Nathan Nunes
Nada de Novo no Front é um livro escrito por Erich Maria Remarque, baseado nas suas próprias experiências como veterano alemão na Primeira Guerra Mundial. Publicado em 1929, o texto não demorou a ser transposto para o Cinema, com a adaptação Sem Novidade no Front sendo lançada um ano depois. Dirigido por Lewis Milestone, o longa fez tanto sucesso que venceu o Oscar de Melhor Filme em 1931, consagrando-se como a primeira adaptação literária a conquistar essa honraria, bem como a primeira vitória conjunta da categoria principal com o prêmio de Melhor Diretor. Agora, 91 anos depois, o diretor Edward Berger (Patrick Melrose e Your Honor), em parceria com a Netflix, traz uma nova versão de mesmo nome do material base para o streaming, exibida na programação da 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo na seção Perspectiva Internacional.
A história começa em 1917, acompanhando o jovem de 17 anos Paul Bäumer (Felix Kammerer), que se alista para lutar no exército alemão sob uma visão idealista da guerra. Chegando na frente de batalha, ele se depara com algo completamente diferente do que esperava, num cenário de caos, mortes e destruição. Logo vamos para 1918, quando Paul e seus amigos continuam lutando, enquanto o oficial Matthias Erzberger (Daniel Bruhl, de Rush e Falcão e o Soldado Invernal) tenta negociar um armistício com a França.
Logo nos primeiros minutos de rodagem, Nada de Novo no Front chama atenção imageticamente, com um plano aéreo registrando milhares de corpos espalhados por um terreno coberto de lama e cinzas. Essa imagem tão impactante evidencia a visão da obra como um todo de que a guerra é um desperdício da vida humana. A sequência que a sucede na montagem de Sven Budelmann expande ainda mais esse comentário, pois o que vemos são os uniformes dos soldados mortos sendo lavados, costurados e secados para serem vestidos por novos combatentes, representando o quão descartáveis essas pessoas são diante do conflito.
Nesse sentido, chamam atenção os elementos técnicos, sob o comando preciso da câmera de Berger, que situa muito bem o público dentro de tamanho caos bélico. A cinematografia de James Friend se destaca pela natureza fria e a complexidade dos planos de ação, enquanto o design de produção de Christian M. Goldbeck reproduz perfeitamente o desgaste das trincheiras; os efeitos práticos ressaltam a periculosidade das armas de fogo e a maquiagem de sangue, machucados, membros decepados e sujeira impressiona pela veracidade. No campo mais abstrato da sonoridade, mixagem e edição de som, sob supervisão de Lars Ginzel, Frank Kruse e Viktor Prášilo, bombardeiam os ouvidos do público por todos os lados, enquanto a trilha de Volker Bertelmann usa texturas eletrônicas no meio de uma orquestração dramática comum para realçar a violência iminente.
Nota-se, portanto, que tudo está no lugar em All Quiet on the Western Front (título em inglês da obra, utilizado em sua distribuição internacional), com exceção de uma coisa: a emoção. Isso não se dá por falta de tentativa, pois o roteiro de Berger, Lesley Paterson e Ian Stokell até tenta estabelecer vínculos significativos entre os soldados, mas falha por não diferenciá-los uns dos outros. Suas falas, modos de agir e até mesmo seus nomes se tornam difíceis de se distinguir entre si, o que gera a falta de nuances dramáticas e conflitos humanos e faz a experiência ser cansativa, por mais que os atores se esforcem para capturar as fortes emoções, como o jovem Kammerer na pele do protagonista.
Ainda que a falta de um aprofundamento emocional no longa de Berger não invalide o seu virtuosismo técnico, influencia muito no seu impacto para com o público. É um tipo de erro que não acomete outras histórias como O Resgate do Soldado Ryan (1998), de Steven Spielberg, ou Até o Último Homem (2016), de Mel Gibson, pois estas entendem a importância das emoções humanas para relacionar a audiência com as dores dos personagens assolados pela guerra. No fim das contas, isso só prova que Nada de Novo no Front precisa justamente daquilo sobre o que ele mais fala: humanidade.