Gabriele Lack
Eu estou tão cansada de correr o mais rápido que consigo/Imaginando se eu chegaria lá mais rápido se eu fosse um homem/E estou tão cansada deles vindo atrás de mim de novo/Porque se eu fosse um homem, então eu seria o cara/Eu seria o cara
Esse trecho que você acabou de ler foi retirado da música The Man da Taylor Swift. Nela, a artista reflete sobre a sua situação como mulher tanto no mundo da Música como na sociedade como um todo, transparecendo o quanto ela sempre tem que se esforçar mais para alcançar o mesmo sucesso dos homens, embora eles entreguem resultados medíocres quando comparados aos dela.
Enquanto a Miss Americana já migrou do country para o pop e do pop para o folk, faturando 11 Grammys, ela também enfrenta seu trabalho desvalorizado e às vezes até “roubado”. Enquanto um homem, cuja trajetória musical se baseia em usar jeans, camisa de botão e segurar um violão no palco, é considerado “O Homem”.
No clipe da música The Man, que foi roteirizado, dirigido e estrelado por Taylor, há uma cena na qual ela, vestida de homem, faz xixi numa parede de um metrô. Nessa parede, se encontram os títulos de 5 dos seus álbuns e também uma plaquinha escrito “PERDIDO, se achar devolver à Taylor Swift.” Onde ela claramente faz uma referência ao produtor musical, Scooter Braun, responsável pela compra de sua antiga gravadora e por vender os discos da artista sem o seu consentimento, desta forma, fazendo com que ela deixasse de ter direitos sobre as suas próprias músicas.
Para superar toda essa história e evitar que um homem lucrasse com o árduo trabalho que havia depositado em cada álbum que foi gravado pela gravadora Big Machine, Taylor Swift decidiu enfrentar uma jornada de regravação de todos os seus álbuns, que a antiga gravadora detinha os direitos. O primeiro desta jornada de regravação foi Fearless, o segundo álbum de estúdio da cantora, que inclui enormes sucessos como You Belong With Me e Fifteen.
O álbum original estreou na primeira posição da Billboard 200, fazendo Swift a artista mais jovem a conseguir a marca de álbum mais vendido em um ano nos EUA, que ainda rendeu 8 indicações ao Grammy e 4 vitórias na premiação para a cantora. Logo após o lançamento de Fearless, houve o single Love Story, que foi um divisor de águas na carreira de Taylor, pois após isso a Miss Americana alcançou seu sucesso mundial.
O sucesso mundial do segundo álbum de Swift pode ser justificado por apresentar um dos grandes traços de Taylor: suas composições intimistas onde a cantora encapsulou seus sentimentos, tornando possível a identificação por parte do grande público. E também por sua sonoridade marcante e sutil, que traz um country com uma mescla de pop, sem fazer esse crossover de uma forma grosseira ou forçada.
A regravação de seu primeiro sucesso mundial é chamada Fearless (Taylor’s Version), onde é perceptível notar que Swift nos trouxe uma voz mais madura e valorizada pela produção técnica do álbum, em comparação a 2008, mas ainda sim capaz de transmitir as mesmas sensações que a Taylor de 18 anos. A composição Love Story foi feita há 12 anos, mas ao cantá-la novamente em 2021, Swift em momento algum transpassou a música um tom infantil, nos entregando sua maturidade de agora aveludada aos seus sonhos de adolescente, feito que se estende por todo o álbum. Taylor demonstrou muito bem que, ao conversar com seu passado, ela não se sente deslocada em sua própria história.
Possuindo atitudes como contratar a banda original da primeira versão, a artista não poupou esforços para manter os dois álbuns o mais próximo possível um do outro. Porém ainda tiveram mudanças, que vieram em sua grande maioria em forma de acertos. Através de faixas como Fifteen, onde Taylor narra sutilmente sua entrada no Ensino Médio, é visto um tom mais nítido e acertado que o de sua versão original. Em seu ritmo, há um country mais melódico e romântico, com banjos, baterias e violinos bem marcados. Os acertos na composição do ritmo trazem vivacidade à música e a sensação de que você está no mesmo lugar que Taylor ao compor ela.
Apesar do álbum ser escrito por uma adolescente imersa em suas fantasias, Taylor é ciente dos altos e baixos do amor e Fearless também apresenta o momento em que o conto de fadas é quebrado. Segundo a própria Taylor, White Horse mostra como ela está chegando a uma conclusão de que não existe o conto de fadas em tudo e que esta é a vida real. A música narra uma desilusão amorosa da Miss Americana, e ao compará-la com Love Story, na versão regravada, fica muito nítido a disparidade entre suas melodias: Love Story desperta uma vontade de se apaixonar pela forma como narra um amor forte e permanente apesar de tudo; já em White Horse, temos um som mais calmo e um country melodramático, com acordes de violão bem fortes.
A sensação de nostalgia para os fãs de longa data da Miss Americana é constante, e ainda mais forte ao ouvir algumas faixas extremamente marcantes. Em You Belong With Me, Taylor nos presenteou com uma versão impecável de seu grande sucesso, apresentando um vocal nítido e mais harmônico, com os instrumentos mais bem trabalhados e resultando em uma sonoridade que traz uma percepção maior de cada instrumento que compõe a música. Resultando em uma melodia eletrizante e nostálgica para quem já acompanhava a artista há anos.
Mesmo trazendo um acerto na produção técnica da música e na produção da voz de Taylor, a regravação possui pequenas falhas, como em The Way I Loved You. Essa faixa possui um banjo bem marcado, destoando do que acontece ao decorrer do álbum. Logo no começo da música, já nota-se que a versão atual possui acordes mais sutis que a versão original e com uma progressão de grave maior, algo que aqui não foi tanto um acerto, pois a intro dessa música era algo muito marcante e diferenciado no álbum original. O arranjo de Fearless (Taylor’s Version) tirou um pouco da originalidade dessa faixa, e assim como outras músicas, a voz de Taylor casou mais com a melodia na versão atual, mas ao ouvir há a sensação que na versão de 2008 a cantora trouxe mais emoção.
A maior diferença entre as versões segue sendo a adição de seis faixas novas, escritas na época que o álbum original foi produzido, mas que ficaram de fora do lançamento. Entre as extras, está uma das músicas mais populares da cantora no Spotify atualmente: Mr. Perfectly Fine, que traz uma melodia composta por um country pop muito alegre, com guitarras energéticas e um ritmo com intervalos. A sua composição descreve um pós-término e como o narrador se sente frustrado com o parceiro do relacionamento romântico se mostrando uma pessoa diferente do esperado, um clássico de Taylor Swift. Vale ressaltar também a faixa Don’t You, cuja melodia apresenta um pouco mais de pop que o restante do álbum. Para um fã assíduo da cantora, a música aparenta ser mais algo que Taylor faria durante sua era 1989 do que em sua era Fearless.
Outra diferença entre os álbuns digna de ser vista é em relação às suas notas na plataforma Metacritic, que pontua trabalhos artísticos com base em textos de jornais renomados. A regravação e as faixas inéditas apresentam uma nota 82, enquanto a versão original apresenta uma pontuação de 73, mostrando como o álbum foi bem recebido pela crítica especializada. O álbum também foi bem recebido pelo público, igualmente à versão original, estreando na em primeiro lugar nas paradas da Billboard 200, como o álbum com a melhor semana de vendas do ano.
Os números demonstram como a atitude corajosa de Taylor de regravar seus álbuns, que de certa forma foram roubados, foi promissora. Segundo Swift, Fearless (Taylor’s Version) e esse importante processo de regravação foi mais satisfatório e emocional do que a mesma poderia ter imaginado, e a convenceu ainda mais a regravar todas as suas músicas, deixando transparecer os sentimentos em relação à retomada da sua própria Arte. Além de tudo, o interesse da Miss Americana em expor toda a situação em relação a Scooter e a sua antiga gravadora foi um grande alarmante para as condições em que jovens talentos são postos ao assinarem seus contratos.