Ana Nóbrega
Em 2020, a maior parte do público não esperava muito de Sonic – O Filme. Afinal, o longa já havia passado por um baita de um rebuliço ao liberar o seu trailer e não agradar nada os fãs com o design “diferente” do ouriço azul mais conhecido do mundo. No entanto, o filme – que praticamente encerrou o funcionamento de cinemas no início da pandemia – ganhou o coração da audiência com um bom redesign e uma ótima trama. Desta forma, sua sequência não poderia ser diferente.
Sonic 2 – O Filme, dirigido por Jeff Fowler, chegou aos cinemas dois anos, e uma pandemia, depois do primeiro longa-metragem, e conseguiu trazer a fórmula de sequências do MCU direto para as adaptações de games. Desta vez, muito mais focado no desenvolvimento do universo do Sonic (Ben Schwartz), do que no planeta Terra. Assim, a produção entrega para seus espectadores tudo que há de bom no mundo dos jogos, a animação, o enredo, o plot line e as referências.
A trama começa algum tempo depois de Sonic derrotar Robotnik (Jim Carrey), e enviá-lo direto para o planeta dos cogumelos. Enquanto Tom (James Marsden) e Maddie Wachowski (Tika Sumpter) viajam para o Havaí para prestigiar o casamento de Rachel (Natasha Rothwell), irmã de Maddie, o Doutor Robotnik cruza novamente o caminho de Sonic. Ainda depois de escapar do planeta cogumelo com a ajuda de Knuckles (Idris Elba), o equidna vermelho que busca pela esmeralda mestre.
Logo, o ouriço azul também precisa entrar em uma viagem cheia de aventuras para encontrar a esmeralda, e impedir que ela acabe nas mãos do cientista maluco. Para isso, ele conta com a ajuda de Tails (Colleen O’Shaughnessey), a raposa amarela de cauda dupla mais famosa do mundo dos videogames, que veio para a Terra apenas para alertar Sonic sobre Knuckles. Quando Tails entra em cena, o filme se torna uma animação realista quase que perfeita, vista pela última vez apenas quando Hollywood lançou a adaptação de Smurfs. Deste momento em diante, os atores que interpretam seres humanos se tornam meros coadjuvantes em uma trama enemies to friends (inimigos para amigos), com um quê de “a amizade é mágica”, entre um equidna, um ouriço e uma raposa extraterrestre.
O segundo Sonic se dedica em explicar as origens do ouriço azul e as complexidades de seu universo. Com o desenrolar da trama, o telespectador consegue aprender mais sobre a importância dos poderes do personagem. Além de desenvolver melhor a razão pela qual ele é perseguido por Knuckles, e a sua relação com a coruja Garra Longa, que o criou como um filho e o enviou para a Terra em uma tentativa de fuga.
Apesar das adaptações de videogames serem conhecidas por seu fracasso entre os fãs e o público geral, como Super Mario Bros.(1993) e Assassin’s Creed (2016), Sonic the Hedgehog 2 continua o legado de seu filme antecessor, só que ainda melhor. Isso porque ele agrada os fãs, trazendo referências e plots da história original, ao mesmo tempo que dialoga com o público geral, utilizando de tramas diferentes, como, por exemplo, a relação do Sonic com o mundo humano e o planeta de onde veio. Ou seja, ele consegue equilibrar ambos os lados, sem precisar fugir totalmente do enredo do jogo.
A mistura de realidade com animação consegue atrair não apenas os adultos, como as crianças e os fãs da trama de jogos. Mesmo que — se você prestar bastante atenção — a atuação dos humanos com os personagens animados não seja tão boa, a produção do longa se dedica em fazer tudo parecer o mais natural possível. Desde a relação paternal entre Tom e Sonic, até o acordo de interesses entre o equidna vermelho e o Doutor Robotnik. Em alguns momentos optando por manter esses dois núcleos separados, em prol da qualidade do filme.
É perceptível a preocupação dos roteiristas, Patrick Casey, Josh Miller e John Whittington, em agradar não apenas o público geral, como também os fãs do game. Afinal, as referências são facilmente encontradas por aqueles que conhecem e admiram o jogo desde a infância, e a trama é absorvida com facilidade por quem nunca ouviu falar da história original. Outro fator que faz com que a obra não seja voltada apenas para um grupo de espectadores específico, já que tudo é feito com sutileza.
Um dos erros que mais chamam atenção no longa-metragem são os cortes secos que transitam de uma cena para outra. Em boa parte da produção, principalmente mais perto do fim, as cenas não alternam de maneira fluída, e sim com cortes bruscos. Essa mudança repentina faz com que o público se questione como o cenário se modificou de maneira tão rápida, e tira a fluidez da produção visual. Esse fator aponta que, apesar de ser uma adaptação promissora e bem desenvolvida, a saga de Sonic ainda não saiu do patamar de filmes da “Sessão da Tarde”. Sonic 2 está mais para segunda opção, do que uma atração principal nos cinemas. Característica que é reforçada quando a trama se revela uma surpresa para o seu público, que já chegou às salas com baixas expectativas na estreia do primeiro.
A interação entre os humanos e o núcleo animado ainda continua um pouco engessada, algo claramente notável nas interações do ouriço azul com a sua família humana, Maddie e Tom. Em alguns momentos, em que o alienígena está levando broncas e conselhos de seus amigos terrestres, a atuação não acompanha o tempo e a posição da animação, o que torna as cenas algo bobo, de uma maneira que chega a ser cômico. Desta forma, o relacionamento de Sonic com seus amigos humanos evoluiu positivamente para um clima mais ao estilo de Eu, a Patroa e as Crianças.
No entanto, essas preocupações se perdem quando Sonic se reúne com Tails e Knuckles, e o foco do filme passa para a animação. A relação entre os três personagens do desenho é bem explorada, e o vilanismo do Doutor Robotnik não fica de fora disso. Em Sonic 2 – O Filme, o personagem de Jim Carrey chega mais próximo do Doutor Eggman dos videogames, não só em aparência como em personalidade e loucura, algo que não era tão presente no primeiro longa.
Além disso, a dinâmica entre o Doutor Robotnik e seu fiel escudeiro, o Agente Rocha, é transformada em um ponto ainda mais cômico do que o filme de 2020. Os dois passam a ser uma dupla quase romântica, que é incentivada pelo amor platônico de Rocha por seu mestre, por muitas vezes sendo o núcleo humano mais interessante da história. Afinal, eles contracenam diretamente com as animações em diversas situações.
O cientista maluco também se torna um alento ao coração dos fãs do videogame, já que suas tecnologias e suas características se igualam cada vez mais ao Doutor Robotnik original. Suas referências a cultura pop, a atuação impecável de Jim Carrey e a presença do robô gigante criado pelo cientista – que faz parte do jogo – diverte tanto as crianças quanto os adultos loucos pelo universo nerd.
Por fim, as cenas finais e os pós-créditos deixam o telespectador com um gostinho de quero mais, que só era encontrado antes em filmes da Marvel. Isso porque aqueles que não entendem as referências ficam curiosos para compreender o significado do fim da produção, e os que entendem ficam ansiosos pelo desenvolvimento de mais personagens e características vindas diretamente dos jogos da SEGA.
Toda essa expectativa aponta que, mesmo com falhas perceptíveis de roteiro e montagem, e ainda em um patamar de qualidade meio duvidoso, o live-action de Sonic apresenta um futuro promissor. A relação do primeiro filme com o segundo aponta a evolução da produção, pois, dessa vez, Sonic não é apenas sobre um ouriço perdido no mundo humano, e sim um personagem mais bem desenvolvido com toda uma história por trás. Fator que pode abrir caminho para adaptações de mais jogos e que eleva a expectativa de qualidade das que estão por vir, como a próxima adaptação de Super Mario Bros.