Gabrielli Natividade da Silva
O primeiro episódio de La Casa de Papel veio ao ar em 2017, e agora, 5 anos depois, uma das séries mais conhecidas e adoradas da Netflix chega ao fim. A quinta temporada foi dividida em dois volumes (o primeiro lançado no dia 3 de setembro, e o segundo exatos três meses depois), e seguiu a narrativa deixada pela anterior: a gangue ainda estava no Banco da Espanha, depois do assassinato de Nairóbi e da chegada conturbada de Lisboa ao assalto, enquanto o Professor lutava com a fúria da inspetora Sierra e do coronel Tamayo. Só a menção desses pequenos fatos leva à conclusão de que coisas grandes estariam prestes a acontecer para finalizar a produção com chave de ouro e, de fato, aconteceram.
Juntamente com a última temporada, foi lançado o documentário La Casa de Papel: De Tóquio a Berlim (também dividido em dois volumes), que mostra um pouco da rotina por trás das câmeras e a visão das pessoas envolvidas na série. Nele, Álex Pina (produtor executivo) contou um pouco sobre os desafios de criar todo o ambiente de guerra da nova fase, que surpreendeu e agradou o público: “Precisávamos fazer algo maior, mas não sabíamos como abordar o gênero de guerra, nem como filmar, pois é extremamente complicado”. O diretor, Jesús Colmenar, completou falando sobre a pressão de finalizar a trama do jeito certo: “Entrei nisso com uma imensa sensação de responsabilidade […] temos que tornar esta temporada maior, temos que torná-la mais épica”. Felizmente, o resultado não deixou a desejar e entregou um final realmente inesquecível.
Afinal, não dá para falar sobre a última temporada de La Casa de Papel sem mencionar o roubo do ouro. Observando o plano de Berlim e Palermo, a única palavra que vem à mente é “impossível”, mas, na verdade, o roubo realizado no Banco da Espanha seria parcialmente possível, e isso foi explicado no documentário De Tóquio a Berlim. A produção da série contratou um engenheiro naval que fizesse todos os cálculos essenciais para que o plano de extração do ouro desse certo, desde o tempo mínimo necessário, até a pressão, o atrito e todos os outros conceitos de física complexos demais para meros mortais. Então, com a equipe e o material certo, roubar o Banco da Espanha poderia funcionar, exceto talvez pela parte de convencer o governo a substituir a reserva nacional por latão.
Fazendo uma retrospectiva da série como um todo, não é difícil perceber como ela adquiriu cada vez mais ação em seu enredo, ganhando nesse último momento um tom quase sombrio. As primeiras duas temporadas retrataram o assalto à Casa da Moeda, o qual, apesar de toda a ação e até mesmo as mortes envolvidas, foi muito mais simples quando comparado ao assalto ao Banco da Espanha, mostrado nos últimos três anos. É importante ressaltar, no entanto, que o segundo caso já teve início como uma guerra, quando a gangue começou o crime apenas para resgatar Rio das mãos da polícia, e a equipe policial, que já estava furiosa por não ter tido sucesso em interromper a retirada do dinheiro na primeira vez, não queria errar de novo. Tudo apenas se intensificou no decorrer da série para algo imenso e totalmente inesperado.
Uma possível razão para essa mudança de tom em La Casa de Papel é a modificação sutil na equipe de criação da série. A primeira temporada contava com cinco diretores, sete roteiristas e cinco produtores, enquanto a última contou com apenas dois diretores, quatro roteiristas e o acréscimo de um produtor. A alteração certamente trouxe alterações perceptíveis no curso da trama (como já foi comentado anteriormente), mas a permanência de quase todos os membros da equipe – em especial o produtor Álex Pina e o diretor Jesús Colemar – não permitiu que a essência tão especial da série se perdesse ou que pontas soltas fossem criadas. La Casa de Papel se comprometeu e entregou tudo até o fim.
Grande parte da emoção da última fase de La Casa de Papel também se deve ao fato de que, diferente da primeira parte da série, o grupo de assaltantes não tem mais a necessidade de evitar criar qualquer tipo de laço afetivo entre si, já que todos se tornaram uma grande família. Nessa temporada final, em vários momentos, era evidente o quanto cada membro da gangue lutou com unhas e dentes para proteger os outros. Mesmo em uma grande guerra contra o governo e o exército espanhol, toda a equipe ainda conseguiu demonstrar amor, apoio e lealdade, passaram por cada vitória e derrota juntos. É também interessante notar como a vulnerabilidade do time foi explorada ao máximo até nos pequenos detalhes, e um grande exemplo disso é a falta da proteção trazida pelas máscaras de Dalí e pelos reféns, experienciada pela primeira vez na história de La Casa de Papel.
Falando sobre o desenvolvimento das relações interpessoais no novo assalto, é inevitável mencionar como o romance se manteve presente. Na quinta temporada, Estocolmo (Esther Acebo) e Denver (Jaime Lorente) permaneceram como um dos casais principais, mesmo com o desenvolvimento rápido e superficial de um triângulo amoroso envolvendo Julia (Belén Cuesta). Mas o título de casal que tirou o ar dos espectadores uma última vez ficou para Rio (Miguel Herrán) e Tóquio (Úrsula Corberó). Logo de cara, na primeira temporada, La Casa de Papel ofereceu aos espectadores uma paixão ardente entre os dois personagens que faziam tudo um pelo outro. A bolha de amor foi estourada a partir da terceira – após o sequestro de Rio -, mas, nesse último momento, o arco romântico foi encerrado de forma heroica e com muito amor envolvido, como deveria ser.
A história de Tóquio também foi explorada ao máximo e de todos os ângulos possíveis na última temporada, trazendo uma construção perfeita para o grande momento de redenção da personagem que ficará marcado na história de La Casa de Papel. Quem se recorda da narradora apenas como a responsável por muitos dos problemas da série, desde a primeira temporada, não imaginaria que ela seria capaz de um sacrifício tão grande para salvar sua família. Os últimos episódios do primeiro volume da quinta temporada trouxeram com muita clareza os motivos de Tóquio ter a personalidade explosiva que todos amam (ou odeiam). Sua vida antes de entrar para a gangue foi finalmente contada, e sua importância para outros personagens (principalmente Rio, Denver e o próprio Professor) ficou explícita. Tóquio disse adeus da melhor forma que podia, e todos pararam para ouvir.
Outro ponto alto da temporada foi o desenvolvimento da relação entre o Professor e a inspetora Sierra, através de uma narrativa imprevisível e muito interessante (é claro que a química entre Álvaro Morte e Najwa Nimri foi o ponto chave para o ótimo resultado). Sierra, desde a sua chegada, se mostrou uma mulher forte e impenetrável que faz de tudo para conseguir o que quer, e não foi diferente quando foi passada para trás por Tamayo na quarta temporada, o que a deixou empenhada em fazer o impossível para encontrar o Professor e entregá-lo para conseguir sua reputação de volta. No entanto, a personagem foi levada ao limite e foi possível notar toda a vulnerabilidade que ela carrega; o Professor, por sua vez, teve um papel essencial na jornada de reconstrução e redescoberta de Sierra. Analisar a forma como a dupla saiu de inimigos para parceiros de sobrevivência, chegando enfim a uma relação de respeito mútuo, foi muito reconfortante.
De todos os arcos que aconteceram ao mesmo tempo na quinta temporada, aquele que deixou os fãs da série mais confusos no primeiro volume foi de longe o de Berlim (Pedro Alonso) e seu filho, Rafael (Patrick Criado). Não é mistério para ninguém que o personagem de Pedro Alonso é um dos mais queridos pelo público desde o início de La Casa de Papel, tanto que suas aparições foram indispensáveis mesmo depois de sua morte na segunda temporada. Porém, nos capítulos lançados em setembro, sua participação foi uma incógnita, com narrativa de introdução ao seu filho (nunca mencionado antes), sem nenhuma relação aparente com a trama principal. Houve muita especulação sobre a participação de Rafael na parte final da série, e o motivo da introdução de um roubo paralelo, mas mais uma vez a série espanhola não deixou de impressionar na perspicácia de um bom plot twist, já que tudo só fez realmente sentido no último episódio.
La Casa de Papel se despede com uma temporada épica, cheia de emoção e nostalgia, relembrando a todos os espectadores o motivo para terem se apaixonado por ela em primeiro lugar. O final pode ter sido irreal e utópico, mas era o necessário para fechar esse ciclo de forma perfeita e deixar todos com o coração quentinho e com lágrimas nos olhos. Todos os personagens caminharam e celebraram o final juntos, e todos os fãs também. Uma última vez: Oh Bella Ciao, Ciao, Ciao e obrigada pelos anos intensos e recheados de momentos incríveis.
Para todos que já estão chorando de saudade, vale mencionar que a Netflix confirmou no dia 30 de novembro um spin-off focado totalmente no queridinho Berlim, a nova trama leva o nome do personagem e deve chegar em 2023; não parando por aí, a plataforma ainda anunciou o remake sul-coreano La Casa de Papel: Coreia – Área de Economia Conjunta, com um teaser lançado no dia 18 de janeiro, é esperado que o projeto chegue ao serviço de streaming ainda em 2022.