Gabrielli Natividade
Há pouco mais de 15 anos, Gossip Girl ia ao ar pela primeira vez. A série, que tinha como meta colocar os luxos da elite de Manhattan em foco e explorar todos os pecados de um grupo de adolescentes levando a vida como adultos, comemora sua década e meia de existência mantendo uma consolidada base de fãs nostálgicos e o gosto de ter influenciado uma geração e muitas produções posteriores. Claro que nem tudo envelheceu como vinho: apesar de diversas pautas importantes serem tratadas ao longo das seis temporadas, é possível perceber que nem todos os temas foram abordados com a sensibilidade necessária, reflexo da mentalidade da época.
Com todo o impacto positivo, não foi surpresa que o HBO Max investisse em um reboot para o sucesso de 2007 e se dedicasse a consertar alguns de seus erros em uma nova história, mesmo que com algumas falhas. A segunda geração de Gossip Girl estreou em 2021 e, apesar de trazer um sentimento familiar, não chegou nem perto de se tornar tão influente quanto sua inspiração. Pode-se dizer que houve certa rejeição do público apaixonado pela versão original, devido à mudança de quase toda a equipe de criação, com exceção da produtora Stephanie Savage e do idealizador Josh Schwartz, o que tornou a nova série irreconhecível. Porém, há certos fatores que agradam, como a própria modernização da persona Gossip, saída dos blogs para se aventurar no Instagram e no Twitter.
Outro problema solucionado pela segunda produção foi a falta de representatividade. É inevitável pensar na série aniversariante sem lembrar do elenco majoritariamente branco, magro e hétero. Não é uma simples coincidência que Vanessa (Jessica Szohr), uma das únicas personagens não-brancas, fosse vista como uma grande vilã, ou que Eric (Connor Paolo), abertamente gay, tivesse um arco tão fraco em comparação com as grandes narrativas de seus colegas de elenco. Até mesmo Dorota (Zuzanna Szadkowski) e Cyrus (Wallace Shawn), únicos personagens não-magros, não passaram de alívios cômicos em meio aos dramas de Blair (Leighton Meester). Foi realmente uma vitória notar como a produção evoluiu em 15 anos, tendo agora, em sua segunda versão, um elenco diverso e com o mesmo glamour.
O que mais impressiona em Gossip Girl é a quantidade de pautas importantes discutidas, independentemente dos problemas em algumas abordagens. Logo na primeira temporada, o espectador se depara com a bulimia de Blair, devido a pressão de manter seu relacionamento arranjado com Nate (Chace Crawford) e viver à sombra de sua melhor amiga, Serena (Blake Lively); com o quase estupro de Jenny (Taylor Momsem) pelas mãos de Chuck (Ed Westwick); com a tentativa de suicídio de Eric e muito mais. A seriedade dos assuntos não diminuiu ao longo dos anos. Cenas de overdose, mortes, pedofilia e relacionamentos abusivos fazem parte da narrativa da produção. Não existem personagens puros e bons, mas adolescentes que conheceram o poder cedo demais e nunca aprenderam a lidar com isso, espelhando-se nas figuras adultas que tinham próximas a si, geralmente muito problemáticas.
Diversas séries foram influenciadas pela obra de Schwartz e Savage e se lançaram na estratégia de mostrar jovens em sua fase de rebeldia e inconsequência, ao mesmo tempo que lidam com as pressões do mundo. Algumas se esforçaram para explorar as questões com mais responsabilidade, como é o caso de Euphoria, que debate o vício e a abstinência em drogas com maestria. Já outras acabaram sendo até mais superficiais que a série de 2007, como Elite e a segunda geração de Rebeldes, que falam sobre estupro, doenças terminais, vício, homofobia e morte com pouquíssimo tato. Enquanto A Garota do Blog recebe o benefício da dúvida por ter sido lançada há 15 anos, não há desculpas para a imprudência das novas gerações.
É impossível falar de Gossip Girl sem mencionar as estrelas da série, Blair e Serena. Ao longo das seis temporadas, as duas tiveram incontáveis altos e baixos, indo de melhores amigas a inimigas em segundos. Elas brigaram o tempo todo, como se fossem irmãs, mas estiveram presentes na vida uma da outra, se apoiando desde sempre, e isso é o suficiente para se amarem incondicionalmente. Porém, não dá para ignorar o fato de que os conflitos ultrapassaram limites logo nos primeiros episódios em que Serena, mesmo sabendo da importância para Blair e sua família que ela mantivesse um relacionamento dos sonhos com Nate, e que a amiga o amava como a um príncipe encantado, engatou um namoro com o jovem. Do lado contrário, Waldorf também cruzou a linha: algumas temporadas depois, expôs um dos maiores traumas de Serena para pessoas importantes da Universidade de Yale enquanto ambas disputavam uma vaga.
Quem é fã da Queen B definitivamente não se decepcionou com o desenrolar de seu enredo. Blair teve, definitivamente, um dos arcos de redenção mais bonitos da série e foi um dos personagens que mais se desenvolveu positivamente. Na primeira temporada, a garota era apenas mesquinha, mimada e egoísta, uma bela fachada para esconder o fato de não ser feliz consigo mesma e não saber lidar com as situações sombrias de sua vida. Ao longo da produção, Waldorf viveu um romance intenso com Chuck Bass e sofreu demais em vários momentos, novamente não se valorizando o suficiente. Ao final, após perder amores, amizades, sua faculdade dos sonhos, seu filho e outros fatores que ela acreditava que a definiam como pessoa, ela finalmente se descobre e fica em paz. A garota se torna uma mulher madura e segura de si, e encerra seu ciclo com uma família que ama e celebrando o casamento de sua melhor amiga, feliz e livre dos pesos colocados sobre si.
Não há consenso acerca do final de Gossip Girl: muitos amam, muitos odeiam. Entre os desfechos que mais causam discussões está o de Dan Humphrey (Penn Badgley) como a fofoqueira queridinha e desprezada. Diversos fãs se incomodaram com a explícita hipocrisia do lonely boy, que se queixava constantemente da atenção que a Garota do Blog e a elite de Manhattan recebiam, se sentindo superior por não ser dependente dos luxos da vida nova-iorquina. Outra situação que causou controvérsias foi o casamento de Serena e Dan, após a garota ter transitado a série toda entre Humphrey e Nate; muitos prefeririam que Van der Woodsen tivesse terminado seu arco com Archibald, mas não foi realmente uma surpresa assisti-la caindo de vez nos encantos do garoto do Brooklyn. De qualquer forma, o melhor acontecimento foi a reunião de todo o elenco no último episódio, incluindo a eterna Little J, que havia deixado a produção dois anos antes para focar em sua carreira musical.
15 anos depois dessa grande produção, a Garota do Blog ainda é capaz de conquistar o coração de seus fãs. Mesmo com todas as desavenças, ainda há um ar de nostalgia, compreensão e confiança ao longo dos episódios, uma vez que os espectadores cresceram juntamente com os personagens, acompanharam todos os seus momentos de conquista e perda, seus altos e baixos, desde a escola até a sua vida adulta. A série acabou, mas seu legado ainda vive para que novas histórias surjam e representem adolescentes e suas vidas complicadas. Para Gossip Girl: XOXO, ainda amamos você.