Leonardo Teixeira
O ditado diz que não se mexe em time que está ganhando, mas Ariana Grande não segue máximas pré-concebidas. Sweetener (2018) é cheio de vida, mas já tem um sucessor. “Eu só quero falar com os meus fãs e cantar e escrever músicas e lançá-las do jeito que os caras fazem”, ela disse à Rolling Stone no fim do ano passado. E a atual crescente de sua carreira não deixa mentir: ela tem esse poder. thank u, next nos apresenta mais um capítulo da montanha-russa artística e emocional de Ariana.
Os “caras” a que ela se refere são artistas como Pusha T e Drake, que transformam suas desavenças em músicas (as famosas diss tracks) e as lançam sem o roteiro de divulgação que a indústria pop costuma exigir de artistas femininas, principalmente.
A liberdade de fazer o que quiser e quando quiser não é a única similaridade entre Grande e esses rappers, já que o hip-hop é a principal influência do novo disco. Prova disso é o hit 7 rings, uma celebração do poder que vem com uma carreira tão bem-sucedida. Ainda que relembre clássicos de Mariah Carey, a faixa não poderia ser mais a cara da nova Ariana — e ainda traz uma amostra do musical A Noviça Rebelde (1965), num dos usos de samples mais legais dos últimos anos.
A auto confiança é apenas uma das novas facetas que thank u, next revela sobre sua intérprete. Narrativas românticas sempre fizeram parte da expertise de Grande, mas nunca em tom tão amargo quanto o que vemos aqui. Diferente da doçura de seu trabalho anterior, em que a princesinha do pop exorcizava seus fantasmas, aqui ela encara as decepções frente a frente.
E é com uma franqueza desconcertante que Ariana prova esse amadurecimento. O amor romântico dificilmente tem um final feliz e essas desalegrias são contadas sem papas na língua. Em needy — o único momento sonoramente mal resolvido do trabalho —, ela admite: é carente de atenção e insegura, além de não saber o que é se sentir importante para alguém.
Tanto desencanto costuma ser relacionado à vida pessoal da cantora, já que os últimos anos não tem sido gentis com ela. Mas o pulo do gato aqui é que as faixas se sustentam sozinhas, em seu próprio universo. Explico: ainda que as narrativas midiáticas tenham sido muito importantes na concepção que o público tem de Ariana Grande, elas não são necessárias para a compreensão do que é dito no novo disco.
Altos e baixos emocionais também são percebidos na disposição das faixas na tracklist, que conseguem ir de momentos da total melancolia a auto celebração de forma súbita. O que poderia soar contraditório e inconsistente, na verdade eleva a experiência do álbum, porque parte do impacto da belíssima e triste ghostin vem do contraste climático que a música exerce com sua antecessora, mais otimista.
Além disso, as variações emocionais marcam o que talvez seja o discurso mais importante do disco: o de que Ariana é uma mulher complexa. O discurso de que o sucesso profissional nem sempre vem com alegrias na vida amorosa ou mental e que aprender com cada um desses picos e vales é o que nos resta na vida adulta.
No fim das contas, Ariana empoderada e a Ariana de coração partido fazem parte de um todo e não necessariamente são conflitantes. Pertencem à personalidade de uma mulher que, mesmo segura de si, não é forte e estável o tempo todo.
A faixa-título é a explosão disso, com a cantora analisando seus relacionamentos passados como oportunidades de aprendizado, passando longe da dor de cotovelo que é tão bem usada na cultura pop. Não é exatamente uma forma melhor de ver as coisas, apenas um ponto de vista de uma mulher que, aos 25 anos, já tem tantas experiência pra relatar.
E, mesmo com o circo midiático constante rodeando sua narrativa, só me interessa a versão que Ariana Grande quiser nos contar.
Um comentário em “Ariana Grande é dona da própria história”