Henrique Marinhos
Em meio à poeira e quietude do Mississippi, Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal (All Dirt Roads Taste of Salt, no original) desenha uma narrativa lírica e contemplativa sobre amadurecimento. Dirigido por Raven Jackson e produzido pela A24, o filme é uma coleção de memórias e silêncios que moldam a história de Mackenzie, interpretada por Mylee Shannon, Kaylee Nicole Johnson, Charleen McClure e Zainab Jah, cada uma em diferentes fases da vida.
Dessa forma, Mylee Shannon traz à tela a infância de Mackenzie, cheia de inocência e curiosidade; Kaylee Nicole Johnson captura a turbulência da adolescência; Charleen McClure apresenta os dilemas da fase adulta; Zainab Jah reflete a maturidade, marcada por cicatrizes e sabedoria. A diretora entrelaça o corpo humano e a natureza, tecendo um retrato sensível do passar do tempo e das marcas profundas e invisíveis que ele imprime.
O filme opta por uma abordagem sensorial e introspectiva, com poucos diálogos e uma forte ênfase nos gestos e nos sons da natureza. Assim, cada cena parece deixar as palavras na ponta da língua. É uma sensação de desconforto, mas só por estarmos acostumados com narrativas mais dinâmicas e diálogos explicativos. Em comparação a outros filmes coming-of-age, como Lady Bird (2017), que se apoia no humor e nas interações verbais para desenvolver seus personagens, o longa de Jackson prefere o caminho do sentir.
Não é fácil trabalhar a contemplação, a narrativa social que envolve a narrativa e um amadurecimento pessoal de tantas perspectivas. A direção se propõe a fazer isso com pouquíssimos diálogos. No entanto, essa tentativa ambiciosa de unir tantas camadas acaba sobrecarregando o público com tantos simbolismos, nos afastando do que realmente importa: os pequenos momentos de vida.
A Fotografia de Jomo Fray e a trilha sonora de Sasha Gordon e Victor Magro elevam o longa. Enquanto a trilha mistura sons da natureza – o canto dos grilos, o farfalhar das folhas – com composições sensíveis, o enquadramento é como os olhares de um ser onisciente que a acompanha desde sempre. Há momentos em que a estética parece superar a narrativa, deixando a sensação de que a forma é mais importante do que o conteúdo emocional dos personagens.
Em termos de desenvolvimento, o amadurecimento de Mackenzie se dá nos detalhes, como olhares demorados, pequenos gestos e interações sutis. A irmã se torna um pilar constante, enquanto a mãe oferece apoio dentro de suas limitações. Ao contrário de Moonlight (2016), com momentos de catarse, aqui, a diretora opta pela sutileza e pelo silêncio. Por vezes, a falta de clímax faz com que algumas passagens pareçam se arrastar. Nessa mesma linha, a protagonista é moldada tanto pelas presenças quanto pelas perdas; pelo vazio deixado por quem parte e pelo calor das conexões que se formam. Assim, a narrativa não linear e o ritmo contemplativo demandam paciência.
Apesar de suas qualidades, Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal não escapa de alguns tropeços. A ausência de diálogos mais substanciais e de uma estrutura narrativa convencional pode fazer com que o filme pareça distante e difícil de conectar emocionalmente. Ainda assim, há beleza e sucesso em sua tentativa de capturar a vida nos pequenos momentos – os abraços silenciosos, o vento sussurrando entre as árvores e o som da terra sob os pés. Podemos refletir sobre as marcas que carregamos e sobre como, em cada jornada, há sempre algo de belo a ser encontrado, mesmo que discreto e fugaz.