Nathan Sampaio
Um Lugar Silencioso, de 2018, foi um sucesso inesperado. Com sua proposta intrigante de extrair o terror do silêncio absoluto, a produção faturou mais de 340,7 milhões de dólares na bilheteria, além de dar a Emily Blunt o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante no SAG Awards de 2019. Então, havia uma grande expectativa para a sua sequência, que, infelizmente, teve seu lançamento adiado por causa da pandemia de covid-19, e estreou mais de um ano depois do planejado. Mas fica a dúvida, será que a sequência foi tão boa quanto o filme original?
Este segundo capítulo começa imediatamente após o final dos eventos do primeiro longa. A família Abbott, composta pela mãe Evelyn (Emily Blunt) e seus filhos Regan (Millicent Simmonds), Marcus (Noah Jupe) e seu bebê recém nascido, partem em uma jornada em busca de outro local seguro para morar, e tal trajetória será marcada por perigos, desafios e antigos amigos.
Um Lugar Silencioso – Parte II faz jus ao seu título, por contar uma história que segue diretamente os eventos do primeiro filme, em dois longas-metragens que se complementam, formando uma unidade. Ao fazer isso, esse projeto consegue mostrar todos os desdobramentos da história anterior, tendo assim progressão e evolução coerentes, tanto da trama quanto dos personagens.
John Krasinski, diretor e roteirista, adota um estilo de narrativa que permite a trama iniciar sem muitas apresentações ou enrolações, uma vez que essa já possui toda a situação inicial já apresentada, basta colocar os personagens dentro das novas problemáticas e desafios, conferindo assim um grande dinamismo ao enredo. Essa movimentação constante na história permite que o espectador raramente descanse, uma vez que ele está sempre imerso em novas problemáticas ou descobertas.
É bem comum que continuações, principalmente no gênero de terror, busquem repetir as situações do filme anterior em maior escala, para que assim atinjam a mesma sensação no público. Esse recurso raramente funciona e tende a enfraquecer o projeto, uma vez que não há novidades sendo mostradas. Felizmente, esse não é o caso de A Quiet Place Part II. Krasinski aborda novos perigos em uma grande variedade de cenários ainda não explorados, e cria a sensação de novidade necessária em uma sequência. Tememos pela vida dos personagens, que precisam ser mais criativos para escapar das situações com vida.
Outro elemento importante que o filme traz é a exploração do mundo: logo nas primeiras cenas é mostrado o início do apocalipse, cena realizada em um plano sequência muito bem executado e tenso, que mostra todo o caos no começo de tudo. Além disso, o longa-metragem aproveita essa cena para introduzir personagens novos que serão relevantes, portanto, essas cenas de expansão do universo são muito boas por saciar nossa curiosidade e por servirem à história.
Um dos pontos fortes de Um Lugar Silencioso (2018) foi a construção dos personagens e das suas relações entre si, e, neste segundo capítulo, isso continua sendo um grande acerto. A família Abbott se mostra impactada pelos recentes eventos, perceptível nos vários diálogos e também nas atitudes tomadas por eles.
Evelyn é, com certeza, a pessoa que mais está sofrendo com o ocorrido, e Emily Blunt se esforça para mostrar isso em cada cena e em cada conversa: com apenas um olhar conseguimos entender todos os seus pensamentos. A personagem se mostra quebrada com as recentes perdas e tensa com a jornada que a família precisa enfrentar, porém, pelos seus filhos, Evelyn tenta ir sempre em frente, sobrevivendo um dia após o outro, e isso é muito bem proposto no roteiro e na atuação.
Os filhos possuem um grande destaque nesse novo longa, tomando para si o protagonismo tanto do filme quanto da sua própria vida. Regan demonstra um amadurecimento vindo do último capítulo, já Marcus é um retrato da perda e preocupação com outros membros da família. Definitivamente, Regan é melhor trabalhada. Krasinski e Simmonds criam juntos uma personagem forte, madura, mas com toda a esperança de uma jovem, e ela é um dos pontos altos do longa.
Seu irmão, Marcus, já não é tão bem trabalhado, pois embora ele protagonize cenas importantes e impactantes, ainda há alguns resquícios de clichês de filmes de terror nele, principalmente com relação às atitudes questionáveis que toma. Isso destoa um pouco do resto dos personagens, que são muito mais reais e tomam atitudes lógicas.
Um ator estreante na franquia é Cillian Murphy, que dá vida à Emmett, um personagem completamente destruído emocionalmente pelo apocalipse. Há um grande destaque nele e na sua interação com Regan, e juntos eles são responsáveis por cenas muito emocionantes. Vemos uma evolução de seus pensamentos e convicções durante a projeção, mas nada abrupto, é tudo realizado de maneira natural e coerente. A performance de Murphy também é digna de elogios, visto que ele consegue transmitir toda a tristeza, dor, rigidez e, até mesmo, breves momentos de doçura com excelência. Um dos maiores destaques do filme.
A trama acerta em dividir os personagens em dois núcleos. Krasinski permite que a história adquira um dinamismo, indo de um grupo para outro, e mostrando as dificuldades que cada um enfrenta. Essa intercalação também é feita de forma exemplar durante momentos de tensão, deixando-nos apreensivos pelo que pode vir em seguida.
É interessante destacar o esforço do filme na construção de suas cenas de tensão e suspense. Nesse longa, embora os personagens tenham uma vantagem contra os inimigos, ela nem sempre pode ser usada, ou então a tensão gira em torno da possibilidade de perder essa tal vantagem, sendo assim, não há espaço para que o espectador ou os protagonistas relaxem durante a história.
O silêncio volta a ser muito bem utilizado nesta continuação. O diretor usa-o com excelência e precisão para construir o suspense nas cenas, além dele sempre permear todo aquele mundo, deixando-nos apreensivos com qualquer barulho feito.
Há uma diferenciação excelente e curiosa entre a cena inicial, em que cada som, por menor que seja, é muito alto, e o resto do filme, no qual o silêncio domina completamente. Nos apresentando assim o antes e depois do apocalipse através da nossa audição, e essa transição gradativa que o filme faz do barulho à quietude é perfeita.
Há breves momentos em que a trilha sonora se coloca à frente do silêncio, prejudicando um pouco nossa imersão naquele mundo quieto e sem ruídos. Felizmente, esses momentos são tão breves que não incomodam quando se olha o todo. Um Lugar Silencioso – Parte II é uma continuação excelente, que se coloca à altura do original e o complementa de maneira tão coesa que é difícil dissociar as duas obras.
Esse filme jamais se rende a clichês ou tenta repetir fórmulas para atingir sucesso, ele apresenta ótimas novidades e adições à franquia. Embora haja momentos que quebram a imersão no filme, eles jamais chegam a prejudicar a experiência como um todo, uma vez que a história é bem conduzida, traz personagens cativantes, expande o universo apresentado e nos proporciona uma jornada tensa, assustadora e muito gratificante.