Vitória Lopes Gomez
Antes mesmo da internet implicar com os ‘cringes’, Pen15 já abusava da vergonha alheia. Na série escrita e estrelada pelas atrizes Maya Erskine e Anna Konkle, as duas mulheres voltam à pior fase da vida, a pré-adolescência, para reviverem todos os terrores, estranhezas e também os prazeres de se ter 13 anos. Só tem um pequeno detalhe: as intérpretes das adolescentes, na verdade, já estão na casa dos 30.
A primeira parte da segunda temporada, que foi contemplada com três indicações ao Emmy 2021, vai além das situações comicamente absurdas da primeira e se dedica aos dilemas e às nuances das protagonistas. As melhores amigas Anna Kone (Konkle) e Maya Ishii-Peters (Erskine) continuam lidando com a dureza de estar – e conviver com quem também está – no Ensino Fundamental, mas, quando a excentricidade proposital deixa de ser o foco, Pen15 aprofunda sua comédia ‘cringe’ com uma sensibilidade descontraída.
No novo ano da série, Maya e Anna já começam unidas. Como qualquer pré-adolescente ansioso para estar perto de seus crushes, as duas logo se metem nas usuais situações inusitadas, como quando entram para o time de luta livre só para se aproximarem dos meninos. E é mais do que justo que os namoricos continuem sendo tema recorrente também na continuação, afinal, a agitação toda é típica dos 13 anos e as intérpretes relembram a timidez e a falta de jeito quando se trata dos romances juvenis.
Mas não só de paixonites se faz a adolescência e Pen15 evoca toda a nostalgia dos anos 2000 para lembrar de outras experiências e peculiaridades da fase. Mais ou menos corriqueiramente, primeiro beijo, puberdade, menstruação, sexualidade, orientação sexual, depilação e até as crueldades adolescentes dão as caras na temporada, sempre do jeito divertido e descontraído – e cringe – que faz a produção. O linguajar inconveniente (principalmente dos meninos), por mais exagerado que possa soar, é mais uma das formas de recriar as atitudes e modos dos jovens.
Entre momentos de risadas e outros nem tanto, a série lembra de como o Ensino Fundamental também é sufocante. Os boatos e as fofocas distorcidas mostram que aquilo que acontece nos corredores da escola pode machucar, e não só Maya e Anna, mas outros personagens também. Por exemplo, quando uma competição escolar vira pretexto para caçoar dos alunos e os meninos tiram sarro de “quem é o mais gay da classe”, as piadas de mau gosto aumentam a insegurança de Gabe (Dylan Gage), que está descobrindo a própria orientação sexual.
Recriar fielmente os anos da pré-adolescência inclui recriar os traumas da época, como fazem os criadores de Pen15, Erksine e Konkle junto do diretor Sam Zviblemanj. Os jovens podem ser maldosos, isso ficou claro, mas é um dos pontos centrais e recorrente em toda a produção que mais retoma a essência da idade: a vontade e a necessidade de pertencer e ser validado. Nas muitas furadas em que Maya e Anna se metem, a procura pela aceitação e pelo pertencimento que as colocou ali são o que a série tem de mais comum e identificável.
No segundo ano, apesar de Pen15 dar uma atenção maior a alguns de seus personagens secundários, os holofotes ainda são de Anna e Maya. A amizade das duas é o combustível da série a todo momento e, ao aprofundá-las individualmente, a segunda temporada as traz mais para perto uma da outra. O divórcio dos pais de Anna e as questões de Maya com o pai ausente são tratados com sensibilidade e a cumplicidade entre elas só aumenta o carinho pelas meninas.
Além de serem o foco da narrativa, as protagonistas também são a principal peça do humor da série, mas a performance exagerada de Konkle e Erskine se suavizou. Se a primeira temporada extraia sua comédia das situações absurdas e das intérpretes mais velhas em meio às crianças, agora as duas já estão mais confortáveis ao retornarem aos seus eus mais novos. Claro, as atrizes de 30 anos incorporando adolescentes de 13 que agem como mais velhas ainda rendem risadas, só que com menos olhos revirados logo depois.
Ainda assim, as estrelas não foram lembradas por suas performances no Emmy 2021. Maya Erskine, porém, ainda pode subir ao palco do evento na categoria Melhor Roteiro em Comédia, na qual o episódio Play, escrito por ela, foi indicado. E Pen15 não tem só essa chance de brilhar: a segunda temporada garantiu nada mais, nada menos do que a nomeação como Melhor Série de Comédia, uma das disputas principais da maior premiação da TV.
Se a segunda temporada superou a anterior e pode render à série sua primeira vitória no Emmy, a questão foi chegar até aqui. Pen15 sabe ser descontraída e leve, mas o humor ácido e ‘cringe’ definitivamente não é para todo mundo. Felizmente, chegamos: a continuação melhorou e, com mais sete episódios à caminho, é de se torcer e esperar que Maya e Anna continuem peculiares e divertidas à medida que crescem.