, a educação muda pessoas e pessoas mudam o mundo.
Ao longo da obra, podemos conhecer o professor de 65 anos, Dieter Bachmann, e seus alunos extremamente únicos, todos unidos em uma sala de aula multicultural. Do lado de Bachmann há um trabalho extraordinário de desenvolver seres humanos por diversas disciplinas, pois ele entende que o aprendizado vem da Música, das artes, de contas de matemática em grupo ou de pausas para cochilo. Mas, acima de tudo, o professor enxerga a particularidade a mais que seus alunos ali de Stadtallendorf possuem: se não são imigrantes, seus pais um dia foram.
Cada uma das famílias dos alunos do Sr. Bachmann passa dificuldades diferentes, no entanto, esse não é o foco principal. É de suma importância para o documentário mostrar que há muito esforço naquelas crianças para desenvolverem sua educação no meio da vida escolar, com uma língua completamente diferente e dentro de um sistema educacional muito segregador. Por isso, o professor lindamente adota a posição de mostrar que os enxerga e estima, até fazer florescer um amor próprio dentro de cada um, e, por consequência, entre eles mesmos.
O enredo de Sr. Bachmann e Seus Alunos (Herr Bachmann Und Seine Klasse, no original) recorda a série catalã Merlí, cujo protagonista é um professor de filosofia que se envolve no crescimento de seus jovens alunos. Assim como no seriado, o longa alemão realça a falha do sistema educacional que desconsidera a humanidade dos estudantes, exemplificado pela fala especial de Bachmann “Essas notas não refletem quem vocês são. Elas são apenas uma imagem instantânea, de coisas sem importância, como matemática e inglês.” De fato, a Arte imita a vida – e ainda bem que professores tão poderosos existem para transformar as nossas.
A câmera de Maria Speth é como uma coruja muito bem camuflada em uma sala de adolescentes muito diferentes. O formato escolhido por ela parte de deixar a rotina do aprendizado fluírem para guiarem a obra. Assim, a combinação desses dois aspectos compuseram uma obra extremamente natural em que os alunos e seu professor se esqueceram de que estão sendo filmados. No entanto, o resultado é um documentário negativamente extenso e cansativo já nos primeiros 60 minutos, e isso arruinou seu sucesso.
Salva pelo sinal do recreio, a história real e genuína garantiu à diretora o Urso de Prata – Prêmio do Júri do Festival de Berlim 2021. O multiculturalismo é o esplendor de Sr. Bachmann e Seus Alunos, além da concordância com uma educação revolucionária e digna de Paulo Freire. Nem toda a minutagem do mundo seria suficiente para mostrar a profundidade dessas crianças, ou de um professor tão bom quanto Dieter Bachmann.