Diretor de “Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir” conta as influências do filme vampiresco e revela sua paixão pelos Irmãos Coen (e pelo Adam Sandler)
Vitor Evangelista
Ainda no recém-nascido quadro de entrevistas do Persona, dessa vez a conversa é internacional. Jonathan Cuartas vive em Miami, se formou na faculdade de cinema em 2016 e Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir é o seu filme de estreia. Exibido na 44ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo e ovacionado por esse que vos escreve, o longa abre uma porção de debates sobre doença, vulnerabilidade e sobre o amor familiar.
O jovem cineasta bateu um papo honesto conosco e abriu o próprio coração, contando a sensibilidade de sua criação e o que ele almejava no primeiro trabalho em longa metragem. Como de praxe, ao fim do texto temos um bate-bola mais descontraído, e Jonathan até revela seu time dos sonhos para trabalhar futuramente no cinema.
Da tragédia, a arte pode florescer. A primeira coisa que Jonathan Cuartas identifica quando pensa nas inspirações para Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir acaba por ser um momento de extrema tristeza. “Veio da morte da minha avó”, ele começa. Ela faleceu quatro anos atrás, no mesmo ano que o jovem cineasta se formou na faculdade de cinema. O ponto de partida para a criação do roteiro, também assinado por ele, foi a ideia de exploração da linha tênue entre “a tensão e o amor”.
Sua avó já estava doente por algum tempo antes de partir. Jonathan conta, também, que no lado paterno da família houve essa tensão que acabou servindo como motor do filme. “Meu pai tem 5 irmãos e 4 irmãs, então tinham várias pessoas discutindo”, foi aí que ele enxergou o centro do drama que viria a se tornar um conto vampiresco de três irmãos em busca de sobrevivência.
Mas se engana quem pensa que o processo bruto de criação e lapidação de Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir foi rápido, “demorou uns 2 anos para escrever o roteiro”, é o que conta o diretor. Na verdade, o produto de uma hora e meia é a versão longa do curta-metragem que serviu de conclusão de curso de Jonathan. A versão de 22 minutos é batizada de Kuru, e compartilha o enredo e os personagens do longa. O elenco, todavia, é outro.
Sair da faculdade direto para exibições internacionais foi algo surreal para Jonathan, que ainda se sente como um estudante de cinema. Ele e seu irmão Michael Cuartas, cinematógrafo do filme, realizaram outro curta no intervalo da graduação e do lançamento de Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir. The Horse and the Stag, de 2018, não liga para o baixo orçamento na hora de agonizar seu espectador. Recheado de horrores distantes da câmera, a obra demonstra uma destreza do realizador na hora de mesclar o terror ao drama.
E esse parece ser seu lema ou, ao menos, um preceito seguido à risca. Existe uma porção de exemplos de obras recentes que souberam usar do horror como algo mais que uma simples caixa de susto ou sangue. Jonathan cita A Bruxa (2015) e Hereditário (2018) como filmes que não hesitaram em contar histórias humanas envelopadas no terror. Quando falamos de seu próprio trabalho, claramente um filme de vampiro, ele se orgulha: “eu queria explorar o vampirismo como uma doença”.
“Ao invés de Béla Lugosi e Bram Stoker, que é muito romântico, essa criatura poderosa, com luxúria às mulheres e também muito monstruosos”, é o que aponta. Thomas, o tal vampiro do filme, “está doente demais para se alimentar e depende de sua família para fazê-lo”. Contudo, Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir nunca nomeia a criatura, e para isso Jonathan faz o retorno à ideia da doença e da fragilidade, fatores primordiais na inspiração da mortalidade.
Com um título gigantesco desse, o filme fica na cabeça de quem entra em contato com ele, mesmo antes de ser assistido. Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir é uma letra emprestada da canção I Am Controlled By Your Love, de Helene Smith. A ideia do nome veio do produtor Kenny Riches. “Eu sou péssimo com títulos”, confidenciou Jonathan, “‘The Horse and the Stag’, o que isso tem a ver com a história?”, ele brinca, se referenciado ao curta que realizou em 2018. Kenny sugeriu que eles usassem uma música, uma canção de soul que foi gravada em Miami, mesma cidade onde o colombiano-americano nasceu e foi criado.
Então, enquanto liam a letra deram de cara com o trecho ‘My Heart Can’t Beat Unless You Tell It To’, e “meio que coube”, conta Cuartas. “Não só literalmente, pois tem a ver com vida e dar vida a alguém, mas também tematicamente, é sobre amor e a maneira como a codependência limita relacionamentos, especialmente laços familiares”. Fora isso, o diretor acredita que filmes de festival necessitam de títulos “bem pronunciados, para serem lembrados”. E o nome Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir fica com a gente.
Se você pudesse escolher 3 pessoas para trabalhar junto em um filme, vivas ou mortas, quem seria e por quê?
Jonathan: “Steve Buscemi, ele está no topo da lista de atores com quem eu gostaria de trabalhar. E Frances McDormand, os dois colaboraram bastante com os Irmãos Coen. Talvez escolheria um diretor, por mais que eu dirija, apenas para segui-lo, para estar em um de seus sets, Ingmar Bergman”.
Você tem um filme brasileiro favorito?
Jonathan: “Vai parecer muito clichê, mas Cidade de Deus. Na faculdade de cinema nós vimos ele como parte da grade curricular, eles nos ensinam diferentes filmes de uma série de países. Teve outro que eu assisti no Miami Film Festival, Divino Amor, é incrível pois também é um filme de gênero mas de uma maneira muito interessante”.
Se você pudesse levar 3 filmes para uma ilha e assisti-los várias vezes, quais seriam e por quê?
Jonathan: “Onde os Fracos Não Têm Vez, eu assistiria esse filme sempre. Na faculdade nós vimos e aprendemos onde posicionar a câmera, como construir atmosfera. Se bem que ele pode ser um pouco intenso para se ver numa ilha sozinho, mas eu escolheria Embriagados de Amor, para contrabalancear. É um filme muito divertido, eu amo o papel do Adam Sandler nele e a maneira com que ele explora vagamente espécies de distúrbios mentais, um tipo de personagem exilado, e também tem a relação de irmãos, ele tem 7 irmãs.
E o último, talvez um filme mais antigo, Os Olhos Sem Rosto, da França. Ele é muito bom, é um filme de terror belamente realizado, e outra das minhas influências. Eu acredito que é um filme lindo, especialmente para o período que se passa e para o período que foi feito, ele vai além de seu tempo”.
Quais são seus próximos passos depois de Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir?
Jonathan: “Agora vou escrever meu próximo roteiro. Tem sido um pouco lento mas eu tenho algumas ideias, ano que vem já espero ter um rascunho para o próximo projeto. Eu quero fazer algo no mesmo universo, então ainda terror e drama, eu quero que seja mais assustador e o título pode ser um pouco menor. Gostaria de explorar mais da cultura colombiana, talvez seja um filme em espanhol, ou uma parcela dela será, talvez se passe em Miami, também”.
Por enquanto, Meu Coração Só Irá Bater Se Você Pedir está rodando o mundo por festivais de cinema.